Implantação da Justiça Restaurativa obtém resultados práticos em 2020

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Última reunião do Comitê Gestor da Justiça Restaurativa em 2020 ocorreu virtualmente em 16 de dezembro. FOTO: Arquivo
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Apesar da pandemia do novo coronavírus (Covid-19) e as consequentes restrições de mobilidade e de atividades presenciais, o ano de 2020 foi de avanços para a implantação da Justiça Restaurativa nos tribunais brasileiros. Este é o balanço das atividades do ano, realizadas pelo Comitê Gestor da Justiça Restaurativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que se reúne desde março deste ano sob a coordenação do conselheiro Luiz Fernando Tomasi Keppen.

A Justiça Restaurativa é um paradigma alternativo às punições aplicadas pelo sistema penal como resposta-padrão a conflitos e casos de violência. Baseia-se na reparação dos danos gerados em atos de violência por meio do diálogo e do compartilhamento de responsabilidades entre todos os envolvidos no caso – vítimas e acusados, incluídos –, consideradas as necessidades legítimas de todos e a complexidade do fenômeno da violência.

A Justiça Restaurativa tornou-se política pública nacional do Poder Judiciário em 2016.Em agosto do mesmo ano, o CNJ instituiu um Comitê Gestor da Justiça Restaurativa com participação de magistrados de várias regiões do país, tanto da Justiça Federal quanto da Estadual, para promover a implantação da política. Em 2019, o Comitê Gestor elaborou o Planejamento da Política Nacional de Justiça Restaurativa no âmbito do Poder Judiciário, aprovado pelo Plenário do CNJ, que também acrescentou à política judiciária da Justiça Restaurativa um plano de implantação, difusão e expansão da política pelos tribunais do país. A norma incumbiu o Comitê Gestor de prestar consultoria aos tribunais e acompanhar a implantação desse plano nos órgãos de Justiça.

Ao longo de 2020, o Comitê Gestor da Justiça Restaurativa publicou e distribuiu aos tribunais da Justiça Estadual e da Justiça Federal um manual de implantação de programas e projetos na área. Organizado em 10 passos, o manual trata desde o local da Justiça Restaurativa no organograma do tribunal até o treinamento de quem atuará no projeto da Justiça Restaurativa. A cartilha, disponível no Portal do CNJ, sugere ao tribunal a instituição primeiramente de um projeto-piloto, ambientado em uma das áreas do tribunal, como Infância e Juventude Infracional e Protetiva ou um Juizado Especial Criminal, por exemplo. Para ter pessoal capacitado nas práticas restaurativas, recomenda-se o contato com algum tribunal com experiência prévia na área para formar o primeiro núcleo de servidores que terão a responsabilidade por facilitar as primeiras práticas restaurativas.

Olhar qualitativo

Ainda em 2015, o Poder Judiciário aprovou como meta nacional para 2016 que os tribunais de Justiça dos estados implementassem “projeto com equipe capacitada para oferecer práticas de Justiça Restaurativa, implantando ou qualificando, pelo menos, uma unidade para esse fim até 31/12/2016”. O relatório de cumprimento da meta indica que, naquele ano, 67% dos tribunais de Justiça implantaram programa para viabilizar a Justiça Restaurativa. Em 2019, o CNJ ouviu tribunais estaduais e federais para identificar programas, projetos e ações de Justiça Restaurativa no Poder Judiciário. De um universo de 32 tribunais, 31 responderam – 28 deles, positivamente. Foram mapeados programas em 17 tribunais, projetos em outros sete tribunais e ações em mais quatro tribunais. Em alguns órgãos, foram encontrados mais de um programa em funcionamento – como o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC), onde há quatro programas em curso.

Para obter um diagnóstico mais preciso da disseminação das práticas restaurativas nos tribunais brasileiros, em 2020, o Comitê Gestor inseriu a Justiça Restaurativa nas Tabelas Processuais Unificadas (TPUs) do Poder Judiciário. O efeito prático é que procedimentos restaurativos como uma mediação ou conferência entre vítima, ofensor e comunidade, por exemplo, passarão a ser computados pelos servidores das varas judiciais e constarão na lista de movimentações de cada processo. Outras atividades complementares à realização de um procedimento restaurativo, como os círculos restaurativos, conferências de grupos familiares e círculos de apoio a vítimas também passarão a contar como uma etapa da tramitação dos processos nos sistemas eletrônicos dos tribunais, possibilitando estatísticas mais precisas.

Prática disseminada

Outra realização do Comitê Gestor da Justiça Restaurativa em 2020 foi uma capacitação para 400 alunos, entre magistrados estaduais e federais e servidores do Poder Judiciário, ministrada em parceria com a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam). Entre 8 de setembro e 19 de outubro, o Curso de Formação em Justiça Restaurativa auxiliou magistrados responsáveis pelas ações ou projetos de Justiça Restaurativa nos seus tribunais a estruturar seus planos de ação de acordo com as diretrizes da Resolução CNJ nº 225/2016. O curso teve a participação de todos os membros do Comitê Gestor do CNJ, sob a coordenação de três integrantes: a juíza do Tribunal Regional Federal (TRF3) Katia Roncada, a juíza do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) Jurema Carolina Gomes e o juiz do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) Marcelo Salmaso.

Para pautar as futuras ações de capacitação do Poder Judiciário, o Comitê Gestor elabora desde o início do ano um plano pedagógico mínimo. A construção do plano começou com uma consulta a entidades com experiência na área, como escolas da magistratura, universidades e entidades acadêmicas, que compartilharam 79 planos pedagógicos que já aplicam na formação dos chamados facilitadores da Justiça Restaurativa. As propostas foram compiladas pelo juiz do TJSP Marcelo Salmaso e submetidas a consulta pública em novembro passado – as 131 manifestações recebidas durante o processo participativo estão sob análise do comitê gestor.

O texto-base do plano pedagógico mínimo, também acessível via Portal do CNJ, foi estabelecido com uma série de premissas e diretrizes que balizarão o processo de habilitação de servidores e magistrados do Judiciário para atuar na área. A proposta foi apresentada em duas grandes seções: a formação teórica e a formação prática. Abordam-se desde o conteúdo programático, formatos das atividades, carga horária, número de participantes, público-alvo e a bibliografia básica que o curso deverá ter.

Perspectivas

Para 2021, o Comitê Gestor decidiu que oferecerá auxílio técnico e orientações aos tribunais na concretização dos planos de implantação da Justiça Restaurativa como política pública nacional do Judiciário. O Comitê se comprometeu também a definir, em 2021, indicadores para balizar o que serão os dados qualitativos sobre o exercício da Justiça Restaurativa nos tribunais. O Plano Pedagógico Mínimo para formação de pessoal na Justiça Restaurativa também deverá ser finalizado ao longo de 2021 e ações de formação serão estabelecidas no próximo ano. Para o primeiro semestre, os integrantes do Comitê aprovaram a realização de um Seminário de Justiça Restaurativa, atividade prevista anteriormente para este ano que ficou prejudicada pela pandemia da Covid-19.

Manuel Carlos Montenegro
Agência CNJ de Notícias