Justiça ajuda a formar profissionais de acolhimento de crianças

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Como seria uma instituição ideal para acolher crianças e adolescentes retirados de suas famílias? A pergunta foi feita na Vara de Infância e Juventude do Distrito Federal (VIJ-DF) pelo consultor organizacional Antônio Monteiro dos Santos, diante de um auditório repleto de profissionais que trabalham em instituições de acolhimento. Tratava-se de mais uma das 14 aulas que compõem o curso “psicologia da libertação”, oferecido pela Rede Solidária Anjos do Amanhã, programa de voluntariado do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT).

Assim como no TJDFT, juízes de outros tribunais atuam na capacitação de profissionais que trabalham em abrigos. O Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), por exemplo, capacitou 227 educadores sociais de 23 abrigos do Estado, no período de 2011 a 2014, por meio do programa “Bem formar para bem cuidar”.

O objetivo do Poder Judiciário ao oferecer cursos de capacitação para esse público é melhorar a qualidade do atendimento a crianças e adolescentes que vivem nos abrigos. No Cadastro Nacional de Crianças Acolhidas (CNCA), coordenado pela Corregedoria do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), há em torno de 46 mil crianças e adolescentes em situação de acolhimento, que vivem as quase 4 mil entidades acolhedoras credenciadas junto ao Judiciário em todo o País.

Segundo o juiz Renato Rodovalho, titular da Vara da Infância e da Juventude do DF, essa capacitação realizada por profissionais de reconhecida experiência nacional e internacional demonstra a preocupação da VIJ-DF com a qualidade do trabalho prestado pelas entidades de acolhimento às crianças e adolescentes.

“Estou certo de que o curso trará aos técnicos subsídios teóricos e metodológicos com impacto nos diagnósticos e nas intervenções em cada um dos casos”, diz o juiz Rodovalho.

O martelo e o prego

O curso oferecido pelo TJDFT, em parceria com o Instituto Internacional para Mindfulness e Paz Interna (Impaz), é conduzido pelo psicoterapeuta Antônio Monteiro dos Santos, que foi professor da Universidade de Viena. O curso é baseado na psicologia da libertação, que trabalha mudanças para libertar o indivíduo de estruturas internas e externas que bloqueiam a inteligência criativa.

A intenção é abordar o contexto histórico, as condições sociais e as aspirações das pessoas. “Psicólogos e agentes de saúde não podem ser cúmplices de injustiças sociais”, diz Santos.

Durante o curso, são levantados assuntos que  permeiam as instituições de acolhimento, como a violência dos jovens, a evasão escolar e a convivência com abusos sexuais.

A escuta dos problemas é o primeiro passo em busca de uma solução.  “A teoria deve vir da prática, e não o contrário”, diz  dos Santos . Em seguida, menciona o psicólogo americano Abraham Maslow: “Quando se tem um martelo, trata-se tudo como um prego”. Segundo o psicólogo, para resolver esses conflitos não se pode aplicar técnicas sem considerar as pessoas e os contextos diferentes.

Outro ensinamento do curso é que as crianças e adolescentes têm de participar da organização da instituição. Eles devem fazer parte das reuniões periódicas em que são distribuídas responsabilidades no dia a dia da instituição. “Subestimamos muito as crianças”, disse Santos ao se referir à capacidade de crianças e adolescentes de assumir responsabilidades. Durante o curso, os profissionais são colocados a pensar que tipos de mudanças poderiam ser feitas para melhorar a situação dos abrigos e a trocarem experiências das diferentes instituições, com objetivo de fortalecer a rede de acolhimento.

Formação continuada no Espírito Santo

A preocupação com a formação adequada dos educadores sociais dos abrigos no Espírito Santo foi o que motivou o programa “Bem formar para bem cuidar”, uma parceria da Coordenadoria de Infância do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES) com o Lar Batista Albertine Meado, que possui duas casas lares. Por meio do patrocínio de empresas como a ArcelorMittal Brasil, o projeto formou 227 educadores sociais de 23 abrigos do estado, situados em dez municípios diferentes, no período de 2011 a 2014.

O público alvo foram pessoas que trabalham diretamente com as crianças, com objetivo de assegurar um tratamento digno, humanizado e de qualidade. De acordo com a juíza da 2ª Vara da Infância e da Juventude da Serra e colaboradora da Coordenadoria das Varas da Infância e da Juventude do Poder Judiciário do Espírito Santo, Janete Pantaleão Alves, havia muitas denúncias feitas pelas próprias crianças que viviam em abrigos em relação ao desleixo dos cuidadores. “As crianças não se sentiam acolhidas e, depois do curso, essa situação melhorou muito. Não tivemos mais denúncias de maus-tratos”, diz.

O curso teve quatro módulos com carga horária total de 240 horas. Entre os temas abordados, estão a psicologia do desenvolvimento infantil e adolescência, prática e perseverança educativa, escolarização e processos pedagógicos, o momento de reintegração familiar ou de adoção, entre outros. De acordo com a juíza Janete, a qualificação oferecida possibilitou que os educadores passassem a auxiliar no retorno da criança para casa, e houve redução significativa dos casos em que as crianças se “eternizavam” nos abrigos.

Luiza Fariello
Agência CNJ de Notícias