Com adesão de mais de 11 mil pessoas, entre cidadãos, cidadãs, operadores e operadoras do direito, a Pesquisa sobre Percepção e Avaliação do Poder Judiciário Brasileiro realizada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), teve seus resultados apresentados na quinta-feira (13/4), durante o Seminário de Pesquisas Empíricas Aplicadas a Políticas Judiciárias. O levantamento possibilitou um diagnóstico mais amplo sobre áreas importantes para o funcionamento do Judiciário e melhoramento de todo o sistema.
Inédito no âmbito do CNJ, o levantamento coleta as percepções de advogados e advogadas, defensores e defensoras e integrantes do Ministério Público e de outras pessoas que tenham sido parte em algum processo judicial nos últimos cinco anos. A pesquisa possibilitou a criação de uma série de recomendações que propõem melhorias a médio e longo prazos à prestação jurisdicional.
Foram elaborados o Índice de Percepção à Justiça dos Cidadãos e o Índice de Percepção à Justiça dos Operadores do Direito, com uma variação para cada índice que é o Trâmite pela Modalidade Remota. O objetivo geral foi mensurar a percepção e avaliação do público em relação ao Poder Judiciário Brasileiro e em relação à utilização de tecnologias de acesso remoto aos fóruns e tribunais.
O secretário especial de Programas, Pesquisas e Gestão Estratégica (SEP) do CNJ, Ricardo Fioreze, destacou que a pesquisa foi produzida com finalidade de subsidiar o CNJ sobre os diferentes públicos afetados pelos serviços do sistema judiciário. “É uma das atribuições do DPJ [Departamento de Pesquisas Judiciárias] desenvolver pesquisas empíricas que possam ser aplicadas à realidade judiciária. Os resultados dessa pesquisa servirão para criação de recomendações que possam melhorar o Poder Judiciário como um todo”, ponderou.
Para a juíza auxiliar da Presidência do CNJ Lívia Cristina Marques Peres, o trabalho com dados empíricos é essencial para o aprimoramento dos serviços jurisdicionais. “A pesquisa nos ajuda a pensar em termos de planejamento estratégico e traçar metas para tornar o Judiciário mais eficiente, que é o que a sociedade busca”, disse.
De acordo com a diretora do Departamento de Gestão Estratégica (DGE/CNJ), Fabiana Gomes, a pesquisa atende a um dos macrodesafios da Estratégia Nacional do Poder Judiciário. “Uma grande novidade da Estratégia Nacional 2021-2026 foi o desenvolvimento de Indicadores de Desempenho para monitorar os Macrodesafios. E a pesquisa alcança o “Fortalecimento da relação institucional do Judiciário com a sociedade” um dos 12 Macrodesafios, inclusive ouvindo a sociedade”, disse. Segundo a diretora, os benefícios da pesquisa incluem avaliar os serviços prestados pelo Poder Judiciário e aprimorar os serviços e os produtos entregues aos cidadãos e aos usuários. Além disso, os dados permitem aperfeiçoar as políticas judiciárias nacionais, os programas e os projetos tanto de abrangência nacional quanto aqueles realizados pelos tribunais ou conselhos.
Acesse aqui dados completos da Pesquisa sobre Percepção e Avaliação do Poder Judiciário Brasileiro
Profissionais do direito
No que tange à percepção dos três públicos de operadores e operadoras do direito sobre aspectos que poderiam contribuir para melhorar sua atuação, todos destacaram a relevância de alguns programas. Entre eles estão os de Justiça Restaurativa, Justiça Itinerante, Juízo Digital e Balcão Virtual. Para aumentar a eficiência de suas atuações, essas pessoas sugeriram a realização mais frequente de audiências de mediação e conciliação, o desenvolvimento de mais funcionalidades de intercomunicação no sistema de processo judicial eletrônico e a automação de rotinas no sistema de processo judicial eletrônico. A capacitação e especialização de magistrados, magistradas, servidores e servidoras, além da ampliação do número de comarcas, varas e juizados, também configuraram entre os itens propostos.
A Justiça Itinerante foi considerada como muito relevante por 26,4% da advocacia, extremamente relevante por 31,6% de defensores e defensoras e pouco relevante por 30,3% de integrantes do Ministério Público. Essa política judiciária é regulamentada atualmente pela Resolução CNJ n. 460/2022, que estabelece a implementação de medidas para garantir o pleno exercício do direito de acesso à Justiça pelos tribunais. Já a Justiça Restaurativa, tratada na Resolução CNJ n. 300/2019, foi considerada extremamente relevante por 41,6% das pessoas que responderam pela Defensoria Pública, muito relevante por 31,5% das que atuam na advocacia e 31,7% de integrantes do Ministério Público.
Questionários
Foram elaborados questionários específicos para cada público, diante de suas diferentes funções, interesses e percepções quanto às instituições do Judiciário. Entre cidadãos e cidadãs, foram coletados dados referentes ao último processo judicial, às audiências de conciliação, aos serviços prestados por servidores e servidoras, magistrados e magistradas, aos meios de comunicação do fórum ou tribunal, às ferramentas de consulta utilizadas, aos custos envolvidos no processo, à avaliação em relação ao acesso à Justiça, entre outros aspectos.
Entre operadores e operadoras do direito, foram coletados dados referentes à área de atuação, aos sistemas de processo eletrônico utilizados, aos sistemas de consulta de jurisprudência utilizados, às dificuldades encontradas na utilização, aos gargalos que mais dificultam a adequada prestação jurisdicional, às formas de comunicação processual, à avaliação das audiências de conciliação e dos programas, institutos e ações do Poder Judiciário, entre outros aspectos.
Sobre o público de cidadãos e cidadãs, a diretora do Departamento de Pesquisas Judiciárias (DPJ/CNJ), Gabriela Soares, esclareceu que, como a pesquisa foi feita por adesão, os questionários não abrangeram uma fatia muito ampla da população. A maioria que respondeu ao formulário da pesquisa tem ao menos ensino superior completo (79,2%) e renda acima de R$5.500 (47,5%). “Nesse momento, não atingimos uma boa parcela da população, como, por exemplo, aqueles que não têm acesso a computadores”, afirmou.
Um dos principais serviços do Judiciário, as audiências de conciliação têm sua satisfação percebida pela sociedade civil conforme o acordo e tempo da tramitação processual. O perfil das pessoas muito satisfeitas com a audiência de conciliação do último processo judicial é definido majoritariamente pela obtenção de acordo entre as partes, acordo cumprido de espontânea vontade pelas partes, e dos que acharam o tempo de duração desse processo mais rápido que o esperado. Já quem indicou insatisfação ou muita insatisfação do último processo judicial não tiveram, em sua maioria, acordo entre as partes.
Outro ponto importante se refere ao entendimento da linguagem jurídica utilizada nos processos, por parte do público externo. Avaliando sobre o fácil entendimento da linguagem, cerca de 41,4% dos respondentes apontaram discordar em parte e 23,5% discordam totalmente. Na avaliação do DPJ, os resultados estão em consonância com as políticas em andamento por parte do CNJ, as quais podem ser aprimoradas.
A coordenadora da Unidade de Governança e Justiça para o Desenvolvimento do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), Moema Dutra Freire, lembrou que a pesquisa está alinhada com os objetivos e a agenda internacional de desenvolvimento, a Agenda 2030, desenvolvida pela Organização das Nações Unidas (ONU). “Um marco importante dessa agenda é um objetivo centrado na Justiça. Nesse sentido, seguir fortalecendo o Judiciário garante a democracia e torna forte o Estado de Direito”.
Recomendações
A pesquisa indicou alguns aspectos a serem melhorados no Judiciário, especialmente no que se refere à acessibilidade de informações referentes ao processo judicial e da linguagem jurídica e à morosidade dos processos judiciais. As recomendações, apresentadas no seminário pela juíza auxiliar da Presidência do CNJ Dayse Motta, foram divididas em cinco categorias: Organização e estrutura do sistema de justiça; Tecnologias e sistemas eletrônicos; Comunicação; Aprimoramento da prestação jurisdicional para mitigar morosidade.
As categorias Tecnologias e Sistema eletrônicos e Comunicação foram as que mais receberam sugestões. Dentro do primeiro grupo, uma das medidas propostas está o fortalecimento da Plataforma Digital do Poder Judiciário Brasileiro (PDPJ-Br), que tem como principal intuito incentivar o desenvolvimento colaborativo entre os tribunais. Também foram sugeridas ações de promoção na estabilidade dos sistemas processuais e disponibilização de cursos sobre a alimentação das Tabelas Processuais Unificadas (TPUs) voltados aos operadores do direito, a fim de sensibilizar sobre a importância da adequada categorização dos processos.
No que tange à Comunicação com junto às unidades judiciárias, as recomendações orientam a capacitação de servidores e servidoras, magistrados e magistradas, melhoria dos sistemas de comunicação eletrônico (como e-mail, aplicativos de mensagens, etc.), elaboração de cartilhas e materiais informativos de linguagem acessível. Melhorar a capacitação de conciliadores e conciliadoras e estabelecer estratégias de monitoramento da execução dos acordos também estão entre as metas.
Debates
Nos debates realizados durante o seminário com os operadores do direito, a promotora de Justiça do Rio de Janeiro Cristiane Branquinho Lucas alertou para a importância de rever o processo da capacitação das pessoas que atendem ao público na Justiça. Pessoas com deficiência sensorial, como pessoas cegas ou com deficiência auditiva, não são contempladas por essas capacitações, na avaliação da procuradora. “Não é possível dar uma capacitação sem um livro em braile ou sem um intérprete de libras. Como é que vamos poder aprimorar o serviço sem que essas pessoas estejam inseridas nesse contexto”, questionou.
O advogado especialista em Direito Humanos Paulo Iotti Vecchiatti ressaltou alguns aspectos negativos apontados pela pesquisa: as dificuldades com o sistema do PJe e a relação entre a magistratura e a advocacia. “Para a advocacia, o PJe é o mais complicado e aquele com o qual os advogados têm mais dificuldades. O diálogo com juízes, que é uma questão notória, prerrogativa garantida em lei, deve ser observada. Mas vale lembrar que nesse ponto tem que prevalecer o bom senso de todos os lados”, afirmou.
Ao apresentar um contraponto, a juíza auxiliar Lívia Peres destacou que o PJe é um sistema público, sendo concebido para enfrentar a pulverização de sistemas processuais eletrônicos presentes nos tribunais. Ela ressaltou que atualmente a Plataforma Digital do Poder Judiciário (PDPJ-Br serve ao mesmo propósito no ponto em que aglutina soluções tecnológicas passíveis de utilização por distintos sistemas. Referente à relação magistratura e advocacia, ela declarou que as eventuais dissonâncias podem ser superadas a partir do estabelecimento do jurisdicionado como eixo central das discussões.
Texto: Ana Moura
Edição: Sarah Barros
Agência CNJ de Notícias
Reveja abaixo a apresentação da Pesquisa sobre Percepção e Avaliação do Poder Judiciário Brasileiro durante seminário do CNJ: