Processo do Pavilhão da Gameleira recebe selo Tema Relevante

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A decisão no processo criminal, datada de março de 1974, foi publicada integralmente na revista Minas Policial em 1975. Foto: Divulgação
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A Comissão Técnica de Avaliação Documental do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) concedeu, pela primeira vez, o selo Tema Relevante a um processo judicial. Os autos se referem ao desabamento do pavilhão de exposições do Parque da Gameleira, em 1971, em Belo Horizonte (MG). A partir de agora, esse material passa a ficar disponível para consulta por pesquisadores, jornalistas e o público em geral, no Arquivo Permanente do TJMG, de forma alinhada às recomendações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para a gestão documental.

Um episódio trágico, mas de grande significado jurídico, social, cultural e histórico, o desastre completou 50 anos em 2021. Durante as obras, a estrutura desmoronou, ocasionando a morte de 64 trabalhadores e deixando diversos operários feridos, alguns incapacitados de forma permanente. Os autos informam que houve falhas por parte da empresa construtora e do governo de Minas Gerais.

O processo criminal que apurou a responsabilidade pelo ocorrido foi indicado para receber o selo pelo desembargador Marcos Henrique Caldeira Brant, superintendente de Segurança Institucional do TJMG e superintendente adjunto da Memória do Judiciário Mineiro (Mejud). O magistrado, que é membro do Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais, submeteu a sugestão aos demais componentes da comissão. A pedido dele, o feito, que já estava baixado, foi desarquivado e levado à apreciação do grupo. Em reunião virtual, em 28 de abril, a proposta foi aprovada por unanimidade.

Segundo Brant, o processo criminal tem 16 volumes. Foi o primeiro a receber o selo para ficar sob a custódia do Arquivo Permanente. Os itens recebidos na unidade, que fica em Contagem, na região metropolitana de Belo Horizonte, são higienizados, recompostos, se for o caso, e passam por acompanhamento especializado periódico para evitar sua deterioração.

“Isso se deve ao valor informativo, histórico e sociocultural desses autos para a memória da Justiça. Trata-se especificamente de um grande sinistro da construção civil, o desabamento do pavilhão de exposições do Parque da Gameleira, situado na Avenida Amazonas, na capital. A obra, pertencente ao governo do estado, tinha projeto arquitetônico de Oscar Niemeyer”, afirmou o desembargador.

O magistrado rememorou as circunstâncias da tragédia. “Foi em 4 de fevereiro, uma quinta-feira. Era meio-dia, em pleno horário de almoço, quando, de repente, duas das vigas que sustentavam a estrutura se romperam. Isso causou a queda de toneladas e toneladas de concreto e ferragem sobre os indefesos operários.”

O fato, segundo o desembargador, provocou forte comoção na população belo-horizontina. “Naquela época eu tinha 11 anos. Foi durante as férias escolares. Eu estava no Minas Tênis Clube quando surgiu a notícia. Foi um alvoroço, e a curiosidade e a perplexidade foram gerais.”

Ele conta que rapidamente se formou uma grande rede de solidariedade. “Vários voluntários se dirigiram ao local, com equipamentos e instrumentos, para auxiliar a Polícia Militar e o Corpo de Bombeiros na busca e no salvamento, serviço que durou semanas. Nesse desastre, infelizmente, houve 64 vítimas fatais e 20 com lesões corporais de naturezas diversas.”

História

Deflagradas as investigações, três engenheiros e um arquiteto foram indiciados e processados. Eles responderam pelos artigos 256 (desabamento ou desmoronamento) e 258 (formas qualificadas de crime de perigo comum) do Código Penal. O processo tramitou na 7ª Vara Criminal de Belo Horizonte e ficou sob a responsabilidade do juiz Walter Veado.

Brant conta que estavam envolvidas as seguintes autoridades: o delegado que presidiu o inquérito policial, Geraldo Lara Resende, o promotor de justiça Francisco Raposo Lima, e, entre os advogados, Aloísio Aragão Villar, Ariosvaldo Campos Pires, Evandro Lins e Silva, Hélio Hermeto Corrêa, José Alfredo de Oliveira Baracho e Nicanor Netto Armando. Uma das testemunhas foi o poeta e diplomata João Cabral de Melo Neto. “A substanciosa sentença de 72 laudas absolveu dois engenheiros e condenou um engenheiro e o arquiteto. Houve apelações ao extinto Tribunal de Alçada de Minas Gerais (TAMG), que, através de sua única câmara criminal, deu provimento e absolveu os réus apelantes, com um acórdão de 113 laudas.”

A turma julgadora do TAMG foi formada pelos juízes Agostinho de Oliveira (presidente, sem voto), Vieira de Brito (relator), Lindolfo Paoliello e Vilhena Valadão (vogais). O procurador-geral de justiça foi José Arthur de Carvalho Pereira. O desembargador destaca o significado desses documentos, para o resgate do episódio. “Atualmente, o local abriga o Expominas. Não existem marcas ou evidências físicas dessa tragédia. Para perpetuar a memória da capital, entendo que o espaço deveria conter alguma referência a isso, pelo menos uma placa ou um marco alusivo ao desastre e às vítimas. Esse pode ser considerado o maior acidente de trabalho ocorrido no Brasil no século XX.”

Tema relevante

Esse processo é o primeiro ao qual é atribuído o selo Tema Relevante pela Comissão Técnica de Avaliação Documental do TJMG com a finalidade de preservar e difundir a memória judicial e policial mineira. O marcador Tema Relevante foi instituído no TJMG por intermédio da Portaria Conjunta 5/2VP/2018.

De acordo com a norma, a indicação de processo judicial à guarda permanente poderá ser feita, em qualquer fase da sua tramitação, por magistrados, nos feitos em que ele tiver competência para decidir, ou por representantes de entidades de caráter histórico, cultural e universitário. Saiba mais sobre a gestão documental no TJMG.

Fonte: TJMG