Fonajus: “Saúde é um dos temas mais difíceis que o Judiciário enfrenta”, diz Barroso

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Abertura da VII Jornada de Direito da Saúde e comemoração de 15 anos do Fonajus. Foto: Gláucio Dettmar/Ag. CNJ
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Os 15 anos do Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde (Fonajus), criado em 2010 para monitorar as demandas judiciais que chegam ao Judiciário, foram comemorados nesta quinta-feira (24/4), na cerimônia de abertura da VII Jornada de Direito da Saúde, ocorrida no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em Brasília/DF. O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes foi o homenageado nesta edição da Jornada. 

O presidente do CNJ, ministro Luís Roberto Barroso, abriu a cerimônia destacando que nenhum país no mundo tem um nível de demandas judiciais tão grande nessa área e que essa é uma questão que precisa e vem sendo enfrentada pela Justiça não apenas pela quantidade de casos, mas principalmente pelas suas complexidades.

“Esse é um dos temas mais difíceis e complexos com os quais o Poder Judiciário tem se deparado, pelo volume, pelas escolhas trágicas envolvidas. Ninguém deseja que a saúde seja administrada pelo Poder Judiciário, mas ao mesmo tempo é papel dele atender a direitos fundamentais, inclusive o direto à saúde quando não esteja sendo devidamente assistido”, afirmou.

Segundo dados de janeiro do Painel de Estatísticas Processuais de Direito à Saúde, havia 869.271 ações judiciais relacionadas à saúde pendentes de julgamento. Dessas, 518.811 se referem à saúde pública e 365.286 à saúde suplementar. “A judicialização não é a forma convencional de se resolver questões. Se está havendo judicialização, instâncias que deveriam estar funcionando não estão funcionando. Vivemos uma epidemia de litigiosidade da saúde e aqui estamos pensando em como superá-las”, disse. 

Apenas em 2024, foram ajuizados 663.864 novos processos, o que representa um crescimento de 16,8% em relação a 2023. Somente nos dois primeiros meses de 2025, houve um incremento de 18,7% nas novas demandas da saúde suplementar, em comparação ao mesmo período do ano anterior.

Barroso destacou que o aumento do volume de demandas relacionadas à saúde tem sido um problema crescente, que desorganiza o sistema como um todo, e que, ao longo desses anos, tem sido feito um trabalho de conscientização do Judiciário e da sociedade para a medicina baseada em evidências. “O Supremo Tribunal Federal tem enfrentado com profundidade essas questões complexas, em especial a questão do fornecimento de medicamento e tratamentos não incorporados ao Sistema Único de Saúde. Nós nos debruçamos sobre o assunto e produzimos enunciados e direcionamentos”, disse.  

O objetivo do Fórum é debater e viabilizar saídas coletivas para o elevado número de processos relativos à saúde pública e privada. Entre os avanços desenvolvidos no âmbito do Fórum, estão a implementação dos Núcleos de Apoio Técnico do Judiciário (NatJus), que elaboram pareceres técnicos baseados em evidências científicas, e o e-NatJus, repositório de pareceres especializados que está disponível para magistrados e operadores do Direito. 

Leia mais: Fonajus 15 anos: ações e políticas qualificam decisões judiciais na saúde

Diálogo e direito à saúde

Abertura da VII Jornada de Direito da Saúde. Foto: Gláucio Dettmar/Ag. CNJ

A presidente do Fonajus, conselheira Daiane Nogueira de Lira, ressaltou o legado do colegiado como a possibilidade de o Judiciário solucionar as ações com base no direito do paciente, mas também observando as evidências médico-científicas disponíveis para o tratamento daquele que busca a Justiça.

“Ele foi idealizado para ser um fórum interinstitucional de diálogo constante e permanente entre o sistema de justiça e o sistema de saúde, para que, por meio dessa construção dialógica, possamos trazer políticas públicas que atuem exatamente nessa questão tão sensível da sociedade, que é o direito à saúde”, disse Daiane.

Como homenageado, o ministro Gilmar Mendes — que presidia o STF e o CNJ na época da criação do fórum — abordou o problema da judicialização excessiva. O ministro citou dados do DataJud, dados de 2020 a 2024, quando houve um exponencial aumento de 290%. Em 2020, havia cerca de 21 mil casos novos por mês judicializados e, no mesmo mês, quatro anos depois, esse número aumentou para mais de 61 mil casos novos por mês. 

Consolidação do E-NatJus 

Gilmar Mendes ressaltou o trabalho das notas técnicas e dos pareceres disponíveis aos juízes por meio da plataforma E-NatJus. Foram registradas mais de 270 mil notas técnicas, que podem ser consultadas pelos juízes responsáveis por processos judiciais na área de saúde. “Esses dados não apenas demonstram a consolidação do sistema como a maturidade dos magistrados para reconhecer a importância de embasar suas decisões em evidências científicas”, afirmou o magistrado, que defendeu a importância do Fórum e de seu permanente funcionamento, para um Judiciário mais técnico e menos controverso. 

O secretário executivo do Ministério da Saúde Adriano Massuda reforçou a importância da parceria entre os órgãos e da rede NatJud, que viabilizou a qualificação das decisões judiciais com base nas melhores evidências científicas disponíveis. “O Fonajus, criado pelo ministro Gilmar, é um exemplo de cooperação entre o Direito e a Saúde. Celebrar essa trajetória é firmar um compromisso com o sistema único universal, integral, público, sustentável, capaz de garantir acesso com qualidade, responsabilidade social e fiscal a toda a sociedade brasileira”.   

O defensor público-geral federal, Leonardo Magalhães, afirmou que a Defensoria Pública tem acompanhado, nesses últimos anos, o aumento do número de casos, assim como o aumento da complexidade deles, e reforçou que o Supremo tem exercido um papel conciliador na organização da judicialização desses temas na Justiça. Entre os pontos citados, lembrou do Tema 1234, do STF, que trata da judicialização da saúde e da competência da Justiça Federal para pedidos de medicamentos, especialmente quando não estão padronizados no SUS e possuem custo elevado.  

Também participaram da cerimônia os ex-conselheiros e ex-presidentes do Fórum: Arnaldo Hossepian, que esteve à frente do Fonajus entre 2015 e 2019; Candice Lavocat Galvão Jobim, que presidiu o colegiado entre 2019 e 2021; e Richard Pae Kim, que esteve à frente do colegiado entre 2021 e 2023. Também estiveram presentes: o ministro Paulo Sérgio Domingues, do Superior Tribunal de Justiça (STJ); os conselheiros Mônica Nobre, João Paulo Schoucair, Ulisses Rabaneda e Rodrigo Badaró; além de magistrados, autoridades do Judiciário e profissionais da saúde. 

A cerimônia foi finalizada com o lançamento do livro 15 Anos do Fórum Nacional do Judiciário para a Saúde, produzido pela Revista Justiça & Cidadania. A obra conta a história da criação do colegiado, o trabalho dos Comitês Estaduais de Saúde e as ações realizadas pelo Fonajus, como o Fonajus Itinerante e os pareceres técnicos e-NatJus. À tarde, haverá debates e atualização dos enunciados conforme decisões do Supremo Tribunal Federal (STF).

Texto: Regina Bandeira
Edição: Geysa Bigonha
Revisão: Caroline Zanetti
Agência CNJ de Notícias

 

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