Escola judicial em MG promove lives com mulheres que inspiram e superam desafios

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Foto: TJMG
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“Eu nunca pensei em desistir, enfrentamos desafios. Nova York é o meu primeiro posto, somos 193 países reunidos e aprendo diariamente, porque a carreira exige muito estudo. Precisamos ousar de alguma forma, todas começamos de algum lugar”, afirmou a diplomata Laura Delamonica, na noite da quinta-feira (20/8). A diplomata foi a expositora do 1º Ciclo de Lives “Mulheres que inspiram pessoas e que superam os desafios da atualidade”, promovido pela Escola Judicial Edésio Fernandes (Ejef) do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG).

Laura Delamonica é natural de Belo Horizonte, bacharel em direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), mestre em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (UNB) e diplomata desde 2012. Atualmente trabalha na missão do Brasil junto à Organização das Nações Unidas (ONU) em Nova York.

Estiveram presentes virtualmente o 2º vice-presidente do TJMG e superintendente da Ejef, desembargador Tiago Pinto; as superintendentes adjuntas da Ejef, desembargadoras Mariangela Meyer e Áurea Brasil; a desembargadora Juliana Campos Horta; a assessora da 2ª Vice-Presidência do TJMG, Clarissa Duana; e a vice-presidente da OAB MG, Helena Delamonica.

Representatividade

Laura lembrou que, em 2020, a ONU Mulheres completa 10 anos. E a Declaração de Pequim, elaborada na 4ª Conferência Mundial sobre as Mulheres: ação para igualdade, desenvolvimento e paz, completa 25 anos. A Declaração Universal de Direitos Humanos elaborada pela ONU, em 1948, já tratava da igualdade entre homens e mulheres e, no cenário nacional, a Lei Maria da Penha está em seu 14º ano de vigência e, apesar disso, o aumento das denúncias de violência doméstica aumentou no período de isolamento imposto para conter a Covid-19.

A diplomata chamou a atenção para os números de representatividade das mulheres em cargos que tradicionalmente eram considerados masculinos. Atualmente, de um total de 1.552 diplomatas brasileiros, apenas 23% são mulheres.

Ela lembrou a história da primeira diplomata brasileira, Maria José de Castro Rebelo Mendes, que teve sua inscrição negada por ser mulher, em 1918. Com o auxílio jurídico de Rui Barbosa, a diplomata conseguiu efetivar sua participação no concurso público, pois não havia na legislação dispositivos que impedissem sua inscrição. Ela foi classificada em primeiro lugar – foi a primeira servidora pública aprovada em concurso.

Na época, o então ministro das Relações Exteriores, Nilo Peçanha, em seu despacho de deferimento da inscrição da candidata, manifestou: “Não sei se as mulheres desempenhariam com proveito a diplomacia, vide tantos atributos de discrição e competência exigidos, e se a requerente está aparelhada para disputar um lugar nessa Secretaria de Estado (…), o que não posso é restringir ou negar o seu direito… Melhor seria, certamente, para o seu prestígio que continuasse a direção do lar, tais são os desenganos da vida pública, mas não há como recusar sua aspiração, desde que fiquem provadas suas aptidões”.

De 1918 a 1938, foram apenas 19 mulheres diplomatas brasileiras. Em 1939 houve a proibição, por decreto-lei, da entrada de mulheres na diplomacia. Entre outros argumentos, estava o fato de que elas distraíam os homens, não estavam preparadas e eram muito sensíveis. Tal regra vigorou até 1954.

Em 1953, a futura diplomata Maria Sandra Cordeiro de Melo lutou para mudar a regra, afirmando que o dispositivo violava direitos e, em 1954, as mulheres reconquistaram seu direito pela via judicial.

Estereótipos de gênero

A partir dessas histórias, Laura propôs aos presentes na live repensar os estereótipos de gênero. Segundo ela, esses símbolos – homens são mais agressivos e mulheres são mais sensíveis – foram criados e perpetuados para afastar as mulheres de cargos de tomada de decisão.

Ela citou a escritora nigeriana Chimamanda que critica tais estereótipos e diz que, para os mesmos comportamentos entre homens e mulheres, a sociedade muitas vezes atribui significados diferentes. Por exemplo, “um homem tem liderança, já a mulher é controladora”.

A iraniana Shirin Ebadi, ganhadora do Prêmio Nobel da Paz, por seu ativismo nos direitos humanos, foi destituída do cargo de juíza em seu país, segundo o argumento de que as mulheres são sensíveis demais para conduzir um tribunal. A ex-juíza e professora foi lembrada pela expositora ao falar sobre os estereótipos de gênero e da luta das mulheres pelo reconhecimento de suas capacidades.

Laura convidou especialmente aos homens a reverem o conceito de masculinidade e ressaltou a importância de as mulheres se fazerem ouvir, de liderarem e darem exemplos para que se tornem modelos de conduta e inspirem outras mulheres.

Uma das entrevistadas do documentário Exteriores (disponível na página do Ministério das Relações Exteriores) que conta histórias de mulheres diplomatas e embaixadoras, Laura lembra que essas mulheres são sempre questionadas sobre a conciliação da vida pública e privada. “Será que essas perguntas são feitas também aos homens?”. Ela entende que tal questionamento advém da percepção de que as mulheres deveriam assumir a maior parte do trabalho não remunerado, dedicando mais tempo à família e aos filhos. “Os homens também deveriam questionar esses papeis.”

Para ela, o desafio em conciliar a vida pública com a privada é inerente ao cargo na diplomacia, assim como a mudança constante de país, a distância da família e dos amigos brasileiros. Para desconstruir preconceitos, a diplomata disse que iniciativas como esta da Ejef proporciona oportunidade para que mulheres inspirem outras mulheres. “São ferramentas fundamentais de transformação capazes de desconstruir preconceitos”, afirmou, reforçando que é importante repensar não só a representação de gênero, mas também as de etnia, raça, opção religiosa e tantas outras.

Respostas ao público

Ao ser questionada pelo público se sua formação jurídica contribui para a sua carreira na diplomacia ela afirmou que sim e lembrou do seu tempo de estudante, na UFMG, quando já se interessava pelo direito público internacional. Ela afirmou ainda que o desenvolvimento de habilidades de negociação como presidente do Centro Acadêmico Afonso Pena da Escola de Direito e sua atuação como professora assistente de direito público internacional também foram enriquecedoras para seu trabalho na diplomacia.

Quanto à igualdade de gênero, ela afirmou que, por um lado, é preciso efetivar a implementação de leis que já existem, tanto no Brasil como em outros países; por outro, derrubar leis discriminatórias em vigor em muitos lugares. Para ilustrar o que afirmou, ela citou o relatório da ONU Mulheres que apresentou, em 2019, um diagnóstico sobre arranjos familiares no mundo quando foi constatado que em quase 20 países as mulheres devem obedecer os maridos, não podem viajar sozinhas e não têm o direito de escolher onde morar.

Sobre quais conselhos daria para quem quer ser diplomata, a diplomata foi categórica, o primeiro passo é ler o edital. Segundo ela não é um concurso fácil, exige fluência em três línguas – inglês, francês e espanhol, a preparação é cara e exige muita dedicação.

Para contatá-la no Instagram busque por laura_delamonica e, por e-mail, você.diplomata@gmail.com.

Fonte: TJMG