O Tribunal Regional Eleitoral do Pará (TRE do Pará) realizou na sexta-feira (19/4) – data na qual se comemora o Dia Nacional dos Povos Indígenas – uma audiência pública com o tema “Barreiras e dificuldades para o exercício dos direitos políticos pelos povos indígenas no Pará” durante a programação da Semana dos Povos Indígenas ocorrida no Hangar – Centro de Convenções e Feiras da Amazônia, em Belém, promovida pelo Governo do Estado, com transmissão ao vivo pelo canal oficial do Tribunal, no Youtube.
O objetivo principal da audiência era de ouvir a comunidade indígena e as respectivas instituições públicas ou privadas, instituições acadêmicas e organizações que defendem seus direitos para entender como a Justiça Eleitoral pode contribuir para uma maior participação política das comunidades originárias.
O ato público foi presidido pelo juiz membro da Corte Eleitoral e ouvidor do Tribunal, José Airton de Aguiar Portela, que abriu oficialmente a cerimônia explicando que desde o ano de 2023 foram criadas pelo TRE do Pará 24 novas seções eleitorais dentro de territórios indígenas no estado. O número de seções, ampliadas em 75% durante a gestão do atual presidente, o desembargador Leonam Gondim da Cruz Junior, permite que os povos originários exerçam o direito ao voto de maneira mais digna e rápida encurtando o deslocamento feito, muitas vezes, em quilômetros de distâncias das comunidades até os locais onde esteja instalada a urna eletrônica mais próxima.
“O que vemos acontecendo na programação dessa semana é inédito e que merece todo destaque, pois contribui para diminuir a inclusão étnico-racial no Brasil. Neste aspecto, a Justiça Eleitoral possui papel de grande relevância, pois administra as eleições para os cargos eletivos do país e deve envidar esforços para viabilizar a parcela marginalizada da sociedade no processo de escolha de nossos representantes políticos. O Projeto ‘Originários’ foi lançado no intuito de reduzir as principais barreiras ao exercício dos direitos políticos dos povos que ocupam e cuidam das nossas florestas”, explicou o juiz-ouvidor.
A diretora-geral do TRE do Pará, Nathalie Castro, também compareceu à audiência. O assessor da Ouvidora Judicial Eleitoral (OJE), Rodrigo Valdez, mediou o momento.
A secretária nacional de Articulação e Promoção de Direitos Indígenas, do Ministério dos Povos Indígenas, Juma Xipaia, abriu o momento das falas de autoridades. “Primeiro gostaria de agradecer por essa iniciativa tão ousada, tão necessária e tão urgente. Nós, indígenas, sempre estivemos aqui, mas sempre fomos jogados à margem da sociedade, principalmente quando se fala de políticas públicas. Estamos aqui demarcando o Pará e as políticas públicas. Nunca mais um Brasil sem nós. Demarcação já!”, disse.
José Maria Vieira, representante da Presidência da OAB Pará e presidente da Comissão de Direitos Humanos da mesma organização, reconheceu a dívida histórica que existe, por parte do Estado, aos povos originários. “Nós, Estado, temos uma dívida com os povos indígenas no Pará, pois, de fato, nunca nos preocupamos em incluir as populações indígenas no Judiciário, mas hoje o nosso vice-presidente é indígena. É importante que façamos mais desses eventos, mas, com os ouvidos abertos para entender as mazelas dos povos e saber como sanar esses problemas não só a respeito do voto, mas de uma representatividade política, pois vocês são os agentes e é importante que indígenas votem em indígenas”, analisou.
A procuradora-chefa substituta da Procuradoria da República no Estado do Pará, Thais Santi Cardoso, falou da satisfação de participar do momento que mostrava a diversidade dos povos da Amazônia. “Que alegria poder representar o Ministério Público Federal em um momento como esse. Atuo em Altamira e o MPF trabalha pela defesa do regime democrático. Talvez a maior riqueza desse estado seja a diversidade de povos. Não temos que ensinar os indígenas a votar, mas permitir que façam esse processo, e as parcerias são necessárias devido à logística de acesso a muitos dos territórios indígenas”, observou.
Contribuições
Após a palavra das autoridades presentes, foi a vez das lideranças indígenas dos diversos povos presentes na programação e demais instituições expressarem sobre a realidade política das suas comunidades.
Nice Tupinambá é indígena em contexto urbanizado e falou da experiência como candidata à Câmara dos Vereadores da capital e sobre o acesso não somente aos direitos, mas aos espaços públicos que muitas vezes é negado ao seu povo.
O cacique Adalton Munduruku, do município de Jacareanga, no Alto Tapajós, acompanhado de sua sobrinha, a professora Giandria Munduruku, que traduzia simultaneamente a fala do indígena para o português, incentivou os ‘parentes’ a continuarem votando em indígenas para representá-los. “Estamos em ano político e vamos mostrar nossa força porque esse ano temos que lançar candidatos. Em Jacareanga já tivemos indígenas ocupando cargos políticos e estou muito feliz por ver muitos parentes de luta e vamos continuar assim, votando nos parentes, no mesmo caminho e na mesma luta”, afirmou.
Giandria também usou a palavra para falar sobre as dificuldades enfrentadas pelo seu povo para ocupar os cargos políticos, como ocorrido com alguns vereadores indígenas eleitos no município. “Vamos votar nos parentes, pois, só assim vamos mostrar nossa força”, disse.
Piná Tembé, do município de Santa Luzia do Pará, chamou a atenção para o fato de que os direitos indígenas devem ser lembrados todos os dias e não apenas em uma data. “Todos os dias celebramos o Dia do Indígena. Se os indígenas se unirem nada passa por cima de nós”, disse.
No encerramento, o juiz José Airton Portela, agradeceu e reforçou a necessidade de se escolher, nas eleições, dignos representantes. “Muito obrigado a todos os ‘parentes’, o TRE se sente muito honrado. Pensemos não em partidos, mas em homens e mulheres honrados para nos representar”, concluiu.
Projeto
Antes da audiência, foi lançado o guia “Originários: Sua língua, seu voto, sua representatividade”. Disponível em cinco edições nas línguas indígenas faladas no estado do Pará, o material tem a finalidade de proporcionar uma compreensão mais ampla e facilitada do processo eleitoral aos povos originários com informações sobre cidadania, democracia, candidatura de pessoas indígenas e o direito ao voto por meio da escrita e de vídeos curtos gravados nas línguas indígenas.
A audiência e o guia são ações do Projeto “Originários: Território, Etnia e Voz” idealizado pela Diretoria-Geral do TRE, que tem organização da Ouvidoria Judicial Eleitoral (OJE) e conta com a parceria da Escola Judicial Eleitoral (EJE), na educação sociopolítica, e da Corregedoria Regional Eleitoral (CRE/PA) que trabalhou na elaboração e tradução das cartilhas bilíngues em parceria com o Núcleo de Formação Indígena (Nufi) da Universidade do Estado do Pará (Uepa).
Reveja a audiência
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