Compensação penal pode responder a condições das prisões nas Américas

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Seminário Internacional "Judiciário, Sistema Penal e Sistema Socioeducativo". Na mesa, Diego Zysman, a conselheira do CNJ Maria Tereza Uille Gomes e Rodrigo Roig. Foto: G.ettmar/Ag.CNJ
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A superlotação carcerária nas Américas, a compensação penal por prisões ilegais e o cumprimento de pena abusivo foram temas de um dos paineis do seminário internacional “Judiciário, sistema penal e sistema socioeducativo: questões estruturais e mudanças necessárias”. O professor argentino com atuação em direito penal e em criminologia Diego Zysman trouxe um panorama da situação americana, com foco na América Latina, enquanto o defensor público do Rio de Janeiro e professor Rodrigo Roig apresentou casos de compensação.

Realizado nos dias 3 e 4 de março, o seminário foi organizado pelo Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas do Conselho Nacional de Justiça (DMF/CNJ) e pelo programa Justiça Presente. Iniciado em janeiro de 2019, o programa é uma parceria do CNJ com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e apoio do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) para superar problemas estruturais nos sistemas prisional e socioeducativo.

Em uma análise comparada, Zysman lembrou que, nos anos 1990, muitos países latino-americanos tinham taxas de encarceramento similares a países europeus, situação alterada com a chamada Guerra às Drogas e com a transição democrática após períodos sob ditaduras militares. “O problema não é apenas quantitativo, mas também qualitativo. É difícil respeitar direitos humanos nesses lugares e esse é um dado que se naturaliza”. De acordo com Zysman, a superlotação prejudica não apenas quem cumpre penas, mas também outros internos, agentes penitenciários e familiares.

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O coordenador do projeto “Punitivismo, reforma legal e atitudes punitivas na Argentina” avalia que o problema da superlotação deteriora as instituições da Justiça e propõe soluções de longo prazo envolvendo os três Poderes. Zysman sugere a avaliação da necessidade de prisões segundo a idade da pessoa e a gravidade dos delitos, além da melhor definição de critérios para prisão em crimes de drogas, já que diversos estudos mostram que alguns grupos têm representação maior no cárcere. Ele defendeu, ainda, melhores parâmetros para a ação policial no ato de prisão, de modo a conter a seleção do público levado às carceragens.

Compensação

Segundo o defensor público do Estado do Rio de Janeiro Rodrigo Roig, a compensação penal tem ganhado destaque no cenário internacional, com decisões em países como Alemanha, Austrália, Estados Unidos, Itália, Israel e Argentina, além do Brasil. “Defender a compensação penal por prisões abusivas não significa legitimar a ocorrência desses abusos. Significa não deixar que desvios ou excessos do cotidiano ocorram em vão ou que sofram subdimensionamento. O Brasil tem a oportunidade de trazer este debate para um maior amadurecimento e reflexão”, afirmou Roig.

O defensor afirmou haver excesso ou desvio de execução sempre que “algum ato for praticado além dos limites fixados na sentença” (Lei de Execução Penal) deixando de assegurar aos presos o respeito à integridade física e moral. “Para a superação deste histórico desacerto político-criminal, torna-se essencial medir o tempo de prisão não mais de forma meramente cronológica ou linear, mas sim considerando as variações de qualidade sofridas com a privação de liberdade ou pela pena durante o seu curso”, afirmou.

Citou o caso da Austrália, onde foi definido que quatro meses de custódia protetiva, destinada a isolar e resguardar a integridade física de algumas pessoas privadas de liberdade, equivalem a seis meses de tempo normal de prisão. Na Califórnia (EUA), com fundamento na proibição de penas cruéis, constatou-se que a superlotação afeta colateralmente a saúde das pessoas presas. Uma Corte Federal intimou o estado a apresentar plano de redução da população carcerária da ordem de um terço (cerca de 46.000 presos), decisão confirmada em 23 de maio de 2011 pela Suprema Corte dos Estados Unidos.

No Brasil, no âmbito de um Recurso Extraordinário no Supremo Tribunal Federal, cogitou-se da proposta de reparação do dano por meio da remição de dias de pena cumpridos em condições degradantes. A Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) também julgou que o Estado deveria arbitrar para que se compute em dobro cada dia de privação de liberdade cumprido no Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho (RJ) – desde que a pessoa privada de liberdade não fosse acusada de crimes contra a vida ou de crimes sexuais.

Entre os exemplos de compensação penal no processo de execução penal estão a concessão de graça (que busca extinguir a punibilidade em atendimento a uma situação peculiar da pessoa condenada) e o indulto, assim como a chamada “redução compensatória”, com detração, remição e comutação. Também são possibilidades a suspensão do encarceramento, a antecipação proporcional da concessão de progressão de regime e de livramento condicional, ou a prisão domiciliar.

Iuri Tôrres
Agência CNJ de Notícias