Propostas buscam reduzir vulnerabilidade na defesa dos direitos humanos

Você está visualizando atualmente Propostas buscam reduzir vulnerabilidade na defesa dos direitos humanos
O grupo está desenvolvelndo diretrizes nacionais ao atendimento e à realização de depoimento especial entre povos e comunidades tradicionais Foto: Luiz Silveira/CNJ
Compartilhe

As propostas dos integrantes do Observatório dos Direitos Humanos do Poder Judiciário, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), demonstraram “sensibilidade para a realidade em que vivem as populações mais vulneráveis de nosso país”, segundo o presidente do CNJ e do Supremo Tribunal Federal (STF), Luiz Fux. Ele afirmou que as ideias apresentadas pela participação social vão resultar em iniciativas concretas para o aperfeiçoamento da tutela dos direitos humanos pelo Poder Judiciário. As 11 proposições foram apresentadas durante a segunda reunião do grupo, realizada nessa quinta-feira (10/12).

Leia mais: Propostas da sociedade contribuem com o Judiciário em favor dos direitos humanos

Começando pela proposta de fomento à justiça itinerante, o embaixador da Organização Internacional do Trabalho, o ator e diretor Wagner Moura, ressaltou a importância da presença do judiciário para conter situações de trabalho escravo e outras medidas emergenciais. “Levar a justiça a locais onde ela não chega – e que normalmente são minorias e populações mais vulneráveis – é uma garantia da manutenção dos direitos humanos”, afirmou Wagner Moura. A proposta do ator prevê o reforço em duas frentes: combate ao trabalho escravo e defesa de terras indígenas.

Para reforçar a proposta, o juiz Jônatas Andrade, do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região (Pará e Amapá), contou a experiência da justiça itinerante na região, com boas práticas e um trabalho exitoso contra o trabalho escravo. De acordo com o magistrado, era necessário um acesso ao Sistema de Justiça às populações isoladas e mais efetividade às decisões judiciais. O trabalho itinerante levava em consideração três institutos processuais: a tutela provisória, inspeção judicial e a produção antecipada de provas. Dessa forma, o TRT8 superou obstáculos como o acesso ao trabalhador e a “naturalização” do trabalho escravo. Por meio da presença do juiz no local, foi possível verificar uma realidade tocante, difícil de ser reproduzida nos autos do processo tradicional, confirmando a importância da iniciativa.

Já a juíza Adriana Alves Cruz, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), apresentou um projeto elaborado em conjunto com mulheres negras de coletivos e organizações que atuam na proteção dos direitos da população negra. A ideia é a implantação de um plano nacional de atenção e apoio às vítimas de crimes e atos infracionais, levando em consideração questões de gênero, raça, classe e sexualidade. Ela lembrou que a Corte Internacional de Direitos Humanos tem norma a respeito do trato da família da vítima, que não pode ser “revitimizada” no atendimento dado pelo Poder Judiciário. Alguns tribunais brasileiros já dispõem de iniciativas nesse sentido, mas a magistrada reforçou que um plano nacional adotado pelo CNJ pode melhorar a atuação de centro de atendimentos ao familiar e às vítimas.

Liberdade de expressão

A embaixadora das Organização das Nações Unidas (ONU) e do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), a cantora Daniela Mercury apresentou a proposta de realização de “Encontros Virtuais sobre Liberdade de Expressão Artística”. O objetivo é reunir profissionais das artes, especialistas, parlamentares, organizações da sociedade e representantes dos governos e da Justiça para promover a reflexão, em cinco webnários, sobre a defesa das manifestações artísticas como direitos humanos indevassáveis e definir ações concretas que fortaleçam as artes, os artistas e os espectadores, bem como iniciativas de combate à censura. Os encontros devem começar em 2021. A cantora também informou que um grupo de artistas lançou, nessa quinta-feira (10/12), um vídeo-manifesto contra a violação dos direitos humanos e pela democracia.

O “Combate à violência contra crianças” é a proposta da especialista em educação Cláudia Costin. A iniciativa destaca a importância da educação sexual na escola para prevenir estupro de crianças, além de sugerir o fomento à comunicação não agressiva e a mediação de conflitos por meio da Justiça Restaurativa.

Representante do Instituto Avon, Daniel Silveira propôs a criação de um Laboratório Nacional da Violência Baseada em Gênero contra Mulheres e Meninas, em articulação com instituições de pesquisas e estatísticas. O objetivo é desenvolver dados regulares que possam pautar, influenciar e avaliar políticas públicas voltadas para o combate da violência de gênero. O Instituto Avon também se dispôs a contribuir com a análise do monitoramento de medidas protetivas de urgência, com análise do banco de dados e a publicação dos resultados.

Para promover o reconhecimento de juristas mulheres no âmbito das decisões judiciais, o diretor Jurídico e de Relações Institucionais da Gerdau, Fabio Spina, propõe a criação de campanhas, programas e prêmios, ou outras iniciativas, com o mote “Cite uma Mulher”. A ideia é que o Judiciário reforce a iniciativa de que, em obras acadêmicas, sentenças e decisões, sejam citadas juristas mulheres também, para fortalecer o trabalho feminino na justiça.

Os representantes da ONG Viva Rio, Sebastião Santos e Rubem César, apresentaram iniciativa para reforçar o controle, a certificação e qualificação das empresas de segurança privada. O tema está sendo proposto em decorrência dos elevados índices de violência – muitas vezes motivados por racismo – registrados nas áreas de atuação dessas empresas. De acordo com eles, a proposta está sendo apresentada também a associações representativas de shoppings e supermercados, principalmente.

Já Frei David, da organização da sociedade civil Educação e Cidadania de Afrodescendentes e Carentes (Educafro), pediu que a proposta de implementação de cotas raciais em concursos públicos para cartórios, ampliando a política de ações afirmativas já adotada pelo Poder Judiciário, seja analisada pelo Plenário do CNJ em sua próxima sessão, marcada para o dia 15 de dezembro. Ele pediu, ainda, que os concursos para serviços extrajudiciais que já estiverem abertos também possam ter editais de retificação, adotando a medida.

Para qualificar a prestação jurisdicional sobre os direitos dos povos indígenas, a antropóloga Manuela Carneiro da Cunha propõe criação de grupo de trabalho para elaborar recomendações e orientações sobre a condução de processos judiciais que abordem direitos territoriais indígenas. Além disso, busca-se reforçar a qualificação do Sistema de Justiça, com a elaboração de publicação sobre questões constitucionais e procedimentos processuais em matéria indígena, destinada prioritariamente a magistrados e escolas de magistratura.

Dom Walmor, da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), ressaltou ser importante que o CNJ emita uma recomendação aos tribunais para suspender o cumprimento de mandados coletivos de desocupações de imóveis urbanos e/ou rurais durante a pandemia do novo coronavírus, até existir a imunização social, por meio de vacina ou remédio. Ele destacou o agravamento das questões sanitárias durante a pandemia. Citando o Papa Francisco, Dom Walmor afirmou que “não é tempo para egoísmos ou indiferenças, mas é tempo para se unir e enfrentar a crise trazida pelo vírus”.

E a proposta do rabino Nilton Bonder, que não pôde estar presente à reunião, sobre a ampliação da Audiência de custódia por videoconferência para o Sistema prisional, foi atendida parcialmente pelo CNJ previamente, com a aprovação da Resolução n. 357/2020, que dispõe sobre a realização de audiências de custódia por videoconferência quando não for possível a sua realização, em 24 horas, de forma presencial.

As propostas receberam o encaminhamento do ministro Fux, que devem começar a ser efetivados em 2021.

Lenir Camimura
Agência CNJ de Notícias