Fux: regulamentação do trabalho remoto para magistratura virá após debate participativo

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Ministro Luiz Fux participa da abertura da audiência pública sobre Trabalho Remoto para a Magistratura. Foto: Luiz Silveira/CNJ
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A proposta de regulamentação do trabalho remoto para a magistratura brasileira será resultado de um debate aberto à advocacia, à sociedade civil e aos próprios magistrados. Ao abrir a audiência pública que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) realizou para discutir o tema, nesta quarta-feira (13/10), o presidente do CNJ, ministro Luiz Fux, garantiu um processo participativo à elaboração da norma que disciplinará o trabalho que juízes, desembargadores e ministros realizem fora das dependências físicas do Judiciário, com o auxílio de recursos tecnológicos.

Fux ressaltou a importância crescente da tecnologia no trabalho da Justiça brasileira, sobretudo em função das restrições de mobilidade impostas pela pandemia da Covid-19 desde março de 2020. Citando o anuário estatístico do Poder Judiciário, Justiça em Números, o ministro lembrou que, no ano passado, 96,6% das ações judiciais foram impetradas em formato virtual e que já tramitavam eletronicamente todos os processos em 48 dos 91 tribunais brasileiros. O presidente do CNJ destacou os benefícios da virtualização das ações para a eficiência dos tribunais, por meio da desburocratização, da inovação, da transformação digital, do acesso e da aproximação da Justiça aos cidadãos e da dispensa do comparecimento das pessoas aos órgãos do Judiciário.

No entanto, ele lembrou da necessidade de se ouvir outros segmentos da sociedade antes de redigir a proposta de regulamentação. “Estamos em um trabalho continuado remoto que tem reduzido despesas e o acervo (de processos) dos tribunais. Por isso, registro a importância dessa audiência pública, porque temos de ouvir representantes da magistratura, da advocacia e da sociedade civil para juntos pensarmos sobre a regulamentação desse trabalho remoto, promovendo segurança jurídica e gestão democrática e participativa. Temos de ouvir principalmente magistrados e as classes gravitantes em torno da prestação jurisdicional para chegarmos a um ponto comum na medida em que é uma tradição do CNJ baixar resoluções desse porte ouvindo todos os segmentos da sociedade.”

O presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, reconheceu a contribuição dos avanços das tecnologias da informação e da comunicação para a melhoria dos serviços prestados pelo Poder Judiciário. Lembrou como exemplo que, embora o novo Código de Processo Civil previsse que a sustentação oral de advogados fosse feita por videoconferência desde a entrada em vigor da legislação, em 2015, a prática só foi adotada definitivamente com a pandemia, como meio de garantir a realização dos julgamentos a distância.

Apesar das vantagens proporcionadas pela virtualização da Justiça, Santa Cruz avaliou que a falta de presença física da magistratura nos fóruns trará restrições à atuação da advocacia e, consequentemente, à defesa de direitos na democracia. “De acordo com a Lei Orgânica da Magistratura (Loman), é dever do magistrado atender, a qualquer momento, advogados e partes que o procurarem, especialmente para adoção de providências de natureza urgente. Sou testemunha do produtivo sistema de atendimento on-line que mantivemos na pandemia, em todo o país, mas também sabemos que há falta desse acesso pessoal e há carência do retorno do funcionamento dos nossos fóruns.”

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Para o representante da OAB, trabalho remoto “plenamente liberado” prejudicará a administração das unidades judiciárias e a vida das comarcas, especialmente em um país desigual no acesso da população à internet e escolaridade. “Pode o Poder Judiciário ser considerado um mero serviço, a ponto de prescindir da presença de um pacificador social? Pode tudo ser virtualizado – o atendimento, as audiências criminais, as audiências do trabalho, muitas vezes diante de trabalhadores com pouca ou nenhuma formação acadêmica, as audiências de custódia, o Tribunal do Júri? Pode o Brasil ser um país de bares abertos e fóruns fechados? Acreditamos que não. Se o avanço da tecnologia alterou dinâmicas da sociedade e do Poder Judiciário, com a adoção de ferramentas positivas como a videoconferência ou o balcão virtual, não se pode tomar esse caminho como absoluto.”

De acordo com o conselheiro do CNJ Mário Guerreiro, o objetivo do encontro virtual era a busca de um consenso que “preserve as prerrogativas dos advogados, o direito de acesso à justiça dos jurisdicionados, a autonomia dos tribunais e também o direito dos juízes de exercerem o trabalho à distância”. Para o conselheiro Marcos Vinícius Rodrigues, o foco do debate é a natureza e a importância da função pública da magistratura, sem perder de vista a legalidade, as limitações e os impactos das medidas propostas em relação à eficiência dos serviços judiciários, ao Ministério Público, à advocacia e, principalmente, à sociedade. “Penso que o foco deste debate é analisar as inovações tecnológicas, as possibilidades de trabalho remoto para a magistratura sem jamais desgarrar da função principal do Poder Judiciário, que é a pacificação social.”

Participação

A transformação digital do Judiciário, por meio do Programa Justiça 4.0, que oferece atendimento virtual nas salas dos tribunais sem a necessidade da presença de partes ou advogados, gerou discussão sobre quais limites, regras e procedimentos deveriam ser adotados em todo o país em relação ao trabalho remoto dos magistrados. Além do Conselho Federal da OAB, também serão ouvidos o Conselho Nacional das Defensoras e Defensores Públicos-Gerais (Condege) e representantes de 18 entidades, como associações nacionais e estaduais da magistratura, o Conselho da Justiça Federal (CJF) e o Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT).

Manuel Carlos Montenegro
Agência CNJ de Notícias

Reveja a audiência pública no canal do CNJ no YouTube