Inoperância do Judiciário favorece a tortura no Cone Sul, atesta Declaração de Buenos Aires

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A prática recorrente da tortura na América do Sul tem, entre diversas causas, a inoperância do Poder Judiciário e do Ministério Público de cada país na investigação, punição e reparação às vítimas. O diagnóstico faz parte da Declaração de Buenos Aires, divulgada ao final da Primeira Jornada sobre Prevenção da Tortura no Cone Sul, realizada na capital argentina entre os dias 14 e 16 deste mês. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ), um dos signatários do documento, foi representado no evento pelo juiz auxiliar da Presidência Luciano Losekann, coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF).  

A jornada teve a participação de instituições que combatem a tortura na Argentina, na Bolívia, no Brasil, no Chile, no Paraguai, no Peru e no Uruguai, além de representantes do Alto Comissariado das Organizações das Nações Unidas para os Direitos Humanos (EACDH) e da Associação para a Prevenção da Tortura (APT), organização internacional que promoveu o evento. Na ocasião, os participantes traçaram um diagnóstico dos principais desafios para a prevenção da tortura, trocaram experiências e definiram estratégias para reforçar o combate a todas as formas de maus-tratos no continente.

A Declaração de Buenos Aires enumera causas e possíveis soluções contra a prática da tortura, que geralmente ocorre em locais de privação de liberdade, como presídios, unidades de internação de adolescentes em conflito com a lei e hospitais de custódia, entre outros. Além de críticas ao Judiciário e ao Ministério Público no Cone Sul, o documento aponta outros aspectos favoráveis a esse tipo de crime: impunidade administrativa dos agressores; legitimação social da mão forte do Estado e do encarceramento em massa; preconceito contra os setores mais fragilizados da sociedade; restrições ao trabalho de advogados, defensores públicos, médicos e outros profissionais; militarização das forças de segurança; crise nos sistemas carcerários; e deficiências na tipificação da tortura pelos respectivos legislativos.

Tipificação  O documento, que reitera ser responsabilidade do Estado proteger a integridade das pessoas privadas de liberdade, propõe, entre outras ações, a tipificação da tortura conforme os padrões internacionais. Além disso, a carta defende que o Judiciário e o Ministério Público atuem com mais celeridade na investigação das denúncias. Outra recomendação é pela criação de uma carreira profissional de caráter civil, no âmbito das forças de segurança, para atuar na defesa dos direitos humanos das pessoas privadas de liberdade.

Os países participantes da Jornada também assumiram o compromisso de criar e pôr em execução os respectivos mecanismos de prevenção da tortura, conforme estabelecido pelo Protocolo Facultativo da Convenção contra a Tortura e Outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes, das Nações Unidas. No Brasil, essa providência está prevista na Lei n. 12.847, sancionada no início deste mês pela presidenta Dilma Rousseff.

O mecanismo, segundo a lei, consiste na estruturação de diversos órgãos do Executivo e no desenvolvimento de ações integradas com diferentes poderes, como, por exemplo, inspeções, sem aviso prévio, em qualquer instituição de privação de liberdade. Quando forem constatadas agressões, serão elaborados relatórios com recomendações aos diretores dessas unidades, que terão prazo determinado para adotar as providências devidas.   

Jorge Vasconcellos
Agência CNJ de Notícia