Desinformação e fake news são temas de debate na Justiça Eleitoral de Mato Grosso

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Foto: TRE-MT
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O desafio da responsabilização jurídica dos intermediários na propagação de desinformação e fake news. Este foi apenas um dos pontos levantados durante o evento “Democracia Digital – Eleições 2020”, realizado pelo Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso (TRE-MT) e parceiros.

“Qual o direito de resposta de quem é difamado numa rede social? Nós atravessamos a sociedade onde a comunicação era feita em um grande aglomerado, com grandes redações, para uma outra sociedade onde todos são produtores de conteúdo. A informação é impulsionada por robôs, você não sabe quem viu aquilo, a estrutura utilizada para divulgação, então como dar o verdadeiro direito de resposta?”. Essas foram as perguntas trazidas pelo docente assistente na Goethe Universität Frankfurt am Main, Alemanha, Ricardo Campos. Ele é o diretor do Instituto LGPD (Legal Grounds for Privacy Design) e coautor da obra “Fake News e Regulação”.

As redes sociais foram abordadas profundamente pelo professor. “Ficou claro que essas plataformas aumentaram o nosso potencial de liberdade de expressão. Quem quer comunicar de verdade utiliza o ambiente virtual, são poucos os que insistem em ir nas praças e espaços públicos para expor suas ideias. As redes viraram uma infraestrutura pública da comunicação diária da população. Porém a falta de regulação potencializou o aspecto de lesividade de direitos de terceiros. O Estado têm que acelerar a produção de normas e aplicação do direito neste ambiente.”

Para o juiz auxiliar da presidência do TRE-MT, Lídio Modesto, esse caráter lesivo das redes sociais têm sido preocupante para Justiça Eleitoral. “Nós vemos notícias que constroem determinado candidato, que enaltecem alguém, mas que às vezes não são verdadeiras, da mesma forma identifica-se um poder arrasador de destruir a dignidade de alguém que poderia merecer atenção popular. Todos os conceitos e reflexões deste evento certamente serão utilizados nas nossas eleições municipais deste ano. Precisamos sempre buscar eleições mais transparente, e são eventos como este que consolidam entendimentos e auxiliam magistrados, advogados e a imprensa para juntos combatermos a desinformação.”

O procurador Regional Eleitoral de Mato Grosso, Pedro Melo Pouchain, elencou que não apenas o direito eleitoral enfrenta desafios, mas todo o Poder Judiciário está atento a disseminação de desinformação. “Não é apenas a liberdade de informação que está em pauta, mas a própria era digital, em como ela influencia uma mudança de perspectiva e uma série de direitos fundamentais da própria privacidade.”

Segundo Pouchain, a “dificuldade é a distinção do discurso individual de boa-fé, mesmo que este não se importe se o fato é verdadeiro, das organizações que promovem em escala Industrial conteúdo escuso. O aspecto da responsabilização é delicado, primeiro porque você precisa fazer uma investigação, e no caso da escala Industrial, é muito mais um crime do que uma desinformação. Por ser crime, vão se valer de toda técnica para manter o anonimato, utilizando túneis VPN, Darknet, servidores internacionais, sempre para dificultar o trabalho do Ministério Público. São investigações que depende de cooperação internacional, onde o crime cometido aqui também têm que ser visto como crime no outro país, acordos demorados, e fazer isso em quatro anos, destacando a questão eleitoral, se torna uma tarefa árdua.”

Com uma posição mais flexível em relação a desinformação como ato criminoso, o advogado Lenine Póvoas, vice-presidente da Comissão de Direito Eleitoral, falou sobre diferenças entre opinião falsa, fato falso, matérias sensacionalistas e distorção parcial dos fatos. “Quando alguém faz uma opinião falsa, ele se calca no fato verídico, só que os desdobramentos e conclusões são subjetivas e falsas. Quando se expressa uma opinião baseada no fato falso, inexistente, dolosamente criado, é necessário outro tratamento do Judiciário. Temos a matéria sensacionalista, que não necessariamente é baseada no fato falso, mas vem com uma alta carga emocional apelativa para seduzir as pessoas que provavelmente tem identificação com aquele tema. Existem os casos onde o jornalista pratica a distorção parcial dos fatos, às vezes por equívoco profissional, sem malícia e nenhum dolo, trata-se de um equívoco. É preciso muito debate sobre o assunto, mas para mim, o ponto é muito mais de educação tecnológica do que criminalização jurídica.”

Tecnologia

Representando o Instituto Tecnologia e Equidade (IT&E), Ariel Kogan, lembrou da aproximação entre o virtual e o real. “Temos um risco enorme de um linchamento virtual se transformar em linchamento real, físico. Nos momentos eleitorais esse risco aumenta muito. É necessário trazer essas plataformas para próximo da Justiça Eleitoral, e mesmo assim, é impossível que ela acompanhe sozinha tudo que é publicado, os movimentos que acontecem nessas redes.”

Kogan reforçou que “nenhuma organização, nenhum governo, tem capacidade de processamento tão grande. É necessário um conjunto de institutos trabalhando nessa linha de frente. Essas plataformas públicas de comunicação, porém privadas e transnacionais, precisam estar comprometidas com o processo eleitoral brasileiro, transparente e legítimo.”

Para ele, “somente assim podemos diminuir o alcance das notícias que já são comprovadamente falsas. Outro ponto é o financiamento. Não é possível que canais comprovadamente desinformativos, com notícias comprovadamente falsas, continuam recebendo um volume tão grande de recursos financeiros”.

Também da área de tecnologia, Luís Cézar Darienzo, doutor em sistemas distribuídos pela USP, atual secretário de Tecnologia da Informação do TRE-MT, lembrou que a dificuldade é global. “Temos um cenário da Ciberguerra, onde a velocidade da tecnologia é muito maior que o legislativo. Temos ações pontuais que mostram um caminho a ser seguido. Por exemplo, na eleição passado uma pessoa foi presa por espalhar fake news no dia da votação, dizendo que havia um mal funcionamento na urna com uma informação falsa por ela produzida. É necessário clareza que quando se fala em WhatsApp, precisa-se seguir todas as suas publicações, são bilhões de mensagens, para conseguir coibir a propagação de conteúdo criminoso. Isso vai exigir um investimento tão alto que talvez você não torne esse processo inviável”.

Em formato de talk show, a jornalista Petria Chaves conduziu o debate online, que ainda contou com a participação do diretor de Estratégias e Negócios da Agência Lupa, Gilberto Scofield Jr., e do diretor do MCCE (Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral), Luciano Caparroz Pereira Santos.

A iniciativa faz parte do programa Democracia Digital – Eleições 2020, realizado pela Agência Lupa, o Instituto Tecnologia e Equidade (IT&E) e o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) para conscientizar, educar e ajudar no combate aos processos de desinformação em massa nas próximas eleições municipais. Ao todo, já foram realizados cinco eventos presenciais nos seguintes estados: Rondônia, Pará, Amazonas, Espírito Santo e Minas Gerais. Em Mato Grosso, a organização do evento foi feita pela Escola Judiciária Eleitoral.

Fonte: TRE-MT