Disputas fundiárias exigem mediação com participação do Estado, dizem especialistas

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Problema histórico do Brasil, as disputas por terras demandam tratamento específico da Justiça, seja por causa da complexidade do tema quanto pelo elevado número de ações judiciais e agentes envolvidos nos litígios. A conclusão é de especialistas que participaram, na quarta-feira (19/2), do seminário Conflitos Fundiários em Debate, promovido pela Secretaria de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça.

A partir da análise de quatro casos emblemáticos de disputas por terras ocorridos nos estados do Pará, do Paraná e de Pernambuco , a Organização de Direitos Humanos Terra de Direitos diagnosticou que cada conflito gerou de cinco a quinze ações judiciais e abrangeu de 14 a 40 agentes da sociedade civil, da iniciativa privada, do Poder Judiciário e de órgãos do Executivo federal e estadual. Os autores dos processos em 20 das 35 ações ajuizadas nos quatro casos são empresas ou proprietários de terras. Os dados constam do Estudo sobre Soluções Alternativas para Conflitos Fundiários Agrários e Tradicionais, lançado durante o evento.

Para os pesquisadores da Terra de Direitos, os números mostram a necessidade de adoção de “ferramentas menos formais” na solução das disputas, como audiências públicas e de mediação.

Na opinião do juiz auxiliar da Presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) Rodrigo Rigamonte, os magistrados devem procurar ouvir todos os agentes direta e indiretamente envolvidos no conflito fundiário e buscar sempre a sua resolução pela conciliação ou mediação, em que os próprios interessados “participem da construção” da decisão que deverá ser cumprida. “Tratar os conflitos fundiários como os demais, sem atentar para suas peculiaridades, especialmente as graves consequências sociais que trazem, fatalmente não trará uma decisão efetiva”, afirmou Rigamonte, que também coordena o Comitê Executivo Nacional do Fórum de Assuntos Fundiários do CNJ.

No caso das disputas por terras, a mediação seria uma forma de resolução da disputa, mas não uma alternativa à judicialização, segundo a Subprocuradora-Geral da República Ela Wieko Volkmer de Castilho. “Alguma decisão judicial é fundamental no curso do processo, como o cabimento da desapropriação ou a definição sobre a legalidade de um empreendimento hidrelétrico questionado pelas comunidades”, disse e acrescentou que a mediação deve ser feita sempre sob a intermediação do Estado. “Será que é eficaz realizar uma mediação entre uma comunidade vulnerável e uma empresa com poder econômico? Acho impossível. Deve haver uma intermediação. O Estado não pode fugir dessa obrigação”, completou.

Presente no evento, o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, destacou a importância da criação de uma escola de mediadores. “Temos carência enorme de pessoas que nos ajudem. A velha figura do latifúndio contra o pequeno agricultor ainda existe, mas evolui para disputas, até entre indígenas e pequenos agricultores, mais complexas e difíceis de resolver”, disse.

Citando o exemplo do atual conflito entre índios tupinambás e produtores rurais no Sul da Bahia, Carvalho afirmou, porém, que as disputas só cessarão com o ataque das causas do problema. “Podemos fazer 300 mesas de negociação, mas se a demarcação das terras indígenas não ocorrer, não há mediador que resolva. A mediação é fundamental para se evitarem as mortes e, até, para se chegar à solução”, completou o ministro.

De acordo com o Secretário de Reforma do Judiciário, Flávio Caetano, o Ministério da Justiça ministrará, no final de março, um curso de formação de mediadores sociais e políticas públicas de mediação. “Todos do governo participarão do curso”, afirmou, acrescentando que também está em elaboração um cadastro nacional de mediadores sociais para auxiliar o Executivo em conflitos fundiários.

Bárbara Pombo
Agência CNJ de Notícias