Ao menos 24 mil atendimentos a vítimas de crimes foram feitos pela Justiça no ano passado por meio dos Centros Especializados de Atenção às Vítimas (Ceavs). Essas estruturas foram criadas pelos tribunais para oferecer atendimento humanizado e multidisciplinar a essas pessoas; e um levantamento inédito revela como o Poder Judiciário tem estruturado o acolhimento e o apoio a esse público em todo o país.
Os dados que mostram avanços na implementação dos Ceavs foram publicados no boletim “Olhares Plurais — Atenção às Vítimas no Judiciário: panorama inicial, desafios e possibilidades”, divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Elaborada pelo Programa Justiça Plural, a publicação mapeou 70 Ceavs em funcionamento, sendo 43 vinculados a tribunais estaduais e 27 a tribunais regionais federais. O número de 24 mil atendimentos corresponde aos registros de 81% dos centros — os demais não têm a consolidação dessa informação.
A maior parte dos centros foi implementada entre 2023 e 2024, sob as diretrizes das Resoluções CNJ n. 253/2018 e n. 386/2021. Elas estabelecem a criação de estruturas voltadas ao atendimento integral das vítimas e de seus familiares.
Para o conselheiro do CNJ José Edivaldo Rocha Rotondano, que apoiou a mobilização dos tribunais e dos Ceavs para a pesquisa, os resultados reforçam a importância de fortalecer a política de atenção às vítimas no Judiciário. “Acolher as vítimas é um passo essencial para garantir direitos e evitar a revitimização. Os Ceavs representam uma mudança cultural no sistema de Justiça, aproximando-o das pessoas que mais precisam de proteção”, afirmou.
Dados
Em relação ao modelo de funcionamento, 77% dos Ceavs adota o formato híbrido. Essa modalidade tem ampliado o alcance do serviço e garantido acolhimento mesmo a quem enfrenta dificuldades de deslocamento ou outras vulnerabilidades, preservando a qualidade do atendimento.
Entre as demandas de atendimento mais frequentes, estão o encaminhamento a outros serviços públicos (74%), a assistência psicológica (53%) e o acolhimento durante audiências e diligências (51%). Embora 56% dos Ceavs possuam espaço físico exclusivo e 68% possuam salas de atendimento individual, o levantamento aponta desigualdades estruturais e de pessoal. O percentual de 30% dos centros funciona em espaços compartilhados e 53% dos Ceavs atuam com profissionais que acumulam outras funções no tribunal.
O estudo revela ainda variações no grau de implementação, inclusive na composição de pessoal. Ainda que o serviço preveja assistência multidisciplinar, 20% dos Ceavs não conseguiram, até o momento, compor equipes completas e atuam com apenas uma pessoa na equipe técnica. As representações profissionais mais frequentes são na área de Psicologia (51%) e Assistência Social (50%). Em relação à dedicação, 53% dos Ceavs têm profissionais que acumulam funções com outras atividades do tribunal, ligadas geralmente à violência doméstica e à Justiça Restaurativa, enquanto apenas 23% possuem equipes técnicas exclusivas.
Características como tempo de criação, composição de equipe e estrutura física impactam diretamente os diferentes níveis de implementação dos Ceavs. O levantamento aponta que 51% dos centros enfrentam defasagem de servidores. A falta de integração com outros serviços da rede também aparece entre os principais desafios, visto que 40% dos centros relatam dificuldades de articulação com órgãos como a Defensoria Pública e os Centros de Referência de Assistência Social (Cras). Além disso, 41% dos Ceavs mencionam falhas na divulgação e comunicação institucional, o que afeta o reconhecimento do serviço pela magistratura e pelo público em geral.
O relatório final do diagnóstico deve ser divulgado até o fim de 2025, com entrevistas presenciais e virtuais realizadas em ao menos um Ceav em cada região do país. A iniciativa busca oferecer subsídios para o aprimoramento das políticas de acolhimento e para a consolidação de uma Justiça mais humana, acessível e sensível às necessidades das vítimas.
Justiça Plural
O programa Justiça Plural, iniciativa do CNJ em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), busca fortalecer as capacidades do Poder Judiciário na promoção dos direitos humanos e socioambientais e na ampliação do acesso à Justiça por populações estruturalmente vulnerabilizadas.
Texto: Lali Mareco
Edição: Sâmia Bechelane
Revisão: Caroline Zanetti
Agência CNJ de Notícias
