Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0005247-54.2021.2.00.0000
Requerente: CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA
Requerido: SERGIO LUIZ ARRUDA PARENTE e outros

 


EMENTA

 

 

PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. PRISÃO PREVENTIVA. REQUERIMENTO FORMULADO PELO MINISTÉRIO PÚBLICO DE ARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL POR ATIPICIDADE MATERIAL DA CONDUTA (PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA). MORA NA APRECIAÇÃO PELO JUIZ. MANUTENÇÃO DA PRISÃO. VIOLAÇÃO DOS DEVERES DA MAGISTRATURA. CELERIDADE, DILIGÊNCIA E DEDICAÇÃO. PROPOSITURA DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR.  

1. Magistrado de primeiro grau que deixa de analisar o pedido de arquivamento do Inquérito formulado pelo Ministério Público por cerca de cinco meses, mantendo o cidadão  preso por igual tempo.

2. Negligência no cumprimento da obrigação estatuída pelo artigo 316, caput, do Código de Processo Penal, que impõe a revisão das prisões cautelares a cada 90 (noventa) dias, sob pena de ilegalidade.

3. Ilegalidade que só foi sanada com a intervenção do STJ, que deferiu liminar no Habeas Corpus 650.072/CE e que requereu a instauração de investigação disciplinar.

4. Juiz de Direito que, mesmo após a determinação do STJ de imediata soltura do paciente, demorou 6 (seis) dias para cumprir a ordem e confirmar a libertação, em contrariedade ao que estabelecia, à época, o artigo 1º da Resolução 108/2010 do Conselho Nacional de Justiça, que estipulava prazo máximo de 24 horas. 

6. Havendo indícios de afronta pelo requerido aos deveres de diligência e dedicação, além do dever de não exceder injustificadamente os prazos para sentenciar ou despachar (art. 35, II, da LOMAN c/c art. 20 do Código de Ética da Magistratura Nacional), bem como de possível violação da própria Constituição Federal, que, em seu artigo 5º, inciso LXXVIII, assegura “a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”, indica-se a necessidade de instauração de processo administrativo disciplinar.  

7. Processo administrativo disciplinar instaurado.


 

 

J5/F29

 

 

 

 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, determinou o arquivamento da reclamação disciplinar em relação ao Desembargador e a instauração de processo administrativo disciplinar em desfavor do magistrado, aprovando desde logo a portaria de instauração do PAD, nos termos do voto do Relator. Votou a Presidente. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário, 29 de novembro de 2022. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão (Relator), Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, Sidney Madruga, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Sustentaram oralmente: pela interessada Associação dos Magistrados Brasileiros, o advogado Alexandre Pontieri - OAB/DF 191828 e pelo requerido Fabricio Vasconcelos Mazza, o advogado Dionísio de Barros Cavalcanti Junior - OAB/MG 130440.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0005247-54.2021.2.00.0000
Requerente: CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA
Requerido: SERGIO LUIZ ARRUDA PARENTE e outros


RELATÓRIO


             O EXMO. SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO, CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA (Relator):


Trata-se de Reclamação Disciplinar instaurada por provocação do eminente Ministro Rogerio Schietti Cruz, da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, Relator do Habeas Corpus 650.072/CE, com a finalidade de apurar a conduta do Juízo da 15ª Vara Criminal de Fortaleza – CE e do Desembargador Sérgio Luiz Arruda Parente, da 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará.

Consta do acórdão prolatado pelo STJ no HC 650.072/CE que o paciente VARNEY RODRIGUES BARBOSA foi preso em flagrante no dia 19/9/2020 pelo suposto furto de seis shorts e de três camisas da loja C&A e que, no dia seguinte, o Juízo da 15ª Vara Criminal da Comarca de Fortaleza homologou o flagrante e converteu a custódia em preventiva.

Em 21/10/2020, o Ministério Público requereu o arquivamento do Inquérito, por incidência do princípio da insignificância. No entanto, passados cerca de cinco meses sem a apreciação do pleito pelo Juízo de primeiro grau, a defesa impetrou, em 19/2/2021, o Habeas Corpus 0622297-75.2021.8.06.0000 no Tribunal de Justiça do Estado do Ceará.

Ocorre, porém, que, após mais de duas semanas da impetração, a liminar ainda não havia sido apreciada, razão pela qual, em 8/3/2021, a Defensoria Pública impetrou o Habeas Corpus 650.072/CE no Superior Tribunal de Justiça.

Em 10/3/2021, o Relator do HC 650.072-CE, eminente Ministro Rogério Schietti Cruz, concedeu a medida de urgência para determinar a imediata soltura de VARNEY RODRIGUES BARBOSA e a análise do pleito de arquivamento do inquérito.

Todavia, segundo informado pela Defensoria Pública, a despeito do deferimento da liminar pelo STJ, o Juízo da 15ª Vara Criminal da Comarca de Fortaleza expediu o alvará de soltura apenas em 16/3/2021, permanecendo o paciente recolhido na unidade prisional até 18/3/2021.

Concluiu a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça que a situação seria teratológica e que houve reiteradas violações dos direitos fundamentais do paciente VARNEY RODRIGUES BARBOSA, por omissões da 15ª Vara Criminal da Comarca de Fortaleza, do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará e da Unidade Prisional Professor José Sobreira de Amorim.

Ressaltou, outrossim, que “o Magistrado de primeira instância não apresentou algum motivo a justificar a morosidade de quase cinco meses na apreciação do pedido de arquivamento do feito, situação que vai de encontro ao princípio da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, da CF)”.

Além disso, destacou que o TJCE, ao ser provocado pela defesa para se manifestar sobre o constrangimento ilegal na liberdade de locomoção do paciente, manteve-se inerte.

Notificado para prestar informações, o magistrado Fabrício Vasconcelos Mazza, Titular da 15ª Vara Criminal da Comarca de Fortaleza/CE, asseverou que (Id 4481581):

 

1. O Auto de Prisão em Flagrante n° 0252935-90.2020.8.06.0001 foi, inicialmente, apreciado pelo MM. Juiz de Direito Ireylande Prudente Saraiva, que, ao atuar no Plantão Judiciário do dia 19/09/2020, converteu a prisão em flagrante de Varney Rodrigues Barbosa, em preventiva, conforme demonstra cópia da decisão, em anexo. Portanto, esclarecido está o erro constante no pedido de providências acima aludido, que assevera que foi o Juízo da 15ª Vara Criminal que homologou o flagrante do paciente, decretando sua prisão preventiva. Somente após os autos terem tramitado pela fila do Plantão Judiciário, pois, é que foram estes redistribuídos e passaram a pertencer ao acervo do Módulo Judiciário titularizado por este subscritor; 

2. Assim, quando os autos foram virtualmente recebidos por esta Unidade Jurisdicional, estes entraram no fluxo do sistema processual do SAJ, da 15ª Vara Criminal de Fortaleza, sendo importante registrar, neste ponto, que antedito sistema processual é composto por diversos fluxos e sub-fluxos, o que pode, eventualmente, levar a existência de equívocos na correta movimentação de determinado processo, o que, contudo, não causa maiores problemas, em regra; 

3. A alocação dos processos nas filas corretas é, assim, um fator importante para a celeridade da tramitação. No caso em questão, consultando o histórico do fluxo processual do feito, cujo extrato segue anexo, verifica-se que, no dia 15/10/2020, o feito entrou na fila "concluso para despacho", conforme demonstra o histórico do sistema antes referenciado. Então, no dia 19/10/2020, foi proferido o primeiro despacho deste Juízo nos autos: na oportunidade, determinou-se a abertura de vistas ao representante do ministério público que, em 21/10/2020, apresentou manifestação pelo arquivamento do feito; 

4. Quando os autos retomaram da promotoria de justiça, foram direcionados, no sistema processual, para a fila "aguardando análise de juntada de petição", permanecendo nesse escaninho virtual até o dia 01/12/2020, quando, então, foram movido para a fila "concluso extinção arquivamento"; 

5. Cabe aqui esclarecer que o procedimento correto teria sido mover o processo para a fila "concluso para decisão", pois o feito tinha "tarja" de réu preso; essa seria a
localização indicada para que os autos fossem apreciados com maior celeridade. Equívocos dessa natureza são raros nesta Unidade Judicial, entretanto, como o fator humano intervém na movimentação dos processos, não há eliminar-se, por completo, os deslizes (notadamente diante do deficitário quadro de servidores responsáveis por esta tarefa);
 

6. Lamentavelmente, esse erro causou indesejado elastério na apreciação da demanda, tendo em vista que os processos de réus presos, alocados na fila correta, demandam a prioridade que lhes é devidamente dispensada. Infelizmente, portanto, enquanto eram decididos os processos que estavam na fila correta, o auto de prisão em questão acabou sendo negligenciado, por estar localizado em fluxo diverso daquele em que deveria estar;

7. Quando o ministro Rogério Schietti Cruz determinou a expedição de ofício requisitando informações no H.C. n° 650072/CE (2021/0066871-7), impetrado contra ato Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, tal pedido também chegou ao conhecimento deste Juízo. Então, o processo em referência foi localizado no acervo deste Módulo Judiciário, sendo prontamente analisado, e proferida a decisão que acatou o pedido de arquivamento formulado pelo parquet. Assim, a causa foi decidida e, consequentemente, a prisão foi revogada, sendo restituída a liberdade do réu;

8. Importante salientar, que o ofício de informações supracitado foi lido, por meio do serviço de malote digital desta Unidade, no final do expediente de uma sexta-feira (12/03/2021); por isso, a apreciação do caso ocorreu, cm sequência, na segunda-feira (15/03/2021). O alvará de soltura foi expedido no dia seguinte, 16/03/2021, sendo enviado diretamente à unidade prisional em que o réu encontrava-se recolhido. Posteriormente, o presidio informou a este Juízo que a ordem de soltura foi cumprida, no dia 18/03/2021, conforme demonstram documentos anexos. Logo, observa-se, que entre a expedição do alvará de soltura e o cumprimento da ordem passaram-se quase 48h (quarenta e oito horas), sendo de se anotar que este trâmite não depende exclusivamente deste Magistrado;

9. Após isso, em 16/03/2021, foi lido, no malote digital desta Unidade, o ofício do Tribunal de Justiça, que ao tempo cm que comunicava a concessão da liminar no H.C. n° 0622297-75.2021.8.06.0001, solicitava informações sobre o processo. Em resposta a esse pedido de informações, foi explanado que a prisão do réu já havia sido revogada;

10. Mesmo após a confirmação da soltura do paciente, as solicitações de informações sobre o caso continuaram surgindo, inclusive, por parte da Corregedoria do Tribunal de Justiça. Esses novos pedidos questionavam a razão pela qual o réu não tinha sido posto em liberdade, mas este Juízo demonstrou, repetidas vezes, que ele estava solto. Por isso, junto com as informações seguiam os documentos que comprovavam a soltura do réu, tais como: cópia do e-mail enviado pela Unidade Prisional, informando o dia e a hora do cumprimento do Alvará e o extrato do Sistema Penitenciário do Estado (SIGEPEN), comprovando que o réu encontrava-se com o "status" "liberto";

11. Feitos todos os esclarecimentos acima, no que tange à demora no trâmite do feito, vale destacar uma omissão que entendemos fundamental para que a situação discutida tenha se verificado, qual seja, a atuação da defesa do réu. Com efeito, depois que o auto de prisão em flagrante foi distribuído para esta 15ª Vara Criminal, a defesa do indiciado não apresentou qualquer petição. Reitero, depois que este Magistrado recebeu o processo, oriundo do Plantão Judiciário, a defesa do réu não exerceu a sua função de provocar a jurisdição deste Módulo, ou seja, não requereu sua liberdade provisória, tampouco fez alusão ao pedido de arquivamento formulado pelo parquet. A defesa do réu permaneceu absolutamente inerte no processo em trâmite neste Juízo, optando por saltar instâncias. Isso, sem dúvidas, também, teve forte contribuição para a demora da apreciação dos autos:

12. Esta 15a Vara Criminal da Comarca de Fortaleza conta com o acervo de aproximadamente 2.400 (dois mil e quatrocentos) processos e possui apenas 03 (três)
servidores e 03 (três) estagiários. Nota-se a considerável desproporção entre o quantitativo de processos e o de colaboradores, sendo o quadro destes ínfimo diante da demanda. Desse modo, toma-se imperiosa a atuação da defesa dos réus, para que os processos tramitem regularmente. No caso em questão, teria sido suficiente que o defensor tivesse atuado perante este Juízo. Caso tivesse assim agido, este Magistrado teria impulsionado o feito, fosse para deferir, ou para indeferir o pedido, mas, sem sombra de dúvidas, a provocação da jurisdição teria dado visibilidade ao processo. A defesa, entretanto, decidiu provocar as instâncias superiores, sem aos menos ter exercido sua função perante o 1o grau;

13. Por fim, registre-se que este Juízo continua à disposição para eventuais esclarecimentos, frisando, por oportuno, que ocorrências como a que foi registrada no pedido de providencias n° 0005427-54.2021.2.00.0000 são absolutamente raras, e que apesar do quadro de servidores ser insuficiente quando contrastado com o acervo processual deste Módulo Judiciário, existe enorme esforço por parte daqueles e deste Magistrado para atender satisfatoriamente às demandas.

 

Também oficiado para prestar informações acerca dos fatos objeto de apuração neste expediente, o Desembargador Sérgio Luiz Arruda Parente pronunciou-se nos seguintes termos (Id 4479565):

 

[...]

Feitas essas considerações, informo que o Habeas Corpus n° 0622297-75.2021.8.06.0000, impetrado pela Defensoria Pública do Estado do Ceará em favor de Varney Rodrigues Barbosa, contra ato do Exmo. Senhor Juiz de Direito da 15ª Vara Criminal da Comarca de Fortaleza, nos autos da Ação Penal nº 0252935-90.2020.8.06.0001, foi distribuído à minha Relatoria por equidade, na data de 19/02/2021, vindo à minha conclusão em seguida.

Na ocasião, o feito ingressou em fila Concluso para Ato Inicial, onde permaneceu aguardando análise juntamente com outros Habeas Corpus, cujo exame se dá em ordem cronológica de conclusão, regra esta excetuada unicamente em casos extraordinários, quando justificada a decisão antecipada aos demais processos.

Ao analisar o writ em questão, verifiquei tratar-se de situação peculiar, diferenciada dos demais Habeas Corpus, o que importou na necessidade de análise mais detida do fato especialmente porque o entendimento deste Relator acerca da incidência do princípio da insignificância é distinta do que aventado pela defesa do paciente, conforme destaquei, inclusive, no bojo da decisão liminar proferida.

Há de se ressaltar que a questão apresentava ainda maior complexidade, eis que pela narrativa constante na peça inicial, o membro do Ministério Público atuante na origem havia requerido o arquivamento do feito, o que ainda não havia sido apreciado pelo Magistrado a quo.

Nesse contexto, este Magistrado analisava o feito quando recebeu ofício proveniente do Superior Tribunal de Justiça, comunicando a concessão da ordem liminar nos autos do Habeas Corpus n° 650.072/CE (2021/0066871-7), de Relatoria do Exmo. Sr. Min. Rogério Schietti Cruz, no sentido de determinar a imediata soltura do paciente, bem como a análise do pedido de arquivamento dos autos pelo Juízo de primeira instância e do Habeas Corpus impetrado neste Tribunal.

Tal ofício foi acostado aos autos no dia 12/03/2021, às 1lh31min, tendo este Relator cumprido a ordem e proferido decisão logo após, às 13h47min, determinando a soltura do paciente, medida essa a ser implementada pelo Juízo da 15a Vara Criminal de Fortaleza, através da expedição de alvará de soltura em favor do paciente. A decisão foi remetida pelo Serviço de Habeas Corpus ao Juízo de origem, via Malote Digital, às 17h04min.

Na mesma data, providenciei as informações ao Superior Tribunal de Justiça (Habeas Corpus n° 650.072/CE), remetidas pelo Serviço de Habeas Corpus ao Protocolo do STJ, por Malote Digital, às 15h54min.

[...]

Registro que, após a comunicação ao Juízo de origem para dar cumprimento à ordem de liberação, o trâmite para a soltura do paciente não mais dependia deste Magistrado.

Cumpre destacar, ainda, que após o protocolo do Habeas Corpus junto a este Tribunal de Justiça, a defesa do réu não entrou em contato com esta unidade judiciária para diligenciar acerca do andamento do feito, mesmo estando à sua disposição o atendimento via WhatsApp e e-mail institucional, diariamente respondidos pela Secretaria do Gabinete.

Não obstante, a defesa do réu optou por ingressar com um novo Habeas Corpus perante o Superior Tribunal de Justiça, apontando negativa de prestação jurisdicional sem sequer, ter diligenciado junto a este Tribunal qualquer pleito de celeridade ou impulso processual, o que importa, de certo modo, em desprestígio ao princípio da cooperação, especialmente porque, sempre que há pedido de agilidade, seja da própria parte, seja de sua defesa técnica, este Magistrado procura dar maior celeridade possível na análise dos casos, especialmente quando se trata de soltura de réu preso.

Por derradeiro, informo que foram tomadas medidas no sentido de que os pedidos de liminar em Habeas Corpus sejam apreciados com a maior brevidade possível, sendo que, atualmente, este Gabinete não possui nenhum feito pendente de análise liminar, o que demonstra total comprometimento desta Serventia em proporcionar jurisdição de forma cada vez mais eficiente e célere.

Prestados os referidos esclarecimentos sobre a análise do pedido liminar do paciente e não havendo desídia por parte deste Magistrado, que se encontrava em franca produção de outros atos judiciais e demandas, tão urgentes quanto, não resta configurada, pois, qualquer violação aos deveres funcionais previstos na Lei Orgânica da Magistratura.

Desta feita, certo de que não há subsídio para a abertura de Procedimento Administrativo Disciplinar em meu desfavor, postulo o arquivamento da reclamação, permanecendo à disposição para eventuais esclarecimentos que se façam necessários.

 

Tendo em vista a informação de que a conduta do magistrado Fabrício Vasconcelos Mazza teria sido objeto de exame pela Corregedoria-Geral de Justiça do Estado do Ceará, oficiou-se àquela para que encaminhasse informações sobre a apuração do episódio mencionado (Id 4506043). No entanto, conforme se verifica da leitura de cópia do expediente instaurado e arquivado na Corregedoria local, limitou-se aquele órgão a comunicar o Superior Tribunal de Justiça da manifestação do magistrado reclamado no sentido de que a decisão foi cumprida em tempo (Id 4511872). 

Diante  da possível afronta, em tese, ao artigo 35, II, da LOMAN e ao artigo 20 do Código de Ética da Magistratura Nacional, os reclamados foram notificados para apresentação de defesa prévia à abertura de Processo Administrativo Disciplinar.

Manifestou-se o magistrado Fabrício Vasconcelos Mazza (Id 4525101) no sentido de que, mesmo atuando com um diminuto quadro de servidores, a demora na apreciação dos autos citados teria sido um caso isolado.

Ressaltou que a conversão em prisão preventiva no processo 0252935-90.2020.8.06.0001 foi realizada pelo magistrado plantonista, Ireylande Prudente Saraiva, e reiterou que, “lamentavelmente, os autos permaneceram deslocados durante tal lapso temporal, pois foram movimentados para filas incorretas, uma vez que, de acordo com a organização que foi adotada na gestão dos processos, não eram aquelas destinadas a feitos urgentes”.

Consignou, outrossim, que não houve conduta desidiosa ou negligente do reclamado ou dos servidores da 15ª Vara Criminal e que a movimentação errônea decorreu de erro involuntário.

Argumentou, ainda, que, ignorando o princípio da cooperação, a defesa do paciente não formulou pedido de liberdade no 1º grau, nem entrou em contato com a Unidade Judiciária para solicitar diligências de andamento do feito,  tendo optado a Defensoria Pública por “’recorrer’ diretamente às instâncias superiores, ANTES DE SEQUER TER INTERPOSTO qualquer pedido de liberdade ou DE QUALQUER FORMA PETICIONADO, junto a esse Juízo, o que, decerto, teria contribuído, sobremaneira, para a identificação do erro de movimentação do feito acima referido”.

Quanto ao período de 8 (oito) dias transcorridos entre a prolação da decisão do STJ e o cumprimento do alvará de soltura, pontuou que a supervisora da Vara estava de licença médica e que não houve negligência, tendo sido os atos para liberação realizados sequencialmente. Nesse sentido, destacou novamente que “o malote digital foi lido, no final do expediente de uma sexta-feira (12/3/2021), por isso, a apreciação do caso ocorreu, em sequência, na segunda-feira (15/3/2021). O alvará de soltura foi expedido, no dia seguinte, 16/3/2021, sendo enviado, diretamente, à unidade prisional em que o réu encontrava-se recolhido. Posteriormente, o presídio informou a este Juízo que a ordem foi cumprida, no dia 18/3/2021, conforme demonstram documentos anexos. Logo, observa-se que entre a expedição do alvará de soltura e o seu cumprimento passaram-se quase 48 horas, sendo de se anotar que esse trâmite não depende exclusivamente do Magistrado”.

Ao final, salientou que “a representação por excesso de prazo não se presta para apurar situações pontuais de morosidade, mas excesso injustificado de prazo causado por desídia grave ou reiterada de magistrado no cumprimento de seus deveres funcionais, o que, definitivamente, não é o caso”.

Na sequência foi apresentada a defesa prévia do Desembargador Sérgio Luiz Arruda Parente, que, na mesma linha do outro magistrado reclamado, asseverou que a Defensoria Pública teria deixado de observar o princípio da cooperação processual pois, após duas semanas da impetração do HC  0622297-75.2021.8.06.0000, optou por impetrar novo HC no STJ, quando “o reclamado estava analisando os autos”, dada a sua “maior complexidade”.

Sustentou que, “quando da análise do caso, respeitando-se a ordem cronológica, a liminar não fora proferida de forma imediata em razão da peculiaridade do caso, vez que o entendimento do Desembargador acerca da incidência do princípio da insignificância difere da que fora explanada pelo Ministério Público atuante na origem”.

Sublinhou que “sempre que há pedido de agilidade, seja da própria parte, seja de sua defesa técnica, o Gabinete do Desembargador procura prestar a jurisdição da forma mais ágil e eficiente possível”. 

  Afirmou que não houve desídia de sua parte e que, após o recebimento do ofício proveniente do Superior Tribunal de Justiça, determinou imediatamente o cumprimento da ordem de soltura. 

Nesse sentido, esclareceu que o ofício proveniente do Superior Tribunal de Justiça foi acostado aos autos no dia 12/3/2021, às 11h31min, e que cumpriu a ordem e proferiu decisão às 13h47min, determinando a soltura do paciente, medida a ser implementada pelo Juízo da 15ª Vara Criminal de Fortaleza, tendo a decisão sido remetida pelo Serviço de Habeas Corpus do TJCE naquela mesma data, às 17h04min. 

Enfatizou que “a demora excepcional de cerca de duas semanas para decidir um pedido de soltura em caráter liminar em um dos Habeas Corpus do acervo da Unidade Judiciária não foge ao razoável, diante de todos os outros atos proferidos nos outros processos de responsabilidade do Desembargador, ainda mais diante dos dados referentes ao Poder Judiciário Brasileiro, em especial diante do atual contexto de sobrecarga e do cenário de Pandemia, em plena alta quando do protocolo do mandamus em questão”.

No mais, destacou a alta produtividade do seu gabinete e pontuou a ausência de demonstração do elemento subjetivo da sua conduta para configuração de responsabilidade administrativa.

Conforme ID 4591167, houve oposição ao julgamento virtual e pedido de sustentação oral, deferidos pelo despacho constante do ID 4592292.

Admitida a Associação dos Magistrados Estaduais - ANAMAGES e Associação dos Magistrados Brasileiros - AMB como terceiros interessados.

É o relatório.

 


J5/F29

 

 

 


 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0005247-54.2021.2.00.0000
Requerente: CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA
Requerido: SERGIO LUIZ ARRUDA PARENTE e outros

 


VOTO


             O EXMO. SR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO, CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA (Relator):


Da análise dos autos, verifica-se a presença, na esfera administrativa disciplinar, de indícios reveladores de conduta funcional afrontosa aos deveres do Magistrado elencados na Lei Complementar n. 35/1979 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional) e na Resolução CNJ n. 60/2008 (Código de Ética da Magistratura Nacional). 

Conforme relatado, o presente expediente foi instaurado por provocação do eminente Ministro Rogerio Schietti Cruz, da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, Relator do Habeas Corpus 650.072/CE, com a finalidade de apurar a conduta de Fabrício Vasconcelos Mazza, Juiz de Direito da 15ª Vara Criminal de Fortaleza – CE, e do Desembargador Sérgio Luiz Arruda Parente, da 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará.

No julgamento do HC 650.072/CE, pelo STJ, apurou-se que o paciente Varney Rodrigues Barbosa foi preso em flagrante no dia 19/9/2020 pelo suposto furto de seis shorts e de três camisas da loja C&A e que, no dia seguinte, o Juízo da 15ª Vara Criminal da Comarca de Fortaleza homologou o flagrante e converteu a custódia em preventiva.

Embora tenha sido requerido, em 21/10/2020, o arquivamento do Inquérito pelo Ministério Público com base no princípio da insignificância, o feito permaneceu sem análise pelo reclamado Fabrício Vasconcelos Mazza por cerca de cinco meses.

Diante desse desate, a defesa impetrou, em 19/2/2021, o Habeas Corpus 0622297-75.2021.8.06.0000 no Tribunal de Justiça do Estado do Ceará. No entanto, tendo decorrido mais de duas semanas da impetração sem que a liminar fosse apreciada pelo Relator, o Desembargador Sérgio Luiz Arruda Parente, em 8/3/2021 a Defensoria Pública impetrou o Habeas Corpus 650.072/CE no Superior Tribunal de Justiça.

Em 10/3/2021, o Relator daquele writ, o eminente Ministro Rogerio Schietti Cruz, concedeu a medida de urgência para determinar a imediata soltura de Varney Rodrigues Barbosa e a análise do pleito de arquivamento do inquérito.

Ocorre, porém, que, segundo informado pela Defensoria Pública, a despeito do deferimento da liminar pelo STJ em 10/3/2021, o Juízo da 15ª Vara Criminal da Comarca de Fortaleza expediu o alvará de soltura apenas em 16/3/2021, permanecendo o paciente recolhido na unidade prisional até 18/3/2021.

No entender da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, trata-se de situação teratológica, com reiteradas violações dos direitos fundamentais do paciente Varney Rodrigues Barbosa, por omissões da 15ª Vara Criminal da Comarca de Fortaleza, do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará e da Unidade Prisional Professor José Sobreira de Amorim.

A ementa do acórdão da Sexta Turma do STJ, no julgamento do Habeas Corpus 650.072/CE, foi sintetizada nos seguintes termos (Id 4416127):

HABEAS CORPUS. FURTO. PRISÃO PREVENTIVA. PEDIDO DE ARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL. ATIPICIDADE MATERIAL. MORA NA APRECIAÇÃO PELO JUIZ. MANUTENÇÃO DA PRISÃO. WRIT IMPETRADO PERANTE O TRIBUNAL ESTADUAL. NÃO APRECIAÇÃO DA LIMINAR PELO DESEMBARGADOR. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. DETERMINAÇÃO DE SOLTURA. MORA NO CUMPRIMENTO DA DECISÃO JUDICIAL. FLAGRANTE ILEGALIDADE. SUPERVENIÊNCIA DA DECISÃO DE ARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO. HABEAS CORPUS PARCIALMENTE PREJUDICADO E, NO MAIS, ORDEM CONCEDIDA.

1. O arquivamento do inquérito policial acarreta a prejudicialidade do julgamento de parte do mérito deste habeas corpus, pela perda superveniente do seu objeto, em que se pleiteava a determinação ao Juízo de primeira instância que apreciasse o pedido ministerial.

2. A par da parcial prejudicialidade deste writ, as reiteradas violações das garantias do jurisdicionado sem a mínima justificativa plausível, observadas na espécie, reclamam considerações desta Corte Superior de Justiça.

3. Com efeito, o Magistrado de primeira instância demorou cerca de cinco meses para apreciar o pedido de arquivamento do inquérito policial. A delonga imotivada é especialmente agravada pelo fato de o então indiciado haver permanecido preso por crime sem violência ou grave ameaça.

4. O juízo exercido pelo órgão acusatório acerca da atipicidade material da conduta coloca em xeque a própria existência do crime, a fragilizar requisito essencial à prisão preventiva, qual seja, a demonstração do fumus comissi delicti. Por essa razão, proposto o arquivamento do inquérito policial, a custódia cautelar há de ser imediatamente revogada ou ao menos reexaminada, junto aos mecanismos de controle interinstitucional da obrigatoriedade da ação penal previstos no art. 28 do Código de Processo Penal.

5. Ademais, o Tribunal estadual, ao ser provocado pela defesa para se manifestar sobre o constrangimento ilegal na liberdade de locomoção do paciente, manteve-se inerte. A ausência de apreciação de habeas corpus caracteriza verdadeiro esvaziamento da garantia constitucional de inafastabilidade de jurisdição (art. 5º, XXXV, da CF).

 6. A soltura do agente deferida em liminar neste habeas corpus não foi cumprida tempestivamente, sem que houvesse alguma justificativa, em desconformidade com o art. 1º da Resolução n. 108/2010 do Conselho Nacional de Justiça, segundo o qual a expedição e o cumprimento de alvarás de soltura deverão ocorrer no prazo máximo de 24 horas.

7. O descaso sistêmico com o jurisdicionado evidenciado na espécie deve ser veementemente repudiado, notadamente por advir do próprio Estado, a quem incumbe zelar pelos fundamentos que sustentam o sistema de justiça.

8. Habeas corpus parcialmente prejudicado e, no mais, concedida a ordem para, confirmada a liminar, relaxar a prisão preventiva do paciente. Determinada a comunicação ao CNJ para as providências, corretivas e preventivas, que entender cabíveis. (grifos nossos)

 

Inicialmente, ressalto que o Conselho Nacional de Justiça possui competência disciplinar originária e concorrente, podendo instaurar originariamente, avocar ou revisar procedimentos disciplinares, sem prejuízo da atuação das corregedorias e tribunais locais.

No caso, da análise do caderno processual, constata-se a possível afronta aos deveres do magistrado de diligência e dedicação (art. 20 do Código de Ética da Magistratura), bem como a violação do dever de não exceder injustificadamente os prazos para sentenciar ou despachar (art. 35, inciso II, da LOMAN). Além disso, observa-se, também, o vilipêndio ao texto da própria Constituição Federal, que, em seu artigo 5º, inciso LXXVIII, assegura “a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação”. 

- FABRÍCIO VASCONCELOS MAZZA, Juiz de Direito da 15ª Vara Criminal de Fortaleza – CE.

(a) Vilipêndio ao artigo 316, caput e parágrafo único, do Código de Processo Penal

O magistrado incorreu em aparente desídia ao ignorar a situação de constrangimento ilegal na liberdade de locomoção do réu preso pela suposta prática de delito sem violência ou grave ameaça (furto simples), desprezando por quase cinco meses o pedido ministerial de arquivamento do Inquérito, por atipicidade material da conduta (princípio da insignificância), e mantendo o cidadão encarcerado.

Dessa forma, deixou o reclamado de analisar a possível revogação ou o relaxamento da custódia cautelar – notadamente diante da manifestação da acusação no sentido da ausência da prática de crime – ou mesmo de reexaminar a necessidade de manutenção da prisão preventiva, como exige o artigo 316, caput e parágrafo único, do Código de Processo Penal, verbis:

Art. 316. O juiz poderá, de ofício ou a pedido das partes, revogar a prisão preventiva se, no correr da investigação ou do processo, verificar a falta de motivo para que ela subsista, bem como novamente decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.     

Parágrafo único. Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor da decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal.       

 

Como bem destacado pela Sexta Turma do STJ, no julgamento do mérito do HC 650.072/CE, “o juízo exercido pelo órgão acusatório acerca da atipicidade material da conduta coloca em xeque a própria existência do crime, a fragilizar requisito essencial à prisão preventiva, qual seja, a demonstração do fumus comissi delicti. Por essa razão, proposto o arquivamento do inquérito policial, a custódia cautelar há de ser imediatamente revogada ou ao menos reexaminada, junto aos mecanismos de controle interinstitucional da obrigatoriedade da ação penal previstos no art. 28 do Código de Processo Penal”.

Nesse contexto, a conduta de morosidade excessiva e imotivada do reclamado na prestação jurisdicional, bem como de descontrole sobre as prisões preventivas, diante da falta de organização e de indicação de processos com réus presos, reforça a conclusão sobre a ausência da necessária revisão das medidas cautelares, inclusive as de prisão, em processos que tramitam na unidade por ele titularizada.

Compete ao magistrado exercer rigoroso controle e minuciosa supervisão de todos os processos com pessoas presas que transitam no Juízo, não sendo plausível a alegação de que, no caso, houve um mero erro de fluxo processual, sanado após meses e apenas em razão da intervenção do Superior Tribunal de Justiça nos autos do HC 650.072/CE, com o ulterior arquivamento do feito pelo reclamado.

(b) Afronta ao artigo 1º da Resolução 108/2010 do Conselho Nacional de Justiça

Segundo apurado, houve, também, atraso injustificado do magistrado de primeira instância no cumprimento da determinação de imediata soltura do paciente, tendo sido expedido o alvará de soltura apenas seis dias após o deferimento da liminar no HC 650.072/CE pelo eminente Ministro Rogerio Schietti Cruz, data em que ambos os reclamados foram comunicados da decisão.   

Desse modo, a conduta do reclamado contraria o que à época estabelecia o artigo 1º da Resolução 108/2010 do Conselho Nacional de Justiça, segundo o qual a expedição e o cumprimento de alvarás de soltura deveriam ocorrer no prazo máximo de 24 horas:

Art. 1º. O juízo competente para decidir a respeito da liberdade ao preso provisório ou condenado será também responsável pela expedição e cumprimento do respectivo alvará de soltura, no prazo máximo de vinte e quatro horas.

 

Destaque-se que aquele ato normativo, em seu artigo  1º, § 1º, previa também que “O Tribunal poderá delegar ao juízo de primeiro grau o cumprimento de decisão determinando a soltura, caso em que a comunicação será feita imediatamente após a decisão, a fim de possibilitar a observância do prazo previsto no caput”.

- SÉRGIO LUIZ ARRUDA PARENTE, Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará.

O Desembargador reclamado, ciente da existência de pessoa presa por cerca de cinco meses por furto simples e não obstante a existência de pedido da acusação de arquivamento do Inquérito por ausência de crime, teria se omitido em apreciar o pedido de liminar em Habeas Corpus por período superior a duas semanas, mesmo sendo flagrante o excesso de prazo.

Em sua defesa, argumentou o reclamado que a mora na análise do pedido teria justificativa na sua compreensão jurídica particular sobre a aplicação do princípio da insignificância. Ocorre, porém, que não era esse o âmago da controvérsia, mas sim o pedido de liberdade pelo excesso de prazo. Conforme redação em vigor do artigo 28 do Código de Processo Penal, a discordância em relação ao arquivamento do Inquérito só poderia ser manifestada ao Procurador-Geral de Justiça pelo Juiz de primeiro grau:

Art. 28.  Se o órgão do Ministério Público, ao invés de apresentar a denúncia, requerer o arquivamento do inquérito policial ou de quaisquer peças de informação, o juiz, no caso de considerar improcedentes as razões invocadas, fará remessa do inquérito ou peças de informação ao procurador-geral, e este oferecerá a denúncia, designará outro órgão do Ministério Público para oferecê-la, ou insistirá no pedido de arquivamento, ao qual só então estará o juiz obrigado a atender. 

 

Dessa forma, não procede a justificativa do reclamado de que não deu a necessária celeridade ao caso porque tem interpretação diferente sobre a incidência do princípio da insignificância, pois a questão central objeto da liminar no HC era apenas o excesso de prazo. 

Saliente-se que não se pode imputar à defesa afronta ao princípio da cooperação processual, como pretendeu o reclamado, quando, em virtude da inquestionável mora de ambas as autoridades judiciárias reclamadas, teve que se socorrer do Superior Tribunal de Justiça para que fosse sanado o constrangimento ilegal apontado pelo STJ.

O dever de diligência e de dedicação do magistrado independe de pedido da parte ou da defesa técnica, mas, ao contrário, é inerente ao exercício da magistratura, podendo constituir, a sua não observância, infração disciplinar, nos termos do artigo 35, II, da LOMAN e do artigo 20 do Código de Ética da Magistratura Nacional.

Entretanto, neste caso, o que se afigura realmente decisivo para o excesso de prazo é a atuação do magistrado de primeiro grau, que teve relevância superior e decisiva, se comparada à mora do julgador de segundo grau em despachar o pedido de Habeas Corpus.

Dessa forma, quanto a Sérgio Luiz Arruda Parente, é cabível o arquivamento desta Reclamação Disciplinar.

No que se refere a Fabrício Vasconcelos Mazza, é recomendável submeter a questão ao Plenário, visando à instauração de Processo Administrativo Disciplinar para a efetiva apuração dos fatos.  

Pelo exposto, diante da existência de elementos indiciários de afronta, em tese, ao art. 35, II, da LOMAN, c/c o art. 20 do Código de Ética da Magistratura Nacional, voto pela instauração de processo administrativo disciplinar contra FABRÍCIO VASCONCELOS MAZZA, Juiz de Direito da 15ª Vara Criminal de Fortaleza – CE, e pelo arquivamento da RD com relação a SÉRGIO LUIZ ARRUDA PARENTE, Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará.

É como voto. 

  

Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO   

Corregedor Nacional de Justiça   

 

J5/F29

 

 

  

PORTARIA N.       DE                       DE  2022.  

   

Instaura processo administrativo disciplinar em desfavor de magistrados sem afastamento cautelar das funções. 

   

O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, usando das atribuições previstas nos arts. 103-B, § 4º, III, da Constituição Federal, e 6º, XIV, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e 

CONSIDERANDO a competência originária e concorrente do Conselho Nacional de Justiça para processar investigações contra magistrados independentemente da atuação das corregedorias e tribunais locais, expressamente reconhecida pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal na apreciação da liminar na ADI n. 4.638/DF; 

CONSIDERANDO o disposto no § 5º do art. 14 da Resolução CNJ n. 135, de 13 de julho de 2011, e as disposições pertinentes da Lei Complementar n. 35, de 14 de março de 1979 (Lei Orgânica da Magistratura Nacional), da Lei n. 8.112, de 11 de dezembro de 1990 (Regime Jurídico dos Servidores Públicos Civis da União), da Lei n. 9.784, de 29 de janeiro de 1999, e do Regimento Interno do CNJ;

CONSIDERANDO que houve suposta desídia do requerido FABRÍCIO VASCONCELOS MAZZA, Juiz de Direito da 15ª Vara Criminal de Fortaleza – CE, que deixou de analisar pedido ministerial de arquivamento de inquérito por atipicidade material da conduta por cerca de cinco meses, sem reexaminar a prisão preventiva do paciente, conforme previsão do artigo 316 do CPP;

CONSIDERANDO que houve também mora do requerido FABRÍCIO VASCONCELOS MAZZA na determinação da soltura do paciente, tendo sido expedido o alvará de soltura somente seis dias após o julgamento do STJ, em contrariedade ao que estabelece o artigo 1º da Resolução 108/2010 do Conselho Nacional de Justiça; 

CONSIDERANDO que há indícios de que o requerido tenha incorrido em afronta aos deveres de diligência e dedicação, bem como de não exceder injustificadamente os prazos para sentenciar ou despachar;

CONSIDERANDO a decisão proferida pelo Plenário do Conselho Nacional de Justiça, no julgamento do Reclamação Disciplinar 0005247-54.2021.2.00.0000, durante a  __ Sessão, realizada no dia______________.                          

RESOLVE: 

Art. 1º Instaurar processo administrativo disciplinar em desfavor de FABRÍCIO VASCONCELOS MAZZA, Juiz de Direito da 15ª Vara Criminal de Fortaleza – CE, para apurar eventual violação, em tese, do art. 35, II, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (LOMAN), bem como a não observância do dever de diligência e dedicação, previsto no art. 20 do Código de Ética da Magistratura, que deve nortear a conduta de todos os magistrados.

Art. 2º Determinar que a Secretaria do CNJ dê ciência ao Presidente do Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba da decisão tomada pelo Conselho Nacional de Justiça e da abertura de processo administrativo disciplinar objeto desta Portaria, sem afastamento cautelar das funções.

Art. 3º Determinar a livre distribuição do processo administrativo disciplinar entre os Conselheiros nos termos do art. 74 do RICNJ.




 

  

Ministra ROSA WEBER

Presidente do Conselho Nacional de Justiça

  

 

 J5/F29