A 693 km de São Luís, os povos indígenas da etnia Krikati preparavam-se para mais uma ação de promoção da cidadania do Poder Judiciário em seu território. Após casamento comunitário e instalação de um Ponto de Inclusão Digital (PID), foi a vez de a comunidade da Aldeia São José, localizada entre os municípios de Montes Altos e Sítio Novo, receber certidões de registro civil, nessa terça-feira (20/5). A iniciativa, coordenada pela Corregedoria Geral do Foro Extrajudicial (Cogex), é resultado das mobilizações da Semana Nacional do Registro Civil (Registre-se!).
Além dos moradores da Aldeia São José, o evento contou com a presença de indígenas de outras aldeias da etnia Krikati. A mesa de abertura da cerimônia contou com a presença do corregedor-geral do Foro Extrajudicial, desembargador José Jorge Figueiredo dos Anjos; da juíza auxiliar da Cogex, Laysa Paz Mendes; do cacique da Aldeia São José, Maurício Krikati; do prefeito de Montes Altos, Domingos França; da registradora titular da Serventia do Ofício Único de Sítio Novo, Ana Cristina Duarte; da coordenadora regional da Funai no Maranhão, Edilena Krikati; do secretário de assunto indígenas de Montes Altos, Marcelo Krikati; e da vereadora de Montes Altos, Letícia Awju Krikati.
Durante a ação, o corregedor-geral do Foro Extrajudicial, desembargador José Jorge Figueiredo dos Anjos, ressaltou que a iniciativa era pioneira dentro de um novo projeto da Cogex, intitulado Registro Cidadão Indígena. O projeto será ampliado para além da Aldeia São José, visando beneficiar o maior número possível de comunidades indígenas no Maranhão, com atendimentos voltados à emissão de documentação básica, além de ações relacionadas à saúde e à cidadania.
“O Brasil possui uma dívida histórica com os povos indígenas, e esta ação é um resgate do compromisso de garantir cidadania a essas comunidades, muitas vezes esquecidas pelo poder público. Atualmente, muitos indígenas ainda enfrentam dificuldades para obter a documentação básica e acessar direitos fundamentais previstos na Constituição Federal. Nesta iniciativa, estamos entregando mais de 350 certidões de nascimento, e essa ação não vai parar, é um trabalho permanente do Poder Judiciário, por meio da Corregedoria Extrajudicial”, afirmou.
A juíza auxiliar da Cogex, Laysa Mendes, estendeu os cumprimentos à comunidade, agradecendo o acolhimento e ressaltando a parceria fundamental tanto com as lideranças quanto com os órgãos parceiros.
“Para nós, é uma honra estar nesse momento na Aldeia São José, falando diretamente com a comunidade, conhecendo seus costumes e sua cultura. É uma troca enriquecedora poder sair dos limites do local onde trabalhamos e ver o impacto desse trabalho”, disse.
Segundo o cacique Maurício Krikati, a população Krikati da Aldeia São José chega a aproximadamente 1400 pessoas. Ao todo, após a ação, 388 pessoas foram beneficiadas e agora possuem a documentação regularizada.
“Essa ação está sendo muito importante para a minha comunidade, porque veio para realmente atender às demandas do nosso povo, principalmente porque muitos não têm como sair da aldeia e se deslocar para resolver essas questões. Alguns precisam da documentação para conseguir benefícios como aposentadoria, auxílio maternidade, por exemplo”, destacou o cacique.
Registro Cidadão Indígena
“Tem muita gente que precisa desse documento para tirar a carteira de identidade e outros documentos, então é importante que essa ação aconteça mais vezes”. Com essas palavras, Lídia Krikati, que garantiu a segunda via da sua certidão de nascimento, bem como a do marido e as dos cinco filhos, definiu a importância da iniciativa.
Ela explicou, ainda, que devido às famílias grandes e à situação financeira, muitas vezes, a regularização dos documentos fica em segundo plano. Mas esse não será mais um problema devido à mais nova iniciativa da Cogex, uma extensão do projeto Registro Cidadão, mas que agora terá as populações indígenas como foco principal.
Ainda durante a entrega de registro civil na Aldeia São José, a juíza Laysa Mendes explicou sobre o projeto que se inicia e que ela considera um marco, não somente para a população beneficiada como também para a Cogex e todo o Poder Judiciário do Maranhão.
“Há necessidade de documentos para além da certidão de nascimento. Ela é apenas o pontapé inicial, mas as pessoas precisam da carteira de identidade nacional, do título de eleitor e de outras regularidades, então o Registro Cidadão Indígena entrega, juntamente com órgãos parceiros, outros documentos para além do registro civil”, frisou.
União para garantia de direitos
A pequena Linda, de apenas 4 anos, também recebeu sua primeira certidão de nascimento das mãos do corregedor e da juíza auxiliar da Cogex, do cacique e do prefeito, representando a união que fez a ação acontecer.
Para a registradora Ana Cristina Duarte, a entrega dos registros demonstra que a união e a parceria são capazes de garantir ações concretas para quem mais precisa. Ela também reforçou a participação dos cartórios e seu papel, que não é apenas burocrático, mas também de transformação social.
“É uma alegria imensa retornar à Aldeia São José, reafirmando o nosso compromisso com os povos originários, com a dignidade da pessoa humana de forma efetiva e concreta”, disse.
A vereadora de Montes Altos, Letícia Awjju Krikati, esteve presente para apoiar a ação que considera uma reparação histórica . A parlamentar, que já foi facilitadora do Ponto de Inclusão Digital (PID) da Aldeia São José, também ressaltou que a aproximação do Tribunal de Justiça, da Corregedoria Extrajudicial é o primeiro passo para a garantia da cidadania dos povos indígenas Krikati.
Para promover a entrega dos registros, foram mobilizados os cartórios de Montes Altos, Lajeado Novo, Sítio Novo, Amarante do Maranhão, Porto Franco e Imperatriz.
Valorização da cultura
O cacique também destacou a união de seu povo na organização do evento. Na aldeia São José, Maurício Krikati é a liderança máxima, mas conta com auxílio e colaboração. Para simplificar, ele fez uma analogia ao funcionamento das prefeituras, contando que a aldeia possui secretários em diversas áreas como cultura e esporte.
O responsável pela logística e mobilização para o evento foi o secretário de cultura da aldeia, Milton Krikati.
Na língua Jê (um dialeto da língua timbira) e também em português, o secretário saudou os presentes e expressou sua satisfação com a realização do evento. A liderança e um grupo de jovens realizou uma apresentação de música e dança, para aproximar ainda mais os presentes da cultura do povo Krikati.
“Temos muito orgulho de manter nossa cultura viva, a cultura deixada pelos nossos ancestrais. Sejam bem-vindos! A casa é nossa, sintam-se à vontade!”, disse.
Semana Registre-se
A Semana Registre-se ocorreu entre os dias 12 e 16 de maio, com o objetivo de erradicar o sub-registro civil e ampliar o acesso à documentação básica da população vulnerável. Durante a semana, foram atendidos a população indígena, pessoas em situação de rua e hipossuficientes, reeducandos e egressos do sistema prisional.
Em um balanço realizado pelo Operador Nacional do Registro Civil de Pessoas Naturais, o Maranhão ocupou o segundo lugar geral em ações bem-sucedidas relacionadas à Semana. O estado realizou cerca de 23 mil solicitações de certidões durante o período, perdendo apenas para Pernambuco.