Atuação conjunta culmina em política judiciária por direitos na primeira infância

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Seminário de Lançamento da Política Nacional pela Primeira Infância. Foto: G.Dettmar/CNJ
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As relações interinstitucionais e com a sociedade civil possibilitaram a ampliação do diálogo sobre as necessidades e direitos das crianças de zero a seis anos de idade e motivaram o desenvolvimento da Política Judiciária Nacional para a Primeira Infância lançada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) nessa quarta-feira (31/8). O trabalho conjunto foi um dos frutos do Pacto Nacional pela Primeira Infância, coordenado pelo CNJ e que já conta com mais de 310 signatários em todo o país.

Segundo o presidente do Fórum Nacional da Infância e Juventude (Foninj), conselheiro Richard Pae Kim, a partir do engajamento no Pacto Nacional – que completou três anos desde seu lançamento -, a política foi desenvolvida a partir das reflexões desenvolvidas junto a representantes do sistema de Justiça e do sistema de garantias de direitos. “Enfrentamos um grande retrocesso nas medidas relativas à primeira infância durante os anos mais agudos da pandemia. A situação está afetando os negócios, apertou a vida, aumentou a pobreza, os alunos deixaram de frequentar a escola, o que resultou em um decréscimo do crescimento intelectual e de vida de nossas crianças e adolescentes.”

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O conselheiro também enfatizou a necessidade de que cada signatário do Pacto, dentro de sua competência e atribuição, invista mais esforços na garantia dos direitos das crianças e adolescentes. “O Poder Judiciário entendeu que não queria entregar só um relatório, mas dar um passo a mais e, por isso, estamos entregando essa política nacional que propõe o enfrentamento de forma estrutural dentro do Poder Judiciário, com planejamento e ações que atendam à primeira infância.”

Aprovada por unanimidade pelo Plenário do CNJ durante sua 355ª Sessão Ordinária, realizada na terça-feira (30/8), a Resolução CNJ n. 470/2022 traz os princípios, diretrizes e objetivos da nova política, incluindo regras de atendimento inicial à criança na primeira infância e suas famílias. A ideia é que ainda seja elaborado um plano de execução com as ações de curto, médio e longo prazos, além de atuar junto ao Executivo e ao Legislativo para também produzirem um plano nacional para a primeira infância de forma articulada para ações futuras. “Demos o primeiro passo sobre o aspecto interno do Poder Judiciário. Estamos dispostos a contribuir para que os demais Poderes, junto com a sociedade, possam elaborar todas essas futuras ações”, acrescentou Pae Kim.

A nova política judiciária é fruto do projeto Justiça Começa na Infância, executado em parceria com centenas de instituições por meio do Pacto Nacional pela Primeira Infância e que fortaleceu a atuação da Justiça na promoção de direitos para o desenvolvimento humano integral. “O CNJ avançou em reflexões importantes sobre o seu próprio papel, enquanto órgão central de gestão e planejamento estratégico do Poder Judiciário, e, para tanto, tornou-se indispensável dar um passo estruturante para efetivamente conferir prioridade à garantia dos direitos desde a primeira infância, e com isso concretizar o que está previsto na Constituição Federal, no Estatuto da Criança e do Adolescente e no Marco Legal da Primeira Infância, entre outras leis”, explicou a juíza auxiliar da Presidência do CNJ Trícia Navarro.

Segundo ela, foi observado que as crianças também são direta e indiretamente afetadas pelos processos que transcorrem nas varas de família, nas varas criminais que combatem a violência contra mulher, e nas ações da Justiça restaurativa. Na Justiça do Trabalho, por exemplo, deve ser combatida a violação representada pelo trabalho infantil, além de garantir a proteção à gestação no ambiente de trabalho e do direito à licença a maternidade e paternidade para atenção primordial aos filhos recém-nascidos.

Já na Justiça Federal, devem ser observadas as ações de direito a benefícios e o enfrentamento do tráfico de crianças, entre outras questões. “Trata-se de um avanço inédito. Temos pavimentado o caminho para integração dos vários segmentos de Justiça, sem nos esquecermos da importância da atuação das corregedorias, especialmente nas ações de registro de nascimento, com vistas a cumprir o direito ao atendimento integral na primeira infância. É um grande desafio, mas é a nossa responsabilidade e a maior oportunidade de construir um futuro digno e sustentável, a partir do respeito às crianças”, disse a juíza.

Política

A Resolução n. 470/2022 prevê a ampliação do acesso à justiça por crianças na primeira infância, a adoção de métodos adequados de solução de conflitos, com foco na abordagem restaurativa e na resolução consensual. Também trata da promoção de ações preventivas e coletivas por meio da criação de programas de capacitação continuada dos atores do Poder Judiciário e cooperação para a capacitação da rede de serviços.

A cooperação também está prevista entre órgãos e entidades públicas e privadas para melhoria do atendimento especializado da inclusão da temática da primeira infância em concursos públicos, em programas de formação profissional, monitoramento do acervo processual de demandas judiciais relacionadas à primeira infância e o investimento em soluções tecnológicas para aprimoramento permanente da execução da política.

O texto ainda trata da especificação de medidas para garantir o direito à filiação, à convivência familiar e comunitária, à educação infantil, à saúde, assistência social às famílias, à habitação, ao lazer e ao brincar. “A medida exige também a definição de fluxos e protocolos de atendimento, a adequação dos espaços do Poder Judiciário para a participação das crianças nas ações que lhe dizem respeito e a capacitação específica para escuta das crianças da primeira infância, entre outros”, explicou Trícia Navarro.

Para efeito de produtividade, a norma traz ainda a exigência de que sejam informados, em todas as ações judiciais que envolvam crianças e adolescentes, dados como nome, CPF e data de nascimento. “Essa medida tira as crianças da invisibilidade nos processos judiciais. Estamos animados com a perspectiva de avançarmos na aproximação entre Justiça, ciência e governança colaborativa”, disse a juíza.

Relacionamentos

A programação do seminário de lançamento da Política Nacional da Primeira Infância incluiu a apresentação de dois painéis estatísticos com dados sobre a primeira infância e o relatório de atuação do Pacto Nacional pela Primeira Infância e palestra com a pediatra do Centro de Desenvolvimento Infantil da Universidade de Harvard, Mary Young. Trícia Navarro também destacou a evolução das ações brasileiras em relação à Primeira Infância a partir da construção dos relacionamentos e diálogos interinstitucionais e com a sociedade.

Ela afirmou que o Pacto Nacional alinha e converge as ações relacionadas a esse público de zero a seis anos de idade. “Na verdade, vocês estão alimentando políticas, programas e convergindo para uma abordagem completa que faz parceria com as comunidades, com as práticas existentes e os relacionamentos que precisamos nas políticas públicas. Afinal, a Justiça começa na infância.”

O fortalecimento da rede pela primeira infância também foi citado como destaque pelos participantes da abertura do evento. Cada instituição apontou ações específicas que estão sendo desenvolvidas em prol da primeira infância, como o painel desenvolvido pelo Tribunal de Contas de Goiás (TCE-GO), que traz os dados nacionais, estaduais e municipais com indicadores previstos no Pacto Nacional, como mortalidade infantil, consultas pré-natal, partos cesáreos e imunizações, entre outros.

O baixo índice de vacinação infantil foi destacado por vários participantes, incluindo a representante do Unicef no Brasil, chamando a atenção para a necessidade de ampliação das imunizações, inclusive para doenças que já estavam erradicadas no país, mas que correm o risco de voltarem, como a poliomielite.

Também foram destaques as ações de apoio às mães e à parentalidade, com ênfase na necessidade de fortalecimento das famílias, para o bom desenvolvimento das crianças na primeira fase da vida, além da apresentação do movimento Agenda 227, que faz referência ao artigo da Constituição que prevê a priorização do cuidado integral à criança, com propostas estruturadas para serem apresentadas aos candidatos à Presidência, governos estaduais e municipais.

Participaram da abertura, o subprocurador-geral da República Alcides Martins; Daniel de Macedo Alves Pereira, defensor público-geral da União; Florisvaldo Fiorentino Junior, defensor público-geral de São Paulo e presidente do Conselho Nacional das Defensoras e Defensores Públicos-Gerais; Leonardo Milhomem, diretor do Departamento de Atenção à Primeira Infância da Secretaria Nacional de Atenção à Primeira Infância do Ministério da Cidadania; Edson José Ferrari, presidente do TCE-GO e representante da Atricon; Diego Bezerra Alves, presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente; Miriam Pragita, diretora-executiva da Agência de Notícias dos Direitos da Infância; Maria Aparecida Freire de Oliveira Couto, representante da Rede Nacional da Primeira Infância; e Rosana Vega, chefe da área de direitos e proteção à criança e ao adolescente do Unucef Brasil.

Foninj

Antes do seminário, integrantes do Foninj estiveram reunidos para análise de vários temas relacionados a crianças e adolescentes. O encontro realizado em formato híbrido pela plataforma Cisco Webex foi conduzido pelo coordenador do Foninj, conselheiro Richard Pae Kim, e com a presença da maioria dos membros do fórum.

Durante os trabalhos foram analisados oito itens, dentre os quais o roteiro para inspeção anual nos serviços de acolhimento para crianças e adolescentes, o fluxo nacional para o Programa de Proteção a Crianças e Adolescentes Ameaçados de Morte (PPCAM) no âmbito do Judiciário e uma proposta de recomendação conjunta entre CNJ e o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), Ministério da Cidadania e Ministério da Mulher, Família e dos Direitos Humanos para promover a atuação integrada, expansão e qualificação do serviço de acolhimento em família acolhedora.

Na abertura da reunião, foi comunicado aos membros do Foninj que o desembargador Reinaldo Cintra, presente à reunião, passará a presidir a Associação Brasileira de Magistrados da Infância e Juventude (Abraminj). Entre os participantes do encontro do Fórum estavam as juízas Noeli Reback, Cláudia Catafesta e Samyra Remzetti Bernardi, as juízas auxiliares da presidência do CNJ Trícia Navarro e Lívia Peres, e os juízes Hugo Zaher, Eduardo Rezende Melo, Bruno Rodrigues e Afrânio Nardy.

Texto: Lenir Camimura e Luciana Otoni
Edição: Sarah Barros
Agência CNJ de Notícias

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31 08 2022 Seminário de Lançamento da Política Nacional pela Primeira Infânci

Macrodesafio - Garantia dos direitos fundamentais