Projeto de acolhimento a presos estrangeiros chama atenção de europeus

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Consulados de doze países da União Europeia, situados em São Paulo, discutem apoiar o Instituto Liberty, de Campinas/SP, a expandir seu projeto-piloto de acolhimento a presos estrangeiros, iniciado em maio deste ano por meio de parceria com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e a 9ª Vara Federal de Campinas. Pioneiro nesse tipo de atendimento no País, o Liberty hoje oferece moradia e trabalho a cinco estrangeiros condenados à prisão domiciliar com prestação de serviço comunitário. Flagrados no Brasil transportando drogas, eles são da Bulgária, do Senegal, da Tunísia, do Paraguai e da Bélgica.

O interesse das representações diplomáticas em ampliar o trabalho do Liberty está relacionado a um dos principais problemas enfrentados pelos presos estrangeiros no Brasil: sem parentes e endereço fixo, não conseguem usufruir dos benefícios da legislação penal brasileira, como a progressão de pena para o regime semiaberto ou aberto. Além disso, ficam impossibilitados de cumprir medidas cautelares, a exemplo da prisão domiciliar.

Essa realidade os obriga a permanecer no regime fechado até a conclusão do processo de expulsão para seu país de origem, sem ter tido acesso a qualquer projeto de ressocialização. Sua permanência nos presídios brasileiros também representa gastos públicos que poderiam ser evitados.
 
O apoio ao Instituto Liberty está sendo articulado por Bart Struyf, assistente para assuntos consulares do Consulado da Bélgica. Em comunicado aos colegas da União Europeia, ele se diz surpreso com o bom tratamento dispensado ao condenado belga que, por decisão da 9ª Vara Federal de Campinas, cumpre prisão domiciliar e trabalha nas dependências do Instituto Liberty. O serviço comunitário prestado por ele e os outros quatro estrangeiros consiste no atendimento a telefonemas, na recepção a visitantes, na limpeza e conservação. Ao mesmo tempo eles desempenham atividades remuneradas, como a produção de canetas biodegradáveis, sacolas e tijolos ecológicos.

Em seu comunicado Bart Struyf também observa que o Liberty sobrevive graças à ajuda da Prefeitura Municipal de Campinas, que fornece alimentos. Ele acrescenta que, em função disso, a instituição merece receber o apoio dos doze consulados, já que, além de oferecer moradia e trabalho aos estrangeiros, tem boa interlocução com a administração penitenciária e a Polícia Federal. Struyt também destaca a parceria do CNJ como fundamental para o sucesso do trabalho.

O coordenador do Liberty, Marcos Silveira, comemora a repercussão de sua iniciativa. “Os representantes dos consulados estão muito felizes com o que está acontecendo no Brasil. Falei pelo telefone com o Consulado da Bélgica e me disseram que estão agendando data para eu ir a São Paulo para apresentar o Instituto Liberty para eles; já propuseram nos ajudar no que fosse necessário”, afirmou Silveira.

Uma reunião entre os consulados e o Liberty está sendo programada para acontecer na primeira quinzena de dezembro. Na ocasião, serão discutidas formas de apoio para que o projeto-piloto da entidade seja levado a outras localidades, principalmente onde há concentração de presos estrangeiros. Segundo informações do Ministério da Justiça, o Brasil registrava a existência de 3.191 custodiados de outras nacionalidades em junho de 2011. O maior contingente (1.912) era do estado de São Paulo, seguido de Mato Grosso do Sul (187), Paraná (164) e Rio de Janeiro (144).

O Instituto Liberty foi criado em 2006. Desde então, dedica-se à reinserção social de brasileiros egressos do sistema carcerário, tendo conseguido colocação no mercado de trabalho para cerca de 200 deles, por meio de parcerias com entidades públicas e privadas. Em 2010, como reconhecimento pelo trabalho realizado, foi uma das instituições agraciadas pelo CNJ com o Selo do Programa Começar de Novo, conferido aos que se destacam em ações de reinserção social de detentos e egressos do sistema carcerário.

Com o novo projeto voltado aos presos estrangeiros, fica ainda mais estreita a parceria com o CNJ, que tem realizado seminários para discutir o tema. O último encontro ocorreu em julho, no Rio de Janeiro, quando autoridades e especialistas discutiram soluções para os problemas enfrentados por esse segmento específico, como a dificuldade com a língua portuguesa, a distância dos familiares e deficiências na assistência prestada pelas representações diplomáticas.

O juiz auxiliar da Presidência do CNJ Luciano Losekann, coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF), defende que a parceria entre o Instituto Liberty e a 9ª Vara Federal de Campinas inspire a adoção de iniciativas semelhantes. “Trata-se de medida inovadora do juízo federal, que pode ser estendida, mediante convênio com outras instituições idôneas na área da execução penal, facilitando-se o cumprimento da pena por estrangeiros”, disse o magistrado.

Jorge Vasconcellos
Agência CNJ de Notícias