Juiz federal de São Paulo, o conselheiro Silvio Rocha participa, na próxima terça-feira (6/8), de sua última sessão como membro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Indicado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), seu mandato se encerra no dia 8. Como presidente da Comissão Permanente de Tecnologia da Informação e Infraestrutura, Silvio Rocha esteve à frente da implantação do Processo Judicial Eletrônico (PJe), um dos principais projetos do CNJ. Na entrevista abaixo, o conselheiro faz um balanço de sua participação no Conselho e fala sobre as perspectivas para a atuação do órgão.
Que projetos o senhor destacaria durante a sua passagem pelo Conselho?
Desenvolvi dois projetos que considero muito importantes. Um é o Processo Judicial Eletrônico (PJe), um projeto revolucionário que vai resolver os problemas de morosidade do Judiciário. O outro é o projeto Resgate da Cidadania de Pessoas Internadas em Hospitais Psiquiátricos, que prevê a obtenção de documentos para essas pessoas, para que elas possam usufruir de benefícios previdenciários e assistenciais.
Como esses projetos estavam quando o senhor chegou ao CNJ e como estão hoje?
O PJe já vinha sendo desenvolvido, mas algumas medidas foram tomadas para amarrar melhor o projeto. Tivemos, nesse período, adesão e comprometimento maiores dos tribunais. Passamos também a condicionar o repasse de recursos orçamentários a certas exigências por parte dos tribunais, o que foi uma contribuição muito importante. Além disso, finalizamos uma proposta de resolução que estrutura, do ponto de vista legal, o processo judicial eletrônico, que aguarda aprovação pelo Plenário. Então, acho que hoje o projeto está mais bem estruturado que estava.
Já o projeto com pessoas internadas em hospitais psiquiátricos era um projeto-piloto que, por sugestão de outras entidades, incluiu também um levantamento das pessoas e das condições de internação dos pacientes. Isso facilitou, por exemplo, um termo de ajustamento de conduta em Sorocaba feito pelo Ministério Público estadual e por outros órgãos da saúde. Com isso, temos a perspectiva de uma melhoria concreta das condições de internação destes pacientes, que pela própria condição não têm possibilidade de reclamar.
Quais os desafios o seu sucessor terá nesses projetos daqui para frente?
No PJe, o desafio é aprovar a resolução e, depois disso, implantar efetivamente o projeto nos estados. O projeto está indo bem na Justiça do Trabalho e em algumas regiões da Justiça Federal, mas precisamos de uma melhor estruturação no âmbito da justiça estadual. Temos poucos estados efetivamente participando do PJe: Pernambuco, Sergipe, Rio Grande do Sul e Minas Gerais são alguns exemplos. No entanto, precisamos nos estruturar em termos de técnicos e isso foi sendo feito ao longo dos últimos dois anos.
E em relação ao projeto Resgate da Cidadania de Pessoas Internadas em Hospitais Psiquiátricos?
Esse foi um trabalho que aproximou o CNJ de outros órgãos que tratam dessa questão, como o Ministério da Saúde, a Secretaria de Direitos Humanos, a Procuradoria da República na Defesa do Cidadão, a Defensoria Pública, o Ministério Público Estadual e as Secretarias de Saúde. Acho então que meu sucessor terá condições de dar continuidade ao projeto em outros hospitais psiquiátricos.
Ainda há resistência de tribunais para a informatização?
Quase todos os tribunais dos estados têm processo judicial eletrônico, mas não nos moldes concebidos pelo CNJ. As soluções que existem nos estados são soluções privadas, em que há o pagamento de licenças. A ideia é implantar um processo judicial eletrônico com base em um software livre, desenvolvido pelo CNJ. A questão é que o CNJ precisa se estruturar, porque, a partir do momento em que se implanta o programa, o Conselho precisa ser capaz de dar suporte aos tribunais. Para ter essa capacidade de resposta, precisamos de um corpo permanente de técnicos voltados para o desenvolvimento e o aperfeiçoamento do PJe. Isso passa pela criação de nova estrutura e pela nomeação dos servidores que foram aprovados no concurso. A situação ideal é que tivéssemos pelo menos mais 30 servidores nomeados exclusivamente para isso. Recentemente, o ministro Joaquim Barbosa deu um sinal positivo para o projeto, com a designação de técnicos para desenvolver o PJe nos estados. É um investimento que vai significar a economia de milhões de reais em recursos que seriam pagos em soluções privadas.
Em relação à atuação em plenário, o que o sr. destacaria durante esse período em que esteve no Conselho?
Terei boas recordações. Foi uma composição em que todos os conselheiros, sem exceção, foram pautados pela cordialidade e pela humildade. Conseguimos implantar a chamada pauta rápida e isso permitiu que muitos procedimentos fossem julgados. Tivemos também algumas discussões produtivas sobre a aplicação de resoluções do CNJ, como a que trata da promoção por merecimento.
Começamos com algumas dúvidas sobre a aplicabilidade da resolução e chegamos a certo entendimento de que ela deve ser aplicada com a maior objetividade possível, justamente para reduzir a margem de discricionariedade do tribunal na hora de decidir qual juiz deverá ser promovido. Eu destacaria também as resoluções que tratam de conciliação, mediação e formas alternativas de resolução de conflito. Acho que estes foram os aspectos positivos do período.
Que perspectivas o senhor vê para a atuação do Conselho?
O CNJ é um órgão muito importante em dois aspectos: do ponto de vista do planejamento do Poder Judiciário e do ponto de vista disciplinar, sobretudo para comportamentos graves, que envolvam corrupção ou negligência no exercício da função jurisdicional. Mas também acho que o Conselho pode se perder em questões individuais. O CNJ é um órgão de planejamento e controle muito importante para ficar tratando de questões meramente individuais. Por isso, acho que a orientação de que o CNJ não deve tratar de casos individuais, sem repercussão geral, deve continuar.
Tatiane Freire
Agência CNJ de Notícias