O Sistema de Justiça sob a ótica do Direito da Antidiscriminação esteve no centro dos debates da primeira aula do projeto Academia CNJ. Conduzido pela secretária-geral do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) Adriana Cruz, o encontro reuniu, na tarde da quinta-feira (16/11), diversas pessoas que trabalham no CNJ para refletir sobre temas que envolvem desigualdades sociais, raciais e econômicas e que podem impactar o bom desempenho da Justiça.
Adriana Cruz falou das diversas formas de discriminação e da herança histórica que envolve a desigualdade racial, suas peculiaridades e a forma como a Justiça poderia compreender melhor as realidades para produzir a solução de conflitos. Segundo a magistrada, o sistema de Justiça deve estar socialmente comprometido com o combate às desigualdades, procurando compreender como os litígios se estruturam.
“A gente acha que não precisa entender de questões raciais, de identidade de gênero, econômicas e sociais para exercer a Justiça, mas precisamos entender que todos os conflitos que batem à nossa mesa, seja no âmbito judicial ou administrativo, estão marcados por essas diferenças de profundas desigualdades raciais, de gênero, econômicas, entre outras”, acentua.
Para oferecer e ampliar a compreensão e sensibilidade dos(as) participantes, bem como dos(as) magistrados(as) e operadores(as) do sistema de justiça, a secretária se concentrou em trazer os conceitos que permeiam o Direito da Antidiscriminação, baseados nos trabalhos do autor Roger Ralph Rios. Segundo a juíza, esses conceitos partem do princípio de que o Brasil foi fundado e sedimentado sob os alicerces de uma estrutura escravocrata e, por isso, não é possível olhar para o Direito e para a solução de conflitos sem considerar esse passado histórico.
“A escravidão é o pecado original da sociedade brasileira e é o informador de todas as tecnologias das outras desigualdades”, frase de Roger Raupp Rios, trazido por Adriana Cruz para salientar a necessidade de trazer novo olhar para o Judiciário sob a ótica do Direito da Antidiscriminação.
A secretária-geral reforçou que há dificuldade de o corpo social entender suas diferenças, mas acrescentou existir ferramentas no direito, conceitos e chaves de leitura para auxiliar os(as) magistrados(as) a compreenderem como se consolidam esses conflitos sociais.
“Temos instrumentos e normativos importantes para produzir menos injustiça, mas é preciso pensar na proteção de direitos e enxergar as pessoas verdadeiramente como merecedoras de atenção, independentemente da condição econômica, cor da pele, orientação sexual, religião e capacidade física”, afirma.
Contudo, salienta Adriana Cruz, todos (homens, mulheres, brancos e negros) foram “cozidos num caldo de discriminação e racismo” e, segundo ela, o desafio da justiça é desfazer esse “tempero ruim”.
E, para desfazer essa “má receita”, o primeiro passo é reconhecer que, independentemente da compreensão individual, a tendência da sociedade é reproduzir desigualdades a menos que as pessoas permaneçam em constante vigilância pela garantia dos direitos de todos.
“O esforço que temos de imprimir para esse ‘Titanic desviar do iceberg’, é muito grande, o tempo de mudança de direção existe, mas precisamos gastar energia para que as coisas se encaminhem de uma maneira diferente e que as pessoas possam bater às nossas portas e possam realmente encontrar Justiça”, conclui.
Projeto Academia CNJ
O projeto prevê a realização de aulas ministradas por juízes(as) do CNJ com o intuito de compartilhar saberes e práticas, bem como suprir eventuais lacunas de competências relacionadas a atividades estratégicas do CNJ, em especial, aquelas desempenhadas pelos(as) juízes(as) auxiliares deste órgão.
Academia CNJ é uma ação de capacitação ofertada pela Seção de Educação Corporativa (SEDUC) cuja intenção é proporcionar espaço para o compartilhamento de saberes e interação dos(as) servidores(as), terceirizados(as) e estagiários(as) com juízes e juízas altamente qualificados e dispostos a promover a disseminação de conhecimento no CNJ.
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O próximo encontro abordará o tema Técnicas de Efetivação das Sentenças Coletivas para Ampliação do Acesso à Justiça, ministrado pela juíza auxiliar do CNJ Helena Refosco, em 14 de dezembro.
Texto: Juliene Andrade
Edição: Mirela Lopes
Comunicação Interna