Livro aponta avanços e desafios das cortes superiores ao julgar sobre infância e juventude

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Painéis sobre Diagnóstico da Primeira Infância, no Seminário Primeira Infância e Prioridade Absoluta. Foto: Ana Araújo/Ag.CNJ
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A evolução do arcabouço normativo e das políticas públicas em relação a temas como a concessão de prisão domiciliar às gestantes, lactantes e mulheres com filhos de até 12 anos de idade teve um impacto positivo no efetivo cumprimento do Artigo n. 227 da Constituição Federal, que assegura a prioridade absoluta a crianças e adolescentes. A conclusão integra o livro “Prioridade absoluta de crianças e adolescentes nas cortes superiores brasileiras”, lançado pelo Instituto Alana e a FGV Direito na segunda-feira (17/04), durante o seminário “Primeira Infância É Prioridade Absoluta”, no auditório do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

“É com muita alegria que lançamos esse trabalho desenvolvido desde 2019 por pesquisadores – o mais extenso estudo feito sobre o tema”, afirmou a coordenadora jurídica do Instituto Alana, Ana Claudia Cifali. A advogada, que mediou o painel, agradeceu ao CNJ pela oportunidade do debate, considerando o papel relevante do Conselho para aprimoramento do Poder Judiciário e aplicação da regra de prioridade absoluta.

Aspecto penal e infracional

Durante o evento, as pesquisadoras apresentaram o recorte da “Interpretação da prioridade absoluta dos direitos das crianças e adolescentes pelas Cortes Superiores: Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça”. O trabalho englobou 30 anos de jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), tendo sido encontrados, pelas palavras-chave “criança” ou “adolescente”, 627 acórdãos e 5.971 decisões monocráticas do STF e 8.803 acórdãos do STJ.

Foi encontrada a incidência dos termos em oito macrotemas. Contudo, de acordo com a professora e pesquisadora da FGV Direito SP Eloísa Machado, a distribuição temática evidenciou a predominância dos aspectos penal e infracional, reproduzindo uma lógica punitivista. Segundo ela, quando há infração, perdura a crença da institucionalização como forma de garantia de direitos.

Na análise da pesquisadora, apesar de haver muitos avanços na jurisprudência das cortes superiores, os tribunais não exploram a densidade normativa da prioridade absoluta. “Há obstáculos processuais que impedem debate mais amplo. Por que estão esses temas ficando nas instâncias inferiores?”, questionou.

Pico de decisões

De acordo com a pesquisadora do Supremo em Pauta, da FGV Direito SP, Luíza Pavan Ferraro, com a evolução das políticas públicas entre 2000 e 2010, o Poder Judiciário passou a obrigar a Administração Pública a oferecer vagas em creches e, às escolas particulares, a serem inclusivas. Também houve um salto nas iniciativas para acesso a medicamentos, enfrentamento da superlotação de instituições e questões afeitas à publicidade infantil.

Todo esse arcabouço jurídico acabou se refletindo em um pico de decisões das cortes superiores no contexto do cumprimento à prioridade absoluta às crianças e aos adolescentes. “Apesar disso, a medida socioeducativa não é percebida como pena e, portanto, podendo ser cumprida desde logo. É vista como caráter pedagógico”, ressalvou a pesquisadora que também participou do trabalho.

Juíza auxiliar do Gabinete da ministra do STF Cármen Lúcia, a magistrada Andremara dos Santos destacou a metodologia estratégica da pesquisa, que apresentou um caráter transversal. As conclusões aferidas, para ela, remetem a uma reflexão importante. “Falta entrosamento, conexão intrainstitucional. E o Estado somos nós do Poder Judiciário, do Poder Executivo e do Ministério Público. Somos nós que representamos o Estado”. Na avaliação dela, o livro apresenta uma nova perspectiva. “É um olhar que não se acha. É um outro olhar que se deve ter, inclusive, nas universidades”, disse.

 Painéis sobre Diagnóstico da Primeira Infância, no Seminário Primeira Infância e Prioridade Absoluta. Foto: Ana Araújo/Ag.CNJ.

O vice-presidente da Associação Brasileira dos Magistrados da Infância e da Juventude (Abraminj) e integrante do Comitê Gestor da Primeira Infância do CNJ, Hugo Zaher, concordou. “Esse livro de fato desnuda essa ideia, a perspectiva do Poder Judiciário de como é recente esse olhar no aspecto quantitativo, mostrando o salto no volume de decisões acerca do tema”.

Ao elogiar a produção do livro e destacar a adesão dos signatários do Pacto, a gestora-adjunta do Pacto Nacional pela primeira infância, Ivânia Ghesti, também apontou um desafio relacionado às políticas de Primeira Infância que são as equipes técnicas existentes no Poder Judiciário e o avanço das políticas. Para ela, “é preciso fortalecer as equipes técnicas, as instituições, caso contrário não conseguiremos colocar em prática. […] O que queremos com o pacto é não precisar da judicialização para que as crianças tenham acesso aos direitos”.

Campanha “Se Renda à Infância”

Após a apresentação do livro, foi lançada a campanha “Se Renda à Infância”, de divulgação da iniciativa que possibilita que parte do Imposto de Renda de pessoas físicas e jurídicas a ser pago à Receita Federal possa ser destinado à realização de programas e projetos de promoção dos direitos de crianças e adolescentes. “Contamos com os 312 signatários do Pacto Nacional pela Primeira Infância para a adesão à campanha”, afirmou o juiz auxiliar da Presidência do CNJ Edinaldo César Santos Junior, que coordenou o seminário e é o atual gestor do Pacto Nacional pela Primeira Infância. Nessa segunda fase do Pacto, um olhar especial sobre a diversidade das infâncias brasileiras será a tônica das ações.

O evento foi transmitido pelo canal do CNJ no YouTube e contou com programação diversificada, incluindo apresentações de pesquisas voltadas à aplicação do Artigo n. 227 da Constituição Federal, do Estatuto da Criança e do Adolescente e do Marco Legal da Primeira Infância.

Texto: Mariana Mainenti
Edição: Sarah Barros
Agência CNJ de Notícias

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