Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0007279-66.2020.2.00.0000
Requerente: LEANDRO DUARTE VASQUES e outros
Requerido: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ

 


RECURSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. SUSTENTAÇÃO ORAL. DISCIPLINA. COMPETÊNCIA DOS TRIBUNAIS. ALTERAÇÃO DA ORDEM LEGAL. CNJ. AUSÊNCIA DE ATRIBUIÇÃO. DISCIPLINA. CPP E CPC. INTERPRETAÇÃO CONFORME. COMPETÊNCIA DO STF. RECURSO IMPROVIDO.

1. Recurso contra decisão que, em face da manifesta incompetência deste Conselho, não conheceu de pedido para disciplinar a ordem de sustentação oral nos Tribunais.

2. O pedido formulado nos autos não pode ser conhecido por não ser da alçada desta Corte Administrativa interferir em questões relacionadas à normatização da sustentação oral pelos Tribunais e, principalmente, pelo fato de que eventual inconstitucionalidade de dispositivos da lei processual civil e penal deve ser apreciada pela via judicial própria.

3. Os Tribunais têm autonomia para disciplinar questões referentes à sustentação oral em seus julgamentos e não é atribuição do Conselho Nacional de Justiça controlar atos desta natureza, salvo no caso de flagrante ilegalidade.

4. A ordem das manifestações das sustentações orais está expressamente disciplinada pelo Código de Processo Civil (art. 937, caput) e pelo Código de Processo Penal (art. 618, parágrafo único). Eventual ingerência por parte deste Conselho ou dos Tribunais na matéria somente seria legítima para colmatar lacunas ou adequar a norma às peculiaridades locais, o que não é a hipótese dos autos.

5. Falece de competência para o CNJ, ainda que com esteio na necessidade de observância de direitos e garantias fundamentais, estabelecer uma interpretação conforme à Constituição de dispositivos da lei processual quando inexiste manifestação do Supremo Tribunal Federal em sentido análogo.

 

6. Recurso improvido.

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto da Conselheira Candice L. Galvão Jobim (então Relatora). Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Plenário Virtual, 11 de fevereiro de 2022. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luiz Fux, Maria Thereza de Assis Moura, Emmanoel Pereira (então Conselheiro), Luiz Fernando Tomasi Keppen (então Conselheiro), Rubens Canuto (então Conselheiro), Tânia Regina Silva Reckziegel, Mário Guerreiro (então Conselheiro), Candice L. Galvão Jobim (então Relatora), Flávia Pessoa, Sidney Madruga, Ivana Farina Navarrete Pena (então Conselheira), André Godinho (então Conselheiro), Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Não votou, em razão da vacância do cargo, o Conselheiro representante do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil.

RELATÓRIO 

 

A SENHORA CONSELHEIRA CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA): Trata-se de recurso administrativo interposto por Leandro Duarte Vasques e Outros contra decisão que não conheceu do pedido de regulamentação da ordem da sustentação oral nos Tribunais.

Monocraticamente, foi consignado que a regulamentação da sustentação oral e julgamentos judiciais e administrativos é uma prerrogativa dos Tribunais. Além disso, foi pontuado que a ordem da palavra é estabelecida pelo caput do art. 937 do Código de Processo Civil e pelo parágrafo único do art. 610 do Código de Processo Penal e eventual inconstitucionalidade destes dispositivos por virtual prejuízo à ampla defesa deve ser examinada pela via jurisdicional própria.

No recurso, os requerentes afirmaram ser possível o questionamento da validade de normas que contrariam princípios constitucionais. Repisaram argumentos da inicial ao sustentar que a defesa deve ser a última a ser ouvida em sustentações orais, numa interpretação conforme do Código de Processo Civil e do Código de Processo Penal.

É o relatório.

 

Conforme certidão de julgamento expedida em 19/08/2021 (Id. 4448029), in verbis: 

 

Após o voto da Relatora, negando provimento ao recurso, no que foi acompanhada pelos Conselheiros Luiz Fux, Maria Thereza de Assis Moura, Emmanoel Pereira, Luiz Fernando Tomasi Keppen, Rubens Canuto, Tânia Regina Silva Reckziegel, Mário Guerreiro, Flávia Pessoa, Sidney Madruga, Ivana Farina Navarrete Pena, André Godinho e Luiz Fernando Bandeira de Mello, o processo foi retirado da pauta da 90ª Sessão Virtual, a pedido do Conselheiro Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, nos termos do art. 118-A, § 5º, II do RICNJ. Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Plenário Virtual, 13 de agosto de 2021. (grifou-se). 

 

Em razão do término do mandado do então Conselheiro Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, o feito foi redistribuído à relatoria do Conselheiro Sidney Madruga e, por determinação da Presidência do CNJ, retornou à Pauta da 99ª Sessão Virtual, mantendo-se, na integra, o voto proferido pela Conselheira Candice Lavocat Galvão Jobim, então, relatora do procedimento. 

 

VOTO 

 

A SENHORA CONSELHEIRA CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA): Trata-se de recurso administrativo contra a decisão que não conheceu do pedido, nos seguintes termos (Id4187806): 

Trata-se de Pedido de Providências (PP) em que Leandro Duarte Vasques e Outros requerem ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) que seja regulamentada a ordem da sustentação oral nos Tribunais.  

Aduziram que diversos Tribunais permitem a sustentação oral do Ministério Público após a manifestação da defesa quando o recurso é interposto exclusivamente pelo réu. Alegaram que a prática viola o contraditório e a ampla defesa pelo fato de a última palavra ser da acusação.  

Sustentaram que a defesa não pode ser surpreendida com argumentos posteriores e que a posição do recurso não pode ditar a ordem das sustentações orais. Assinalaram que a pretensão tem arrimo nas disposições constitucionais e em entendimento do Supremo Tribunal Federal.  

Ao final, requereram a este Conselho a regulamentação do procedimento para sustentação oral nos Tribunais de modo a impedir que o representante do Ministério Público seja o último a se manifestar, ainda que o recurso seja exclusivo da defesa.  

Em razão da certidão da Secretaria Processual (Id4112431) que noticiou a existência de procedimento com objeto análogo previamente distribuído ao Ilustre Conselheiro André Godinho, o feito lhe foi encaminhado para consulta de prevenção, circunstância que não foi reconhecida (4119496).  

É o relatório. Decido.

A questão suscitada neste procedimento reside no pedido de regulamentação da ordem de sustentação oral nos Tribunais. O requerente defendeu a tese de que, em qualquer situação, a defesa deve ser a última a se manifestar. A pretensão do requerente não merece ser conhecida.

Conquanto o art. 103-B, §3º, inciso I, da Constituição Federal autorize o Conselho Nacional de Justiça a expedir atos regulamentares, esta prerrogativa deve ser exercida com observância à autonomia dos Tribunais. No que tange à regulamentação da sustentação oral nos julgamentos judiciais e administrativos, importa destacar que esta matéria está diretamente relacionada à ordem dos trabalhos nos Tribunais. Diante disso, a regulamentação dos procedimentos configura expressão da autonomia garantida aos Tribunais pelo art. 96, inciso I, alínea “a”, da Constituição Federal. Nesse sentido, são os precedentes deste Conselho:

RECURSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 13ª REGIÃO. REGIMENTO INTERNO. PROIBIÇÃO DE SUSTENTAÇÃO ORAL NOS RECURSOS DE AGRAVO DE INSTRUMENTO E DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. COMPATIBILIDADE DA VEDAÇÃO COM AS NORMAS APLICÁVEIS AO PROCESSO DO TRABALHO. SUPRESSÃO DE PRERROGATIVA OU DE DIREITO DE ADVOGADOS NÃO CONFIGURADA. AMPLIAÇÃO DAS HIPÓTESES DE CABIMENTO DE SUSTENTAÇÃO ORAL. POSSIBILIDADE INSERIDA NA AUTONOMIA DOS TRIBUNAIS. INCOMPATIBILIDADE COM AS ATRIBUIÇÕES DE CONTROLE ADMINISTRATIVO DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ). RECURSO NÃO PROVIDO. 1. A inclusão, em regimento interno de Tribunal Regional do Trabalho, de norma proibitiva da sustentação oral no julgamento dos recursos de Embargos de Declaração e de Agravo de Instrumento não implica supressão de prerrogativa ou de direito assegurados aos membros da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), por não haver previsão para sua realização nas normas aplicáveis ao processo do trabalho. 2. O Código de Processo Civil (CPC), aplicado subsidiariamente ao processo do trabalho, nos casos omissos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT, artigo 769), ao estabelecer as hipóteses de cabimento da sustentação oral, não incluiu entre elas os Embargos de Declaração; quanto ao Agravo de Instrumento, apenas a admitiu quando este for interposto em face de decisões interlocutórias que versem sobre tutelas provisórias de urgência ou de evidência (CPC, artigo 937, inciso VIII). 3. No Direito Processual do Trabalho, como desdobramento da adoção do princípio da irrecorribilidade imediata das decisões interlocutórias (CLT, artigo 893, § 1º), o recurso de Agravo de Instrumento é cabível apenas contra despachos denegatórios de interposição de recursos (CLT, artigo 769), o que impossibilita a ocorrência da hipótese prevista no artigo 937, VIII, do CPC no processo do trabalho. 4. A ampliação das hipóteses legais de cabimento da sustentação oral em recursos, prevista no artigo 937, IX, do CPC, está inserida na esfera de autonomia dos tribunais, conferida pelo artigo 96, inciso I, “a”, da Constituição Federal, o que afasta a possibilidade de controle administrativo por parte do Conselho Nacional de Justiça. 5. Recurso não provido. (CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências - Conselheiro - 0008534-64.2017.2.00.0000 - Rel. DALDICE SANTANA - 50ª Sessão Extraordinária - julgado em 11/09/2018)

RECURSO ADMINISTRATIVO EM PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. LIMITAÇÃO DO NÚMERO DE PROCESSOS COM SUSTENTAÇÃO ORAL APREGOADOS POR SESSÃO DE JULGAMENTO DE TURMA CRIMINAL. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. PRESERVAÇÃO DAS PRERROGATIVAS DOS ADVOGADOS. AUTONOMIA ADMINISTRATIVA DO TRIBUNAL. MANUTENÇÃO DA DECISÃO MONOCRÁTICA PROFERIDA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Pretensão de declaração de nulidade de ato que limitou o número de processos com sustentação oral apregoados por sessão de julgamento de Turma Criminal, em suposta violação às prerrogativas dos advogados. 2. A limitação da quantidade de processos com sustentação oral apregoados por sessão de julgamento não viola as prerrogativas profissionais dos advogados, tendo em vista a possibilidade de sua realização em sessão de julgamento futura. 3. Nos termos da Constituição Federal, os Tribunais possuem autonomia administrativa para dispor sobre o funcionamento de seus órgãos jurisdicionais. 4. Não tendo os recorrentes apresentado fundamentos que pudessem justificar a alteração da decisão monocrática proferida, mantém-se a decisão recorrida. 5. Recurso conhecido e não provido. (CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências - Conselheiro - 0003600-63.2017.2.00.0000 - Rel. Henrique de Almeida Ávila - 273ª Sessão Ordinária - julgado em 05/06/2018)

Nesse contexto, não cabe ao Conselho Nacional de Justiça estabelecer normas para disciplinar a sustentação oral tal como requerido na inicial, uma vez que a intervenção nesta matéria terminaria por subtrair dos Tribunais uma prerrogativa constitucionalmente garantida.

Não bastasse a regulamentação da questão suscitada nos autos ser de competência dos Tribunais, a intervenção deste Conselho requerida nos autos também encontra óbice no fato de a ordem das sustentações orais nos julgamentos ser matéria disciplinada tanto pelo Código de Processo Civil, quanto pelo Código de Processo Penal.

Com efeito, o caput do art. 937 do Código Civil evidencia que, em primeiro lugar, o recorrente deve realizar a sustentação. Após, deve ser concedida a palavra ao recorrido e, quando for o caso, ao membro do Ministério Público. Confira-se:

Art. 937. Na sessão de julgamento, depois da exposição da causa pelo relator, o presidente dará a palavra, sucessivamente, ao recorrente, ao recorrido e, nos casos de sua intervenção, ao membro do Ministério Público, pelo prazo improrrogável de 15 (quinze) minutos para cada um, a fim de sustentarem suas razões, nas seguintes hipóteses, nos termos da parte final do caput do art. 1.021:

No processo penal as regras para sustentação oral constam no art. 610 do Código de Processo Penal. Vale destacar que o art. 618 do citado diploma estabelece que cabe aos Tribunais disciplinar normas complementares relacionadas ao tema. Vejamos:

Art. 610. Nos recursos em sentido estrito, com exceção do de habeas corpus, e nas apelações interpostas das sentenças em processo de contravenção ou de crime a que a lei comine pena de detenção, os autos irão imediatamente com vista ao procurador-geral pelo prazo de cinco dias, e, em seguida, passarão, por igual prazo, ao relator, que pedirá designação de dia para o julgamento.

Parágrafo único. Anunciado o julgamento pelo presidente, e apregoadas as partes, com a presença destas ou à sua revelia, o relator fará a exposição do feito e, em seguida, o presidente concederá, pelo prazo de 10 (dez) minutos, a palavra aos advogados ou às partes que a solicitarem e ao procurador geral, quando o requerer, por igual prazo.

[...]

Art. 618. Os regimentos dos Tribunais de Apelação estabelecerão as normas complementares para o processo e julgamento dos recursos e apelações.

Desse modo, não cabe ao Conselho Nacional de Justiça no estrito exercício da atividade administrativa regulamentar questão disciplinada em lei e tampouco inovar no mundo jurídico e normatizar a questão de modo não previsto na legislação.

 Com efeito, a norma regulamentar não pode contemplar situações que não estejam previamente disciplinadas pela lei regulamentada.

Ademais, as obrigações constantes em normas regulamentares são meramente acessórias, pois seu fundamento de validade é a lei regulamentada. Eventualmente, podem colmatar lacunas, desde que o vácuo normativo esteja relacionado a procedimentos para fiel cumprimento do comando normativo primário.

Vale destacar que o requerente argumentou que a alteração da ordem das sustentações orais nos julgamentos seria necessária para assegurar à defesa a efetividade das garantias constitucionais. Em razão disso, sustentou que os dispositivos legais em vigor reclamam interpretação em conformidade com os princípios do contraditório e da ampla defesa.

Nesse cenário, a incursão do Conselho Nacional de Justiça na forma pretendida pelo requerente demandaria análise da legislação processual civil e penal à luz da Constituição Federal. Esta tarefa, ao fim e ao cabo, constitui verdadeiro controle de constitucionalidade, medida estranha às atribuições deste Conselho.

Ante o exposto, com fundamento no art. 25, inciso X, do RICNJ, não conheço do pedido formulado na inicial e determino o arquivamento do feito.

Intime-se. Em seguida, arquivem-se os autos independentemente de nova conclusão. (grifos originais)

Não diviso no recurso administrativo interposto pelos requerentes a presença de fundamentos capazes de infirmar a decisão monocrática que não conheceu do pedido.

As razões recursais não apresentaram fatos ou argumentos diversos daqueles lançados na inicial e, por isso, não há motivos para reforma da decisão Id4187806.

Os requerentes pediram a intervenção deste Conselho para regulamentar a ordem de sustentação oral nos Tribunais ou determinar que a defesa seja a última a se manifestar por entenderem ser esta a conduta alinhada aos preceitos constitucionais.

Em linhas gerais, os requerentes defendem a tese de que a ordem das sustentações orais previstas no Código de Processo Civil e no Código de Processo Penal está em desacordo com os direitos e garantais fundamentais por permitir que o Ministério Público seja o último a se manifestar, a depender do titular do recurso. Em razão disso, caberia ao Conselho Nacional de Justiça disciplinar a matéria.

Reafirmo a compreensão de que o pedido formulado nos autos não pode ser conhecido por não ser da alçada desta Corte Administrativa interferir em questões relacionadas à normatização da sustentação oral pelos Tribunais e, principalmente, pelo fato de que eventual inconstitucionalidade de dispositivos da lei processual civil e penal deve ser apreciada pela via judicial própria.

O pedido formulado pelos requerentes não é fundado na frontal desconformidade das normas relativas à sustentação oral de um Tribunal com a lei ou dispositivo constitucional. Na realidade, foi suscitada nos autos a necessidade de este Conselho, com base em princípios da Constituição Federal, estabelecer como norma geral para todo o Poder Judiciário (com exceção do Supremo Tribunal Federal) que a defesa tenha a última palavra nas sustentações orais.

Conforme os precedentes destacados na decisão Id4187806, os Tribunais têm autonomia para disciplinar questões relacionadas à sustentação oral em seus julgamentos e não é atribuição do Conselho Nacional de Justiça controlar atos desta natureza, salvo no caso de flagrante ilegalidade.

Ademais, a ordem das manifestações das sustentações orais está expressamente disciplinada pelo Código de Processo Civil (art. 937, caput) e pelo Código de Processo Penal (art. 618, parágrafo único). Eventual ingerência por parte deste Conselho ou dos Tribunais na matéria somente seria legítima para colmatar lacunas ou adequar a norma às peculiaridades locais, o que não é a hipótese dos autos.

Com efeito, os requerentes buscam por meio do Pedido de Providências extrair do Conselho Nacional de Justiça uma interpretação conforme à Constituição Federal para as normas relacionadas à sustentação oral. Ao fim e ao cabo, o que se tenciona neste procedimento é o controle de constitucionalidade de dispositivos da lei processual, entretanto, esta medida é estranha às competências do Conselho Nacional de Justiça.

O artigo 103-B, § 4º, incisos I a VII da Constituição Federal delimitou o campo de atuação deste Conselho e lhe conferiu a missão de controlar a atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário, bem como o cumprimento dos deveres funcionais dos seus juízes. Não há, portanto, espaço para esta Corte Administrativa alijar do mundo jurídico leis aprovadas pelo legislativo federal ou estadual cuja inconstitucionalidade não foi declarada pelo órgão judicial competente.

Outrossim, é preciso considerar que o controle de constitucionalidade de norma estadual in abstrato em face da Constituição Federal é de competência do Supremo Tribunal Federal e somente pode ser requerido pelos legitimados elencados no artigo 103, incisos I a IX, da Carta Magna.

Desse modo, não entrevejo fundamento para o Conselho Nacional de Justiça examinar artigos do Código de Processo Civil e do Código de Processo penal e realizar um verdadeiro controle de concentrado de constitucionalidade. Esta medida é veementemente refutada pelo Supremo Tribunal Federal e por este Conselho, confira-se:

Mandado de segurança. Ato do Conselho Nacional de Justiça. Rol de atribuições do art. 103, § 4º, da CF. Impossibilidade de o CNJ realizar controle de constitucionalidade de ato normativo ou de lei, a menos que se trate de matéria já pacificada na Suprema Corte. Determinação de apresentação de documentos em procedimento já encerrado. Abuso de poder. Segurança concedida. 1. O Conselho Nacional de Justiça, com base no princípio da isonomia entre os magistrados, entendeu inconstitucionais as Resoluções nº 257/2005 e 296/2007, editadas pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, com vistas a regulamentar a reclassificação de entrâncias promovida pelas Leis Complementares Estaduais nº 980/2005 e 991/2006. 2. Não compete ao Conselho Nacional de Justiça, mesmo em pretenso controle de legalidade dos atos do Poder Judiciário, emitir juízo acerca da constitucionalidade de norma em face de dispositivo ou princípio constitucional. Exorbitância do rol de atribuições do art. 103, § 4º, da CF. Precedentes. Exceção apenas admitida quando se trate de matéria já pacificada no STF, o que não ocorre no caso. 3. Determinação de apresentação de documentos após encerrado o procedimento administrativo de controle. Impossibilidade de se vislumbrar de que modo tal providência poderia alterar o resultado do aludido PCA, visto que já encerrado. Abuso de poder configurado. 4. Segurança concedida. (MS 29077, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, julgado em 07/08/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-184 DIVULG 23-07-2020 PUBLIC 24-07-2020)

RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. RESOLUÇÃO STJ Nº 03/2016. DECLARAÇÃO DE ILEGALIDADE/ INCONSTITUCIONALIDADE. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. I. A Resolução STJ nº 03/2016 delegou aos Tribunais de Justiça a competência para processar e julgar as Reclamações destinadas a dirimir divergência entre acórdão prolatado por turma recursal estadual ou do Distrito Federal e a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. II. Apesar da delegação da competência, nos moldes que foi efetuada, ser discutível do ponto de vista constitucional, não cabe a este CNJ realizar o controle de constitucionalidade de normas em abstrato, conforme reiterada jurisprudência do Eg. STF. III. Analisar a validade da norma em questão implica, necessariamente, no exame de sua constitucionalidade em abstrato (seja sob o prisma do princípio da reserva legal, seja sob o prisma da autonomia dos Tribunais). IV. Recurso Administrativo conhecido e não provido. (CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0002921-97.2016.2.00.0000 - Rel. ROGÉRIO NASCIMENTO - 259ª Sessão Ordinária - julgado em 26/09/2017)

Nesse contexto, é imperioso concluir que falece de competência para o CNJ, ainda que com esteio na necessidade de observância de direitos e garantias fundamentais, estabelecer uma interpretação conforme à Constituição de dispositivos da lei processual quando inexiste manifestação do Supremo Tribunal Federal em sentido análogo.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso administrativo e determino o arquivamento do feito.

É como voto.

Intimem-se as partes. Em seguida, arquivem-se os autos, independentemente de nova conclusão.

 

Brasília, data registrada no sistema.

 

Candice Lavocat Galvão Jobim

Conselheira