Combate à pandemia é debatido pelo Observatório dos Direitos Humanos

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Reunião do Observatório dos Direitos Humanos do Poder Judiciário Foto: Romulo Serpa/CNJ
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Os reflexos da pandemia da Covid-19 no Brasil estiveram no centro dos debates do terceiro encontro do Observatório dos Direitos Humanos do Poder Judiciário, realizado na terça-feira (23/3). O presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Luiz Fux, destacou os resultados ações propostas pelo colegiado para minimizar os impactos causados pela disseminação do novo coronavírus, principalmente entre as pessoas mais vulneráveis.

De acordo com Fux, o Judiciário está implementando medidas para conter a propagação da Covid-19 e tomando as decisões exigidas pelo momento. Ele destacou que, em comparação com tribunais superiores de outros países, o STF é a que adotou o maior número de medidas para o enfrentamento da pandemia e tomou decisões que, inclusive, são utilizadas como referência para jurisprudência internacional. “Implementamos também medidas propostas neste Observatório, como a recomendação para que juízes analisem com cautela ações de desocupação coletivas de imóveis urbanos e rurais no período da pandemia.”

A sugestão que deu origem à Recomendação n. 90/2021, que recomenda cautela nas decisões judiciais sobre desocupações durante a pandemia, foi apresentada ao CNJ pelo presidente da Confederação Nacional do Bispos do Brasil (CNBB), Dom Walmor Oliveira de Azevedo. No encontro, o religioso enfatizou a importância da medida e apontou a necessidade do envolvimento de todos no combate à disseminação da doença. “Não é tempo de indiferença. A pandemia exige o envolvimento de todos e um outro aspecto fundamental é buscar mecanismos que supram a insuficiência de leitos para acolher as pessoas alcançadas pela Covid-19.”

Em relação às medidas envolvendo a área de saúde, a cantora Daniela Mercury, falando como representante da sociedade civil, sugeriu a criação de um Grupo de Trabalho para elaborar diagnóstico sobre a gestão da pandemia e propor medidas efetivas para contê-la. Na visão da embaixadora do Fundo das Nações Unidas pela Infância (Unicef) e embaixadora da Organizações das Nações Unidas (ONU) para igualdade racial, é preciso exigir que o governo federal se comprometa a vacinar 180 milhões de pessoas no prazo de 60 dias, a partir de abril. “Ele também deve incentivar o isolamento social – inclusive lockdown -, uso de máscaras, álcool em gel e valorizar a ciência. Temos a obrigação moral de defender medidas que salvem vidas.”

Outro tema abordado pela cantora foi a aplicação recorrente da Lei de Segurança Nacional contra pessoas que se manifestam sobre os problemas sanitários oriundos da crise causada pela Covid-19. O tema também foi abordado pelo ator Wagner Moura, que apontou que o recurso tem sido usado pela polícia contra quem contesta a gestão da pandemia. “Esse é um precedente muito perigoso e para o qual devemos estar atentos”, enfatizou o embaixador da Organização Internacional do Trabalho (OIT) contra o trabalho escravo.

Responsável pelo Comitê de Acompanhamento à Covid-19 no âmbito do CNJ, a conselheira Maria Tereza Uille Gomes considerou positivas as sugestões da cantora e defendeu a realização de audiências públicas para, num prazo de 10 dias, preparar um diagnóstico que contemplem as propostas. “Os tribunais estão dando muitas respostas. Mas considero essencial que busquemos respostas para as questões referentes à agilização da vacinação e garantia de suprimentos para atendimento às vítimas da doença.”

Ao declarar o alinhamento com as proposições da cantora Daniela Mercury, a diretora Geral do Centro de Excelência e Inovação de Políticas Educacionais do Rio de Janeiro, Cláudia Costin, defendeu os encaminhamentos também propostos pela conselheira Maria Tereza. “Nós nunca tivemos crise tão grave como a que estamos vivendo hoje no Brasil. Isso é fruto da dificuldade do Poder Executivo em operar políticas públicas, fato que um dia a Justiça deverá julgar.”

A conselheira Flávia Pessoa se mostrou favorável a criação do grupo, como forma de pensar coletivamente as ações de combate à pandemia. “Critica-se o Poder Judiciário pelas atuações micro na área de saúde, como ordens judiciais para realização de cirurgias. No momento atual, com a carência de tudo, é importante a atuação de políticas públicas macro, de maior alcance.”

Já a conselheira Candice Lavocatt Galvão Jobim observou que o CNJ conta com o Fórum Nacional da Saúde, cujo braço executivo é o Comitê Nacional da Saúde. E indicou que as sugestões podem ser formuladas para esse colegiado, que já vem atuando e debatendo os diversos impactos que a Covid-19 vem trazendo ao Sistema de Justiça. “Os pleitos relativos à pandemia podem ser encaminhados ao Comitê, que desenvolverá ações para implementa-los.”

O presidente da ONG Educação e Cidadania de Afro-descendentes e Carentes (Educafro) frei David Santos, reforçou a necessidade de implementação das propostas de Daniela Mercury e chamou a atenção para os efeitos do racismo estrutural brasileiro que, segundo ele, se reproduz também na pandemia. “De cada três adultos vacinados no país até o momento, apenas um é negro. Isso comprova como a estrutura é violenta e vitima, principalmente, a população afrodescendente.”

Terras indígenas

A defesa dos povos indígenas foi outro tema na pauta do Observatório dos Direitos Humanos. Professora aposentada da Universidade Estadual de São Paulo e professora emérita da Universidade de Chicago (EUA), Manuela Carneiro da Cunha chamou a atenção para o julgamento da Ação Rescisória nº 2686, que deve iniciar o julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) nesta sexta-feira (25/3). Por meio da ação, o povo Guarani Kaiowá busca reverter decisão que anulou a demarcação da TI Guyraroka.

Ela destacou que o Artigo 232 da Constituição Federal é claro em apontar os povos indígenas como legítimos defensores de suas terras, mas lembrou alguns magistrados ainda consideram a Fundação Nacional do Índio (Funai) como responsável. “Por isso, é fundamental pautar e julgar, no STF, a tese do marco temporal. Ela está no cerne da questão do julgamento que se inicia. A indefinição leva a uma insegurança que só multiplica e acirra conflitos.”

População carcerária

As ações do Observatório são, na visão da conselheira do CNJ Ivana Farina, implementadas na busca de igualdade, liberdade e por vida digna. Ela enfatizou que alguns pleitos são encaminhados pelo CNJ, como a Recomendação nº 91, aprovada recentemente e que renova os cuidados exigidos pela pandemia com a população carcerária. “Se convidamos a sociedade civil para se manifestar, ela tem legitimidade e revela que as escutas que fazemos são muito qualificadas.”

A conselheira lembrou que a segunda onda da doença fez com que o número de mortes em presídios aumentasse 190%. Segundo Ivana Farina, isso fez com que o ministro Luiz Fux propusesse a renovação da Recomendação que trata da questão. “No caos sanitário provocado pela pandemia da Covid-19, o CNJ tem uma série de normativas editadas sobre o tema e seguirá atento para a implementação das ações necessárias para contenção desse caos.”

Atenção à vítima

A aprovação pelo da implementação do Plano Nacional de Atenção à Vítima foi saudada pela juíza da 5a Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro (RJ), Adriana Cruz. Ela tratou das dificuldades das famílias em acompanhar os processos e ressaltou a necessidade de o Poder Judiciário não ser mais um elemento de aprofundamento da dor. “Temos que evitar a revitimização e também agradecer a celeridade do CNJ na condução da proposta trazida a este Observatório.”

Falando em nome do Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), o presidente Yuri Costa ressaltou o trabalho do órgão em relação à atenção às vitimas e destacou as ações do CNDH relativas ao problema da vulnerabilidade em tempos de pandemia. “O CNDH criou a Comissão Direitos Humanos e Pandemia e ela está à disposição do CNJ para atuar conjuntamente na implementação de medidas que forem definidas pelo Observatório.”

Jeferson Melo
Agência CNJ de Notícias

Reveja a reunião do Observatório no canal do CNJ no YouTube