Audiência de custódia em segundo grau confirma ações do Justiça Presente

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A indispensabilidade da realização de audiência de custódia com pessoas presas em flagrante nos termos estabelecidos pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), independentemente do grau de jurisdição, foi confirmada recentemente em decisão inédita do Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES). Na última semana, o desembargador Fernando Zardini Antonio analisou a prisão em flagrante de uma prefeita que estava custodiada em uma cidade a 140 quilômetros de Vitória.

A prefeita foi presa na Operação Rubi, deflagrada pelo Ministério Público Estadual, e os agentes penitenciários da Secretaria Estadual de Justiça a trouxeram até a capital para audiência onde o flagrante foi convertido em prisão preventiva. O desembargador determinou a realização da audiência de custódia no prazo de um dia, nos termos da Resolução CNJ n. 213/2015. O caso da prefeita foi analisado em segundo grau porque a lei estabelece foro especial por prerrogativa de função.

Além de relator da ação originária sobre o caso da prefeita, o desembargador Zardini é supervisor do Grupo de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário (GMF) do TJES. Os GMFs são regidos pela Resolução CNJ n. 96/2009 e n. 214/2015 e atuam para trabalhar políticas judiciárias voltadas ao sistema prisional em escala local. Para o coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas (DMF/CNJ) do CNJ, Luís Lanfredi, a decisão do TJES confirma que a política do CNJ sobre audiências de custódia atinge tanto o primeiro quanto o segundo grau de jurisdição.

“A efetividade das audiências de custódia deve ser compreendida como política pública, pois permite a utilização correta da prisão como instrumento excepcional de contenção da liberdade de ir e vir. Mais que um dever, realizá-la na conformidade da Resolução CNJ n. 213/2015 sinaliza a própria responsabilidade que toca ao Judiciário na qualificação da porta de entrada e obrigação de zelar pela racionalização da utilização dos espaços prisionais”, avalia.

Ações previstas

A consolidação e qualificação das audiências de custódias em todo o país é uma das atividades desenvolvidas no programa Justiça Presente, parceria entre o CNJ e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) para superar o quadro de crise do sistema prisional brasileiro. As atividades relativas a audiências de custódia contam com a parceria do Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) para implementação das atividades em escala nacional.

De forma inédita, o programa irá alocar 27 assessores especializados a cada unidade da federação para dar apoio técnico aos profissionais que atuam na temática penal com base em diretrizes e boas práticas internacionais. Os assessores irão facilitar o acesso dos custodiados à rede local de políticas públicas de proteção social (saúde, educação, trabalho e emprego etc.), assim como auxiliar no desenvolvimento de ações relativas às políticas de alternativas penais e monitoração eletrônica.

Serão lançadas publicações técnicas para o fortalecimento da adoção de medidas alternativas à prisão, quando cabível, e a identificação e apuração de casos de tortura e maus tratos. Também haverá articulação e formação continuada de instituições e atores envolvidos nas audiências de custódia, o que inclui a criação de uma rede de magistrados para troca de experiências e um módulo dedicado ao tema a ser desenvolvido em conjunto com as Escolas de Magistratura.

Contexto

As audiências de custódia foram instituídas como política nacional pelo CNJ em 2015 (Resolução n. 213/2015) e consistem na apresentação do preso em flagrante a um juiz no prazo de 24 horas. Após a audiência, o magistrado decide se o custodiado deve responder ao processo preso ou em liberdade, podendo ainda decidir pela anulação da prisão em caso de ilegalidade. Por colocar o magistrado em contato com o custodiado no momento da prisão, essas audiências facilitam a comprovação de casos de tortura e maus-tratos, geralmente pouco notificados.

Apesar da redução na conversão de flagrantes em prisões preventivas, que chegavam a 90% em algumas unidades da Federação antes da implantação das audiências de custódia no Brasil, a detenção provisória ainda é adotada na maioria dos casos – incluindo aqueles que não resultariam em prisão após a sentença, cerca de 18%. Os dados mais recentes do CNJ sobre o tema indicam que, das 258 mil audiências de custódia realizadas até julho de 2017, 44% resultaram em liberdade provisória e 55% em prisão preventiva. Além disso, as audiências de custódia ficaram concentradas nas capitais e cada estado adotou mecanismos próprios para sistematizar a prática.

A proposta do programa Justiça Presente é fortalecer o modelo difundido pelo CNJ e sensibilizar atores do sistema de justiça e de segurança pública, como juízes, promotores, defensores públicos e policiais para substituírem a prisão por outras ações mais adequadas sempre que possível, como medidas cautelares e monitoração eletrônica. Além de reduzir a superlotação, a medida busca evitar a exposição de pessoas não violentas que sequer foram condenadas com presos condenados por crimes mais graves, incluindo integrantes de facções criminosas.

O programa ainda adotará ações para enfrentar o encarceramento excessivo de mulheres (que cresceu de forma vertiginosa nas últimas décadas), de acusados de tráfico de drogas e de negros. A intenção é combater a seletividade do sistema penal observada em audiências de custódia e medidas alternativas.

Justiça Presente

Iniciativa da gestão do ministro Dias Toffoli, o Justiça Presente é uma parceria inédita entre CNJ e agências da Organização das Nações Unidas (ONU) e coloca o Judiciário como protagonista para enfrentar o estado de crise do sistema penal. O programa resultou de acordo de cooperação técnica firmado em novembro do ano passado com recursos repassados pelo Ministério da Justiça e da Segurança Pública.

Entre as principais apostas do programa, estão a atuação simultânea em todos os gargalos da execução penal, a customização das atividades de acordo com as necessidades e capacidades de cada unidade da Federação, bem como o fortalecimento dos atores locais para garantir a eficácia e a sustentabilidade das iniciativas.

Agência CNJ de Notícias