Segundo programa criado pela atual gestão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para dar atenção ao sistema carcerário, o Cidadania nos Presídios trabalha com a ideia de um olhar mais humano não apenas para aqueles que ainda estão cumprindo pena, mas, sobretudo, para os recém-egressos do sistema. É o que propõe um dos eixos do programa, o Escritório Social, que está unindo poderes públicos e a sociedade civil no Espírito Santo para solucionar questões que podem reduzir a reincidência criminal, como a inclusão social dos ex-detentos e o apoio às suas respectivas famílias.
O Escritório Social propõe reunir em um só local todos os órgãos e instituições que podem auxiliar o egresso do sistema carcerário a superar as barreiras e dificuldades encontradas no primeiro momento de contato com a liberdade. Uma equipe multidisciplinar ficará à disposição dos ex-presos e seus familiares para dar orientação e apoio em serviços de assistência à saúde, assistência psicossocial, qualificação, capacitação e encaminhamento profissional, valorizando o resgate da cidadania.
Segundo o coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Cumprimento de Medidas Socioeducativas (DMF) do CNJ, juiz auxiliar da presidência Luís Geraldo Sant’Ana Lanfredi, o programa está promovendo a articulação e a organização de serviços federais, estaduais e municipais de forma inédita. “Sabemos que as políticas públicas existem, mas não se conversam. O que pretendemos é sistematizar o que já existe, amplificando e fortalecendo a ideia da rede de apoio e assistência social ao egresso e a seus familiares”, explica.
Outro objetivo do Escritório Social é atender a situação particular de cada condenado que deixa a unidade prisional, fortalecendo sua identidade. “Queremos dar uma estrutura que o ajude a resgatar suas referências como pessoa e como cidadão, dentro da concreção de direitos defendida pelo ministro Ricardo Lewandowski”, explica o juiz Luís Lanfredi. Para a coordenadora do Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário do Espírito Santo (GMF-ES), juíza Gisele Souza, o Judiciário está dando um passo à frente para promover a pacificação social. “Quando essa pessoa retorna à sociedade e é acompanhada, a chance de voltar a cometer crimes diminui muito”, explica.
Estreia – Com o Escritório Social, o Cidadania nos Presídios avança em mais uma etapa no Espírito Santo, onde o programa está sendo desenvolvido de forma pioneira desde 2015. Depois da fase de estudos e de preparação, o eixo processual do programa começou a funcionar em meados de fevereiro de 2016, com a análise mais ágil de direitos previstos na legislação penal. Desde então, mais de mil vagas foram liberadas no sistema carcerário capixaba, com impacto na individualização das penas e diminuição da superlotação carcerária.
De acordo com o secretário de Justiça do Espírito Santo, Eugênio Ricas, o Escritório Social capixaba está sendo montado em um prédio na área central de Vitória e deverá começar a ter as primeiras operações ainda em abril. O espaço está sendo projetado para atender a todos os ex-detentos que voltarão a ter contato com a sociedade depois de cumprirem pena ou ainda no regime aberto, dando continuidade a atividades profissionais e educacionais já desenvolvidas nos presídios – atualmente 3,6 mil presos do Espírito Santo estudam e mais de 2, 5 mil trabalham.
“Queremos evitar que o preso volte a reincidir e, com o “Escritório Social”, vamos conseguir mensurar o serviço que é prestado dentro das unidades prisionais. Hoje, quando o ex-detento sai, não temos mais notícia dessa pessoa até o momento em que ela eventualmente volte ao sistema. Agora, queremos inverter essa lógica dando o acompanhamento após o cumprimento da pena”, explica o secretário.
Esforço conjunto – Coordenado pelo Judiciário local, o Escritório Social tem a parceria do governo do estado na disponibilização da estrutura e de pessoal, assim como do setor privado e da sociedade civil. Para garantir o sucesso e a longevidade dos atendimentos, uma gerência especial está sendo criada dentro da Secretaria de Governo para dar tratamento estratégico ao assunto. “Hoje temos uma ótima ideia que o governo assinou embaixo e agora temos que colocar essa ideia de pé e fazer um projeto. Não adianta abrir o Escritório e não ter definição de metas ou o acompanhamento de quantos egressos conseguimos inserir no mercado ou quantos voltaram a estudar”, explica a secretária de governo, Ângela Silvares.
De acordo com a secretária, a proposta do governo capixaba é dar encaminhamento normativo ao assunto em um futuro próximo, além de manter frequente contato com o Judiciário e outros atores envolvidos até que o funcionamento se torne o modelo esperado por todos. “No passado estávamos na mídia internacional por conta de denúncias de masmorras em forma de prisões. Hoje temos um sistema prisional que é considerado modelo por vontade política daqueles interessados em mudar esse cenário”, completa a secretária.
Protagonismo – Para os atores que estão trabalhando pela concretização do Escritório Social, o envolvimento do CNJ e do presidente Ricardo Lewandowski para a consolidação dos programas voltados para o sistema prisional é fundamental para a obtenção de resultados. “O ministro Ricardo Lewandowski, ao colocar esse debate em um nível institucional elevado, ajuda muito, pois viemos arrastando esse tema no Brasil há décadas e nunca vimos tantos avanços como vem ocorrendo com as audiências de custódia e, agora, mais este passo com o Cidadania nos Presídios”, afirma Eugênio Ricas, da secretaria de Justiça capixaba.
Segundo a coordenadora do GMF-ES, juíza Gisele Souza, os resultados dos programas do CNJ estão conquistando cada vez mais apoiadores no sistema de Justiça e na sociedade local. “Esses projetos estão derrubando mitos sobre o uso do encarceramento como medida de segurança, pois estamos observando que embora haja mais pessoas libertadas desde o último ano, a taxa de criminalidade no estado está caindo”, observa a magistrada.
Deborah Zampier
Agência CNJ de Notícias