Especialista defende que juízes tenham mais tempo para se dedicar a julgamentos, não à gestão de tribunais

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Depois de 30 anos de carreira, o especialista em gestão judiciária que ministrará palestra na abertura do VIII Encontro Nacional do Poder Judiciário, Jeffrey Apperson, chegou à conclusão de que os magistrados precisam de mais tempo para se dedicar à análise das ações judiciais. Atualmente, o diretor-executivo da IACA (organização não governamental criada para o aperfeiçoamento da gestão dos sistemas de Justiça no mundo) avalia que a administração das cortes deveria ficar a cargo de especialistas na área de gestão.

Com uma trajetória profissional que inclui passagens pelo Tribunal Penal Internacional das Nações Unidas e pelo Judiciário de países do Leste Europeu, África e Américas, Apperson sentencia:  “Magistrados são treinados para se tornarem especialistas em assuntos jurídicos, não em gestão. Isso não significa que juízes não podem se especializar em gestão judiciária. Contudo, independentemente do modelo de gestão judiciária que for adotado, é necessário especialização”. Acompanhe abaixo a entrevista com o especialista.

O senhor poderia identificar o principal desafio para a Justiça brasileira em termos de gestão judiciária?

Creio que o principal desafio para o sistema de Justiça é institucionalizar a capacidade de gestão profissional em todos os núcleos da administração dos tribunais e, em seguida, distribuir a capacidade profissional ao restante das áreas do Judiciário. A gestão do Judiciário é uma ciência e uma arte. Nunca houve tantos desafios de gestão como agora nas áreas da tecnologia e da gestão de processos.

Quais medidas deveriam ser adotadas, em termos de gestão, para dar respostas mais céleres à prestação jurisdicional?

Um desafio é reduzir a carga de trabalho dos magistrados por meio da reorganização do trabalho de modo a permitir que os juízes possam priorizar a análise dos casos. O processamento dos recursos judiciais também precisa ser levado em conta uma vez que o trabalho de análise de recursos é enorme.

Como o senhor vê o fato de, no Brasil, magistrados terem que atuar em questões administrativas?

Magistrados são treinados para se tornarem especialistas em assuntos jurídicos, não em gestão. Isso não significa que juízes não podem se especializar em gestão judiciária. Contudo, independentemente do modelo de gestão judiciária que for adotado, é necessário especialização. É um campo extremamente complicado. Eu fui treinado como gestor judiciário profissional durante 30 anos e aprendi algo novo a cada ano.

Como solucionar essa questão?

Os tribunais deveriam considerar levar especialização técnica para áreas como tecnologia, recursos humanos e compras públicas, sob supervisão do gestor do tribunal. Outro problema é a revisão dos salários oferecidos aos profissionais que se deseja contratar. Muitos governos não pagam salários que sejam iguais às expectativas de salário de um profissional. O setor de gestão de pessoas precisa se adaptar à nova era, baseada na produtividade.

Como o senhor lida como esse problema nos Estados Unidos da América?

Os Estados Unidos da América desenvolveram sistema de gestão judiciária profissional ao longo dos últimos 30 anos. Nós temos gestores profissionais nos tribunais e nos comitês de sistematização judicial. O que era uma função administrativa agora é uma função de gestão profissional. Existem diversas abordagens teóricas organizacionais, porém atualmente tribunais do mundo todo estão se dando conta de que, para equilibrar o poder entre os diferentes ramos do Estado, o Judiciário precisa desenvolver capacidade administrativa igual à dos outros poderes.

Esse seria o modelo a ser seguido por outros países como o Brasil?

Esse é o novo desafio para muitos países cujos Judiciários dependiam do Executivo para ter gestores públicos, como o Brasil. Os princípios para desenvolver uma profissão de gestor judiciário já existem, os meios necessários estão evoluindo. Um princípio central é que os magistrados de cada tribunal precisam trabalhar em conjunto para assegurar que a prática deles seja uniforme sem que isso interfira na independência deles. Em muitos tribunais do mundo, os juízes sequer conversam com seus colegas.

Considerando sua vasta experiência internacional na área, o senhor poderia mencionar um problema de gestão judiciária comum a todos os países que visitou?

Um é a aplicação de padrões éticos a servidores e magistrados. O outro é a deficiência de recursos orçamentários.

O senhor já esteve em algum país com problemas semelhantes aos encontrados na nossa Justiça?

Sim, há muitos países com preocupações semelhantes, como por exemplo a África do Sul, Quênia e Líbano.

Manuel Carlos Montenegro
Agência CNJ de Notícias