Acesso à Justiça: tribunais se mobilizam para atender pessoas em situação de rua

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Fotos: Gil Ferreira/CNJ
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A população em situação de rua no Brasil é estimada em 220 mil pessoas – um grande contingente de cidadãos e cidadãs em situação de pobreza ou de extrema pobreza com grande dificuldade de acesso a direitos básicos. Os dados levantados pelo Programa Polos de Cidadania da UFMG e Instituto de Políticas Econômicas e Aplicadas (Ipea) foram divulgados no I Webinário da Comissão Permanente de Políticas Sociais e de Desenvolvimento do Cidadão, realizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) na última quinta-feira (19/5).

De acordo com os especialistas presentes no debate, essa população é majoritariamente negra (70%), formada em quase sua totalidade (88%) por homens. A radiografia desse segmento da sociedade concentrado nos grandes centros urbanos, e que mesmo assim é considerado invisível, foi apresentada juntamente com dados sobre a situação da moradia no Brasil.

Conforme informações apresentadas no painel “Direitos humanos e moradia adequada”, o país tem um déficit de 5,8 milhões de moradias, 17,8 milhões de pessoas vivendo em favelas e 24,8 milhões de residências inadequadas e com riscos. Ao chamar a atenção para a conexão entre esses dois temas, a juíza Luciana Ortiz Tavares Costa Zanoni, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), destacou a importância em descortinar essas questões sociais no âmbito do Judiciário.

“É uma alegria lançar luz para essa temática fundamental para a cidadania e os direitos humanos, buscando pontos de intersecção com tema que possam ser abraçados por uma futura política judiciária a ser desenvolvida no âmbito da Comissão Permanente de Políticas Sociais e de Desenvolvimento do Conselho Nacional de Justiça”, afirmou. Ela se referiu à questão da moradia e lembrou a importância da Resolução CNJ n. 425/2021, por meio da qual o Judiciário instituiu uma política judiciária específica para a população em situação de rua.

O coordenador do Programa Polos de Cidadania da UFMG, professor André Luiz Freitas Dias, que apresentou os dados, expôs o quadro da população em situação de rua fazendo um alerta sobre a subnotificação por parte do CadÚnico do governo federal, que quantifica a população em situação de rua em 158.191 pessoas. Salientando que os estudos apontam tendência de alta dessa população, o professor advertiu que se o país não investir em políticas públicas estruturantes esse contingente vai se tornar ainda maior.

De acordo com André Luiz, como o CadÚnico é utilizado para identificação de pessoas em situação de vulnerabilidade e transferência de benefícios assistenciais, com a subnotificação há mais de 60 mil brasileiros morando nas ruas sem acesso a esses recursos. “Estamos falando de uma população de rua majoritariamente negra e de um fenômeno social complexo que historicamente deixa marcas nos corpos e na vida das pessoas do nosso país.”

Cidadania

Nesse cenário de risco de agravamento das condições sociais, o juiz Márcio Maia Barbosa, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), apresentou o programa “Movimento PopRuaJud – conquista e desafios” de mutirões de ajuda e de resgate de cidadania das pessoas em situação de rua. Essas ações vêm sendo realizadas desde o ano passado em Brasília, São Paulo e em outras cidades reunindo diversos órgãos do Judiciário e do setor público em apoio para que essas pessoas possam resgatar sua cidadania.

Em Brasília, foram feitos mutirões em dezembro de 2021 e em março deste ano reunindo 11 órgãos com ações do Judiciário e do governo federal e do Distrito Federal, com serviços de emissão de documento de identidade, CPF e título de eleitor, cadastro para benefícios e serviços assistenciais. A próxima ação está marcada para o dia 28 de junho. “É um portal para o resgate da cidadania, com as instituições se unindo e fazendo a sua parte cada uma com uma equipe multidisciplinar. Para as pessoas que precisam desses serviços esses são dias de mais esperança”, explicou Márcio Maia.

O coordenador do Movimento Nacional População de Rua, Darcy Costa, deu um depoimento sobre realidade dos moradores em situação de rua. Para ele, conscientizar a sociedade sobre os direitos dessas pessoas é um desafio permanente e mais que necessário. “Não é humano permitir que outro ser humano esteja em sua nação em uma condição abaixo da sociedade. Falta compromisso do Estado com os mais vulneráveis.”

O papel do Poder Judiciário em um contexto marcado por grandes problemas sociais foi abordado pelo juiz André Augusto Salvador Bezerra, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). Magistrado e professor da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam), Bezerra falou da importância da cooperação judiciária e da formação de magistrados para que o Judiciário e os tribunais não sejam instituições isoladas e distantes da realidade.

“Uma nova gestão de capacidade técnica implica na necessidade de uma magistratura culturalmente esclarecida e equipada com conhecimento vasto e diversificado. Isso implica uma nova formação, uma formação para quebrar a lógica do isolamento e que ensine a nossos juízes e juízas a dialogar e colaborar com os desafios complexos como os presenciados pelos moradores em situação de rua”, avaliou.

Participaram do debate, também, o defensor público de São Paulo Allan Ramalho Ferreira e a juíza Luciana Yuki Sorrentino, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), como presidente da mesa.

Luciana Otoni
Agência CNJ de Notícias

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