Conselho Nacional de Justiça

Gabinete da Conselheira Jane Granzoto

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0010133-33.2020.2.00.0000
Requerente: ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL - SEÇÃO DO ESTADO DA BAHIA
Requerido: JUÍZO DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DA JUSTIÇA FEDERAL NO ESTADO DA BAHIA - BA

 

 

EMENTA: RECURSO ADMINISTRATIVO NO PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. JUSTIÇA FEDERAL DA 1ª REGIÃO. SEÇÃO JUDICIÁRIA DA BAHIA. EXISTÊNCIA DE NORMAS PRÓPRIAS QUE REGEM AS ATIVIDADES DOS(AS) MAGISTRADOS(AS) QUANTO AO PROCEDIMENTO DAS ORDENS DE PAGAMENTO. MATÉRIA JURISDICIONAL. INCOMPETÊNCIA DESTE CONSELHO. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 

1. Recurso contra decisão monocrática que julgou o pedido improcedente para que este Conselho expeça regulamento específico aos(às) magistrados(as) da Seção Judiciária da Bahia, com orientações de como proceder na expedição de alvarás, de ordens de pagamento de RPV’s e de precatórios em nome dos(as) advogados(as) das partes. 

2.  A existência de regramentos próprios que disciplinam a matéria, e condizentes com os preceitos legais de suporte, dispensa a edição de normas complementares por este Conselho.

3. Insatisfações voltadas contra providências determinadas em processos judiciais, diante do seu caráter jurisdicional, não podem ser conhecidas por este Conselho  que possui competência voltada ao controle “da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes” (art. 103-B, § 4º). Precedentes. 

4. Recurso conhecido e no mérito não provido. 

 

 


 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por maioria, negou provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora. Vencidos os Conselheiros Marcello Terto, Marcos Vinicius Jardim Rodrigues e Luiz Fernando Bandeira de Mello, que davam provimento ao recurso. Votou a Presidente. Ausente, justificadamente, o Conselheiro Mário Goulart Maia. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário, 4 de outubro de 2022. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, Sidney Madruga, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Manifestou-se oralmente o Conselheiro Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Doutor Daniel Blume.

RELATÓRIO 

 

 A EXCELENTÍSSIMA SENHORA CONSELHEIRA JANE GRANZOTO (RELATORA): Trata-se de Recurso Administrativo (Id. 4560735) interposto pela requerente, Ordem dos Advogados do Brasil - Seção do Estado da Bahia (OAB/BA),contra decisão que julgou improcedente o pedido (Id. 4537647).

  Reproduzo, inicialmente, o relatório da decisão recorrida: 

Trata-se de Pedido de Providências (PP) formulado pela ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SEÇÃO DO ESTADO DA BAHIA (OAB/DF) em face da SEÇÃO JUDICIÁRIA DA JUSTIÇA FEDERAL NO ESTADO DA BAHIA, por meio do qual requer ao Conselho Nacional de Justiça que expeça Regulamento dirigido aos Magistrados da Seção Judiciária do Estado, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, com orientações de como proceder diante da expedição de Alvarás e Ordens de Pagamento de Requisições de Pequeno Valor (RPVs) e Precatórios em nome dos advogados das partes, com o intuito de evitar exigências ilegais ou desnecessárias.

A requerente informa o recebimento de frequentes e reiteradas reclamações de advogados relativas a entraves criados por Magistrados da respectiva Seção Judiciária para expedição de alvarás e ordens de pagamentos de precatórios e RPVs, com destaque para (Id 4198151):

- Recusa de Expedição de Alvarás e Ordens de Pagamento de Precatórios e RPVs em nome de advogado, com Procuração para receber valores, devidamente acostada aos autos;

- Exigência de juntada de nova Procuração “Atualizada”, como condição para expedição de Alvarás e Ordens de Pagamento de Precatórios e RPVs;

- Exigência de juntada de Procuração Pública, como condição para expedição de Alvarás e Ordens de Pagamento de Precatórios e RPVs, mesmo já havendo procuração particular nos autos;

- Exigência de juntada de Procuração Pública para representação de parte analfabeta, como condição para expedição de Alvarás e Ordens de Pagamento de Precatórios e RPVs, mesmo já havendo procuração particular assinada, a rogo, e por duas testemunhas nos autos;

- Exigência de juntada de Contrato de Honorários Advocatícios, mesmo quando não se pretende realizar a dedução prevista no art. 22, § 4º da Lei 8.906/94;

- Exigência de juntada de declaração, firmada pela parte autora, de que nenhum valor, a título de honorários advocatícios convencionados, foi adiantado aos seus patronos, para posterior expedição de Alvará ou Ordem de Pagamento;

- Exigência de juntada de Procuração com firma reconhecida;

- Recusa em realizar a dedução dos honorários advocatícios contratuais prevista no art. 22, § 4º da Lei 8.906/94, nos termos do contrato acostado aos autos.”

Descreve que essas condutas ocorrem de modo consistente em inúmeras Varas Federais da Seção Judiciária da Bahia, o que permite percepção de uma política judiciária que fere expressivamente as prerrogativas do profissional da advocacia e as garantias do cidadão e do Estado Democrático de Direito, o que confere legitimidade ao Conselho Seccional para o pleito.

Apresenta legislação correlata à matéria, como o art. 133 da Constituição Federal de 1988, arts. 104 e 105 do Código de Processo Civil e art. 22 da Lei n. 8.906/1994, destacando que a criação de óbices para a expedição de alvarás ou ordens de pagamento ao advogado cria obstáculos para o livre exercício de sua atividade profissional, sem respaldo legal ou constitucional, o que viola os arts. 5º, II e XIII da CF/1988, assim como o princípio da legalidade previsto no art. 37 da CF/1988.

Postula a procedência do Pedido de Providências “para que este Colendo Conselho Nacional de Justiça expeça Regulamento, dirigido aos Magistrados da Seção Judiciária da Bahia, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, com orientações de como proceder quando da expedição de Alvarás e Ordens de Pagamento de RPVs e Precatórios em nome dos Advogados das partes, com base nas normas pátrias, mormente o respeito às cláusulas especiais previstas no art. 105 do CPC, obediência ao Art. 2º, II da Lei 13.874/2019, ao art. 22 e seguintes da Lei 8.906/94, mormente no sentido de evitar exigências ilegais e/ou desnecessárias, que atrasam ainda mais o andamento dos processos judiciais, já suficientemente moroso em nosso país.”

Solicitadas informações, o TRF1 colacionou aos autos manifestações dos magistrados que compõem a referida Seção Judiciária, os quais, em sua significativa maioria, afirmaram cumprir, para a expedição de alvarás e ordens de pagamento de precatórios e RPVs, regramentos expedidos pelo Conselho da Justiça Federal (CJF) e pela Corregedoria Regional da Justiça Federal da 1ª Região, expressas na Resolução CJF 458/2017, Capítulo III e na Orientação Normativa Coger 10134629 (Id’s 4413159, 4413160, 4413161, 4413162, 4413163, 4413216, 4413217, 4413218, 4413220, 4413221, 4413222, 4413223, 4413224, 4413225, 4413226, 4413228, 4413229, 4413231, 4413232, 4413233, 4413234, 4413235, 4413236, 4413239, 4413240, 4413241, 4413243).

A Corte acrescenta que o sistema para expedição de requisições de pagamento (precatório e RPV) está disponível e funcionando regularmente para emissão de ofícios requisitórios com e sem destaque de honorário contratual em favor dos advogados, seguindo estritamente as disposições da Resolução CJF 458/2017, especialmente do Capítulo III.

Tendo em vista a relevância e especificidade da matéria abordada neste expediente e a competência do Fórum Nacional de Precatórios (Fonaprec), nos termos da Resolução CNJ n. 158, de 22 de agosto de 2012, encaminhei os autos ao colegiado para conhecimento e emissão de parecer, o qual opinou pela improcedência do pedido, tendo em vista a existência de regramentos que regulam a expedição de requsitórios expedidos pelo CJF e pela Corregedoria Regional da Justiça Federal da 1ª Região (Id 4479106). O Parecer técnico foi aprovado por unanimidade pelo Comitê Nacional (Id 4479109).

O Fonaprec ressalta, ainda, que o detalhamento das orientações não é matéria a ser tratada na Resolução CNJ n. 303/2019, razão pela qual não cabe a discussão em trabalhos que se realizem para a atualização e aprimoramento desse ato normativo.

Em seguida, a requerente apresentou petição em que salienta entender que a Orientação Normativa COGER 10134629, observada pela maioria dos Juízes Federais nas respectivas unidades da Seção Judiciária da Bahia, “fere de morte a Constituição Federal e a legislação infraconstitucional sobre o tema”, especialmente a alínea “h” da exposição de motivos e o §2º do art. 2º, reitera os argumentos apresentados na petição inicial e pugna pelo não acolhimento do parecer (Id 4502067).

É o relatório.

Em sede recursal, a recorrente afirmou que a pretensão se trata de uma demanda coletiva da advocacia local, diante de óbices impostos ao exercício das prerrogativas da classe no levantamento de alvarás, de ordens de pagamento, e quanto à retenção de honorários contratuais, condutas essas que violariam: i) o princípio da legalidade ao não observar o art. 105, do Código de Processo Civil (CPC), e o art. 22, §4º, da Lei nº 8.906/1994; ii) a moralidade administrativa, pois muitas das decisões não estariam fundamentadas; iii) e da eficiência, já que as várias deliberações nesse sentido ensejariam uma multiplicidade de recursos.

Pontuou a existência das seguintes práticas na liberação de alvarás e nas ordens de pagamento de precatórios e de RPV’s: i) recusa de expedição em nome de advogado(a), mesmo que exista nos autos procuração com poderes especiais; ii) exigência de procuração atualizada ou por instrumento público quando a parte for analfabeta, ainda que conste instrumento particular assinado a rogo e com duas testemunhas; iii) obrigação de juntada de contrato de honorários advocatícios, mesmo quando não se pretende realizar a dedução prevista no art. 22, §4º, da Lei 8.906/94; iv) exigência de declaração firmada pela parte autora de que nenhum valor, a título de honorários advocatícios convencionados, foi adiantado aos(às) patronos(as); v) apresentação de procuração com firma reconhecida; vi) recusa em realizar a dedução dos honorários advocatícios contratuais do art. 22, § 4º, da Lei 8.906/94, nos termos do contrato.

Assim, diante da existência de documentos que comprovariam as alegações e por entender que se trata de uma política sistemática adotada pelos(as) magistrados(as) da respectiva seção judiciária, a OAB pugnou pelo conhecimento e procedência deste recurso para se editar normas complementares que garantam aos(às) advogados(as), no âmbito da SJBA, a plena eficácia de suas procurações e contratos quando presentes os pressupostos legais, em especial norma que vede a limitação ex officio de honorários contratuais quando da efetivação do art. 22 §4º, da Lei 8906/94.

Nas contrarrazões, o Diretor do Foro da Seção Judiciária da Bahia considera que a pretensão demonstra tentativa de se impor a este Conselho a edição de normas a respeito da matéria que se encontra regulamentada junto ao Conselho da Justiça Federal (CJF) e ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) (Id. 4581327).

Afastou eventual violação ao princípio da legalidade: i) porquanto o sistema para edição de requisições de pagamento (de precatório e de RPV) está em funcionamento regular para a emissão de ofício requisitório com e sem destaque de honorário contratual em favor de advogados(as); ii) que as decisões judiciais foram devidamente fundamentadas e isso repele violações ao princípio da moralidade; iii) a via recursal representa proteção aos princípios do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório; iv) todas as decisões citadas pela recorrente seriam jurisdicionais.

Ao fim, pugna pela manutenção da decisão proferida, negando-se provimento ao recurso.

É o relatório.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

VOTO


A EXCELENTÍSSIMA SENHORA CONSELHEIRA JANE GRANZOTO (RELATORA): O recurso é tempestivo e dele conheço.

Com a interposição do apelo (Id. 4560735), pretende-se a reforma da decisão terminativa que julgou o pedido improcedente (Id. 4537647).

A seguir, reproduzo os fundamentos da monocrática proferida pela minha antecessora (Id. 4537647):

Conforme relatado, a requerente pretende que o CNJ expeça regulamento específico para os magistrados da Seção Judiciária da Bahia, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, com orientações de como proceder para expedição de alvarás e ordens de pagamento de RPV’s e precatórios em nome dos advogados das partes.

Na esteira do parecer exarado pelo Fórum Nacional de Precatórios (Fonaprec), não se verifica a necessidade de este CNJ expedir novo regramento dirigido à Seção Judiciária respectiva para orientações solicitadas, diante da existência de regramentos específicos que vêm sendo utilizados pelo requerido (Ids 4479106 e 4479109).

Cumpre-me pontuar que a Resolução CNJ n. 303/2019 dispõe sobre a gestão de precatórios e respectivos procedimentos operacionais no âmbito do Poder Judiciário e prevê em seu art. 32, §4º, que “[f]aculta-se aos tribunais estabelecer critérios para a localização do beneficiário como cautela prévia ao pagamento do precatório, autorizada, em qualquer caso, se houver, a liberação do valor correspondente à penhora, à cessão e aos honorários sucumbenciais e contratuais”.

Nesse sentido, verifica-se que o CJF expediu a Resolução nº 670, de 10 de novembro de 2020, ato normativo de caráter complementar às regras estabelecidas pela Resolução CNJ nº. 303/2019, disciplinando a expedição, gestão e pagamento de requisições judiciais previstas no art. 100 da CF/1988:

“CAPÍTULO III DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

Art. 18. Ao advogado será atribuída a qualidade de beneficiário quando se tratar de honorários sucumbenciais e de honorários contratuais. (Alterado pela Resolução n. 670, de 10 de novembro de 2020)

§ 1º Os honorários sucumbenciais não devem ser considerados como parcela integrante do valor devido a cada credor para fins de classificação do requisitório como de pequeno valor, sendo expedida requisição própria. (Incluído pela Resolução n. 670, de 10 de novembro de 2020)

§ 2º Os honorários contratuais devem ser considerados como parcela integrante do valor devido a cada credor para fins de classificação da espécie da requisição (precatório ou requisição de pequeno valor). (Incluído pela Resolução n. 670, de 10 de novembro de 2020)

§ 3º Em se tratando de RPV em que houve renúncia, o valor devido ao beneficiário somado aos honorários contratuais não pode ultrapassar o valor máximo estipulado para tal espécie de requisição. (Incluído pela Resolução n. 670, de 10 de novembro de 2020)

§ 4º Tratando-se de ação coletiva, os honorários de sucumbência serão considerados globalmente para efeito de definição da modalidade de requisição. (Incluído pela Resolução n. 670, de 10 de novembro de 2020)

Art. 18-A. Caso o advogado pretenda destacar do montante da condenação o que lhe couber por força de honorários contratuais, na forma disciplinada pelo art. 22, § 4º, da Lei n. 8.906, de 4 de julho de 1994, deverá juntar aos autos o respectivo contrato, antes da elaboração da requisição de pagamento. (Incluído pela Resolução n. 670, de 10 de novembro de 2020)

Art. 18-B. Havendo destaque de honorários contratuais, os valores do credor originário e do advogado deverão ser solicitados na mesma requisição, em campo próprio, ou por outro meio que permita a vinculação. (Incluído pela Resolução n. 670, de 10 de novembro de 2020)

Art. 18-C. Os valores devidos pelo exequente a título de honorários sucumbenciais ao advogado público, a que alude o § 19 do art. 85 do Código de Processo Civil, serão destacados de seu crédito, desde que autorizados, na requisição de pagamento, em campo que permita a correta identificação da cessão de crédito. (Incluído pela Resolução n. 670, de 10 de novembro de 2020)"

 

Outrossim, no âmbito da Seção Judiciária da Justiça Federal no Estado da Bahia, a matéria foi especificamente disciplinada por meio de Orientação da Corregedoria Regional 10134629, disciplinando a transferência e o levantamento de depósitos judiciais no âmbito de sua jurisdição, e assim estabelece:

“CONSIDERANDO:

a) a competência do corregedor regional, prevista no art. 41, XVII, da Lei 5.010, de 30 de maio de 1966, combinado com o art. 23, VII, do Regimento Interno do TRF da 1ª Região, para expedir instruções e orientações normativas destinadas ao aperfeiçoamento, à padronização e à racionalização dos serviços forenses da primeira instância;

b) a possibilidade de substituição do mandado de levantamento pela transferência eletrônica de valor depositado em conta vinculada ao juízo para outra indicada pelo exequente, na forma do parágrafo único do artigo 906 do Código de Processo Civil;

c) a necessidade de economia de gastos em razão das restrições orçamentárias decorrentes da EC 95/2016;

d) que a Resolução CJF 458/2017, no artigo 40, §§ 2º e 3º, autoriza que os depósitos bancários sejam levantados mediante a expedição de alvará ou meio equivalente;

e) a liberação de crédito mediante meio equivalente ao alvará prevista no § 5º do artigo 386 do Regimento Interno do Tribunal Regional Federal da Primeira Região;

f) o princípio da eficiência da administração pública e a necessidade de se assegurar a razoável duração dos processos judiciais; e

g) a necessidade de uniformização dos procedimentos relativos ao levantamento de depósitos judiciais em contas vinculadas aos juízos, para evitar lesão de difícil reparação a qualquer das partes e assegurar o resultado útil do processo;

h) o entendimento consolidado no Superior Tribunal de Justiça de que o magistrado pode determinar a apresentação de instrumentos de procuração mais recentes do que os presentes nos autos, com fulcro no poder geral de cautela;

RESOLVE:

Art. 1º A transferência e o levantamento de depósitos judiciais no âmbito da Justiça Federal da 1ª Região obedecerão ao disposto nesta orientação normativa”.

Art. 2º No levantamento de depósitos judiciais, o juiz deverá, por meio de ofício ou na própria decisão, determinar a transferência eletrônica dos valores depositados em conta vinculada ao juízo para outra indicada pelo exequente, e o uso de alvará ou mandado de levantamento de valores deverá restringir-se às situações em que se mostre a impossibilidade do uso de meios eletrônicos.

§1º A determinação de transferência entre contas deverá conter os nomes das partes, seus números de inscrição no CPF ou CNPJ, o número do processo, o número da conta e o valor a ser transferido.

§ 2º Nos casos em que a conta informada é de titularidade do advogado ou de sociedade devidamente registrada na Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, dever-se-á observar a existência de procuração válida, com poderes especiais expressos para receber e dar quitação, podendo ser exigida excepcionalmente, por meio de decisão fundamentada, a apresentação de instrumento de procuração atualizado, diante das peculiaridades do caso concreto.

Art. 3º As transferências tratadas por esta orientação normativa reger-se-ão pelas normas aplicáveis ao sistema bancário.

§ 1º O beneficiário deverá arcar com os custos da operação bancária, que serão descontados automaticamente do montante transferido pela instituição financeira.

§ 2º Os valores transferidos estarão sujeitos à retenção da contribuição para o PSS, se houver, e do imposto de renda, nos termos da lei.

Art. 4º Deverá o juiz responsável determinar a juntada ao processo respectivo de informação sobre o cumprimento da ordem, no prazo de até 10 dias da transferência.

Parágrafo único. A informação deve ser fornecida pela instituição bancária depositária, com a especificação das contas de origem e de destino, a respectiva titularidade e a indicação da eventual existência de saldo remanescente.

Art. 5º Esta orientação normativa entrará em vigor na data da sua publicação e revogará a Orientação Normativa Coger 7318728 e a Portaria COGER 8388486.”

Assim, não se verifica a necessidade de mais um regramento a ser expedido pelo CNJ direcionado aos magistrados da justiça federal baiana. Noutro giro, não há nestes autos comprovação de atos administrativos irregulares praticados no âmbito da referida Seção Judiciária, podendo a requerente impugnar eventual irregularidade comprovada, que – estando na esfera de competência do CNJ – poderá ser analisada por meio da via adequada.

A requerente argumenta que o art. 2º, §2º da Orientação da Corregedoria Regional 10134629, bem como a alínea “h” da exposição de motivos, acima transcritos, ferem a Constituição Federal de 1988 e a legislação infraconstitucional que regulamenta o tema, ao permitir, excepcionalmente, por meio de decisão fundamentada, a solicitação, pelo magistrado, da apresentação de instrumento de procuração atualizado, diante das peculiaridades do caso concreto sob o crivo do poder geral de cautela do(a) magistrado(a).

Neste ponto, cumpre tecer as seguintes ponderações.

O art. 105 do CPC preconiza que o instrumento de procuração que conte com cláusula específica para receber e dar quitação confere ao advogado habilitação para a prática de todos os atos consignados, por regular outorga da parte. O §4º do referido artigo dispõe, ainda, que tal instrumento de outorga de poderes é eficaz para todas as fases do processo, “salvo disposição expressa em sentido contrário constante do próprio instrumento”.

Portanto, à exceção das hipóteses em que a validade tenha sido condicionada pelo próprio outorgante ou por expressa disposição legal, não há que se falar em esgotamento da vigência do instrumento de procuração.

A par do exposto, estritamente por haver hipóteses excepcionais em que a própria lei ou a parte outorgante estipula validade à procuração é que não verifico irregularidade na disposição constante na Orientação da Corregedoria Regional, que prevê a possibilidade excepcional, por decisão fundamentada, de apresentação do instrumento de procuração atualizado, diante das peculiaridades do caso concreto.

No mesmo contexto, a despeito de a requerente alegar a inconstitucionalidade da norma, ao CNJ somente competiria o afastamento da incidência deste ato por inconstitucionalidade se houvesse análise da matéria pelo STF. Nesse sentido é o que estabelece a Emenda Regimental n. 04/2021 do CNJ.

ATO NORMATIVO. EMENDA REGIMENTAL. COMPETÊNCIA DO PLENÁRIO DO CNJ PARA, NO EXERCÍCIO DE SUAS ATRIBUIÇÕES, AFASTAR, POR MAIORIA ABSOLUTA, A INCIDÊNCIA DE NORMA TIDA POR INCONSTITUCIONAL. PRECEDENTES DO STF. ATO APROVADO. (CNJ - ATO – Ato Normativo - 0000246-88.2021.2.00.0000 - Rel. LUIZ FUX - 324ª Sessão Ordinária - julgado em 09/02/2021).

 

Dessa forma, acolho integralmente o parecer do Fonaprec ante a ausência do reconhecimento de inconstitucionalidade da matéria regulamentada pela Orientação da Corregedoria Regional 10134629 e da Resolução CJF n. 670/2020, assim como se faz desnecessária a expedição de novo regulamento aos(às) juízes(as) da Seção Judiciária da Bahia com orientações de como proceder quando da expedição de alvarás e ordens de pagamento de RPVs e precatórios em nome dos advogados das partes.

Ante o exposto, julgo improcedente o pedido formulado e determino o arquivamento dos autos, com fulcro no art. 25, X, do Regimento Interno do CNJ.

Intimem-se. Após, arquivem-se os autos.

Brasília, data registrada no sistema.

Tânia Regina Silva Reckziegel

Conselheira relatora

 

 

A Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Judiciária da Bahia (OAB/BA), ora recorrente, reitera o pedido inicialmente proposto para que este Conselho edite normas complementares que garantam a eficácia das procurações e contratos em processos judiciais no momento da expedição de ordens de pagamento e de alvarás.  

Dentre as objeções abordadas e que estariam a representar violação às prerrogativas da advocacia estão: i) recusa na expedição das ordens em nome de advogado(a), mesmo com procuração nos autos e com poderes especiais; ii) exigência de procuração atualizada ou por instrumento público quando a parte for analfabeta, ainda que conste o mandato particular assinado a rogo e com duas testemunhas; iii) obrigação de juntada de contrato de honorários advocatícios, mesmo quando não se pretenda realizar a dedução prevista no art. 22, §4º, da Lei 8.906/94; iv) exigência de declaração firmada pela parte autora de que nenhum valor, a título de honorários advocatícios convencionados, foi adiantado aos(às) patronos(as); v) apresentação de instrumento de mandato com firma reconhecida; vi) recusa em realizar a dedução dos honorários advocatícios do art. 22, § 4º, da Lei 8.906/94, nos termos do contrato. 

Inicialmente, cumpre registrar que a Corregedoria Regional da Justiça Federal da 1ª Região expediu a Orientação Normativa Coger nº 10134629, que dispõe sobre a transferência e o levantamento de depósitos judiciais no âmbito da Justiça Federal da 1ª Região (Id. 4413246): 

Art. 1º A transferência e o levantamento de depósitos judiciais no âmbito da Justiça Federal da 1ª Região obedecerão ao disposto nesta orientação normativa. 

Art. 2º No levantamento de depósitos judiciais, o juiz deverá, por meio de ofício ou na própria decisão, determinar a transferência eletrônica dos valores depositados em conta vinculada ao juízo para outra indicada pelo exequente, e o uso de alvará ou mandado de levantamento de valores deverá restringir-se às situações em que se mostre a impossibilidade do uso de meios eletrônicos. 

[...] 

§ 2º Nos casos em que a conta informada é de titularidade do advogado ou de sociedade devidamente registrada na Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, dever-se-á observar a existência de procuração válida, com poderes especiais expressos para receber e dar quitação, podendo ser exigida excepcionalmente, por meio de decisão fundamentada, a apresentação de instrumento de procuração atualizado, diante das peculiaridades do caso concreto. (Destaquei) 

  

Pela parte final do caput do art. 2º, nota-se que a emissão de alvarás se tornou uma excepcionalidade no âmbito da 1ª Região, pois restrita às situações em que não se mostre possível o uso de meios eletrônicos. 

Por conseguinte, sobre a possibilidade de se exigir procuração válida, é necessário observar que esta ocorre nas situações em que a conta informada para recebimento de valores não é de titularidade da parte, mas do(a) advogado(a) ou da respectiva sociedade, facultando-se ao(à) juiz(a) exigir o instrumento, por decisão fundamentada, a partir das peculiaridades do caso concreto.  

O dispositivo, portanto, não veicula uma condição para o levantamento de valores, porque se assim o fosse, se tornaria ilegal, mas sim uma faculdade ao(à) julgador(a), a depender da situação fática. Ao assim proceder, a hipótese legal vai ao encontro da jurisprudência firmada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (STJ), como se colhe dos precedentes a seguir citados: 

PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO - EXIGIBILIDADE DE PROCURAÇÃO MAIS RECENTE PARA O LEVANTAMENTO DE NUMERÁRIO - POSSIBILIDADE - PRECEDENTES - INCIDÊNCIA DA SÚMULA 83/STJ. 

1. É pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de que o magistrado, seja em razão do poder geral de cautela, seja em função do poder de direção formal e material do processo que lhe é conferido, pode exigir a apresentação de instrumento de procuração mais recente, sobretudo quando se trata do levantamento de numerário, pois, assim agindo, estará salvaguardando os interesses da parte representada. 

2. Agravo regimental não provido. 

(AgRg no Ag 1222338/DF, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/03/2010, DJe 08/04/2010) 

  

PROCESSUAL CIVIL. RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO JUDICIAL. LEVANTAMENTO DE VALORES. EXIGÊNCIA DE APRESENTAÇÃO DE PROCURAÇÕES ATUALIZADAS. DEMANDA TRINTENÁRIA. GRANDE NÚMERO DE AUTORES. SITUAÇÃO EXCEPCIONAL QUE JUSTIFICA A CAUTELA. 

1. Esta Corte é firme no sentido de que o magistrado pode determinar às partes que apresentem instrumentos de procurações mais recentes do que os presentes nos autos, em observância ao poder geral de cautela, quando a razoabilidade diante do tempo percorrido assim determinar. 

2. Precedentes: AgRg no REsp 873.296/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 23/02/2010, DJe 15/03/2010; entre outros. 

3. Agravo regimental a que se nega provimento. 

(AgRg no RMS 20.819/SP, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS), SEXTA TURMA, julgado em 24/04/2012, DJe 10/05/2012) 

  

Quanto à expedição de requisições de pagamento (de precatório e de RPV) também constam informes sobre a existência de sistema próprio e com funcionamento regular para a emissão de ofícios requisitórios, com e sem destaque de honorário contratual em favor dos(as) advogados(as), seguindo estritamente as disposições da Resolução do Conselho da Justiça Federal (CJF) nº 458/2017, que regulamentou a matéria (Id. 4413459). 

O que se verifica é a existência de regramentos próprios e suficientes que disciplinam o tema no âmbito da 1ª Região da Justiça Federal. 

Outra não foi a conclusão externada pelo Fórum Nacional de Precatórios (Fonaprec), em parecer sobre o tema, solicitado pela então relatora, a Conselheira Tânia Regina Silva Reckziegel (Id.4479106): 

E, especificamente editada para disciplinar a matéria junto à Seção Judiciária indicada neste procedimento, a Orientação da Corregedoria Regional correspondente disciplina que: 

[...] 

A existência desse regramento revela a desnecessidade de nova regulamentação, expedida pelo CNJ e dirigida à Seção Judiciária da Justiça Federal da Bahia, não se inferindo, das manifestações prestadas pelos muitos magistrados que juntaram suas respostas a este procedimento, conduta que pudesse implicar em indevida política judiciária. 

  

Aqui também se registrou a observância das normas pela ampla maioria dos(as) magistrados(as) integrantes da Seção Judiciária da Bahia (Id. 4413160). 

Para além da análise dos atos, ainda há de se observar que as insatisfações quanto às determinações judiciais para se apresentar nos autos procuração atualizada ou por instrumento público quando a parte for analfabeta, colacionar declaração firmada pela parte autora sobre a ausência de antecipação de honorários aos(às) advogados ou mesmo a recusa de juízes(as) em realizar a dedução dos honorários contratuais, à vista do disposto no art. 22, § 4º, da Lei 8.906/94, são decisões proferidas no bojo de processos judiciais. 

Por isso, as situações descritas não atraem a atuação desta Casa, que possui competência constitucional voltada ao controle “da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes” (art. 103-B, § 4º). Assim, não poderia este Conselho interferir em decisões judiciais, uma vez que o sistema possui mecanismos próprios para a impugnação destas, além de eventual ingerência representar violação à reserva de jurisdição, em verdadeiro prejuízo à independência funcional conferida à magistratura. 

Sobre o tema, confira a jurisprudência: 

RECURSO ADMINISTRATIVO EM RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. MATÉRIA DE NATUREZA EMINENTEMENTE JURISDICIONAL. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME. RECURSO ADMINISTRATIVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 

1. Os fatos narrados neste expediente tratam de matéria eminentemente jurisdicional. Em tais casos, deve a parte valer-se dos meios processuais adequados, não cabendo a intervenção do Conselho Nacional de Justiça. 

2. Com efeito, a correção do alegado equívoco jurídico do magistrado, na condução do processo, deve ser requerida pela via jurisdicional. O CNJ, cuja competência está restrita ao âmbito administrativo do Poder Judiciário, não pode intervir em decisão judicial para corrigir eventual vício de ilegalidade ou nulidade, porquanto a matéria aqui tratada não se insere em nenhuma das atribuições previstas no art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal. 

3. Recurso administrativo a que se nega provimento. 

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em RD - Reclamação Disciplinar - 0008072-68.2021.2.00.0000 - Rel. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA - 100ª Sessão Virtual - julgado em 25/02/2022). (Destaquei) 

  

RECURSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. APURAÇÃO DISCIPLINAR CONTRA MAGISTRADO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. PRETENSÃO QUE NÃO FOI OBJETO DO PEDIDO INICIAL. PEDIDO NOVO EM SEDE RECURSAL. IMPOSSIBILIDADE. NÃO CONHECIMENTO. TRÁFICO DE DROGAS. EXAME PERICIAL DO TEOR DE PUREZA SOBRE MATERIAL APREENDIDO. NÃO OBRIGATORIEDADE. MATÉRIA PROCESSUAL PENAL. NATUREZA JURISDICIONAL DA DECISÃO. IMPOSSIBILIDADE DE REGULAMENTAÇÃO PELO CNJ. NÃO PROVIMENTO. 

1 – Não se conhece de pedido formulado sede recursal que não foi arguida na petição inicial. 

2 – O Pedido de Providências não constitui instrumento procedimental adequado para verificação disciplinar em face de magistrado do TJ/SP. 

3 - A decisão que defere ou não o pedido para realizar exame de teor de pureza sobre material entorpecente apreendido possui nítido caráter jurisdicional, e, não existindo previsão legal que torne sua realização obrigatória, não pode este Conselho, no exercício regular de suas competências administrativas, regulamentar a matéria. 

4 - As competências deste CNJ se restringem ao âmbito administrativo, correcional e financeiro do Poder Judiciário, não podendo intervir para regulamentar e direcionar os juízes em suas decisões jurisdicionais. Precedentes. 

5 – Recurso Administrativo parcialmente conhecido, e, nesse ponto, negado provimento.   

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PP - Pedido de Providências - Conselheiro - 0000611-45.2021.2.00.0000 - Rel. MARCOS VINÍCIUS JARDIM RODRIGUES - 88ª Sessão Virtual - julgado em 11/06/2021). (Destaquei) 

  

Portanto, existindo normatização própria que corresponda às demandas buscadas pela recorrente e que outras objeções se referem a atos jurisdicionais, o recurso não merece provimento. 

Ante o exposto, conheço do recurso e, no mérito, nego provimento. 

É como voto. 

 

Após as intimações de praxe, arquivem-se os autos. 

  

Brasília, data registrada no sistema. 

  

Jane Granzoto 

Conselheira relatora 

 

 

 

 

 

VOTO PARCIALMENTE DIVERGENTE:

 

 Adoto, na íntegra, o bem lançado relatório firmado pela eminente Conselheira Relatora. Quanto ao mérito, no entanto, peço vênia a Sua Excelência para apresentar divergência pontual, pelas razões adiante aduzidas.

A eminente Relatora inicial do presente Pedido de Providências, então Conselheira Tânia Reckziegel, por decisão monocrática determinou o arquivamento do feito, acolhendo na íntegra o parecer do FONAPREC, registrando ser desnecessária a expedição de novo regramento para orientar aos magistrados como proceder quando da expedição de alvarás e ordens de pagamento de RPVs e precatórios em nome dos advogados das partes, dado que a matéria já estaria suficientemente regulamentada pela Orientação da Corregedoria Regional 10134629 e pelo Resolução CJF n. 670/2020.

E em seu voto, a atual Relatora, eminente Conselheira Jane Granzotto, ao analisar o presente Recurso Administrativo, registra “a existência de regramentos próprios e suficientes que disciplinam o tema no âmbito da 1ª Região da Justiça Federal”, não havendo razões para atuação deste Conselho Nacional no caso concreto.

Todavia, verifica-se que uma das normas indicadas como válida, qual seja, a Orientação da Corregedoria Regional 10134629, ao tratar das procurações e contratos celebrados, criou exigência não conferida pelo legislador no sentido de restringir os direitos do advogado. Para melhor compreensão, transcrevo o trecho em questão:

Art. 2º. (...)

§ 2º Nos casos em que a conta informada é de titularidade do advogado ou da sociedade devidamente registrada na Ordem dos Advogados do Brasil – OAB, dever-se-á observar a existência de procuração válida, com poderes especiais expressos par receber e dar quitação, podendo ser exigida excepcionalmente, por meio de decisão fundamentada, a apresentação de instrumento de procuração atualizado, diante das peculiaridades do caso concreto.

 

 

Com efeito, ao prever que poderá ser exigida, ainda que que por decisão fundamentada, a apresentação de instrumento de procuração “atualizado”-, a Corte Requerida impôs restrição temporal ao exercício profissional da advocacia, na medida em que estabeleceu condição sem respaldo de lei.

Matéria semelhante é enfrentada no PCA 0004864-23.2014.2.00.0000, em julgamento também na sessão de hoje[1], de relatoria da eminente Conselheira Salise Sanchotene.

Vale lembrar que, a teor do Código Civil brasileiro, as procurações conferidas aos advogados por seus constituintes são o instrumento de uma modalidade específica de contrato, qual seja, o mandato. Pois não há para tal espécie contratual a imposição de condição temporal específica de validade, sendo certo que, entre as hipóteses legais de sua cessação, não se encontra o decurso de qualquer lapso temporal específico. Veja-se o texto legal:

 

“CAPÍTULO X
Do Mandato

Seção I
Disposições Gerais

Art. 653. Opera-se o mandato quando alguém recebe de outrem poderes para, em seu nome, praticar atos ou administrar interesses. A procuração é o instrumento do mandato.

Art. 654. Todas as pessoas capazes são aptas para dar procuração mediante instrumento particular, que valerá desde que tenha a assinatura do outorgante.

§ 1o O instrumento particular deve conter a indicação do lugar onde foi passado, a qualificação do outorgante e do outorgado, a data e o objetivo da outorga com a designação e a extensão dos poderes conferidos.

(...)

Art. 682. Cessa o mandato:

I - pela revogação ou pela renúncia;

II - pela morte ou interdição de uma das partes;

III - pela mudança de estado que inabilite o mandante a conferir os poderes, ou o mandatário para os exercer;

IV - pelo término do prazo ou pela conclusão do negócio.”(grifamos)

 

Dessa forma, parece claro, data vênia, que a criação da aludida condição temporal restritiva não encontra respaldo no ordenamento jurídico pátrio. Ao contrário, significou nítida afronta ao princípio da legalidade, insculpido como direito fundamental no artigo 5º, II, da Carta Magna, in verbis:

 “Art. 5º (...)

 II - ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;” 

 

Não há dúvidas, como bem registrado pela nobre Relatora, que é possível ao Magistrado, com fulcro no seu poder geral de cautela para a condução dos processos judiciais, à luz de circunstâncias muito específicas e de maneira fundamentada, determinar a apresentação de novo instrumento de procuração nos autos. Todavia, tal previsão, em norma abstrata, contra legem, traz inegável e indesejável subjetivismo. 

É exatamente o que se depreende do seguinte precedente, oriundo do egrégio Superior Tribunal de Justiça, in verbis:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. DETERMINAÇÃO JUDICIAL PARA APRESENTAÇÃO DE INSTRUMENTO DE PROCURAÇÃO MAIS RECENTE. POSSIBILIDADE. PODER GERAL DE CAUTELA. 

(...) 

2. O magistrado, na condução do processo e em observância ao poder geral de cautela, pode determinar às partes que apresentem instrumento de procuração mais recentes do aquele que consta dos autos, mormente considerado o fato de que, no caso dos autos, a procuração foi outorgada há mais de 25 anos. 

3. "É pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de que o magistrado, seja em razão do poder geral de cautela, seja em função do poder de direção formal e material do processo que lhe é conferido, pode exigir a apresentação de instrumento de procuração mais recente, sobretudo quando se trata do levantamento de numerário, pois, assim agindo, estará salvaguardando os interesses da parte representada" (AgRg no Ag 1.222.338/DF, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 08/04/2010). No mesmo sentido: REsp 830.158/MG, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 23/04/2009; REsp 229.068/SP, Rel. p/ acórdão Ministro Paulo Gallotti, Sexta Turma, DJe 22/09/2008. 

4. Agravo regimental não provido. (AgRg no REsp 1.189.411/PR, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, Primeira Turma, DJe 17/11/10) (grifamos) 

Há que se considerar, portanto, sempre as circunstâncias do caso concreto, o que de modo algum respalda a existência da norma abstrata impugnada no presente PCA.

Não é de hoje que este Conselho vem decidindo pela impossibilidade de estabelecimento de condições restritivas para o levantamento de alvarás por advogados regularmente constituídos nos autos. Veja-se, a título de exemplo, a ementa do julgamento do PCA nº 0002350-73.2009.2.00.0000:

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA. OFÍCIO CIRCULAR 53/2008/CGJ/TJ-SC. EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ. INTIMAÇÃO DE ADVOGADO PARA APRESENTAÇÃO DE DADOS BANCÁRIOS DA PARTE. DIREITOS DO ADVOGADO. LEI 8.906/94. PROCEDÊNCIA.

1. Pretensão de desconstituição da determinação da Corregedoria-Geral do TJ/SC aos cartórios judiciais, no Ofício Circular n. 53/2008/CGJ/TJ-SC, de  14.07.2008, no sentido de que, na ausência dos dados do beneficiário do alvará, seja intimado o advogado da parte para que forneça tais informações.

2. Se o advogado possui poderes especiais para receber e dar quitação, não é válido o ato restritivo da possibilidade de expedição, em seu nome, de alvará para levantamento de crédito.

3. É necessária a expedição de novo ato pela Corregedoria-Geral de Justiça de Santa Catarina, em substituição ao Ofício Circular n. 53/2008/CGJ/TJ-SC, com o sentido de afastar interpretações restritivas do direito dos advogados à expedição de alvará em seu nome, quando detenham poderes especiais para receber e dar quitação.

Procedência do pedido. (CNJ - PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0002350-73.2009.2.00.0000 - Rel. JOSÉ ADONIS CALLOU DE ARAÚJO SÁ - 90ª Sessão Ordinária - julgado em 15/09/2009). 

Por fim, importa consignar, ainda, que a competência e a responsabilidade para apuração e aplicação de sanções em relação às condutas praticadas por advogados que importem em locupletamento em detrimento de seus clientes, nos exatos termos da Lei n. 8.906/94, é da Ordem do Advogados do Brasil:

Art. 34. Constitui infração disciplinar: (...)

I – locupletar-se, por qualquer forma, às custas do cliente ou da parte adversa, por si ou interposta pessoa;

Art. 70. O poder de punir disciplinarmente os inscritos na OAB compete exclusivamente ao Conselho Seccional em cuja base territorial tenha ocorrido a infração, salvo se for cometida perante o Conselho Federal.

 

Pelo exposto, não havendo razão que justifique regramento que, escorado no poder geral de cautela, apresente óbices ao pleno exercício da advocacia no seu sentido mais amplo, peço vênia à eminente Relatora para apresentar PARCIAL DIVERGÊNCIA e voto pelo PROVIMENTO DO RECURSO para reconhecer a invalidade do artigo 2º, §2º, da Orientação da Corregedoria Regional 10134629.

É como voto.

Brasília, data registrada no sistema.

 

Conselheiro Marcello Terto

 



[1] Item 03 da 357ª Sessão Ordinária do CNJ,