Conselho Nacional de Justiça

Gabinete da Conselheira Tânia Regina Silva Reckziegel

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0003058-06.2021.2.00.0000
Requerente: LUIZ GUILHERME MARQUES
Requerido: JUÍZO DA 1ª VARA DE FAMÍLIA DA COMARCA DE JUIZ DE FORA - MG e outros

 

EMENTA: RECURSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. INÉPCIA DAS RAZÕES RECURSAIS. RECURSO NÃO CONHECIDO. 

1. Recurso administrativo no qual se pretende a reforma da decisão terminativa que julgou o pedido improcedente e encaminhou cópia de documentos constantes nos   autos   à   Corregedoria   Nacional   de   Justiça   para   conhecimento e providências que entendesse cabíveis 

2. Pretende-se que este Conselho determine à Corregedoria Geral da Justiça do Estado de Minas Gerais providências para a atualização dos serviços judiciais da 1ª Vara de Família de Juiz de Fora/MG. 

3. Ainda que tenha sido observado o princípio do formalismo moderado, em conformidade com os artigos 2º, incisos VIII e IX, e 22, da Lei nº 9.784/1999, para o alcance da compreensão da pretensão recursal, o insurgente sequer combate os fundamentos da decisão guerreada de forma articulada para aprovisionar esta relatora de motivos congruentes para o entendimento da irresignação apresentada. 

4.  Recurso não conhecido. 



 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, não conheceu do recurso, nos termos do voto da Relatora. Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Plenário Virtual, 8 de outubro de 2021. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luiz Fux, Maria Thereza de Assis Moura, Luiz Fernando Tomasi Keppen, Tânia Regina Silva Reckziegel, Mário Guerreiro, Flávia Pessoa, Sidney Madruga, Ivana Farina Navarrete Pena, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, André Godinho, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Não votaram, em razão das vacâncias dos cargos, os representantes do Tribunal Superior do Trabalho, do Tribunal Regional Federal e da Justiça Federal.

RELATÓRIO 

Trata-se de recurso administrativo (Id’s 4371599 e 4370471) interposto pelo requerente contra decisão terminativa que julgou o pedido improcedente e encaminhou cópia de documentos constantes   nos   autos   à   Corregedoria   Nacional   de   Justiça   para   conhecimento e providências que entendesse cabíveis (Id 4349227). 

Reproduzo, inicialmente, o relatório da decisão recorrida: 

Trata-se de Pedido de Providências (PP), com pedido liminar, proposto pelo juiz de direito LUIZ GUILHERME MARQUES no qual pretende sejam impostas determinações à CORREGEDORIA-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS para que esta tome providências necessárias para a atualização dos serviços da 1ª Vara de Família de Juiz de Fora/MG. 

O requerente explica ter sido colocado em disponibilidade em 10 de fevereiro de 2021, com proposta de reaproveitamento feita pela CGJ em 24 de fevereiro do corrente ano, caso concordasse em participar de cursos oferecidos pela Escola Judicial Edésio Fernandes (Ejef) ou pela Escola Nacional de   Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam). Relata ter sido aprovado em 5 (cinco) dos 6 (seis) cursos, com previsão de término em 14.5.2021, e por isso haveria a possibilidade de retorno iminente à atividade.  

Porém, ressalta que antes de sofrer a punição, a unidade jurisdicional que ocupava possuía apenas 5 (cinco) processos em atraso e passados apenas 2 (dois) meses, encontra-se com 827 (oitocentos e vinte e sete) feitos nessa condição, sem providências por parte da Corregedoria.

Assim, pugna que este Conselho determine, liminarmente, que o Órgão Censor tome as providências necessárias para que o serviço seja colocado em dia.

Em   nova   petição,   além   de   reiterar   o   pedido   inicial,   o   requerente complementa a narrativa para afirmar ser vítima de assédio moral pelo TJMG “uma vez que, sendo o Juiz mais antigo da Entrância Especial do TJMG, e, estando inscrito para a   vaga   de   Desembargador   existente   na   18ª   Câmara   Cível,   ao   invés   de   ter   sido promovido,   na   sessão   de   10/02/2021,   poucos   minutos   antes   foi   colocado   em disponibilidade com vencimentos proporcionais, sendo recusada sua promoção por 20 votantes, mas, mesmo assim, 2 votantes optaram por sua promoção considerando injusta a verdadeira ‘armação’ para que o requerente, ao invés de ser promovido, ficasse afastado da própria atuação na 1ª Vara de Família, onde estava servindo” (Id4335625).

Descreve   sua   trajetória   profissional   para   destacar   sua “mentalidade inovadora   e   grande   produção   intelectual”, mas que   à   medida   em   que   foi   se aproximando do status de juiz mais antigo da entrância, teve contra si “idealizados” processos administrativos disciplinares.

Assinala que, retornando à atividade, é certo que haverá a votação do provimento da vaga no Tribunal, e se não for recusado por 17 (dezessete) votos, será o promovido por antiguidade.

Como forma de comprovar o acúmulo de feitos na unidade, o postulante junta aos autos requerimento protocolado pelo juiz substituto da 1ª Vara de Família da Comarca de Juiz de Fora/MG, João Batista Lopes, datado de 29 de abril de 2021, em que este solicita seu afastamento das atividades na 2ª Turma Recursal em razão do grande acervo processual da unidade - existência de 1.000 (um mil) processos conclusos para despachos e sentenças, além de um grande número de feitos com audiências a serem realizadas (Id 4346126).

Instado, o TJMG informa ter ouvido o substituto acima mencionado, juiz de direito auxiliar especial João Batista Lopes, o qual consigna que, ao assumir as atividades da unidade no dia 2.3.2021, encontrou-a numa situação crítica, com a manipulação, pelo postulante, dos dados da movimentação processual. Para endossar este ponto, afirma ter verificado que o então titular prolatou despachos em bloco; não apreciou pedidos de tutela de urgência; teve despachos e sentenças cassados pelo TJMG por inexistência de fundamentação; permitiu a condução de processos pelo Ministério Público quando determinava o atendimento do que viesse a ser pedido pelo parquet (Id4346291).

Quanto ao reaproveitamento do requerente, a Corte nega a existência dessa proposta. Esclarece ter havido a notificação para que o juiz realizasse cursos virtuais oferecidos pelas escolas judiciais oficiais em matérias voltadas para a gestão de pessoas, gestão de processos, e excelência no atendimento, com nova prorrogação do prazo de 90 (noventa) dias para a verificação do preenchimento das condições então colocadas.

O requerido prossegue relatando ter realizado o cotejo entre a produtividade do juiz substituto, atualmente no desempenho das funções judicantes da 1ª Vara de Família da Comarca de Juiz de Fora/MG, com a do requerente e concluiu que, apenas no mês de março de 2021, o número de sentenças prolatadas superou a quantidade daquelas proferidas nos 12 (doze) meses anteriores, período de atuação do postulante.

A Corregedoria ainda reforça o fato de, em julho de 2018, após a realização de Correição Extraordinária Parcial, ter se verificado a prática irregular, pelo requerente, da condução dos processos e diversos outros fatos graves, como transferir ao assessor a assinatura de termos de tutela e curatela, de mandados de prisão, dentre outros, o que culminou na instauração do PAD nº 5688385-49.2020.8.13.0000.

Assinala   que,   diante   dos   fatos   relatados   pelo   juiz   substituto,   houve determinação para a realização de fiscalização na 1ª Vara de Família de Juiz de Fora/MG “para se apurar o teor dos despachos do Juiz de Direito Luiz Guilherme Marques, bem como para se averiguar, a partir de análise minuciosa dos processos, a fidedignidade dos dados de movimentação processual apresentados pelo requerente perante   o   CNJ,   notadamente   quanto   à   produtividade   do   juiz,   e   efetividade   e regularidade da prestação jurisdicional”.

Em nova petição, o requerente rebate as afirmações da Corte, destaca que ao assumir a vara, a encontrou dominada por esquema de corrupção e improdutividade, e aponta que o Judiciário mineiro sofre de uma “desfiguração da ética” (Id 4346230).

É o relatório.

Em manifestação posterior, o recorrente apresenta novas petições nas quais tece comentários sobre sua trajetória profissional, se queixa da forma como estaria sendo tratado depois de longos anos de magistratura, entendendo ser vítima de assédio moral. Colaciona aos autos relatório padrão de desempenho, produtividade e presteza no exercício jurisdicional de abril de 2021 (Id 4350972, 4369830).

Nova petição foi apresentada pelo recorrente na qual reitera os fatos iniciais e “uma vez que o número de casos resolvidos ou em vias de resolução, ao invés de diminuir ou manter-se estável, aumentou por conta da falta de conhecimento jurídico do substituto e também da CGJ, o caso é de o Conselho Nacional de Justiça tomar as providências necessárias para que, em o requerente voltar a atuar na Vara, não encontrá-la tumultuada, o que está acontecendo (Id 4371599).

O TJMG informa sobre as providências adotadas, entre elas a fiscalização na 1ª Vara de Família de Juiz de Fora (Id 4375841).

Outra manifestação do recorrente sobrevém aos autos para mais uma vez reafirmar sua atuação comprometida como juiz de direito, levantar suspeitas sobre a atuação de desembargadores do TJMG, colacionar novos documentos, prosseguindo dessa mesma forma em requerimentos sucessivos (Id’s 4387176, 4387340, 4394877, 4396764, 4402265, 4410289).

Após a Corte noticiar sobre a realização de Correição Extraordinária Parcial na 1ª Vara de Família da comarca de Juiz de Fora (Id 4388585), o recorrente se opõe ao resultado da apuração, faz acusações contra diversos atores processuais, suscita parcialidade sobre a forma de condução das atividades e que o “trabalho realizado pelo magistrado foi subestimado pela intenção de puni-lo a qualquer preço”, continuamente renovando os argumentos (Id’s  4402265, 4410289).

Nas contrarrazões apresentadas pelo TJMG, este afirma que o recorrente não teria questionado ou refutado os fundamentos da decisão, além do fato de a correição constatar a grave situação na condução dos trabalhos do juízo da 1ª Vara de Família pelo magistrado recorrente, com detecção de vários problemas enumerados em relatório (Id 4402008).

É o relatório.

 

VOTO 

O recurso é tempestivo e cabe aqui um pequeno esclarecimento quanto à observância do prazo recursal.  A decisão terminativa foi proferida em 7.5.2021 com manifestação tempestiva do magistrado recorrente em 20.5.2021 e confirmado o caráter recursal da pretensão em 28.5.2021, como prevalência do princípio do formalismo moderado adotado pela Lei do Processo Administrativo Federal (Lei nº 9.784/1999). 

No entanto, ainda em sede de admissibilidade recursal, a insurgência não cumpre o requisito da regularidade formal, porquanto o magistrado sequer combate os fundamentos da decisão guerreada de forma articulada para aprovisionar esta relatora de motivos congruentes para o entendimento da irresignação apresentada. 

As várias petições colacionadas pelo recorrente após a decisão monocrática demonstram apenas irresignações quanto à não promoção ao desembargo, o aumento da demanda processual na 1ª Vara de Família após sua colocação em disponibilidade, a falta de reconhecimento de sua notável atuação como juiz, e o fato de figurar como possível vítima de assédio moral, o que não são argumentos hábeis a modificar a monocrática (Id 4371599). 

Portanto, ainda que tenha sido observado o princípio do formalismo moderado, em conformidade com os artigos 2º, incisos VIII e IX, e 22, da Lei nº 9.784/1999, para o alcance da compreensão das razões recursais, o recorrente não demonstrou clareza na fundamentação quando da interposição de seu recurso (Id 4371599).

Sobre o tema, cito os seguintes precedentes do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ORDINARIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. RAZÕES RECURSAIS. MERA REPETIÇÃO DA PETIÇÃO INICIAL. REQUISITO DE ADMISSIBILIDADE DA REGULARIDADE FORMAL: INSATISFEITO. PRECEDENTES.

RECURSO NÃO CONHECIDO.

I - Não se conhece do recurso ordinário de mandado de segurança se as razões recursais, ao invés de apresentar os motivos pelos quais o acórdão recorrido não merece subsistir, não passam de cópia da petição inicial.

II - Para satisfazer o requisito de admissibilidade da regularidade formal, deve o recorrente instruir a petição de interposição com as razões recursais, nas quais devera impugnar o decisum recorrido, demonstrando o porquê do seu desacerto.

III - Precedentes do STJ: RMS n. 5.978/SP e REsp n. 38.610/PR.

IV - Recurso ordinário não conhecido" (STJ, RMS 5.749/RJ, Rel. Ministro ADHEMAR MACIEL, SEGUNDA TURMA, DJU de 24/03/97).

 

PROCESSUAL. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CANCELAMENTO DE PERMISSÕES PARA A EXPLORAÇÃO DE TRANSPORTE POR TAXI. INEXISTÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO.

INDEFERIMENTO DA INICIAL DO MANDAMUS.

I - O recurso não faz qualquer apreciação sobre os argumentos trazidos no acórdão recorrido, não atendendo aos preceitos insculpidos no art. 514 do CPC.

II - Agravo regimental improvido" (STJ, AgRg no RMS 15.605/RJ, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA TURMA, DJU de 20/10/2003).

 

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE. NÃO CONHECIMENTO.

1. O princípio da dialeticidade, que informa a teoria geral dos recursos, indica que compete à parte insurgente, sob pena de não conhecimento do recurso, infirmar especificamente os fundamentos adotados pela decisão objurgada, revelando-se insuficiente a mera repetição genérica das alegações já apreciadas pela instância a quo.

2. Nos termos dos arts. 514, II, 539, II, e 540, do Código de Processo Civil, as razões recursais dissociadas da realidade do acórdão recorrido constituem óbice inafastável ao conhecimento do recurso ordinário.

3. Agravo regimental improvido" (STJ, AgRg no RMS 19.481/PE, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, SEXTA TURMA, DJe de 14/11/2014).

Ante o exposto, voto pelo não conhecimento do recurso administrativo.

É como voto.

Após as intimações de praxe, arquive-se.

Brasília, data registrada no sistema.

Tânia Regina Silva Reckziegel

Conselheira relatora