Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0006169-03.2018.2.00.0000
Requerente: ANTONIO CLAUDOMIRO BENTES MONTEIRO
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ - TJPA

 


 

RECURSO EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ. DESIGNAÇÃO DE INTERINO. INOBSERVÂNCIA DAS REGRAS DO PROVIMENTO Nº 77/2018. RECURSO IMPROVIDO.

1. Procedimento que versa sobre a manutenção de interina em desacordo com o regramento estabelecido no Provimento nº 77/2018, da Corregedoria Nacional de Justiça (CN).

2. A designação de interino deve observar os requisitos constitucionais, legais e normativos, bem como os princípios da impessoalidade e moralidade.

3. Inexistência de argumentos capazes de infirmar a decisão monocrática.

4. Recurso a que se nega provimento.

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora. Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Plenário Virtual, 16 de abril de 2021. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luiz Fux, Maria Thereza de Assis Moura, Emmanoel Pereira, Luiz Fernando Tomasi Keppen, Rubens Canuto, Tânia Regina Silva Reckziegel, Mário Guerreiro, Candice L. Galvão Jobim, Flávia Pessoa, Ivana Farina Navarrete Pena, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, André Godinho, Maria Tereza Uille Gomes e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Não votou, em razão da vacância do cargo, o representante do Ministério Público da União.

 

RELATÓRIO

A EXMA. SRA. CONSELHEIRA MARIA TEREZA UILLE GOMES (RELATORA): Trata-se de recurso administrativo em Procedimento de Controle Administrativo interposto por Andressa Fabiane Magalhães de Freitas, em face da decisão monocrática que julgou parcialmente procedente o pedido e determinou ao Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA) a adequação da designação do interino que deverá responder pelo Cartório do 2º Ofício de Alenquer/PA, em observância ao Provimento nº 77/2018.

A recorrente aduz que sua designação como interina do Cartório do 2º Oficio de Alenquer/PA ocorreu dentro dos limites da discricionariedade administrativa, dada a impossibilidade de cumprimento do Provimento nº 77/2018.

Afirma que a regra constante do art. 5º, do Provimento nº 77/2018, não tem como ser observada na localidade, pois apesar de existirem 4 serventias extrajudiciais, apenas uma possui delegatário, que, inclusive, já responde por outra serventia na qualidade de interino.

Alega que o delegatário do 1º Ofício está praticando condutas inapropriadas, o que motivou a recorrente a enviar ofício ao Corregedor para noticiar as irregularidades.

Faz referência à dificuldade de acesso ao município de Alenquer/PA e a distância em relação a outros municípios próximos, a inviabilizar a designação de qualquer agente delegado de município “contíguo”.

Assevera ainda a impossibilidade de indicação de substitutos de outras serventias por não preencherem os requisitos § 1º, do art. 5º, do Provimento nº 77/2018. Ao final, pede o provimento do recurso para reformar a “decisão monocrática na parte que julgou parcialmente procedente o PCA, a fim de permitir/manter a designação da Recorrente como interina do 2º Ofício de Alenquer/PA, posto que realizada no melhor interesse público em razão das peculiaridades do caso concreto”.

O requerente do procedimento apresenta questionamento sobre a legitimidade da recorrente para interposição do Recurso Administrativo e junta requerimento formulado pelo titular do 1º Ofício de Alenquer/PA, no qual se coloca à disposição para exercer a interinidade do cartório do 2º Ofício do município (Id 4165540 - Pág. 5).

Instado a se manifestar, o Tribunal de Justiça do Estado do Pará afirma que “a nomeação da ora recorrente como Responsável Interina da Serventia do 2º Ofício da Comarca de Alenquer [...] não decorreu de mera deliberação ou descumprimento da normativa desse Órgão de Controle” (Id 4170621 - Pág. 2).

 

Acrescenta não ter sido fácil a nomeação da recorrente como Interventora da serventia, tendo sido indicado, inclusive, “o Titular do Cartório do 1º Ofício, Sr. Antônio Augusto da Costa Guimarães, que, à época, não aceitou a incumbência, bem como foi constatado junto ao Setor de Arrecadação da SEPLAN, que, também, possuía pendências com a prestação de contas de selos e pagamentos das taxas de fiscalização”.

Diz que a recorrente foi designada em data anterior à entrada em vigor do Provimento 77/2018 e rechaça a existência de vínculo de parentesco. A situação excepcional consubstanciada na designação da interina/recorrente está amparada no § 1º, do art. 36, da Lei 8.935/94 e nos princípios da moralidade e impessoalidade.

Aduz que o titular do 1º Ofício de Alenquer/PA está respondendo ao processo PA-DES-2020/49115-A, para de prestação de contas de selos não declarados.

   Esclarece, ainda, “que as demais Serventias existentes na Comarca, se tratam de Cartórios Pequenos, exclusivos de Registro Civil de Pessoas Naturais, todos vagos sob a gestão de Responsáveis Interinos e muito distantes da Sede da Comarca, não se coadunando com a regra do art. 5º do provimento nº 77/2018-CNJ, para nomeação de Responsável Interino, que se refere à delegatário de serviço”.

É o relatório.

Brasília, data registrada no sistema.

 

MARIA TEREZA UILLE GOMES

Conselheira

 

 

VOTO

A EXMA. SRA. CONSELHEIRA MARIA TEREZA UILLE GOMES (RELATORA): Trata-se de recurso administrativo contra decisão que julgou parcialmente procedente o pedido, nos seguintes termos (Id 4126445):

O presente procedimento gira em torno de 3 pontos principais:

1) Irregularidade na tramitação dos Processos Administrativos Disciplinares em face do requerente Antonio Claudomiro Bentes Monteiro (1º Processo n° 2015.7.001801-6; 2º PA MEM-2016/28365);

2) Ausência do repasse de 50% do valor da renda líquida da serventia ao requerente, em decorrência da determinação de afastamento do exercício das atividades durante a tramitação do segundo PAD - PA MEM-2016/28365;

3) Designação irregular da interventora do cartório, Andressa Fabiane Magalhaes de Freitas.

Após análise dos autos, entendo que o pedido merece ser julgado parcialmente procedente.

Em relação à tramitação dos PADs, o requerente aponta a ocorrência dos seguintes vícios: citação inválida; oitiva de testemunhas sem a presença do requerente e de sua advogada; ausência de imparcialidade do Juiz Processante; a não oitiva do processado e ofensa aos princípios do contraditório e da ampla defesa.

Após análise dos autos e das peças juntadas dos referidos processos, foi possível estabelecer a seguinte cronologia de tramitação, que por si só deixa evidenciada a inexistência dos vícios e das falhas apontados pelo requerente:

PRIMEIRO PAD - 2015.7.001801-6

23.3.2016

Determinação para realização de correição extraordinária no cartório – Processo n° 2015.7.001801-6 (3326081)

15.04.2016

Despacho indicando a data da realização da Correição Extraordinária no cartório (Id 3326081)

26.04.2016

Correição Extraordinária no cartório

 

Ocorrência de fatos com imensa gravidade (3326081 – p. 22)

“imediata instauração de Processo Administrativo. para apuração dos fatos constados nessa Correição Extraordinária, no qual Inclusive acreditamos, salvo melhor entendimento de Vossa Excelência, deverá inclusive ser analisada a necessidade de uma interdição imediata do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Pará no Cartório Extrajudicial do 2° Ofício da Comarca de Alenquer”.

Relatório da correição

“foi constatada a existência de 17 (dezessete) títulos de crédito (relação em anexo) em que os devedores efetuaram os seus pagamentos diretamente no cartório, e, este até a data da correição não havia efetuado o repasse dos valores recebidos as duas Instituições credoras (BANCO ITAÚ S/A e BANCO BRADESCO S/A).

12.6.2016

Instauração de PAD (Id 3326081 – fl. 47)

Portaria PAD (Id 3326081 – fl. 48)

27.9.2016

Petição da filha do requerente dando conta das inúmeras comorbidades do titular (Id 3326081 – fl. 56)

Atestado médico – 3326081 – fl. 60

17.10.2016

Defesa Prévia

Informa a existência de Boletim de Ocorrência 51/2016.000168-7 contra Emerson – tabelião substituto até 2012, afastado da serventia, mas que frequentava o lugar e se apossava dos valores

5.6.2017

Nova Portaria do PAD em substituição à anterior (Id 3326081 – fl. 89)

6.11.2017

Depoimento da Janilce Sousa da Silva. Trabalho no cartório de 1997-2017. “Que o tabelião Antônio Claudiomiro não tinha conhecimento a respeito dos fatos”. (Id 3326081 - fl. 132)

16.11.2017

Diligência do juiz à residência do requerente para verificação do seu estado de saúde (Id 3326081 - fl. 140)

5.4.2018

Parecer da Comissão Processante final concluindo pela aplicação da pena de perda de delegação (Id 3326081 - fls. 180/185)

22.8.2018

Decisão da Corregedora Geral das Comarcas do Interior:

Indicação da necessidade de realização de perícia (fls. 195/196)

“há indícios, ainda, de que o processado se encontra inválido para o exercício das funções cartoriais, o que, se comprovado, enseja, também, a extinção da delegação, conforme art. 39, III, da mesma lei, fato este confirmado na própria defesa prévia e em laudo médico, tanto assim que não foi interrogado nos autos, conforme determina o art. 1.099 do Código de Normas”.

“o art. 1.098, do Código de Normas, prevê que a indicação de invalidez de qualquer natureza no âmbito de processo administrativo disciplinar será objeto de perícia pela junta medica do TJPA, que atestará a invalidez, total ou parcial, ou sua ausência”.

5.9.2018

Notificação do requerente para comparecimento à Junta Médica

19.9.2018

Solicitação ao Presidente que a junta se desloque para realização da perícia (fl. 203)

SEGUNDO PAD – PA MEM-2016/28365

4.3.2018

Determinação para instauração de novo PAD – sobre a questão dos selos (Id 3326082 – fl. 19), COM AFASTAMENTO

9.4.2018

Abertura de outro PAD

Portaria nº 044/2018

1) ausência da prestação de contas referente a selos de segurança, no total de 26.851 – Período 10/2008 a 08/2016

2) Existência de condições para exercício das funções na serventia (Id 3326082 – fl. 22)

2.5.2018

Designação de interventora estranha à serventia.

Filha de serventuária da Justiça (JANETE MAGALHÃES DE FREITAS), que participa da comissão processante do PAD – Id 3201076

9.8.2018

Parecer final da Comissão Processante.

No relatório informa a prática dos seguintes atos no PAD:

- Termo de instalação da comissão processante;

- Citação do sindicado fl. 197, certificada à fl. 198;

- Pedido de redesignação de sessão, fl. 201 e ss;

- Termo de reunião, fls. 205/205v;

- Inspeção acerca das condições sindicado, fl. 209;

- Termo dê indicação, fl: 201;

- Citação, fl. 212;

- Termo de reunião, fl. 215, onde se deliberou por nova citação;

- Citação fl. 216, certificada à fl. 217;

- Defesa, fls. 218/222

Proposta de aplicação da pena de perda de delegação (Id 3326084 fl. 8)

Diante da inocorrência dos vícios apontados, de abusos ou teratologias, é pacífica a jurisprudência do CNJ no sentido de não ser possível a apreciação de processos disciplinares de titulares de serviços notariais e de registro, ressalvadas unicamente tal possibilidade em situações excepcionais.

RECURSO EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. JUÍZO DA COMARCA DE CANOAS/RS. SERVIÇO NOTARIAL E REGISTRAL. INSPEÇÃO. IRREGULARIDADES. AFASTAMENTO DA TITULAR. DESIGNAÇÃO DE INTERVENTORA. APURAÇÃO DOS FATOS. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PERDA DA DELEGAÇÃO. RECURSO AO CONSELHO DA MAGISTRATURA. MANUTENÇÃO DA PENA. TERATOLOGIA. INOCORRÊNCIA. RECURSO IMPROVIDO.

1. Procedimento de controle administrativo proposto contra ato de Conselho da Magistratura de Tribunal que, ao apreciar o recurso específico interposto pela então titular de serviços cartorários contra decisão que ensejou a perda da delegação, manteve a penalidade aplicada à unanimidade.

2. In casu, não se verifica plausibilidade na oposição formulada, porquanto patente o seu viés recursal.

3. O exame das irregularidades foi tangenciado pelo Tribunal à época de designação de interventora para responder pelos serviços (MS 0177201-47.2015.8.21.7000), o qual confluiu para o acerto dos atos praticados pelo Juízo local, bem como apreciado pelos membros do Conselho da Magistratura.

4. Inocorrendo abuso ou teratologia na decisão, descabe ao CNJ intervir em processos disciplinares deflagrados e julgados por Tribunal em face de titulares de serventias extrajudiciais.

5. Recurso a que se nega provimento.

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0005970-15.2017.2.00.0000 - Rel. MARIA TEREZA UILLE GOMES - 276ª Sessão Ordinária - julgado em 21/08/2018).

Dessa forma, julgo improcedente o pedido relativo à nulidade da tramitação dos processos disciplinares n° 2015.7.001801-6 e PA MEM-2016/28365 em face do requerente. 

No que tange a ausência de repasse de 50% do valor da renda líquida da serventia ao requerente, em decorrência da determinação de afastamento do exercício das atividades durante a tramitação do segundo PAD, verifico que foi proposto Pedido de Providências nº 0009538-05.2018.2.00.000 na Corregedoria Nacional de Justiça, específico para analisar tal situação, que, inclusive, já conta com decisão, ante a regularização dos pagamentos.

DECISÃO

Cuida-se de pedido de providências instaurado por ANTÔNIO CLAUDOMIRO BENTES MONTEIRO em desfavor de ANDRESSA FABIANE MAGALHÃES DE FREITAS, nomeada interventora no Cartório do 2º Ofício da Comarca de Alenquer – PA.

O requerente, titular da serventia supracitada, relata que responde a processos administrativos e, em razão disso, a requerida foi nomeada como interventora de sua serventia em 1º/5/2018.

Em 24/9/2018, a Corregedoria local, em razão de pedido do autor, determinou que a interventora repassasse, mensalmente, metade da renda líquida do Cartório ao requerente. Entretanto, até a presente data, tal determinação não teria sido cumprida.

Requer “que seja concedido ao titular do cartório do 2º oficio da cidade de Alenquer/PA, ora requerente, o direito de receber os valores previstos em Lei. E que seja a Interventora Andressa Fabiane Magalhães de Freitas, responsabilizada pelo crime de desobediência previsto no Art. 330 do CPP, em razão ter conhecimento da referida decisão e continuar a descumpri-la”.

A Corregedoria de Justiça das Comarcas do Interior informou que os pagamentos devidos ao Sr. Antônio foram regularizados e, ainda, que, nos autos do Processo n. 2015.7.001801-6, a delegação do requerente foi extinta com fundamento nos arts. 24 e 39, III, da Lei n. 8.935/94.

É, no essencial, o relatório.

Diante da informação da Corregedoria local de que já foram efetuados os pagamentos ao Sr. Antônio e que foi extinta delegação desse, em razão da ausência de condições físicas e mentais para responder sobre os atos da vida civil, nada mais há a prover nos presentes autos.

Ante o exposto, sem prejuízo da apreciação de fato novo ou da insurgência de algum interessado, arquive-se o presente feito.

Intimem-se.

Brasília, data registrada no sistema.

MINISTRO HUMBERTO MARTINS

Corregedor Nacional de Justiça

Assim, não conheço do procedimento em apreço em relação a esse ponto específico.

O terceiro e último tópico, no entanto, merece melhor sorte. A situação trazida pelo requerente de que a interventora Andressa Fabiane Magalhães de Freitas, designada para responder pelo Cartório do 2º Ofício de Alenquer/PA durante o afastamento do requerente e, agora, designada como interina, ante a extinção da delegação por invalidez do requerente[1], deve ser avaliada sob a ótica do Provimento CNJ nº 77/2018.

Segundo consta dos autos, a designação da interventora/interina não observou as regras constantes da norma respectiva, abaixo transcrita:

[...]

Art. 5º Não havendo substituto que atenda aos requisitos do § 2º do art. 2º e do art. 3º, a corregedoria de justiça designará interinamente, como responsável pelo expediente, delegatário em exercício no mesmo município ou no município contíguo que detenha uma das atribuições do serviço vago.

§ 1º Não havendo delegatário no mesmo município ou no município contíguo que detenha uma das atribuições do serviço vago, a corregedoria de justiça designará interinamente, como responsável pelo expediente, substituto de outra serventia bacharel em direito com no mínimo 10 (dez) anos de exercício em serviço notarial ou registral.

§ 2º A designação de substituto para responder interinamente pelo expediente será precedida de consulta ao juiz corregedor permanente competente pela fiscalização da serventia extrajudicial vaga.

Art. 6º A designação do substituto para responder interinamente pelo expediente deverá ser revogada se for constatado, em procedimento administrativo, o não repasse ao tribunal de justiça do excedente a 90,25% dos subsídios de ministro do Supremo Tribunal Federal.

Em consulta ao Sistema Justiça Aberta[2], verifica-se a existência de outras 3 (três) serventias na mesma comarca que, em tese, poderiam ter recebido a incumbência de intervenção na serventia, de acordo com o art. 5º, caput, do Provimento CNJ nº 77/2018.

Inexistindo na localidade serventia que detenha a mesma competência – o que não é o caso –, ou que não aceite tal incumbência, aplica-se a regra do § 1º, do art. 5º, a qual determina que “a corregedoria de justiça designará interinamente, como responsável pelo expediente, substituto de outra serventia bacharel em direito com no mínimo 10 (dez) anos de exercício em serviço notarial ou registral”.

Ao que tudo consta dos autos, a interina/interventora Andressa Fabiane Magalhães de Freitas não era titular de outra serventia que possuía a mesma atribuição do Cartório do 2º Oficio de Alenquer/PA e tampouco era substituta de outra serventia com no mínimo 10 (dez) anos de experiência.

As regras constantes do Provimento CNJ nº 77/2018 são objetivas e de observância obrigatória, tanto que o art. 8º da norma determina que “[o]s tribunais deverão adequar as designações dos atuais interinos às regras deste provimento em até 90 dias”.

Ante o exposto, julgo parcialmente procedente o presente Procedimento de Controle Administrativo para determinar ao Tribunal de Justiça do Estado do Pará que adeque a designação do interino que deverá responder pelo Cartório do 2º Oficio de Alenquer/PA, no prazo de 30 (trinta) dias.

Publique-se nos termos do artigo 140 do RICNJ.

Intimem-se.

Brasília, data registrada no sistema.

Maria Tereza Uille Gomes

Conselheira 

 

Como demonstrado, a decisão monocrática julgou parcialmente procedente o pedido para determinar ao Tribunal de Justiça do Estado do Pará a adequação da designação do interino responsável pelo 2º Ofício da comarca de Alenquer/PA ao Provimento CNJ nº 77/2018.

Em sede recursal, a interessada que responde pela interinidade da serventia em destaque, pede a reforma da decisão.

O recurso não merece ser provido.

As regras estabelecidas pelo Provimento CNJ nº 77/2018 são objetivas e não devem ser relativizadas, sob pena de afronta ao princípio da legalidade. A edição da norma pelo CNJ considerou, dentre outros aspectos:

(i) “a obrigação dos serviços extrajudiciais de cumprir as normas técnicas estabelecidas pelo Poder Judiciário”;

(ii) “a necessidade de proporcionar a melhor prestação de serviço e corrigir as distorções em busca da modicidade dos emolumentos, da produtividade, da economicidade, da moralidade e da proporcionalidade na prestação dos serviços extrajudiciais”;

(iii) “que os princípios constitucionais da moralidade, da legalidade e da probidade devem orientar todos os atos administrativos, em especial aqueles que emanam do Poder Judiciário, bem como o disposto na Resolução nº 7, de 18 de outubro de 2005 e na Resolução nº 156, de 08 de agosto de 2012, do Conselho Nacional de Justiça;

(iv) a necessidade de observância dos “princípios da supremacia do interesse público, da eficiência, da continuidade do serviço público e da segurança jurídica”.

Como se verifica, não há espaço na norma para a perpetuação de designações que não atendam aos critérios nela estabelecidos.

Ademais o disposto no § 3º, do art. 236, da Constituição da República determina que o “ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses”.

“Ao colocar titulares interinos nas atividades notariais e de registro, o Estado as presta diretamente, acumulando as ‘situações de titular e prestador do serviço’ – o que, diga-se de passagem, só é possível na vigência da Carta Política de 1988 de forma transitória e precária, dado o prazo constitucional de seis meses para a efetivação da delegação” (MS 29.037 MC-AgR/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, j. 24/5/2013).

A manutenção da recorrente como interina do cartório do 2º Ofício de Alenquer/PA afronta não apenas o Provimento CNJ nº 77/2018, mas a própria Constituição Federal.

O TJPA está em mora há mais de 2 (dois) anos em relação ao preenchimento da serventia respectiva e, além disso, ainda designa interventora/interina sem a observância de requisitos mínimos estabelecidos por este Conselho.

O argumento de que a designação foi anterior ao Provimento não deve prosperar, pois os Tribunais foram intimados e tiveram o prazo de 90 (noventa) dias para as devidas adequações[1].

A distância em relação a outros municípios também não pode constituir óbice para a observância do Provimento por tão longo espaço de tempo. Verificada a impossibilidade de seu cumprimento, a realização de concurso público para o preenchimento da serventia seria o caminho mais adequado. Mas isso não foi sequer cogitado pelo Tribunal.

Ainda que não haja nepotismo na designação da recorrente para responder pela serventia, o fato é que a condição de filha de servidora lotada na Vara do Juiz responsável pelos cartórios da região chama, no mínimo, atenção e causa certa estranheza.

 

O TJPA registra que o Juiz Corregedor teve a preocupação e cuidado de não colocar a mãe da interventora na comissão processante do PAD do então responsável pela serventia (Id 3884154 - Pág. 2), mas designou a filha para responder pelo cartório. A decisão, ao contrário do que faz crer o Tribunal, viola os princípios da moralidade e impessoalidade.

Enfim, sob todos os ângulos verificados, não vislumbro a possibilidade de manter a recorrente/interina à frente do 2º Ofício da comarca de Alenquer/PA.

Como dito na decisão singular, a recorrente não possui nenhum dos requisitos previstos na norma, em especial os constantes do art. 5º. De outro lado, existe na localidade tabelião que aceita o múnus de responder pelo cartório referido. Trata-se do titular do 1º Ofício de Alenquer/PA (Id 4165540 – Pág. 3).

É dizer, eventual decisão no sentido de manter a interina/recorrente à frente da serventia significa admitir a prestação de serviços “de organização técnica e administrativa destinados a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos[2]” por pessoa que não preenche os requisitos constitucionais, legais e normativos para tanto. Por isso, as razões apresentadas são incapazes de infirmar a decisão monocrática.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso e mantenho integralmente a decisão monocrática proferida.

Publique-se nos termos do art. 140, do RICNJ.

Intimem-se.

Brasília, data registrada no sistema.

 

Maria Tereza Uille Gomes

Conselheira



[1] Provimento CNJ nº 77/2018. Art. 8º Os tribunais deverão adequar as designações dos atuais interinos às regras deste provimento em até 90 dias.

[2] Lei 8935/1994. Art. 1º.