Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0006110-15.2018.2.00.0000
Requerente: CARLOS ALBERTO DOS SANTOS GUIMARÃES e outros
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO - TJES

 


 

RECURSO EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. SERVIÇO NOTARIAL E REGISTRAL. VACÂNCIA ANTERIOR À CF/88. RECONHECIMENTO DE TITULARIDADE. CONSELHO DA MAGISTRATURA. ATO DECLARATÓRIO. 1993. CESSAÇÃO DOS EFEITOS. 2010. MODIFICAÇÃO DA CONDIÇÃO. INTERINIDADE. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. ANULAÇÃO. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RETOMADA DO PAD. APLICAÇÃO DA PENA DE PERDA DA DELEGAÇÃO. AUSÊNCIA DE DISTINÇÃO. TITULARIDADE. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. ARTIGO 208 CF/67 E RESOLUÇÃO CNJ 80/2009.  PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA PELA ADMINISTRAÇÃO. VÍCIO INSANÁVEL. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.

1. Procedimento de controle administrativo proposto contra atos de Tribunal que ensejaram a perda de delegação a titular de serventia, por duas situações. A primeira, pela ausência de distinção entre o caso concreto e as situações identificadas pelo CNJ no Estado, as quais impuseram a expedição de comando ao Tribunal para desconstituir delegações concedidas sem a realização de concurso público, com base na Constituição de 1967. A segunda, em decorrência de processo administrativo disciplinar.

2. In casu, apesar de o reconhecimento da titularidade ter ocorrido após o novo regime constitucional, os critérios para alcançar a titularidade da serventia foram cumpridos antes da Constituição de 1988, inclusive em relação à data da vacância da serventia.

3. Ante a anulação do ato administrativo que desconstituiu a delegação concedida, fica restabelecida a decisão do Conselho da Magistratura do Tribunal que reconheceu a titularidade do requerente na serventia, para todos os fins de direito.

4. Em relação ao processo disciplinar, cumpre ressalvar que a atuação do Conselho Nacional de Justiça em feitos dessa natureza é excepcional. Inocorrendo abuso ou teratologia, descabe ao CNJ intervir. Todavia, em situações como as do presente caso, em que a pena aplicada ao registrador foi evidentemente fulminada pela prescrição, o controle do ato pelo Conselho é imperativo, por força do artigo 103-B da Constituição Federal, que atribui ao CNJ a missão de controlar a atuação administrativa do Poder Judiciário.

5. De acordo com regramento local, o termo inicial de fluência do prazo prescricional é a ciência da irregularidade pela Corregedoria Geral da Justiça. A interrupção desse prazo, por sua vez, ocorre com a instauração do processo administrativo disciplinar, cujos prazos prescricionais voltam a fluir após decorridos 140 dias desde a interrupção, inteligência das normas aplicáveis à espécie e precedentes do Superior Tribunal de Justiça.

6. Embora a questão (prescrição: matéria de ordem pública), não tenha sido suscitada durante a instrução do PCA, no caso concreto, como o PAD foi instaurado em 15.12.2010, o lapso temporal de que dispunha a Administração para punir o delegatário com a perda da delegação se encerrou em 4.5.2015, estando, portanto, prescrita a penalidade aplicada pelo Conselho da Magistrada em 27.3.2017.

7. Recurso a que se dá parcial provimento para reconhecer a prescrição da pretensão administrativa sancionatória.

 

 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, acolheu a preliminar de prescrição da pretensão punitiva, nos termos do voto da Relatora. Declarou suspeição o Conselheiro Mário Guerreiro. Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Ausentes, justificadamente, o Conselheiro Marcos Vinícius Jardim Rodrigues e, em razão da vacância do cargo, o representante do Ministério Público da União. Plenário, 18 de maio de 2021. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Luiz Fux, Maria Thereza de Assis Moura, Emmanoel Pereira, Luiz Fernando Tomasi Keppen, Rubens Canuto, Tânia Regina Silva Reckziegel, Mário Guerreiro, Candice L. Galvão Jobim, Flávia Pessoa, Ivana Farina Navarrete Pena, André Godinho, Maria Tereza Uille Gomes e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0006110-15.2018.2.00.0000
Requerente: CARLOS ALBERTO DOS SANTOS GUIMARÃES e outros
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RELATÓRIO

A EXMA. SRA. CONSELHEIRA MARIA TEREZA UILLE GOMES (RELATORA): Trata-se de recurso administrativo interposto pelo requerido, Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo (TJES), contra a decisão monocrática que julgou parcialmente procedente o pedido e reconheceu, para todos os fins de direito, a titularidade do então requerente, Carlos Alberto dos Santos Guimarães[1], à frente do 1º Ofício (Registro Geral de Imóveis e Anexos) da 1ª Zona Judiciária do Juízo de Cariacica/ES, desde a data da vacância da serventia (11.2.1987) até a data da publicação do Ato 505/2018 (18.12.2018).

A requerente (viúva supérstite) juntou aos autos petição denominada “Reclamação” (Id 3852592) em razão do descumprimento pelo requerido da decisão proferida.

Instado a se manifestar sobre o cumprimento da decisão (3884597), o TJES interpôs recurso administrativo em 7 de fevereiro de 2020 (Id 3889178), com pedido de reforma da decisão, argumentando, em síntese: i) que o requerente não preenche os requisitos do art. 208, da Constituição Federal de 1967; e, ii) equívoco na data utilizada como marco final do então requerente à frente da serventia.

Contrarrazões apresentadas pela requerente (Id 4020509) com os seguintes fundamentos: i) ilegitimidade do Presidente do TJES para recorrer; ii) reconhecimento tácito pelo Tribunal da condição de titular do então requerente; e, iii) Prescrição do Processo Administrativo Disciplinar julgado em 2015.

A recorrente também apresentou Recurso Adesivo, com fulcro no art. 997, inc. II, c/c art. 15, ambos do Código de Processo Civil (CPC), com vistas a reforma da decisão na parte julgada improcedente (Id 4020639), aduzindo: i) prescrição do Processo Administrativo Disciplinar julgado em 2015; e, ii) desproporcionalidade da pena aplicada no PAD.

O TJES também apresentou contrarrazões (4071959) ao recurso adesivo pleiteando a reforma da decisão: i) com pedido de reforma da decisão que reconheceu a nulidade do Ato 1047/2010; ii) descabimento de recurso adesivo na esfera administrativa; e, iii) ausência de prescrição em razão da condenação do então requerente pela prática de crime de peculato, o que eleva o prazo prescricional ao da sanção penal, conforme arts. 109 e 110, do Código Penal (CP).

A requerente manejou resposta às contrarrazões do requerido (Id 4086166), na qual reafirma os argumentos anteriormente expendidos e aduz que o prazo prescricional da sanção penal deve ser reduzido à metade, em razão da aplicação do art. 115 do CP.

O interessado Evandro Sarlo Antonio pretende seu ingresso no feito como terceiro interessado (Id 4164150).

É o relatório.

Brasília, data registrada no sistema.

 

Maria Tereza Uille Gomes

Conselheira 



[1] Falecido em: 26.3.2019 (Id 3602769).

 

 

 

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Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0006110-15.2018.2.00.0000
Requerente: CARLOS ALBERTO DOS SANTOS GUIMARÃES e outros
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VOTO

A EXMA. SRA. CONSELHEIRA MARIA TEREZA UILLE GOMES (RELATORA): Trata-se de recurso administrativo contra decisão que julgou parcialmente procedente o pedido, nos seguintes termos (Id 3842374):

A matéria submetida à apreciação deste Conselho Nacional de Justiça consiste na análise dos atos do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo (TJES) que ensejaram a perda da delegação do 1º Ofício (Registro Geral de Imóveis e Anexos) da 1ª Zona Judiciária do Juízo de Cariacica/ES e oferecimento da serventia em concurso público.

1)                                        Preliminar

1.1                                    Substituição processual. Falecimento do requerente.

Durante a instrução do presente procedimento, vieram aos autos notícia de que o então requerente faleceu no dia 26.3.2019, seguido de pedido de substituição processual formulado por sua esposa, Neuza Dario Guimarães (Id 3602768).

Como a conclusão do procedimento importa no reconhecimento de situação pretérita, consubstanciada na análise de regularidade do exercício da titularidade do 1º Ofício (Registro Geral de Imóveis e Anexos) da 1ª Zona Judiciária do Juízo de Cariacica/ES pelo então requerente, com efeitos para a cônjuge supérstite, entendo possível analisar o quadro fático propugnado na inicial, em especial em decorrência dos importantes desdobramentos do caso, que poderiam ensejar, inclusive, atuação ex officio deste Conselho.

1.2                                    Delimitação do objeto a ser analisado

Reafirmo a delimitação do objeto da presente decisão, tal como consignado na decisão liminar, no sentido de que o cerne da controvérsia reside em saber se o requerente possui ou não a condição titular de serventia, bem como se o PAD instaurado em seu desfavor contém ou não vício insanável a ensejar a intervenção do CNJ.

1.3                                    Judicialização da matéria

Um ponto importante que deve ser afastado, consiste na judicialização da matéria em apreço, fato esse, que motivou, inclusive a revogação da liminar antes deferida no curso do procedimento.

Todavia, a requerente juntou cópias dos pedidos de arquivamento das ações judiciais em curso na 4ª Vara de Fazenda Pública de Vitória/ES, sob nº 0037841-02.2016.8.08.0024 e nº 0017300-74.2018.8.08.0024, em razão da perda de objeto.

Diante dessas considerações, entendo inexistir óbice ao prosseguimento e análise do presente procedimento.

2) Mérito

2.1 Reconhecimento da condição de oficial substituto do 1º Ofício (Registro Geral de Imóveis e Anexos) da 1ª Zona Judiciária do Juízo de Cariacica/ES

Para facilitar a compreensão dos fatos acerca do reconhecimento da titularidade do requerente à frente do 1º Ofício (Registro Geral de Imóveis e Anexos) da 1ª Zona Judiciária do Juízo de Cariacica/ES, reproduzo o quadro elaborado no momento da decisão liminar proferida, contendo a ordem cronológica dos acontecimentos, com alguns acréscimos. Vejamos:

Data

Fato

Id/fls.

1.9.1973

Ingresso no cartório do 1º Ofício (Registro Geral de Imóveis e Anexos) da 1ª Zona Judiciária do Juízo de Cariacica/ES

Id 3231804, fls. 2/8

17.12.1982

Designação como oficial substituto da serventia.

Id 3231804, fls. 2/8

11.2.1987

Vacância – aposentadoria do então titular da serventia.

Id. 3198752, fls. 1/4

19.9.1993

Deferimento da titularidade da serventia em favor do requerente (Ato 788/93).

Id 3198752, fls. 1/4.

7.6.2010

Cessação dos efeitos do Ato 788/93, com a designação do requerente para responder como interino (Ato 1047/2010).

Id 3198752, fls. 5/8.

6.7.2011

Aplicação da pena de perda de delegação (Ato 1108/2011, publicado em 14.7.2011).

Id 3198752, fl.9.

07.10.2014

RMS 42.193, STJ: conclui pela nulidade do processo administrativo que culminou na perda da delegação por parte do requerente.

Id 3198753, fl. 42/51

19.11.2015

1) Cessação dos efeitos do Ato 1047/2010 de 7.6.2010, com a comunicação de que Carlos Alberto dos Santos Guimarães “não responde mais interinamente pelo serviço vago do Cartório do 1º Ofício de Cariacica/ES”, por prática de infrações disciplinares.

2) Designação do sr. Evandro Sarlo Antônio para ser o Oficial Interventor interino do cartório, até ulterior provimento.

Id 3198752, fl. 42.

19.1.2018

Divulgação Relação Geral de Vacâncias CMFE 0009/2017. Data da vacância (perda) 14.7.2011.

Id 3198752, fl. 26.

 

A partir da apreciação dos documentos colacionados aos presentes autos verifico que o reconhecimento da condição de titular da serventia ao então requerente – ocorrida no ano de 1993 pelo Conselho da Magistratura –, foi respaldada em provas que revelaram a assunção de Carlos Alberto dos Santos Guimarães à condição de oficial substituto, ainda que o referido ato administrativo tenha sido produzido formalmente em momento posterior.

Como se verifica, o então requerente trabalhava na serventia desde 1º.9.1973, mas apenas em 26.4.1982, passou a constar da sua ficha funcional o desempenho dessa atividade. Consta, ainda, que em 17.12.1982 foi formalizada a designação do então requerente para exercer as atividades de oficial substituto (Id 3231804) da serventia.

Referida formalização ocorreu no ano de 1982, justamente no ano da edição do Código de Organização Judiciária do Estado do Espírito Santo – Lei 3.507/1982 –, que determinava em seu artigo 55, inc. XII, alínea b, o seguinte:

Art. 55 - Incumbe, ainda, aos Juízes de Direito em geral, ressalvadas as atribuições das autoridades competentes, funções relativas à esfera administrativa, em especial:

[...]

XII – designar para responder pelo expediente, em caso de vacância de serventia, escrivania ou ofício de justiça, oficializando ou não, até que o cargo seja provido na forma prevista em lei:

a) – um dos escreventes juramentados do cartório;

b) – um dos escreventes auxiliares, que tenha 02 (dois) anos de efetivo exercício na serventia, na falta do escrevente juramentado;

c) – na falta de escreventes, pessoa capaz para o exercício das funções, preferindo-se na escolha o portador de título de bacharel em direito e com vínculo com o serviço público estadual;

Portanto, somente a partir do referido ano o Tribunal passou a exigir a designação de pessoa para responder pela serventia. Cediço que no período em questão, o registro de informações era muito precário.

A vasta documentação acostada aos autos (Id 3231806), utilizada também no processo que ensejou a regularização do enquadramento no ano de 1993, corrobora o fato de que o então requerente atuava como oficial substituto do 1º Ofício (Registro Geral de Imóveis e Anexos) da 1ª Zona Judiciária do Juízo de Cariacica/ES, desde o ano de 1973.

Em documentos datados desde o ano de ingresso na serventia, se verifica a assinatura do requerente na prática de vários atos como “oficial”, o que revela que a situação fática estava distanciada do formalismo necessário até o ano de 1982. Todavia, em situações como a presente, prepondera o princípio da primazia da realidade, com vistas a se corrigir situações jurídicas que não condizem com os fatos, a fim de respaldar os direitos correspondentes.

A título de exemplo, reproduzo as imagens de alguns desses atos.

Além dos mais de 120 (cento e vinte) documentos juntados com a assinatura do requerente, a portaria de nomeação dos escreventes auxiliares assinada em 1982, deixa evidenciado que o requerente trabalhava no cartório sem a necessária nomeação desde o ano de 1973. E, de acordo com o mesmo ato, o então requerente era o funcionário mais antigo do cartório (Id 3231806, fl. 12).

A juntada desse documento revela mais um fato, que inexistia registro adequado dos funcionários do cartório naquela época, tanto que a portaria nomeia não apenas o requerente, mas todas as pessoas que começaram a trabalhar na serventia, inclusive no ano de 1978 (mais de 5 anos depois do requerente).

Outro documento apto a corroborar a situação do então requerente como substituto do cartório, consiste na declaração firmada pelo magistrado Gilson Leão Borges, Juiz de Direito de Cariacica/ES, no período de 1974 a 1978 (Id 3231806, fl. 16).

Declaração similar foi firmada pelo Juiz de Direito José Carlos Cola (Id 3231806, fl. 18), no sentido de que no período compreendido entre 1978 e 1981, o substituto do cartório era o requerente.

Ante o exposto, consoante exaustivamente comprovado nos autos e levando-se em consideração o princípio da primazia da realidade, reconheço que o então requerente, Carlos Alberto dos Santos Guimarães era o substituto mais antigo do 1º Ofício (Registro Geral de Imóveis e Anexos) da 1ª Zona Judiciária do Juízo de Cariacica/ES, desde o ano de 1973.

2.2) Titularidade do 1º Ofício (Registro Geral de Imóveis e Anexos) da 1ª Zona Judiciária do Juízo de Cariacica/ES

O reconhecimento da condição de substituto do oficial da serventia extrajudicial em questão, desde o ano de 1973, não constitui critério único capaz de atribuir ao então requerente a titularidade do 1º Ofício (Registro Geral de Imóveis e Anexos) da 1ª Zona Judiciária do Juízo de Cariacica/ES.

Para que o então requerente tenha reconhecido seu direito à titularidade do cartório é necessária uma combinação de elementos. A Resolução CNJ nº 80/2009, que estabeleceu critérios para a regularização do adequado provimento das serventias extrajudiciais, determina que:

Art. 4º Estão incluídas nas disposições de vacância do caput do artigo 1º desta resolução todas as demais unidades cujos responsáveis estejam respondendo pelo serviço a qualquer outro título, que não o concurso público específico de provas e títulos para a delegação dos serviços notariais e de registro, a exemplo daqueles que irregularmente foram declarados estáveis depois da Constituição Federal de 1988 e dos que chegaram à qualidade de responsável pela unidade por permuta ou por qualquer outra forma não prevista na Constituição Federal de 5 de outubro de 1988.

Parágrafo único. Excluem-se das disposições de vacância do caput do artigo 1º desta resolução as unidades dos serviços de notas e registro, cujos notários e oficiais de registro:

[...]

b) eram substitutos e foram efetivados, como titulares, com base artigo 208 da Constituição Federal de 1967 (na redação da EC 22/1982). Nesses casos, tanto o período de cinco anos de substituição, devidamente comprovado, como a vacância da antiga unidade, deverão ter ocorrido até a promulgação da Constituição Federal de 05 de outubro de 1988;

De acordo com os critérios da alínea b, do parágrafo único do art. 4º, da Resolução CNJ nº 80/2009, o então requerente precisaria – para ter reconhecido seu direito à titularidade da serventia – somar os seguintes requisitos:

1)           Possuir a condição de substituto da serventia;

2)           Ser efetivado como titular com base no artigo 208, da Constituição Federal de 1967, com redação dada pela EC nº 22/1982;

3)           Possuir 5 (cinco) anos de substituição até a Constituição Federal de 1988;

4)           Vacância da unidade até a Constituição Federal de 1988.

Os requisitos estabelecidos convergem com os previstos no art. 208, da Constituição Federal de 1967, acrescido pela Emenda Constitucional nº 22/1982.

Art. 208 - Fica assegurada aos substitutos das serventias extrajudiciais e do foro judicial, na vacância, a efetivação, no cargo de titular, desde que, investidos na forma da lei, contem ou venham a contar cinco anos de exercício, nessa condição e na mesma serventia, até 31 de dezembro de 1983. 

A Resolução CNJ nº 80/2009 ainda confere uma ampliação maior do prazo, para fins de comprovação da substituição, qual seja, contar o substituto mais antigo com 5 (cinco) anos de substituição até a promulgação da Constituição Federal de 05 de outubro de 1988.

Seja pelo prazo da Constituição Federal de 1967 (EC nº 22/1982), seja pelo prazo da Resolução CNJ nº 80/2009, o fato é que o então requerente preenchia o tempo para ser considerado o titular do 1º Ofício (Registro Geral de Imóveis e Anexos) da 1ª Zona Judiciária do Juízo de Cariacica/ES, a partir da data da vacância, ocorrida em 11.2.1987, por ter sido o substituto do oficial do registro, conforme reconhecido no item anterior.

11.2.1987

Vacância – aposentadoria do então titular da serventia.

Id. 3198752, fls. 1/4

Portanto, todos os requisitos exigidos para o reconhecimento da titularidade do então requerente foram devidamente cumpridos.

Tanto é verdade, que no ano de 1993, através do Ato nº 788/93, o Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo apreciou a documentação e, com amparo na regra da Constituição Federal de 1967 (EC nº 22/1982), deferiu a titularidade da serventia em favor do requerente (Processo nº 4.242 - Capital) – Id 3198758, fls. 1/4.

Ocorre que em 7.6.2010, o Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo (TJES), através do Ato nº 1047/2010, determinou a desconstituição de várias serventias extrajudiciais, em observância à decisão do CNJ nos Procedimentos de Controle Administrativo nº 2008.10.00.000697-4 e 2008.10.00.000885-5, dentre as quais estava a de titularidade do então requerente (Id 3198752).

 

Essa decisão do Tribunal deslocou Carlos Alberto dos Santos Guimarães da condição de titular da serventia, para interino do 1º Ofício (Registro Geral de Imóveis e Anexos) da 1ª Zona Judiciária do Juízo de Cariacica/ES.

A medida adotada pelo TJES, em cumprimento aos PCAs julgados por este Conselho Nacional de Justiça, não fez a distinção necessária que o caso requeria no momento. Veja-se:

EMENTA: Procedimentos de Controle Administrativo. Insurgência contra a intimação de terceiros interessados por edital. Alegação de que o Tribunal não incluiu no concurso algumas serventias criadas após o advento da CF/88 e da LFed. 8.935/94 e que estariam em regime ilegal de acumulação.

“I) Não há falar em cerceamento de defesa por falta de intimação pessoal dos terceiros interessados. A intimação por edital encontra supedâneo em norma constante do Regimento Interno do CNJ, inexistindo previsão legal ou regimental de intimação pessoal, como pretendido”. 

 “II) A avaliação quanto à pertinência da instalação de novos serviços da atividade notarial e de registro é atribuição dos Tribunais de Justiça, que deve ser realizada na forma da lei. O permissivo legal não pode ser utilizado como subterfúgio para favorecimentos pessoais e burla à regra do concurso público. Apenas nos casos em que comprovadamente o volume dos serviços e das receitas não justificarem a instalação de novo serviço é permitida a acumulação. Mas a desacumulação dos serviços notariais que tenham sido anteriormente agrupados só encontra justificativa se comprovado que, em razão do volume dos serviços ou da receita é viável e sustentável a cisão, de modo a cumprir a regra do caput do art. 26 da Lei nº 8.935/94. Todavia, essa tarefa e essa verificação constitui prerrogativa que se insere na autonomia privativa do Tribunal ao qual as serventias estão submetidas nos respectivos Estados da Federação”.

“III) Caracteriza burla ao sistema de delegação de serventia por concurso público a criação e instalação, através de desdobramento de uma mesma serventia, em ‘sucursais’ funcionando em vários pontos do município”.

“IV) Impõe-se, com a ressalva necessária, admitir o entendimento no sentido de que o prazo decadencial de cinco anos a que se referem o art. 54 da Lei n. 9.784/99 e 95, par. único do Regimento Interno do CNJ, estabelecido para a revisão e anulação de ato administrativo irregular, não se aplica quando este ato tiver afrontado diretamente norma constitucional, que restaria inócua se tal revisão não pudesse ser admitida, considerando a dicção da ilustrada e expressiva maioria deste Egrégio Conselho, não obstante entendimento em relação ao qual guardo reservas, mas já alentado por inúmeros e reiterados precedentes em situações parelhas, conforme a messe de julgados apontados”.

“V) Os substitutos de serventias extrajudiciais que ascenderam à titularidade da serventia, sem a realização de concurso público, com base na Constituição de 1967, estão em situação irregular, impondo-se a regularização, através da desconstituição das delegações. Também os titulares que receberam a delegação, sem a realização de concurso público, após a Constituição de 1988, com fundamento na Carta de 1967, ou em legislação estadual revogada, devem ter suas delegações desconstituídas. 

A ementa dos julgados, sem a contextualização do voto e a leitura atenta das inúmeras variáveis constantes do texto, leva à uma interpretação equivocada do julgamento.

A premissa para a desconstituição das delegações utilizada no voto referido, em razão da aplicação da regra da Constituição Federal de 1967, estava vinculada à ocorrência da vacância após a Constituição de 1988. Exatamente por isso que o CNJ determinou “a desconstituição de todas as delegações concedidas por ato do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo sem a realização de concurso público, com base na Constituição de 1967 e também as delegações concedidas sem a realização de concurso após a Constituição de 1988, com fundamento na Carta de 1967, ou em legislação estadual revogada”[1].

Como dito, o caso dos autos é diferente! Em que pese o reconhecimento da titularidade do então requerente tenha ocorrido após o novo regime constitucional, frise-se, no ano de 1993, os critérios para alcançar a titularidade da serventia foram todos cumpridos antes da Constituição de 1988, inclusive em relação à data da vacância da serventia.

Essa interpretação é tão cristalina que passou a constar expressamente da Resolução CNJ nº 80/2009, ao fazer as distinções necessárias para que não fossem cometidas injustiças quanto à titularização das serventias antes da Constituição de 1988, mas desde que cumpridos os requisitos da Constituição de 1967.

Diante do exposto, julgo procedente o pedido para anular o Ato 1047/2010, do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo, exclusivamente em relação a Carlos Alberto dos Santos Guimarães, e reconhecer que o então requerente cumpriu todas as exigências do art. 208, da Constituição Federal de 1967 (EC nº 22/1982), durante a vigência da referida Constituição.

Logo, ante a anulação do Ato 1047/2010 em relação ao requerente, fica restabelecida a decisão do Conselho da Magistratura do TJES, que reconheceu a titularidade do então requerente no 1º Ofício (Registro Geral de Imóveis e Anexos) da 1ª Zona Judiciária do Juízo de Cariacica/ES, para todos os fins de direito.

2.4) Dos Processos Administrativos Disciplinares

O então requerente questiona a legalidade da tramitação dos Processos Administrativos Disciplinares levados a efeito pelo Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo.

No ano de 2011, o então requerente passou a responder o Processo Administrativo Disciplinar nº 2012.01.382.054 (1030261), que culminou na pena de perda da delegação, conforme Ato 1108/2011, publicado em 14.7.2011 (Id 3198752, fl. 9).

O referido processo foi anulado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), no julgamento do Recurso em Mandado de Segurança nº 42.193/ES (Id 3198753, fls. 42/51), conforme ementa abaixo:

Vale destacar, que o julgamento do referido PAD foi contraditório em relação à pena aplicada ao então requerente - de perda da delegação - e o conteúdo do Ato 1047/2010, de 7.6.2010, que atribuiu a Carlos Alberto dos Santos Guimarães a condição de interino da serventia.

Reinstaurado o PAD a partir da fase antecedente à anulação, foi o então requerente novamente punido, agora com a pena de cessação da interinidade da serventia, por prática de infrações disciplinares (Ato 1495/2015, publicado 19.11.2015).

Contra essa decisão, foi interposto Recurso Administrativo, ao qual fora concedido efeito suspensivo (Id 3842275 – fl. 2).

No entanto, referido ato foi mantido pelo Conselho da Magistratura e pelo Tribunal Pleno do TJES através do Recurso Administrativo nº 0029712-17.2015.8.08.0000, que resultou na publicação do Ato 505/2018, em 18.12.2018, com a aplicação da penalidade de perda da delegação, quando efetivamente transitado em julgado o referido processo.

Em relação ao processamento e julgamento dos Processos Administrativos Disciplinares é importante esclarecer que este Conselho Nacional de Justiça, em sede de Procedimento de Controle Administrativo, apenas pode se imiscuir nas situações em que efetivamente ficar demonstrada a existência de vício insanável na tramitação dos processos.

RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA. MATÉRIA JUDICIALIZADA. INTERVENÇÃO EM PROCESSOS DISCIPLINARES NA ORIGEM. IMPOSSIBILIDADE. PRAZO QUINQUENAL PARA ADMINISTRAÇÃO REVER SEUS PRÓPRIOS ATOS.

1. O TJSC julgou o Mandado de Segurança n. 9155147-66.2013.8.24.0000, impetrado pelo próprio requerido, e decidiu (i) anular decisão proferida pelo Conselho da Magistratura; (ii) manter hígidos os atos anteriores à decisão anulada; e (iii) determinar que a serventia em tela ficasse sob cuidados do interventor até que fosse proferida nova deliberação no âmbito do processo disciplinar. 

2. Diante da decisão judicial, não há possibilidade deste Conselho determinar o retorno do recorrente à serventia ou analisar a legalidade dos atos declarados hígidos pelo Tribunal.

3. A ingerência do CNJ em procedimentos disciplinares dos tribunais somente é possível em situações em que se constate ilegalidade patente como vícios insanáveis ou provas inequívocas.

4. Por fim, quanto à suposta inaplicabilidade do artigo 54 da Lei n. 9.784/99, é cediço que, na falta de norma local disciplinando o assunto, o prazo para Administração rever seus próprios atos é de cinco anos (prescrição quinquenal), conforme previsto na mencionada Lei.

5. Recurso conhecido e, no mérito, não provido.

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0006296-09.2016.2.00.0000 - Rel. VALDETÁRIO ANDRADE MONTEIRO - 282ª Sessão - j. 20/11/2018).

Após criteriosa análise dos documentos colacionados aos presentes autos, entendo pela inexistência de ilegalidade ou de vício insanável na tramitação dos processos disciplinares em relação ao então requerente Carlos Alberto dos Santos Guimarães.  Senão vejamos.

Em relação ao primeiro PAD, qualquer análise a ser feita ou situação que deva ser considerada por este Conselho, isto porque o julgamento foi anulado pelo Superior Tribunal de Justiça em 7.10.2014.

Quanto ao segundo PAD, reinstaurado após o julgamento do STJ, entendo pela inexistência de qualquer vício insanável que importe a intervenção deste Conselho.

Em que pese a decisão do PAD ter considerado a aplicação da pena de cessação da interinidade, entendo que naquela oportunidade não existia outra alternativa ao Tribunal, senão a de utilizar como fundamento para o caso em apreço o Ato 1047/2010, que passou a considerar o então requerente como interino.

Ocorre que a situação aqui apresentada é deveras complexa, o que pode ser constatado nos votos constantes do acórdão do Conselho da Magistratura, ocasião em que ficou registrado os embates entre os Desembargadores sobre a situação concreta do então requerente. Alguns votaram pela cessação da interinidade, enquanto outros pela perda da delegação.

Mas o que efetivamente importa para o deslinde do tópico em apreço, foi se os princípios constitucionais da ampla defesa, contraditório e devido processo legal foram observados.

À toda evidência, esses não foram pontos questionados pelo então requerente, o que deixa incontroverso a existência de qualquer nulidade nesse sentido.

Conquanto o dispositivo utilizado pelo Tribunal (se cessação da interinidade ou perda da delegação) possa gerar dúvidas em relação ao conteúdo material do julgamento, entendo que o aspecto formal foi observado.

De toda sorte, o que vale como conclusão do segundo PAD, não mais passível de recurso, é a publicação do Ato 505/2018, em 18.12.2018, que determinou a perda da delegação em face de Carlos Alberto dos Santos Guimarães.

 

Ante o exposto, julgo improcedente o pedido, mantendo incólume a decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo em relação ao segundo Processo Administrativo Disciplinar, ante a inexistência de ilegalidade ou de vício insanável.

Considerando a aplicação definitiva de pena de perda de delegação ao então requerente, através do ato 505/2018, publicado em 18.12.2018 e o seu falecimento em 26.3.2019, entendo prejudicado o pedido para exclusão da serventia da listagem de vacâncias.

2.5) Do pedido de pagamento à viúva dos valores excedentes ao teto remuneratório no período de 2017 a 17 dezembro de 2018.

No curso do presente PCA, a requerente, viúva do então requerente formulou pedido de pagamento dos valores excedentes ao teto remuneratório a que fazia jus o Carlos Alberto dos Santos Guimarães no período de 2017 a 17 dezembro de 2018. 

Descabe ao CNJ proferir determinação nesse sentido. Como dito acima, o reconhecimento da titularidade Carlos Alberto dos Santos Guimarães no 1º Ofício (Registro Geral de Imóveis e Anexos) da 1ª Zona Judiciária do Juízo de Cariacica/ES, desde a data da vacância da serventia (11.2.1987) até a data da publicação do Ato 505/2018 (18.12.2018) deve ser considerada para todos os fins de direito.

3) Conclusão

Ante o exposto, julgo parcialmente procedente o Procedimento de Controle Administrativo, nos termos da fundamentação antecedente.

Intimem-se.

Publique-se nos termos do artigo 140 do RICNJ. Em seguida, arquivem-se independentemente de nova conclusão.

 

A decisão monocrática questionada julgou parcialmente procedente o presente Procedimento de Controle Administrativo para reconhecer a titularidade de Carlos Alberto dos Santos Guimarães à frente do 1º Ofício (Registro Geral de Imóveis e Anexos) da 1ª Zona Judiciária do Juízo de Cariacica/ES, desde a data da vacância da serventia (11.2.1987) até a data da publicação do Ato 505/2018 (18.12.2018).

Em síntese, os recorrentes pretendem:

a) Tribunal: i) a reforma da decisão, para desconstituir a declaração de nulidade do Ato 1047/2010; ii) caso mantida a nulidade do Ato 1047/2010, a reforma da decisão para alteração do termo ad quem da titularidade do então requerente; e, iii) o descabimento do recurso adesivo interposto pela recorrente.

b) da recorrente: i) ilegitimidade do Presidente do TJES para recorrer; ii) reconhecimento tácito pelo Tribunal da condição de titular do então requerente; e, iii) Prescrição do Processo Administrativo Disciplinar julgado em 2015.

O Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo não se resigna com a decisão monocrática por entender que o então requerente não preencheu os requisitos estabelecidos na legislação estadual aplicável à época para ser designado formalmente como oficial substituto dentro do prazo previsto pelo art. 208, da Constituição Federal de 1967.

Apesar da designação do então requerente pela Portaria 07/82, de 26/4/1982 (Id 3231804, p. 2) como substituto, todas as provas juntadas aos autos conduzem à constatação de que o senhor Carlos Alberto dos Santos Guimarães respondia pela serventia durante as ausências e impedimentos do titular e, portanto, era o substituto efetivo do titular. Pendia apenas a formalização dessa situação de fato, que foi corrigida através da Portaria referida.

Na decisão monocrática reconheci a condição de substituto do então requerente como oficial substituto desde o ano de 1973. A análise levou em consideração os documentos nos quais o senhor Carlos Alberto dos Santos Guimarães praticava atos em substituição ao titular da serventia, bem como em declarações firmadas por magistrados que respondiam pelos ofícios extrajudiciais na época em que se sucederam os acontecimentos.

A efetivação do então requerente como substituto em 1982 consistiu em ato meramente declaratório, haja vista que as situações constitutivas do direito do então requerente ocorreram em momentos anteriores.

Igual situação se verifica na decisão do Conselho da Magistratura do Tribunal, no ano de 1993, que - por decorrência lógica do reconhecimento da qualidade de oficial substituto do perante o 1º Ofício (Registro Geral de Imóveis e Anexos) da 1ª Zona Judiciária do Juízo de Cariacica/ES ao então requerente – declarou a titularidade do então requerente desde a vacância da serventia, ocorrida em 1987, haja vista o preenchimento dos requisitos para ser considerado titular da serventia extrajudicial alcançados antes da Constituição Federal de 1988.

Após detida apreciação dos argumentos trazidos pelo Tribunal, reforço a minha compreensão de que a decisão monocrática foi acertada e que a declaração de nulidade do Ato 1047/2010 deve ser mantida, restabelecendo-se a validade do Ato 788/93, do Conselho da Magistratura.

Como ficou cristalino no decisum questionado, o Conselho Nacional de Justiça nos PCA’s 2018.10.00.000697-4 e 2008.10.00.000885-5 não determinou a vacância do 1º Ofício (Registro Geral de Imóveis e Anexos) da 1ª Zona Judiciária do Juízo de Cariacica/ES, mas decidiu de modo genérico que todas as delegações que não cumprissem os requisitos constitucionais deveriam ser desconstituídas, independentemente de prazo decadencial.

“Como dito, o caso dos autos é diferente! Em que pese o reconhecimento da titularidade do então requerente tenha ocorrido após o novo regime constitucional, frise-se, no ano de 1993, os critérios para alcançar a titularidade da serventia foram todos cumpridos antes da Constituição de 1988, inclusive em relação à data da vacância da serventia”.

Veja-se, portanto, que tanto o preenchimento dos requisitos como oficial substituto, quanto a vacância, ocorreram antes de 1988.

Nesse aspecto, não vejo qualquer necessidade de ajuste ou alteração da decisão proferida.

A decisão está em absoluta harmonia com julgados do CNJ no mesmo sentido, dentre os quais se destaca o do Pedido de Providências n. 0000584-14.2011.2.00.0000, de relatoria da então Corregedora Nacional de Justiça, Ministra Nancy Andrighi, que declarou a titularidade da oficial do cartório apenas no ano de 1990, reconhecendo seu direito adquirido durante a vigência da Constituição Federal de 1967.

Com relação ao mérito do PAD, entendo que duas questões preliminares devem ser apreciadas. A primeira diz respeito ao cabimento do Recurso Adesivo e a segunda é relativa a arguição de matéria de ordem pública relativa a prescrição da pretensão punitiva da administração para aplicar ao então requerente a pena capital de perda da delegação.

1. Preliminares

1.1 Cabimento do Recurso Adesivo

A recorrente apresenta recurso adesivo ao recurso administrativo interposto pelo Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo.

Como a recorrente deixou fluir in albis o quinquídio para apresentação de recurso administrativo, no prazo para apresentação de contrarrazões, interpôs recurso adesivo, com fulcro no art. 997, inc. II, c/c art. 15, ambos do CPC.

Não obstante o art. 15, do CPC, disponha que “[n]a ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente”, a aceitação de todo e qualquer recurso da via judicial na esfera administrativa importaria na criação de um sistema novo, sem qualquer parâmetro normativo adequado.

Este Conselho Nacional de Justiça se vale do regramento do art. 15, do CPC, para aquelas hipóteses de cabimento de embargos de declaração (art. 1.022, do CPC), mesmo que não haja previsão regimental nesse sentido.

No entanto, permitir que todos os recursos judiciais sejam utilizados na seara administrativa não parece ser o caminho mais adequado. Especialmente no que concerne ao recurso adesivo, que possui restrição quanto ao seu cabimento. De acordo com o art. 997, inc. II, do CPC, somente “será admissível na apelação, no recurso extraordinário e no recurso especial”.

Em vista desses fundamentos, não conheço do recurso adesivo interposto pela recorrente.

1.2 Matéria de ordem pública – Prescrição

A requerente argui em sede de contrarrazões a ocorrência de prescrição da pretensão punitiva da administração para aplicação da pena de perda da delegação ao senhor Carlos Alberto dos Santos Guimarães.

Antes de adentrar à análise sobre a ocorrência da prescrição, entendo ser cabível a atuação do CNJ em processos disciplinares de notários e registrados apenas em situações nas quais constado verdadeiro abuso ou teratologia da decisão do Tribunal.

Sobre essa questão o Plenário do CNJ já possui posicionamento uniforme no sentido de se tratar de atuação excepcional deste Conselho:

RECURSO EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. JUÍZO DA COMARCA DE CANOAS/RS. SERVIÇO NOTARIAL E REGISTRAL. INSPEÇÃO. IRREGULARIDADES. AFASTAMENTO DA TITULAR. DESIGNAÇÃO DE INTERVENTORA. APURAÇÃO DOS FATOS. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PERDA DA DELEGAÇÃO. RECURSO AO CONSELHO DA MAGISTRATURA. MANUTENÇÃO DA PENA. TERATOLOGIA. INOCORRÊNCIA. RECURSO IMPROVIDO. 

1. Procedimento de controle administrativo proposto contra ato de Conselho da Magistratura de Tribunal que, ao apreciar o recurso específico interposto pela então titular de serviços cartorários contra decisão que ensejou a perda da delegação, manteve a penalidade aplicada à unanimidade. 

2. In casu, não se verifica plausibilidade na oposição formulada, porquanto patente o seu viés recursal. 

3. O exame das irregularidades foi tangenciado pelo Tribunal à época de designação de interventora para responder pelos serviços (MS 0177201-47.2015.8.21.7000), o qual confluiu para o acerto dos atos praticados pelo Juízo local, bem como apreciado pelos membros do Conselho da Magistratura. 

4. Inocorrendo abuso ou teratologia na decisão, descabe ao CNJ intervir em processos disciplinares deflagrados e julgados por Tribunal em face de titulares de serventias extrajudiciais. 

5. Recurso a que se nega provimento. (CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0005970-15.2017.2.00.0000 - Rel. MARIA TEREZA UILLE GOMES - 276ª Sessão - j. 21/08/2018). 

Considerando que o tema versado na presente preliminar refere-se à ocorrência de prescrição, verifico aqui a ocorrência de abuso na decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santo ao aplicar penalidade ao delegatário mesmo após a ocorrência da prescrição. Vejamos.

Conforme consta da decisão monocrática, a titularidade do então requerente à frente do 1º Ofício (Registro Geral de Imóveis e Anexos) da 1ª Zona Judiciária do Juízo de Cariacica/ES, foi reconhecida desde a data da vacância da serventia (11.2.1987) até a data da publicação do Ato 505/2018 (18.12.2018).

Após a declaração de titularidade da serventia, ocorrida em 1993, o então requerente respondeu pelo Ofício até o ano de 2010, quando, através do Ato 1047/2010, foi determinada a cessação dos efeitos da delegação, ante a ausência do cumprimento dos requisitos constitucionais, conforme determinação do CNJ, designando-o para responder pela serventia interinamente.

Em 14/7/2011, pelo Ato 1108/2011, em razão do julgamento do Processo Administrativo Disciplinar n. 1102917, o então requerente foi punido com a pena de perda da delegação. Ocorre que através do Ato 1614/2014, publicado em 24/10/2014, o Superior Tribunal de Justiça anulou a decisão do PAD.

Retomado o andamento do PAD, o magistrado foi punido com a cessação da interinidade, conforme Ato 1496/2015, publicado em 17/11/2015.

Todavia, contra essa decisão foi concedido efeito suspensivo ao recurso “para suspender, até o trânsito em julgado, os efeitos da decisão que lhe cassou a delegação das funções registrais do Cartório do 1º Ofício de Cariacica-S” (Id 3198752, fl. 46).

 

Conforme considerado na decisão monocrática, essa decisão do TJES transitou em julgado em 18/12/2018, através do Ato 505/2018, com a aplicação da penalidade de perda da delegação.

O TJES questiona a data reconhecida como termo final da titularidade do então requerente. Entende que a data correta deveria ser 27/3/2017 – data do julgamento definitivo do recurso administrativo, contra o qual os recursos interpostos eram meramente protelatórios. No entanto, a data considerada na decisão foi 18/12/2018 – data da publicação do Ato 505/2018, que aplicou ao então requerente a pena de perda da delegação, consoante demonstrado acima.

Independentemente da definição em relação a essa data – que deveria ser considerada para todos os fins de direito, conforme decidido – entendo que o Processo Administrativo Disciplinar instaurado em face de Carlos Alberto dos Santos Guimarães foi consumido pela prescrição.

Apesar de essa questão não ter sido trazida durante a instrução do processo, nem em recurso administrativo, entendo que por se tratar de matéria de ordem pública, não há qualquer óbice de ser analisada durante o julgamento do presente recurso.

Passo à cronologia detalhada dos fatos para melhor entendimento dos marcos temporais. Vejamos:

15/12/2010

Instauração do PAD - Portaria 020/2010 (Id 4071958);

14/7/2011

Publicação do julgamento do PAD - Ato 1108/2011, que determinou a perda da delegação do então requerente;

24/10/2014

Anulação do PAD - Decisão do Superior Tribunal de Justiça no RMS 42.193/ES - Ato 1614/2014;

6/11/2014

Retomada do andamento do PAD - Portaria 003/2014;

20/11/2015

Julgamento final do PAD - Ato 1496/2015, com a cessação da interinidade;

27/1/2016

Publicação da decisão de suspensão do julgamento do PAD pelo Conselho da Magistratura (Id 3629055, p. 96 e Id 3198752, fl. 46);

27/3/2017

Decisão do Conselho da Magistratura;

18/12/2018

Publicação do trânsito em julgado – Ato 505/2018.

 

De acordo com o Código de Normas da Corregedoria-Geral de Justiça do Estado do Espírito Santo – Provimento n° 029/2009, aplicável na época dos fatos –, o prazo prescricional para punição de delegatários do serviço notarial e de registro com pena de perda de delegação é de 5 (cinco) anos.

DA PRESCRIÇÃO

Art. 1.313. O evento punível prescreverá para servidores públicos e delegatários do serviço notarial e de registro:

I - em cinco anos, quanto aos atos de demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade, e perda da delegação, quando aplicada isolada ou cumulativamente;

II - em dois anos, quanto às faltas sujeitas à pena de suspensão, quando aplicada isolada ou cumulativamente;

III - em cento e oitenta dias, quanto às faltas sujeitas à pena de multa apenas quando aplicada isoladamente e, nos demais casos, salvo quando outro prazo for fixado em lei.

§ 1º. O termo inicial de fluência do prazo de prescrição da pretensão punitiva é a ciência da irregularidade pela Corregedoria Geral da Justiça.

§ 2º. A falta também prevista na lei penal como crime ou contravenção prescreverá juntamente com este.

A conduta praticada pelo então delegatário, que ensejou a aplicação de penalidade administrativa de perda da delegação, também foi objeto de Ação Penal, que resultou em sua condenação pelo crime de peculato, com pena de 4 anos de reclusão (Id 4086168, p. 19).

A sentença foi mantida pelo Tribunal (Apelação 0121111124546, data do julgamento: 16/8/2017) e o Recurso Especial interposto foi inadmitido pelo Presidente do TJES, cuja decisão foi mantida pelo Superior Tribunal de Justiça (Agravo em Recurso Especial nº 1.271.282/ES).

O prazo prescricional que deve ser aplicado à situação em análise deve ser o da sanção penal, tal como previsto no § 2º, do art. 1.313, Código de Normas da Corregedoria-Geral de Justiça do Estado do Espírito Santo – Provimento n° 029/2009, acima transcrito. Da mesma forma prescreve o art. 110, do Código Penal (CP).

Nesse sentido, de acordo com o art. 109, inc. IV, do CP, prescreve “em oito anos, se o máximo da pena é superior a dois anos e não excede a quatro”.

Portanto, como o delegatário foi condenado a uma pena de 4 anos de reclusão, o prazo prescricional a ser aplicado deveria ser de 8 (oito) anos.

Todavia, o art. 115, do CP, determina que os prazos prescricionais devem ser reduzidos pela metade “quando o criminoso era, ao tempo do crime, menor de 21 (vinte e um) anos, ou, na data da sentença, maior de 70 (setenta) anos”. Conforme identidade juntada aos autos (Id 3198751), o então requerente nasceu no ano de 1940. Como a sentença foi proferida em 23/3/2016, o delegatário possuía mais de 70 (setenta) anos na ocasião. Logo, o prazo prescricional a ser aplicado no presente caso é de 4 (quatro) anos.

De acordo com o § 1º, do art. 1.313, do Provimento n° 029/2009, o “termo inicial de fluência do prazo de prescrição da pretensão punitiva é a ciência da irregularidade pela Corregedoria Geral da Justiça”.

A interrupção da fluência desse prazo se dá com a instauração do PAD. Ante a ausência de normas relativas à interrupção de prazo prescricional de notários e registradores, aplica-se ao caso a Lei Complementar n. 46/1994, que institui o Regime Jurídico Único dos servidores públicos civis da administração direta, das autarquias e das fundações públicas do Estado do Espírito Santo, que disciplina o seguinte:

Art. 157. O prazo da prescrição contar-se-á da data da publicação oficial do ato impugnado ou, da data da ciência, pelo interessado, quando não publicado.

§ 1º - Para a revisão do processo administrativo-disciplinar, a prescrição contar-se-á da data em que forem conhecidos os atos, fatos ou circunstâncias que deram motivo ao pedido de revisão.

§ 2º - Em se tratando de evento punível, o curso da prescrição começa a fluir da data do referido evento e interrompe-se pela abertura da sindicância ou do processo administrativo-disciplinar.

No mesmo sentido, o STJ já se posicionou reiteradas vezes, o que levou a Corte da Cidadania a editar o seguinte enunciado:

Súmula 635 - Os prazos prescricionais previstos no art. 142 da Lei n. 8.112/1990 iniciam-se na data em que a autoridade competente para a abertura do procedimento administrativo toma conhecimento do fato, interrompem-se com o primeiro ato de instauração válido - sindicância de caráter punitivo ou processo disciplinar - e voltam a fluir por inteiro, após decorridos 140 dias desde a interrupção. (SÚMULA 635, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 12/06/2019, DJe 17/06/2019)

Como o PAD foi instaurado em 15/12/2010, após o decurso do prazo de 140 dias, a prescrição pela pena aplicada ocorreu no dia 4/5/2015, anteriormente, inclusive, ao 2º julgamento do PAD.

 

De outro lado, rejeito o argumento trazido pelo TJES, pois inexiste hipótese de dupla interrupção de prazo prescricional. Tal como prescreve o art. 202, do Código Civil, a interrupção da prescrição ocorre apenas uma vez.

Em relação a adequação das datas, a timeline abaixo demonstra de forma cristalina a fluência do prazo da administração para punir o delegatário:

Diante dessas considerações, entendo que a penalidade administrativa aplicada ao então requerente foi fulminada pela prescrição da pretensão punitiva, o que torna o processo administrativo disciplinar nulo, para todos os fins de direito.

Ante o exposto, conheço da matéria de ordem pública suscitada e acolho a preliminar da ocorrência de prescrição, para declarar nulo o Processo Administrativo Disciplinar instaurado em face de Carlos Alberto dos Santos Guimarães, que importou na aplicação da pena de perda da delegação.

 

CONCLUSÃO


Em suma, pelo que tudo dos autos constam e, nos termos da fundamentação antecedente:

i)                  mantenho a decisão monocrática final, na parte em que declarou nulo o Ato TJES 1047/2010 (exclusivamente em relação a Carlos Alberto dos Santos Guimarães) e restabeleceu a validade do Ato 788/93 do Conselho da Magistratura, haja vista o preenchimento dos requisitos para ser considerado titular da serventia; 

ii)               não conheço do recurso adesivo interposto pela recorrente; 

iii)            acolho a preliminar de ocorrência de prescrição da pretensão administrativa sancionatória, para declarar nula a decisão do TJES que aplicou a Carlos Alberto dos Santos Guimarães a pena de perda da delegação. 

É como voto.

Intimem-se.

Publique-se nos termos do artigo 140 do RICNJ. Em seguida, arquivem-se, independentemente de nova conclusão.

 

Brasília, data registrada no sistema.

 

 

Maria Tereza Uille Gomes

Conselheira

 



[1] PCA 0000697-70.2008.2.00.0000

[2] Reinstaurado o PAD, somente veio a se esgotar essa esfera administrativa com a decisão do Conselho Superior da Magistratura ao negar provimento ao Recurso Administrativo em 27/3/2017 (Id 3198750, p. 29).