“Recebemos gente como vocês, que vem aqui nos dizer que temos direito a educação e a documentos, mas que o problema é a logística. Meu povo está acostumado a ouvir. Eles querem ver acontecer”. O desabafo foi feito pelo indígena Alcir Ricardo Rodrigues, estudante de química da Universidade Federal do Amazonas, à comitiva do projeto Cidadania, Direito de Todos, durante visita realizada no fim de semana, dias 5 e 6 de maio, à aldeia onde vive.
O projeto foi criado pelo Conselho Nacional de Justiça, em 2010, juntamente com a Coordenação-Geral de Promoção do Registro Civil de Nascimento Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e outros parceiros institucionais, com o objetivo de erradicar o sub-registro e conferir documentos básicos à população indígena. A visita às aldeias de São Gabriel da Cachoeira foi realizada para que o grupo de trabalho do projeto estudasse a realização de um mutirão para atender os índios da região.
Além de integrantes do CNJ, participaram da comitiva representantes da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República (SDH), do Tribunal de Justiça da Amazonas (TJAM) e da Secretaria Estadual de Assistência Social e Cidadania (SEAS), órgão do governo amazonense.
São Gabriel da Cachoeira está localizado no Alto Rio Negro, a 840 quilômetros de distância da capital, Manaus. A cidade tem a maior concentração de indígenas no Brasil. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), são 800 comunidades com índios de 23 diferentes etnias. Com o apoio do Exército, a comitiva do Cidadania, Direito de Todos visitou quatro aldeias.
Na aldeia Areal, que reúne índios das etnias Baniwa e Kuripaco, a comitiva foi recebida pelo “capitão” (como também são chamado os caciques), Ernesto Vitorino. A comunidade também recepcionou o grupo com o Hino Nacional. Depois, as crianças cantaram na língua baniwa uma canção típica de boas-vindas e os homens entoaram o hino da comunidade. “Vocês têm uma forma muito especial de se expressar”, disse o conselheiro Ney Freitas, presidente da Comissão de Acesso à Justiça e à Cidadania do CNJ, responsável pela execução do projeto Cidadania, Direito de Todos.
O conselheiro informou aos indígenas que o mutirão para a concessão dos documentos deverá ocorrer no segundo semestre deste ano. “O povo indígena foi o primeiro cidadão deste país. Não precisaria de documentos, mas com o tempo a documentação tornou-se necessária para obter certos benefícios. Sem sair de casa, todos terão acesso a esses documentos. Vamos voltar ainda neste ano”, afirmou o conselheiro.
O indígena estudante de química transmitiu na língua da comunidade o compromisso assumido. Os índios comemoraram. “Quando nos acostumamos com os problemas, eles se tornam cotidianos, se tornam nossos amigos e ficam parecendo normais. Levem os nossos problemas para as autoridades”, declarou o índio Alcir.
Marina Lacerda, coordenadora de promoção do registro civil de nascimento da SDH, explicou à comunidade que o mutirão será organizado de forma a atender também as comunidades indígenas mais distantes do município de São Gabriel da Cachoeira. “O atendimento aos povos mais distantes também é o objetivo da nossa visita. Vamos estudar como isso se dará. Talvez realizemos a ação em uma comunidade mais próxima, para que as outras também possam participar”, disse a coordenadora.
Mutirão – Os integrantes do projeto Cidadania, Direito de Todos seguiram para São Gabriel da Cachoeira após realizar um mutirão de entrega de documentos em Manaus. A ação aconteceu no Centro de Convivência com o Idoso, no bairro de Aparecida. Cerca de 1.400 pessoas foram beneficiadas. Na ocasião, os indígenas puderam expedir a certidão de nascimento, a carteira de identidade, o Cadastro da Pessoa Física (CPF) e o Registro Administrativo de Nascimento do Índio (Rani). Eles também tiveram acesso a informações sobre benefícios previdenciários e o Cadastro Único para acesso aos programas sociais do Governo Federal, entre os quais o Bolsa-Família.
Giselle Souza
Agência CNJ de Notícias