A falta de atividades destinadas à ressocialização é um dos maiores problemas das unidades de internação para adolescentes em conflito com lei no Mato Grosso. É o que mostra o relatório do Programa Justiça ao Jovem, criado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para avaliar a execução da medida socioeducativa de privação de liberdade aplicada a quem tem de 12 até quase 18 anos de idade. O documento, divulgado nesta semana, foi elaborado após visitas aos estabelecimentos mato-grossenses, realizadas de 8 a 13 de maio deste ano.
De acordo com o relatório “apesar de as unidades promoverem algumas atividades esportivas ou culturais, tais como futebol, basquete e voleibol, os adolescentes permanecem a maior parte do tempo recolhidos em seus alojamentos, inclusive para fazerem suas refeições”. O documento enfatiza que tal situação “compromete sobremaneira o atendimento socioeducativo, estigmatizando os adolescentes e desconsiderando-os como pessoas em desenvolvimento”.
A escassez de cursos de profissionalização foi outro ponto destacado pela equipe do CNJ. Segundo o relatório, os adolescentes têm acesso ao ensino fundamental e médio, mas a carga horária das aulas não ultrapassa duas horas diárias. “A ociosidade ainda é um aspecto marcante no sistema socioeducativo do Mato Grosso”, afirmou Daniel Issler, juiz auxiliar da presidência do Conselho e coordenador do Programa Justiça ao Jovem, juntamente com Reinaldo Cintra Torres de Carvalho, também juiz auxiliar da presidência.
Ideal – Conforme informou Issler, o ideal seria a realização de atividades pedagógicas, de lazer, culturais, esportivas e profissionalizantes o máximo de tempo possível. “Somente assim os adolescentes podem crescer com o sistema socioeducativo. A ociosidade é um estimulo à vivência infracional e coloca em risco a segurança da própria unidade de internação”, comentou o magistrado.
Outro problema verificado pela equipe do CNJ diz respeito à estrutura física das unidades, que são precárias, não apresentam condições adequadas de higiene e se assemelham a prisões. Constatou-se que até bem pouco tempo eram empregados agentes penitenciários para cuidar dos adolescentes internados. Os jovens, por sua vez, queixaram-se de agressões dos funcionários.
Mudanças – O juiz Daniel Issler explicou que o sistema socioeducativo do Mato Grosso passa por mudanças. Pouco tempo atrás estava vinculado à Secretaria Estadual de Segurança Pública, mas no final de 2010 passou a ficar sob a responsabilidade da Secretaria Estadual de Justiça e Direitos Humanos. Além disso, o governo estadual realizou concurso público para a contratação de servidores e deu início à construção de novas unidades de internação.
O aspecto processual também foi destacado no relatório. Muitos juízes do interior mato-grossense, ao encaminhar os jovens para cumprimento de medidas de internação nas comarcas onde funcionam as unidades, acabam por não delegar a competência ao magistrado local para acompanhar a execução da medida.
“O juiz que está mais próximo do adolescente nem sempre é o que decide sobre a execução da internação. Nestes casos, quem tem o poder de decisão é o juiz que está mais distante. No entanto, esse magistrado não tem as melhores condições para aferir a situação do adolescente. Entendemos que o mais adequado seja o juiz da comarca onde está a unidade ser o responsável pela execução”, explicou Issler.
Giselle Souza
Agência CNJ de Notícias