Cármen Lúcia cobra cuidados com bebês que vivem em presídios

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A ministra Cármen Lúcia, presidente do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou aos tribunais do País que fossem registrados e vacinados imediatamente os bebês que vivem nas cadeias brasileiras.

A medida atingiu diretamente as crianças mantidas no cárcere do Instituto Penal Feminino Desembargadora Auri Moura Costa, em Aquiraz/CE, a 32 quilômetros de Fortaleza, onde a equipe do CNJ detectou 11 crianças sem registro civil e um bebê nascido em Sergipe, onde sua mãe cumpria pena no Presídio Feminino Nossa Senhora do Socorro, na cidade de mesmo nome, a oito quilômetros da capital, Aracaju. 

A real situação das presas gestantes e lactantes está sendo revisada pelo CNJ que, desde o dia 18 de janeiro, vistoriou 22 estabelecimentos penais, em 15 Estados e no Distrito Federal, verificando o tratamento dado aos bebês, às gestantes e às lactantes. A última inspeção ocorreu no dia 23 de fevereiro.

A equipe designada pela ministra Cármen Lúcia para visitar os presídios também identificou cinco crianças sem registro no Centro de Reeducação Feminino, no Pará. Na Penitenciária Feminina do Distrito Federal, as duas crianças que não possuíam registros tiveram seus documentos regularizados após visita do CNJ, ocorrida no último dia 19.

São Paulo é o Estado com maior número de crianças sem registros: são 14 pendentes de identificação. No Brasil, existiam 373 grávidas e 249 lactantes encarceradas em dezembro de 2017, segundo o Cadastro Nacional de Presas Grávidas e Lactantes, criado pelo CNJ. O Cadastro vai permitir que o Judiciário conheça e acompanhe, continuamente, a situação de mulheres nessas situações, submetidas ao sistema prisional brasileiro. 

Vacinas

A preocupação da ministra também se estendeu às crianças sem vacinas. No DF, durante a inspeção, foram identificadas quatro crianças sem a dose da chamada BCG (para prevenção da tuberculose). Após a visita da equipe do CNJ, segundo informações da Vara de Execuções Penais (VEP), a situação foi regularizada.

Em Ananindeua, no Pará, a vacinação de uma criança também está atrasada. Nos ofícios encaminhados pela ministra foi determinado que, no futuro, quando for encontrada situações dessa natureza, os problemas sejam imediatamente resolvidos. A dificuldade no acesso à saúde da mãe e da criança foi constatada em todos os presídios femininos visitados.

Nas mensagens aos tribunais, Cármen Lúcia determina que “situações futuras de falta de registro, bem como a vacinação das presas gestantes e dos filhos das lactantes custodiadas no sistema prisional, sejam observadas e resolvidas pelos juízes competentes durante a realização de inspeção de estabelecimentos prisionais femininos ou mistos”.

Visita

A equipe do CNJ contatou pessoalmente 311 das 622 mulheres nessas condições, dentro dos presídios. Encontrou mães e bebês em acomodações precárias e recebendo alimentação inadequada, além de unidades com crianças ainda sem o registro de nascimento.

Na maioria dos locais visitados, constatou-se não haver ginecologistas ou obstetras acessíveis para o atendimento pré-natal das grávidas, nem pediatras disponíveis para os recém nascidos que vivem nas cadeias brasileiras. Em algumas unidades foram encontradas, por exemplo, crianças com vacinação atrasada.

“O que faz a diferença entre uma e outra penitenciária é o empenho de quem está na direção do estabelecimento penal para cumprir a lei e utilizar adequadamente os recursos do fundo penitenciário, disponibilizados pelo Depen (Departamento Penitenciário Nacional) e pelas secretarias de Administração Penitenciária”, disse a juíza auxiliar da presidência do CNJ Andremara dos Santos, que coordenou as visitas aos presídios. 

Segundo a juíza, apesar de existir uma política pública de assistência à saúde no Sistema Prisional, que prevê a instalação de unidades básicas de saúde (UBS) nos complexos penais e espaços materno-infantis, nem todas as unidades dispõem dos recursos. “Em São Paulo, por exemplo, algumas unidades têm brinquedoteca, berços e carrinhos de bebês disponíveis para as lactantes cedidos pelo Depen.

Em outras unidades, como no Mato Grosso do Sul,  encontramos estes equipamentos encaixotados. Em outras, como no DF, nem isso. Os berços encontrados na unidade da capital foram doados pela VEP (Vara de Execução Penal)”, disse a juíza. 

A primeira visita do CNJ aos presídios com grávidas e lactantes ocorreu em janeiro, em Vespasiano/MG, com a presença da ministra Cármen Lúcia. A ministra tem dito, em várias oportunidades, que “presídio não é local apropriado para uma criança se desenvolver”. [Acesse aqui para ler matéria sobre essa visita. A última visita do CNJ às mães e lactantes em presídios ocorreu na Colônia Penal Feminina do Recife, em 23 de fevereiro.

Marmita podre

No Penitenciária Feminina do Distrito Federal (PFDF), apesar da política de inserção social ser um ponto positivo do presídio (dezenas de detentas trabalham e estudam, conseguindo remição da pena), a equipe do CNJ ouviu queixas das mulheres privadas de liberdade em relação ao descaso com os acompanhamentos médicos e com a qualidade da alimentação. 

O CNJ constatou baixa qualidade da comida e falta de fiscalização em relação à dietas oferecidas às lactantes, aos bebês e às grávidas. Sopa com muita gordura, alimento com muito sal, marmita estragada ou sem cozimento adequado foram os problemas mais lembrados. “O frango quase sempre chega cru. Ou você come, ou fica com fome. Não há substituição do alimento, nem quando está estragado”, relatou uma presa. 

Exceções

Foram identificadas também realidades positivas em meio ao caos penitenciário. Na Penitenciária de Cariacica/ES, o cuidado com a alimentação das presas surpreendeu a assessora da Presidência do CNJ Luisa Cruz, que participou das inspeções.

“Lá existem nutricionistas para adequar as dietas dos bebês, das grávidas ou das lactantes. Conferimos o cuidado com a alimentação, cada qual com sua dieta própria”, afirmou Luisa.  Ela também citou que no Presídio Feminino Santa Luzia de Maceió, capital de Alagoas, a unidade materno-infantil possui uma instalação básica de saúde devidamente equipada e em pleno funcionamento.

Para a juíza Andremara dos Santos, “existem estabelecimentos penais que priorizam e investem no acolhimento de mães e bebês, mas esses são minoria”.

Improvisação

“Encontramos muita improvisação. Desde o trabalho de aproximação com as famílias, até o momento da entrega dos filhos”, diz a juíza do CNJ, em relação à falta de padronização de procedimentos na aproximação das famílias com os bebês, que antecedem a entrega das crianças. 

Pela lei, as crianças têm direito à amamentação nos primeiros seis meses de vida. Após essa fase, são separadas de suas mães, que voltam ao cumprimento regular de suas penas. Os bebês podem ser encaminhados às famílias de origem ou a famílias substitutas. 
A maternidade das presas também passa por outro desafio: em geral, elas já são mães de outras crianças.

“Enquanto as mães pagam suas dívidas com a sociedade, os outros filhos ficam com vizinhos e avós ou são encaminhados para lares substitutos. Não raramente vão parar em abrigos. O processo é muito doloroso e, na maioria das vezes, não é acompanhado pela Justiça da Infância e Juventude nem pelo Conselho Tutelar”, constatou Andremara dos Santos.  

Os problemas encontrados nas prisões, com depoimentos das custodias, integram um relatório a ser apresentado à ministra Cármen Lúcia. “É preciso muita responsabilidade na gestão de um presídio. Presídio não é depósito de seres humanos”, observa a juíza Andremara dos Santos. 

Regina Bandeira

Agência CNJ de Notícias