Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: REVISÃO DISCIPLINAR - 0006514-61.2021.2.00.0000
Requerente: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO - TJRJ e outros

 


 

REVISÃO DISCIPLINAR. ABERTURA DE OFÍCIO PELO CNJ. PAD. TJRJ. REQUISITO PARA A REMOÇÃO. INEXISTÊNCIA DE PROCESSOS CONCLUSOS HÁ MAIS DE 30 DIAS. APRESENTAÇÃO DE CERTIDÃO NEGATIVA. REMOÇÃO EFETIVADA. POSTERIOR CONSTATAÇÃO DE MILHARES DE PROCESSOS AGUARDANDO CONCLUSÃO. PENA DE CENSURA. INADEQUAÇÃO. ANTECEDENTES. SANÇÕES DISCIPLINARES PRÉVIAS. PROCEDÊNCIA DA REVISÃO. MODIFICAÇÃO DA PENA. APLICAÇÃO DE DISPONIBILIDADE.

 

1.     Revisão Disciplinar instaurada de ofício pelo CNJ para apurar a proporcionalidade da pena de censura aplicada a magistrado que apresentou, em concurso de remoção, certidão negativa não condizente com a realidade do acervo da vara.

2.     No momento da remoção do magistrado efetivamente não havia processos conclusos na respectiva localização virtual, conforme atestado na certidão. Contudo, o atesto não refletiu a realidade do acervo da unidade, dada a existência de milhares de processos represados na localização virtual “aguardando conclusão”.

3.  Constatação da Corregedoria local, em inspeções anteriores, da adoção de pré-conclusão. Orientação para abertura imediata de conclusão não atendida pelo magistrado.

4.    Aplicação prévia de sanções disciplinares. Reiteração de conduta.

5.    Situação concreta que justifica a adoção de pena mais grave que a censura.

6.  Procedência da Revisão Disciplinar para modificar a pena de censura aplicada na origem para a pena de disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço.


 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, julgou procedente a revisão disciplinar para aplicar a pena de disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço ao magistrado, nos termos do voto da Relatora. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário Virtual, 30 de setembro de 2022. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, Sidney Madruga, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: REVISÃO DISCIPLINAR - 0006514-61.2021.2.00.0000
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RELATÓRIO  

  

Trata-se de Revisão Disciplinar instaurada de ofício pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) por meio da qual o Plenário, por unanimidade, determinou a abertura de procedimento para a verificação da adequação e proporcionalidade da pena de censura imposta a Cláudio Cardoso França, Juiz de Direito do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ), nos autos do Processo Administrativo Disciplinar (PAD) n. 0059285-55.2019.8.19.0000.

Os fatos sob apuração no aludido PAD foram delimitados na Portaria n. 6/2019 (id. 4487039, p. 3/4), por violação aos deveres previstos no art. 35, I, III e VIII, da LOMAN e art. 37 do Código de Ética da Magistratura, consubstanciados em suposta fraude ao critério de remoção por merecimento/antiguidade ao atestar a inexistência de processos conclusos há mais de 30 dias, tendo conhecimento da existência de 2783 processos paralisados aguardando conclusão.

O TJRJ juntou cópia integral do PAD (ids. 4487038 a 4487051) e asseverou a fundamentação de todas as decisões constantes do processo, bem como o respeito aos princípios constitucionais do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa (id. 4466441).

O magistrado requerido aduziu a inexistência de fraude nos documentos apresentados para concorrer à remoção, porquanto o art. 10, III, da Resolução TJ/OE/RJ n. 25/2016 estabelece o requisito de inexistência de autos conclusos há mais de 30 dias, e não de processos aguardando conclusão há mais de 30 dias.

Pontuou a atribuição do Departamento de Informações Gerenciais da Presidência (DEIG) de verificar o cumprimento da exigência e asseverou que seu pedido de remoção foi apreciado e deferido pelo Órgão Especial, o qual atestou a validade das certidões apresentadas, cujos dados foram extraídos do sistema eletrônico do tribunal, que não pode ser fraudado.

Negou a alegação de ter proibido a conclusão de processos, e sim a praxe de abertura de conclusão gradativa (salvo casos urgentes), tal como adotada em outras serventias. Noticiou a existência no sistema, à época, de movimento “aguardando conclusão” para fazer referência a processos ainda localizados em cartório.

Requereu a produção de prova documental suplementar e a oitiva da Chefe da Serventia, assim como o arquivamento da Revisão Disciplinar, com a manutenção da sanção imputada na origem.

O relator originário indeferiu a produção de prova pleiteada (id. 4517509).

O Ministério Público Federal, em alegações finais, manifestou-se pelo conhecimento e procedência do pedido para ser aplicada a pena de disponibilidade, e argumentou, em síntese (id. 4541798): (i) o conhecimento da ilicitude da conduta em decorrência da prévia punição do magistrado em 4 processos administrativos disciplinares que envolvem a remessa de autos ao ambiente “aguardando conclusão”, (ii) o dolo específico da conduta irregular, praticada com o objetivo de burlar o procedimento de remoção; (iii) a demonstração da inadequação da pena de censura ante a reincidência.

Nas razões finais da defesa, o magistrado reiterou as alegações anteriores, e acrescentou (id. 4562673): (i) a taxatividade das hipóteses de cabimento da revisão, que possui natureza rescisória disciplinar, e não recursal; (ii) a aplicação de sanção conforme a lei e as provas carreadas aos autos.

É o relatório.

 

 

 

Conselho Nacional de Justiça

 

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VOTO

           

A presente Revisão Disciplinar foi instaurada pelo Plenário do CNJ para apreciar a decisão tomada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ), que julgou procedente o PAD n. 0059285-55.2019.8.19.0000 e, por maioria, aplicou a pena de censura ao Juiz Cláudio Cardoso França, por violar os deveres previstos no art. 35, I, III, e VIII, da LOMAN, e no art. 37 do Código de Ética da Magistratura.

Considerando o trânsito em julgado certificado na origem em 22/3/2021 (Id. 4487046, p. 51) e a abertura desta Revisão Disciplinar aprovada na Sessão Plenária do Conselho Nacional de Justiça realizada em 13/8/2021, atendido o requisito temporal trazido no art. 103-B, § 4°, V, da CF c/c art. 82, RICNJ.

Os fatos avaliados no processo administrativo disciplinar são lastreados na inspeção realizada em 28/3/2019 pela equipe da Corregedoria-Geral de Justiça do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) na 5ª Vara Cível da Comarca de Campos dos Goytacazes, serventia titularizada pelo magistrado no período compreendido entre 3/4/2007 a 31/1/2019 (id. 4487038, p. 30). O relatório de inspeção consta do id. 4487038, p. 8/59.

Em 8/2/2021 ocorreu o julgamento do PAD n. 0059285-55.2019.8.19.0000 no Órgão Especial do TJRJ. O acórdão prolatado pela Corte fluminense restou assim ementado:

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. Imputação de fraude ao critério de remoção por antiguidade. Prova entranhada que demonstra a paralisação de mais de dois mil processos na Serventia da 5ª Vara Cível da Comarca de Campos dos Goytacazes. Alteração dos locais virtuais dos autos dos processos, sem, contudo, ocorrer o efetivo impulso ao andamento dos processos. Configuração de prática de atos procrastinatórios pelo magistrado. Ofensa aos artigos 35, incisos I, III e VIII na LC nº 35/1979 (LOMAN), e 37, do Código de Ética da Magistratura. Conduta faltosa reiterada. Aplicação da penalidade prevista no art. 42, II, da LC nº 35/1979 (LOMAN). Procedência da representação, por maioria.  (Id. 4487046, p. 13/25 – grifo nosso)

 

                  Os principais documentos do PAD TJRJ n. 0059285-55.2019.8.19.0000 constam dos seguintes ids:

 

Ato

 (PAD TJRJ n. 0059285-55.2019.8.19.0000)

Id.

 (RevDis CNJ)

Relatório de Inspeção da equipe da Corregedoria do TJRJ realizada em 28/3/2019

Id. 4487038, p. 8/59

Parecer da Juíza Auxiliar da Corregedoria (TJRJ) em que opina pela autuação como representação pela abertura de Processo Administrativo Disciplinar

Id.­­ 4487038, p.  207/212

Decisão do Corregedor-Geral da Justiça em que acolhe o parecer da Juíza Auxiliar

Id.­­ 4487038, p. 213

Acórdão Órgão Especial (abertura do PAD, por unanimidade, sem afastamento das funções).

J. em: 7/10/2019

Id.­­ 4487038,

p. 265/308

Portaria TJRJ n. 6/2019 – abertura do PAD

Id. 4487039, p. 3/4

Acórdão PAD TJRJ.

J. em: 8/2/2021

Id. 4487046, p. 13/25

Publicação do acórdão: 26/2/2021

Id. 4487046, p.31

Certidão de trânsito em julgado

Id. 4487046, p. 51

 

De acordo com o art. 83 do Regimento Interno do CNJ, a Revisão Disciplinar tem pertinência nos seguintes casos: I - quando a decisão for contrária a texto expresso da lei, à evidência dos autos ou a ato normativo do CNJ; II - quando a decisão se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos; III - quando, após a decisão, surgirem fatos novos ou novas provas ou circunstâncias que determinem ou autorizem modificação da decisão proferida pelo órgão de origem.

O exame acurado dos documentos encartados neste procedimento demonstra que a pena aplicada pelo TJRJ necessita ser modificada, porquanto em descompasso com a evidência dos autos, como adiante se verá.

 

O magistrado requerido foi removido em 1/2/2019 (id. 4487038, p. 30), por antiguidade, da 5ª Vara Cível da Comarca de Campos dos Goytacazes para a Vara da Infância, da Juventude e do Idoso da mesma Comarca, oferecida à remoção por meio do edital n. 1/2019, de 8/1/2019 (id. 4487048, p. 3/4).

Constou da peça convocatória a expressa menção ao cumprimento de exigências para a movimentação, nos seguintes termos: “deverão ser atendidos os requisitos previstos na Resolução nº 8/20022 do E. Órgão Especial e na Resolução nº 106/2010 do Conselho Nacional de Justiça, na forma da Resolução nº 25/2016 do E. Órgão Especial” (id. 4487048, p. 3).

O inciso III do art. 10 da Resolução TJ/OE/RJ n. 25/2016 estabeleceu a necessidade de comprovação de “não reter injustificadamente autos além de 30 (trinta) dias, não podendo devolvê-los à serventia sem despacho ou decisão ou com despachos pelos quais se apurar notória tentativa de burlar o prazo legal para decisão” (id. 4487048, p. 11- grifo nosso).

Após a inscrição para concorrer à remoção, o Departamento de Informações Gerenciais da Presidência (DEIGE) remeteu ao magistrado, em 15/1/2019, listagem na qual constavam processos conclusos há mais de 30 dias (id. 4487048, p. 15/22). Sanadas, em tese, as pendências, o magistrado foi removido para a vara a que concorreu.

Ao assumir provisoriamente a 5ª Vara Cível da Comarca de Campos dos Goytacazes, o magistrado Heitor Carvalho Campinho constatou a existência de 3.154 (três mil, cento e cinquenta e quatro) processos na localização “aguardando conclusão”, fatos comunicados à Corregedoria local em 5/2/2019 (id. 4487038, p. 31).

Na inspeção realizada pelo órgão censor em 28/3/2019, “havia 2.783 (dois mil, setecentos e oitenta e três) feitos no lugar virtual aguardando conclusão, 956 (novecentos e cinquenta e seis) feitos no local virtual digitação, 1682 (mil seiscentos e oitenta e dois) feitos no local virtual processamento e 748 (setecentos e quarenta e oito) feitos no local virtual aguardando prazo” (id. 4487038, p. 41/21).

O represamento de processos é irrefutável nos autos, e em nenhum momento foi rechaçado pelo magistrado. Ao contrário, em todas as manifestações realizadas nesta RevDis e na origem, o requerido justificou esse reprovável expediente como uma praxe amplamente adotada em outras varas, não se podendo falar, portanto, em fraude.

Vê-se que o magistrado não apenas tinha conhecimento da pendência de conclusão de processos aptos para tanto, como proibia os servidores da pronta abertura da conclusão (id. 4466447, p. 10). Segundo a Corregedoria local,

Em verdade, a atuação do magistrado já havia ensejado outras inspeções e fiscalizações desta CGJ e naquelas ocasiões também foram localizados enorme acervo, grande número de feitos paralisados e milhares de processos aguardando remessa à conclusão durante enorme lapso temporal, na forma consignada nos respectivos relatórios, que faço juntar nesta data, conduta esta que não se modificou, sendo, na forma ora constatada, reiterada. A reiteração das referidas condutas por parte do magistrado revela-se, por exemplo, a partir dos seguintes relatórios de inspeção realizados por esta Corregedoria de Justiça, sendo a mais antiga datada de 2009, ou seja, há dez anos: 2018-01007845, 2018-0031551, 2017-0120621, 2017-0059385, 2013-081973, 2016-0177691, 2019-023194 e 2009-206425 (processo no órgão Especial). (id. 4487038, p. 208 – grifo nosso)

 

A título de exemplo, cabe explicitar o que constou dos relatórios elaborados pela Divisão de Fiscalização Judicial nos 3 anos anteriores à remoção:

 

Ano

Constatação

Orientação/sugestão

2018

2.231 (dois mil duzentos e trinta e um) feitos aguardando abertura de conclusão ao Magistrado, sendo 1.468 (mil quatrocentos e sessenta e oito) processos físicos - o mais antigo aguarda desde 06/10/2016 e 763(setecentos e sessenta e três) eletrônicos - o mais antigo aguarda desde 18/08/2017

 

83(oitenta e três) processos eletrônicos aguardando "Abertura de Conclusão Medida Urgente" - o mais antigo aguarda desde 12/09/2017;

 

(id. 4487050, p. 77);

Abertura de conclusão dos feitos que se encontram no cartório na situação de "aguardando conclusão", na forma prevista no artigo 246 e seus incisos, da Consolidação Normativa da Corregedoria Geral da justiça, não permitindo que novos feitos fiquem represados nessa situação no cartório;

 

Abertura de conclusão dos processos eletrônicos que se encontram no local virtual "aguardando conclusão medida urgente", os quais aguardam despacho inicial. É importante que a abertura de conclusão seja igualmente realizada nos processos eletrônicos;

 

(id. 4487050, p. 79 – grifo nosso)

2017

 

765 (setecentos e sessenta e cinco) feitos aguardando abertura de conclusão ao Magistrado, sendo 500 (quinhentos) processos físicos e 265 (duzentos e sessenta e cinco) processos eletrônicos

 

(id. 4487050, p. 32)

Abertura de conclusão dos feitos que se encontram no cartório na situação de "aguardando conclusão", na forma prevista no artigo 246 e seus incisos, da Consolidação Normativa da Corregedoria Geral da Justiça, não permitindo que novos feitos fiquem represados nessa situação no cartório;

 

Abertura de conclusão dos processos eletrônicos que se encontram no local virtual "aguardando conclusão medida urgente", os quais aguardam despacho inicial. É importante que a abertura de conclusão seja igualmente realizada nos processos eletrônicos;

 

(id. 4487050 p. 34 – grifo nosso)

2016

Além dos feitos pendentes de processamento no cartório, constatamos a existência de aproximadamente 600 feitos pendentes de abertura de conclusão, processados a partir do mês de novembro de 2015.

 

(id. 4487051, p. 36)

Observo que se esses feitos ficarem na serventia aguardando que os demais sejam devolvidos da conclusão, em pouco tempo se dará novo acúmulo.

Em razão disso, entendo ser prudente que o apoio do GEAPC -Gabinete atue, inicialmente, nos feitos que estão pendentes de conclusão a partir de julho de 2015, possibilitando que a conclusão fique em dia ao termino do apoio.

Para tanto, a equipe do processamento — GEAP-C, deverá priorizar a abertura de conclusão dos feitos pendentes, acima mencionados.

 

(id. 4487051, p. 37 – grifo nosso)

 


No momento da remoção do magistrado efetivamente não havia processos conclusos na respectiva localização virtual, conforme atestado na certidão. Contudo, o atesto não refletiu a realidade do acervo da unidade, dada a existência de milhares processos represados na localização virtual “aguardando conclusão”.

A adoção da pré-conclusão é ato protelatório que por si só viola o art. 228 do Código de Processo Civil, o qual determina a remessa à conclusão no prazo de 1 dia da finalização do ato processual anterior. No caso sob exame, a gravidade da situação foi precisamente demonstrada pela Corregedoria Local:

 

“A questão não se resume exclusivamente a autos sem movimentação, o que já é grave. As irregularidades praticadas envolvem o manuseio artificioso e ardiloso dos processos para desviá-los da conclusão, ou seja, alijá-los da possibilidade de receberem impulso oficial. Pior: a finalidade dessa prática foi, no caso, impedir a inclusão desses processos em lista de autos conclusos e facilitar a obtenção da certidão negativa do DEIGE.”

(id. 4487042, p. 3)

 

É de se pontuar que a vedação da movimentação decorrente do acúmulo de processos não se refere à mera norma interna constante do edital e da Resolução n. 25/2016 do TJRJ. A Constituição Federal preceitua a impossibilidade de promoção de magistrados no caso de retenção de autos, ao estabelecer que “não será promovido o juiz que, injustificadamente, retiver autos em seu poder além do prazo legal, não podendo devolvê-los ao cartório sem o devido despacho ou decisão” (CRFB, art. 93, II, e).

Como se sabe, os requisitos da promoção são aplicáveis à remoção, conforme autoriza o texto constitucional (CRFB, art. 93, VIII) e a jurisprudência do CNJ:

 

“As normas que regem a aferição do merecimento são as estabelecidas pela Constituição Federal e pela Resolução CNJ nº 106/2010. Vale esclarecer que apesar de se estar tratando de processo de remoção e as disposições legais citadas se referirem ao de promoção, a norma constitucional remete expressamente aos dispositivos que tratam da promoção para disciplinar o procedimento de remoção a pedido ou a permuta de magistrados de comarca de igual entrância (art. 93, VIII-A). (CNJ - PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0006117-12.2015.2.00.0000 - Rel. GUSTAVO TADEU ALKMIM - 30ª Sessão Extraordinária - julgado em 04/10/2016).

 

 

Verificados todos os documentos encartados nesta revisional, constata-se que a penalidade de censura atribuída pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro merece alteração.

 

A Divisão de Pessoal da Magistratura noticiou a aplicação prévia de pena de advertência no ano de 2016, pena de censura em 2020, e duas anotações de abertura de processo disciplinar em 2019 (id. 4487045, p. 16).

Constou dos autos, ainda, a informação trazida pelo MPRJ, em sede de alegações finais, de que “o magistrado já foi punido em quatro Processos Administrativos Disciplinares que envolvem a remessa de autos ao ambiente ‘aguardando conclusão´, o que demonstra seu conhecimento da ilicitude da conduta: 0051384-12.2014.8.19.0000, 0013859-20.2019.8.19.0000, 0016917-31.2019.8.19.0000 e 0016920-83.2019.8.19.0000” (id. 4487045, p. 28 - grifo nosso).

Desse modo, a censura aplicada na origem é insuficiente para o caso concreto, porquanto as penas anteriormente aplicadas não foram capazes de produzir efeitos pedagógicos ao magistrado, a fim de que aperfeiçoasse a gestão da unidade, com adequação das rotinas às normativas em vigor.

A alegação de que a conduta praticada é também verificada em outras serventias não afasta a caracterização da falta funcional. Na realidade, seria o caso de serem apuradas as condutas irregulares dos demais magistrados, e não de mitigar a infração cometida pelo revisionando.

No caso em apreço, a tipificação da conduta foi adequadamente enquadrada no art. 35, I, III e VIII, da LOMAN e art. 37 do Código de Ética da Magistratura:

LOMAN

Art. 35 - São deveres do magistrado

 

     I - Cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício;

 

[...]

 

     III - determinar as providências necessárias para que os atos processuais se realizem nos prazos legais;

[...]

 

     VIII - manter conduta irrepreensível na vida pública e particular.

 

***

CÓDIGO DE ÉTICA DA MAGISTRATURA

 

Art. 37. Ao magistrado é vedado procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções. 

 

Por outro lado, equivocada a dosimetria da pena.  

A pena de censura é prevista no caput do art. 44 da LOMAN (g.n.):

Art. 44 - A pena de censura será aplicada reservadamente, por escrito, no caso de reiterada negligência no cumprimento dos deveres do cargo, ou no de procedimento incorreto, se a infração não justificar punição mais grave. 

           

O dispositivo acima, também reproduzido no art. 4º da Resolução CNJ n. 135/2011, expressamente ressalvou a aplicação de penalidade mais grave se a infração cometida assim justificar. É o caso dos autos. 

 Nesse sentido, colhe-se da jurisprudência do CNJ:

 

REVISÃO DISCIPLINAR. MAGISTRADO. TJDFT. IRREGULARIDADES NA CONDUÇÃO DE VARA JUDICIAL. ESTATÍSTICA ALTERADA EM DECORRÊNCIA DE REGISTROS INDEVIDOS NO SISTEMA INFORMATIZADO. CONSIDERÁVEL QUANTIDADE DE PROCESSOS COM IRREGULARIDADES - PRAZO E ANDAMENTO PROCESSUAL (75,58%). INASSIDUIDADE FUNCIONAL COMPROVADA. PRETENSÃO DE DESCONSTITUIÇÃO DA PENA DE DISPONIBILIDADE COM VENCIMENTOS PROPORCIONAIS AO TEMPO DE SERVIÇO. IMPOSSIBILIDADE. PENA APLICADA EM CONSONÂNCIA COM O ARCABOUÇO PROBATÓRIO PRODUZIDO NOS AUTOS. PROPORCIONALIDADE E ADEQUAÇÃO. CONTRARIEDADE À EVIDÊNCIA DOS AUTOS NÃO DEMONSTRADA. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO REVISIONAL.

(CNJ - REVDIS - Processo de Revisão Disciplinar - Conselheiro - 0001341-32.2016.2.00.0000 - Rel. BRUNO RONCHETTI        - 23ª Sessão Virtual - julgado em 23/06/2017 – grifo nosso).

 

***

 

REVISÃO DISCIPLINAR. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO. PAD 46.194/2017. RESOLUÇÃO TJSP 587/2013. PORTARIA DE INSTAURAÇÃO. EXCESSO DE PRAZO. AUSÊNCIA DE NULIDADES. MAGISTRADA. PROCESSOS CONCLUSOS COM EXCESSO DE PRAZO. FALTA FUNCIONAL. CONFIGURAÇÃO. CONDUTA NEGLIGENTE. REITERAÇÃO. DISPONIBILIDADE. PROPORCIONALIDADE.

1.Pedido de revisão disciplinar em face de decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo que aplicou à magistrada a pena de disponibilidade com vencimentos proporcionais.

[...]

8. As imputações denotam a ausência de zelo da requerente na condução dos processos ativos na unidade judiciária de sua titularidade. As falhas processuais, sobretudo diante de recidivas e mesmo após a aplicação das penas de advertência e censura, autorizam a imposição da pena de disponibilidade. A reprimenda não é desarrazoada e se mostra adequada ao grau de culpabilidade.

9.Pedido julgado improcedente.

(CNJ - REVDIS - Processo de Revisão Disciplinar - Conselheiro - 0006489-82.2020.2.00.0000 - Rel. CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM - 336ª Sessão Ordinária - julgado em 17/08/2021).

 

              Conclui-se, assim, que pena de disponibilidade é a que mais se coaduna com os elementos constantes dos autos, notadamente pelos antecedentes disciplinares do magistrado, que justificam a imposição de penalidade mais severa.

 

  Ante o exposto, nos termos do art. 88 do Regimento Interno, JULGO PROCEDENTE a revisão disciplinar para aplicar a pena de disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço ao magistrado CLÁUDIO CARDOSO FRANÇA. 

   É como voto. 

   Intimem-se e após, arquive-se

 

Conselheira Salise Sanchotene

Relatora