Vinícius ‘rodou’ após praticar a chamada saidinha de banco – nome atribuído ao roubo de pessoas à saída de uma agência bancaria. Ele tinha 17 anos e foi sentenciado a cumprir a medida socioeducativa de privação de liberdade. Era a terceira internação. A primeira ocorreu aos 13 anos e a segunda aos 16. Esta última, no entanto, foi diferente das demais. O jovem foi parar em uma unidade para adolescentes em conflito com a lei e contava com apoio psicológico, pedagógico e profissionalizante. E hoje, aos 20 anos, ele se orgulha da profissão de designer de AutoCAD (software utilizado para desenhos técnicos em arquitetura, design de interiores e engenharia) e a conquista de um emprego com carteira assinada.
Esta história real evidencia a importância do sistema socioeducativo adequado para a reintegração dos adolescentes envolvidos em atos infracionais. Entretanto, o que o Conselho Nacional de Justiça vem constatando na maior parte do país, por meio do Programa Justiça ao Jovem, é a predominância de um atendimento caracterizado pela visão segregacionista e semelhante ao sistema penal.
O Programa Justiça ao Jovem foi criado pelo CNJ em junho do ano passado para avaliar a execução da medida de internação para adolescentes em conflito com a lei. No ano passado, o programa visitou 138 unidades de internação, em 18 Estados mais o Distrito Federal. Em 2010, o sistema registrava 4.746 vagas e 5.305 adolescentes internados.
“O atendimento pedagógico e psicossocial do adolescente internado é condição necessária para o processo de ressocialização. Não adianta nada colocarmos o adolescente na internação como uma maneira de segregá-lo apenas. É preciso preparar o adolescente para esse retorno ao convívio social”, afirmou o juiz auxiliar CNJ Daniel Issler coordenador do Programa Justiça ao Jovem.
De acordo com ele, casos como o de Vinícius desmitificam a ideia de que a internação não funciona. “Com um trabalho bem feito, é possível fazer com que o adolescente está praticando ilícitos volte para a sociedade melhor. Acredito que casos como esses não sejam poucos. Muitos talvez não tenham tanta visibilidade”, acrescentou Issler.
Opinião semelhante tem Reinaldo Cintra, também juiz auxiliar do CNJ e coordenador do Justiça ao Jovem. Por meio do programa, o magistrado constatou que os agentes envolvidos na execução da medida socioeducativa de internação estão tentando melhorar o sistema. “O que se percebeu é a vontade de fazer um bom atendimento, mas não se conseguiu ainda o nível razoável na maioria dos lugares”, afirmou.
Segundo Cintra, faltam investimentos na estrutura física das unidades, qualificação do quadro de funcionários que lidam com os adolescentes e, principalmente, na prevenção e apoio ao egresso, para que este encontre “novos caminhos” após cumprir a medida socioeducativa. Para o juiz, também se faz necessária maior atenção às famílias dos jovens. “Esse é um problema sério. Infelizmente, pela distribuição geográfica das unidades, há dificuldades de fazer com que as famílias mantenham contato constante com o adolescente, colaborando para a recuperação deste. É preciso criar condições para que elas possam participar”, disse.
O programa Justiça ao Jovem está na reta final. A partir desta segunda-feira (12/9) vai às unidades de internação do interior de São Paulo, último Estado a ser visitado. Após a conclusão do trabalho, o CNJ irá elaborar um relatório nacional, com o raio-x do sistema socioeducativo de internação no Brasil.
“Podemos esperar uma série de informações nesse relatório que vão auxiliar a repensar o sistema. O relatório final vai ser um grande instrumento para a efetivação de melhorias”, destacou Cintra.
Giselle Souza
Agência CNJ de Notícias
Leia Mais:
“Se não tivesse sido internado, talvez estivesse na mesma”