Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0006440-75.2019.2.00.0000
Requerente: ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS MAGISTRADOS ESTADUAIS - ANAMAGES e outros
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO - TJSP

 

 

QUESTÃO DE ORDEM EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO. REAPROVEITAMENTO DE MAGISTRADO COLOCADO EM DISPONIBILIDADE NO ANO DE 1993. PORTARIA N. 9.429/2017 DO TJSP. REQUISITOS E PROCEDIMENTO PARA REAPROVEITAMENTO. DESCUMPRIMENTO DE ACORDÃO DO CNJ PROFERIDO NESTES AUTOS. CASSAÇÃO DA DECISÃO DO TJSP QUE ARQUIVOU O PEDIDO DE REAPROVEITAMENTO DO MAGISTRADO. REGULAMENTAÇÃO DA MATÉRIA PELO CNJ. RESOLUÇÃO N. 323/2020. REAVALIAÇÃO DA CAPACIDADE TÉCNICA E JURÍDICA POR MEIO DE FREQUÊNCIA OBRIGATÓRIA A CURSO OFICIAL NA ESCOLA DA MAGISTRATURA. QUESTÃO DE ORDEM RESOLVIDA.

1. Questão de ordem suscitada por magistrado do TJSP, afastado do cargo em 1993 por penalidade de disponibilidade compulsória, com vencimentos proporcionais, aplicada no âmbito de PAD, na qual alega descumprimento, pelo Tribunal requerido, de decisão plenária do CNJ, e postula instauração de Reclamação para Garantia das Decisões, bem como a cassação do ato infrator e regular prosseguimento do pedido de reaproveitamento.

2. De acordo com o acordão proferido pelo CNJ, em relação à avaliação da capacidade técnica e jurídica  do magistrado em disponibilidade, foi declarada a necessidade de modificação da avaliação técnica e jurídica tal como prevista no inciso III do art. 2º, c/c art. 10, ambos da Portaria n. 9.429/2017 do TJSP, com determinação de exclusão do caráter seletivo e recomendação de capacitação do magistrado por meio de frequência a cursos oficiais ministrados pela Escola da Magistratura.

3. O TJSP não promoveu a participação do magistrado em cursos da Escola da Magistratura, tampouco adotou qualquer providência direcionada ao aproveitamento do magistrado. Ao contrário, determinou o arquivamento do pedido de reaproveitamento formulado, por entender adequada a avaliação técnica e jurídica realizada, sem exclusão do caráter seletivo, descumprindo a decisão proferida pelo CNJ.

4. A Resolução CNJ n. 323, de 7 de julho de 2020, fixou novos parâmetros para a análise do pedido de aproveitamento de magistrado em disponibilidade, cabendo ao tribunal ao qual vinculado o magistrado promover: I – sindicância da vida pregressa e investigação social; II – reavaliação da capacidade física, mental e psicológica; III – reavaliação da capacidade técnica e jurídica, por meio de frequência obrigatória a curso oficial ministrado pela Escola da Magistratura (art. 6º da Resolução CNJ n. 135/2011).

5. Considerando descumprimento do acórdão deste Conselho pelo TJSP, torna-se cabível a cassação da decisão do TJSP que arquivou o pedido de reaproveitamento do magistrado e determinação para que o Tribunal promova a reavaliação da capacidade técnica e jurídica do magistrado, nos termos do art. 6º da Resolução n. 135/2011 do CNJ, excluído o caráter seletivo da avaliação. 

6. Questão de ordem resolvida. Procedentes os pedidos.

 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, julgou procedente o pedido de cassação da decisão do TJSP que arquivou o pedido de reaproveitamento do magistrado, a fim de viabilizar o prosseguimento do procedimento perante o Tribunal Paulista, nos termos do voto da Relatora. Ausentes, em razão das vacâncias dos cargos, os representantes do Tribunal Superior do Trabalho, do Tribunal Regional Federal e da Justiça Federal. Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Plenário, 19 de outubro de 2021. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Luiz Fux, Maria Thereza de Assis Moura, Luiz Fernando Tomasi Keppen, Tânia Regina Silva Reckziegel, Mário Guerreiro, Flávia Pessoa, Sidney Madruga, Ivana Farina Navarrete Pena, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, André Godinho, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Sustentou oralmente pelos Requerentes, o Advogado Cristóvam Dionísio de Barros Cavalcanti Junior - OAB/MG 130.440.

Conselho Nacional de Justiça

Gabinete da Conselheira Tânia Regina Silva Reckziegel

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0006440-75.2019.2.00.0000
Requerente: ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS MAGISTRADOS ESTADUAIS - ANAMAGES e outros
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO - TJSP


RELATÓRIO

 

 

Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo instaurado com a finalidade de se verificar a juridicidade da Portaria n. 9.429, de 1º de agosto de 2017 (Id 3735201), editada pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), que estabeleceu o procedimento para reaproveitamento do magistrado requerente, colocado em disponibilidade por força do acórdão proferido em 10 de fevereiro de 1993, nos autos do Processo Administrativo Disciplinar n. G-29-666/91.

A aludida Portaria estabeleceu que o procedimento de reaproveitamento do magistrado contemplaria as seguintes etapas (art. 2º e 10):

1ª etapa:   sindicância da vida pregressa e investigação social;

2ª etapa:  reavaliação da capacidade física, mental e psicológica; e

3ª etapa: reavaliação da capacidade técnica e jurídica, por meio de uma prova objetiva seletiva, uma prova escrita e uma prova oral.

 

Ademais, o TJSP estabeleceu que se houvesse indeferimento do pedido de reaproveitamento do magistrado, somente poderia ser feito novo pedido após o decurso do prazo de 2 anos (art. 15), apesar de o referido prazo restritivo de direito não ser amparado por qualquer lei.

O Plenário do CNJ examinou o caso e proferiu acórdão em 11/05/2020 (Id 3969742) determinando ao TJSP a exclusão do caráter seletivo da terceira etapa avaliativa do magistrado em disponibilidade, tendo em vista que não se trata de reingresso na carreira da magistratura por meio de concurso público (provas com caráter seletivo), já que não houve perda do cargo, mas sim a pena de disponibilidade.

Determinou-se, ainda, o afastamento do art. 15 da Portaria 9.429/2017, porquanto o cerceamento do direito ao reaproveitamento pelo prazo de, no mínimo, dois anos do indeferimento do pedido não encontra guarida em nenhum fundamento de ordem constitucional, legal ou regimental.

Por fim, pontuou-se a necessidade de o TJSP observar a definição, pelo CNJ, dos critérios de avaliação dos magistrados em disponibilidade, que ainda seriam definidos no âmbito da questão de ordem em andamento no PCA n. 0005442-15.2016, já que o referido processo foi usado como precedente que embasou a decisão proferida no presente PCA.

Ato contínuo, o presente PCA 0006440-75.2019 foi arquivado.

Ocorre que os requerentes formularam pedido de desarquivamento dos autos (Id 4093953), alegando descumprimento pelo TJSP do acórdão proferido pelo CNJ. Justificam que o Tribunal vem criando diversos empecilhos para o reaproveitamento do magistrado, e que não viabilizou sua participação nos cursos ministrados pela Escola da Magistratura, ao contrário, arquivou o Pedido de Reaproveitamento por entender que a terceira etapa da avaliação realizada estava de acordo com a orientação dada pelo CNJ. Apresentaram os seguintes pedidos: 

1)    1) seja instaurado procedimento de Reclamação para Garantia das Decisões, nos termos dos artigos 43, inciso XVI e 101, ambos do RICNJ;  

2)   2)  seja cassada a decisão do TJSP que determinou o arquivamento do processo de Pedido de Reaproveitamento nº 2020/50.780 do magistrado, determinando seu regular prosseguimento; bem como

3)    3) ordem ao Tribunal para que informe como se dará a reintegração gradual e adaptativa do magistrado, em respeito e cumprimento à decisão hierárquica do CNJ e ao artigo 6º, inciso III, da Resolução CNJ nº 323/2020, e quais cursos ministrados pela Escola Paulista da Magistratura deve frequentar e qual a carga horária. 

            Intimado a se manifestar, o TJSP (Id 4113331) informou que não houve violação ao acórdão de ID nº 3969742, prolatado por este Conselho, por entender que os parâmetros fixados pelo CNJ para a avaliação da capacidade técnica e jurídica do magistrado em disponibilidade foram observados pelo Tribunal de Justiça, razão pela qual arquivo o pedido de reaproveitamento. Ao final, pugna pela improcedência dos pedidos dos requerentes.

Encaminhei os autos à Presidência do CNJ, nos termos do art. 101, do Regimento Interno deste Conselho, contudo, conforme decisão constante do Id 4120025, o Presidente determinou devolução dos autos ao meu gabinete, tendo em vista a possibilidade de delegação dos atos de sua competência, nos termos dos arts. 101, 6º, XXV e 105, todos do RICNJ, para adoção das providências cabíveis.

É o relatório.

 

 

VOTO

Trata-se de desarquivamento dos autos para análise de questão de ordem decorrente da alegação dos requerentes ANAMAGES e PEDRO AMARAL DOS SANTOS (Id 4093953) de descumprimento, pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, do acórdão proferido pelo CNJ no dia 11 de maio de 2020 (Id 3969742), cujo objeto de exame foi a Portaria n. 9.429, de 1º de agosto de 2017 (Id 3735201), a qual estabeleceu o procedimento para reaproveitamento do magistrado requerente, em disponibilidade desde 10 de fevereiro de 1993.

A aludida Portaria definiu que o procedimento de reaproveitamento do magistrado contemplaria 3 etapas (art. 2º e 10). A primeira, sindicância da vida pregressa e investigação social; a segunda, reavaliação da capacidade física, mental e psicológica; e a terceira, reavaliação da capacidade técnica e jurídica, por meio de uma prova objetiva seletiva, uma prova escrita e uma prova oral.

Conforme se verifica do acórdão proferido nestes autos, foi determinado ao TJSP a exclusão do caráter seletivo da terceira etapa avaliativa (prevista no art. 2º e 10 da Portaria n. 9.429/2017), tendo em vista que não se trata de reingresso na carreira da magistratura por meio de concurso público (provas com caráter seletivo), já que não houve perda do cargo, mas sim a pena de disponibilidade.  

Ademais, o CNJ determinou o afastamento do art. 15 da Portaria n. 9.429/2017, porquanto o cerceamento do direito ao reaproveitamento pelo prazo de, no mínimo, dois anos do indeferimento do pedido não encontra guarida em nenhum fundamento de ordem constitucional, legal ou regimental.

Contudo, em que pese o CNJ ter declarado que a terceira etapa avaliativa – tal como prevista na Portaria impugnada - não estava legalmente adequada, por possuir natureza seletiva, e ter determinado nova avaliação do magistrado com proposta de frequência a cursos oficias ministrados pela Escola da Magistratura, o TJSP arquivou o Pedido de Reaproveitamento do magistrado sob o fundamento de que a avaliação já realizada havia atendido às orientações do CNJ, caracterizando claro descumprimento da decisão proferida no bojo deste PCA.

Destacam-se os itens 3 e 4 da ementa do acórdão:

EMENTA: RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINSTRATIVO. REAPROVEITAMENTO DE MAGISTRADO POSTO EM DISPONIBILIDADE. PORTARIA N. 9.429/2017 DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO. LEGALIDADE DAS ETAPAS 1 E 2. NECESSIDADE DE REFORMULAÇÃO DA ETAPA 3 (REAVALIAÇÃO DA CAPACIDADE TÉCNICA E JURÍDICA). AFASTAMENTO DA NATUREZA SELETIVA E DO PRAZO PARA NOVO PEDIDO DE REAPROVEITAMENTO (ART. 15 DA PORTARIA N. 9.429/2017). PROPOSTA DE CAPACITAÇÃO DO MAGISTRADO PELA ESCOLA PAULISTA DA MAGISTRATURA. PRECEDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1. A etapa avaliativa seletiva, na forma proposta no art. 10, I, da Portaria n. 9.429/2017, combinado com o art. 15 da Portaria n. 9.429/2017, corresponde a agravamento da sanção aplicada no procedimento administrativo disciplinar, porquanto pode obstar o direito ao reaproveitamento do magistrado por no mínimo 2 (dois) anos, criando limitação distinta daquela prevista na LOMAN (artigo 57, § 1º) e exorbitando as orientações expedidas pelo STF no MS n. 32.771/DF, e pelo CNJ em julgamentos precedentes.

2. Embora este Conselho não tenha impedido o TJSP de realizar procedimento destinado à “Reavaliação da Capacidade Técnica e Jurídica”, houve entendimento do Plenário, no âmbito do PCA 0005442-15.2016.2.00.0000, quanto à ilegalidade da natureza seletiva da terceira etapa do processo de reaproveitamento de magistrado, bem como quanto ao afastamento da aplicação do art. 15 da Portaria 9.314/2016 do TJSP analisada naquele expediente, o qual possui idêntico teor ao do art. 15 da Portaria 9.429/2017 do TJSP objeto deste processo, que estipula o prazo de dois anos para que o magistrado possa renovar o pedido de reaproveitamento, na hipótese de indeferimento.

3. Determina-se nova análise do pedido administrativo de reaproveitamento do magistrado, competindo ao Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo instaurar procedimento com reformulação da sistemática atualmente adotada para Reavaliação da Capacidade Técnica e Jurídica prevista no 10 da Portaria 9.429/2017, excluída a natureza seletiva, porquanto não se trata de reingresso na carreira da magistratura por meio de concurso público (provas com caráter seletivo), tendo em vista que não houve perda do cargo.

4. Recomenda-se, na mesma linha definida no âmbito do PCA n. 5442-15.2016, a previsão de frequência em curso(s) oficial(is) oferecido(s) pela Escola Paulista da Magistratura, diante da necessidade de atualização e aperfeiçoamento do magistrado que foi colocado em disponibilidade e já cumpriu o requisito temporal necessário para pleitear a sua reintegração, com posterior avaliação da aptidão do magistrado para o retorno imediato ou gradual e adaptativo ao exercício da judicatura. 

5. Determina-se o afastamento do art. 15 da Portaria 9.429/2017, porquanto o cerceamento do direito ao reaproveitamento pelo prazo de, no mínimo, dois anos do indeferimento do pedido não encontra guarida em nenhum fundamento de ordem constitucional, legal ou regimental. 

6. Recurso administrativo conhecido e não provido.

Ademais, destaca-se que a decisão plenária do CNJ – em 11 de maio de 2020 - recomendou a capacitação do magistrado pela Escola Paulista da Magistratura, o que não foi observado pelo TJSP. Todavia, em 07 de julho de 2020, o CNJ editou a Resolução n. 323/2020, que dispõe sobre a uniformização de normas relativas ao procedimento administrativo disciplinar aplicável aos magistrados, e tornou obrigatória a reavaliação da capacidade técnica e jurídica, por meio de frequência obrigatória a curso oficial ministrado pela Escola da Magistratura.

Assim, considerando que o descumprimento do acórdão enseja tomada de providências por parte deste Conselho, verifico que a determinação a ser feita em relação à avaliação da capacidade técnica e jurídica do magistrado encontra-se atualmente expressa na Resolução CNJ n. 323/2020 que alterou o art. 6º da Resolução CNJ n. 135/2011, nos seguintes termos:

Art. 1º O artigo 6º da Resolução CNJ nº 135/2011, que dispõe sobre a uniformização de normas relativas ao procedimento administrativo disciplinar aplicável aos magistrados, acerca do rito e das penalidades, e dá outras providências, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 6º .................................................................................

§ 1º Cumpridos dois anos de pena de disponibilidade, havendo pedido de aproveitamento, cabe ao tribunal ao qual vinculado o magistrado promover:

I – sindicância da vida pregressa e investigação social;

II – reavaliação da capacidade física, mental e psicológica; e

III – reavaliação da capacidade técnica e jurídica, por meio de frequência obrigatória a curso oficial ministrado pela Escola da Magistratura.


§ 2º Na análise do pedido, o tribunal procederá ao exame da subsistência das razões que determinaram a disponibilidade, ou da superveniência de fatos novos, quando deverá apontar motivo plausível, de ordem ética ou profissional, diverso dos fatos que ensejaram a pena.


§ 3º Devidamente instruído e fundamentado o procedimento, caberá ao tribunal ou Órgão Especial decidir quanto ao retorno imediato ou gradual e adaptativo do magistrado.”

             Outrossim, conforme relatado, o acórdão do dia 11/05/2020 pontuou a necessidade de o TJSP observar a definição que seria feita pelo CNJ, no âmbito do PCA n. 0005442-15.2016, dos critérios de avaliação dos magistrados em disponibilidade, já que ainda não havia sido editada a Resolução n. 323/2020. O referido PCA foi utilizado como parâmetro precedente, pois, em decorrência de acórdão preferido naquele processo, que analisou a legalidade da Portaria n. 9.341/2016 com idêntico teor à Portaria em análise neste expediente (de procedimento de reintegração de magistrado do TJSP em disponibilidade), foi instaurada a Reclamação para Garantia das Decisões n. 0001398-79.2018.2.00.0000, em que a Presidência do CNJ assim se manifestou:

Remanesce, todavia, uma relevante questão a ser dirimida pelo Plenário: em que exatamente, a par da frequência obrigatória a curso oficial ministrado pela Escola da Magistratura, consistiria a avaliação a que o Tribunal deve submeter o reclamante?

Com efeito, o Plenário decidiu que, antes do reaproveitamento do magistrado, há que se avaliar sua aptidão ou não para o retorno à atividade judicante e, em caso afirmativo, se esse retorno deverá ser feito de forma plena ou gradual (gradualidade que, exemplificativamente, poderia se fazer mediante frequência a curso de formação na Escola de Paulista da Magistratura no período matutino e, no período vespertino, mediante a presidência de audiências e a prolação de despachos e sentenças em auxílio a uma determinada Vara, sob supervisão, objetivando a readaptação progressiva do reclamante à função jurisdicional).

Nesse particular, o voto condutor do acórdão paradigma observou que competiria à Escola de Magistratura (ou a outro órgão do Tribunal, na dicção da maioria), “por meio de sua equipe técnica e observados os parâmetros fixados na Resolução ENFAM n. 2/2016, avaliar a aptidão do magistrado para retorno imediato ou a adequação/ oportunidade do retorno gradual e adaptativo ao exercício da função judicante.”

Ora, o art. 6º da Resolução ENFAM nº 2/2016, ao tratar do programa de formação inicial de magistrados, impõe a “frequência integral como um dos requisitos para a aprovação”, o que significa dizer que outros requisitos, em tese, poderiam vir a ser impostos. Essas questões, a toda evidência, desbordam do âmbito da reclamatória, e devem ser reavivadas na sede própria.

Com essas considerações, em face da absoluta inadequação da via eleita ao fim pretendido, determino o ARQUIVAMENTO SUMÁRIO da presente Reclamação, nos termos do art. 25, X, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça.

Em face da necessidade de se definir o modo de avaliação a que deve ser submetido o reclamante, junte-se cópia da presente decisão aos autos do PCA nº 0005442-15.2016.2.00.0000, a fim de que o Excelentíssimo Conselheiro Relator possa analisar a matéria e submetê-la, em questão de ordem, à oportuna apreciação do Plenário.

Intimem-se. Cumpra-se.”

 

Importante destacar, para fins de avaliação da questão de ordem objeto do presente PCA, que existe semelhança entre o PCA 0006440-75.2019 e o PCA 0005442-15.2016, pois idênticas as redações das Portarias do TJSP que estabeleceram como se dariam os procedimentos de reaproveitamento dos magistrados requerentes nos respectivos processos. Assim, em um primeiro momento relacionado à análise da juridicidade da portaria em si, os acórdãos proferidos pelo CNJ em ambos os PCAs reconheceram a irregularidade da terceira etapa de avaliação dos magistrados e a necessidade da exclusão do caráter seletivo, bem como afastamento do art. 15, referente ao prazo necessário para novo pedido de reaproveitamento.

Contudo, cumpre pontuar que a situação do magistrado requerente do PCA n. 000544215.2016 é diferente da situação em que se encontra o requerente do presente expediente (PCA 6440-75), pois, naquele caso, o magistrado já frequentou 360 horas de cursos ministrados na Escola da Magistratura, após acórdão do CNJ proferido em 2017, e, no caso ora em exame no presente expediente, o magistrado ainda não frequentou a Escola da Magistratura após acórdão proferido pelo CNJ em 2020, sendo um caso mais recente.

Ante o exposto, tendo em vista a obrigatoriedade do que estabelece a Resolução CNJ n. 323/2020, apresento a questão de ordem e proponho ao Plenário deste Conselho determinar ao TJSP que promova a reavaliação da capacidade técnica e jurídica do magistrado em disponibilidade, por meio de frequência a curso oficial ministrado pela Escola da Magistratura, nos termos do art. 6º da Resolução CNJ n. 135/2011, prestadas as devidas informações ao magistrado quanto ao novo procedimento.

Para que seja reformulada a terceira etapa avaliativa, agora com observância dos termos definidos pela Resolução n. 323/2020 do CNJ, julgo procedente o pedido do requerente de cassação da decisão do TJSP que arquivou o Pedido de Reaproveitamento do magistrado, a fim de viabilizar o prosseguimento do procedimento perante o Tribunal Paulista.

É como voto.

Após as comunicações de praxe, arquive-se.

 

Brasília, data registrada no sistema.

 

Tânia Regina Silva Reckziegel

Conselheira Relatora

 

 

VOTO CONVERGENTE

 

(EXMO. CONSELHEIRO LUIZ FERNANDO TOMASI KEPPEN):

Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo instaurado com a finalidade de se verificar a legalidade da Portaria n. 9.429, de 1º de agosto de 2017 (Id 3735201), editada pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), que estabeleceu o procedimento para reaproveitamento do magistrado requerente, colocado em disponibilidade por força do acórdão proferido em 10 de fevereiro de 1993, nos autos do Processo Administrativo Disciplinar n. G-29-666/91.

Os Requerentes – Associação Nacional dos Magistrados Estaduais e Pedro Amaral dos Santos – alegam que o Eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – que havia indeferido o reaproveitamento do Magistrado, em razão da inexorável conclusão da absoluta inexistência de interesse público no reaproveitamento postulado”- descumpriu a decisão plenária deste Conselho consubstanciada no acórdão de 11/05/2020 (Id 3969742), que confirmara parcialmente a decisão monocrática proferida pelo então Relator, Conselheiro Valtércio Oliveira em 10/11/2019 (Id 3802352).

Em síntese, a decisão monocrática original julgou parcialmente procedente o pedido, e continha recomendações e determinações ao Tribunal, nos seguintes termos (ID 3802352):

Quanto às determinações:

a)    Afastamento da natureza seletiva da terceira etapa do processo de reaproveitamento do magistrado estabelecido pelo TJSP (Reavaliação da Capacidade Técnica e Jurídica), que já havia sido determinada no acórdão do julgamento do PCA 0005442-15.2016.2.00.0000.

O Relator, contudo, salientou que este Conselho não havia impedido “o TJSP de realizar procedimento destinado à Reavaliação da Capacidade Técnica e Jurídica”, e que:

(....) a ilegalidade apontada se refere apenas à natureza seletiva da terceira etapa e não à existência de avaliação da capacidade técnica e jurídica do magistrado em disponibilidade que requer o seu reaproveitamento.

b)   Afastamento da aplicação do art. 15 da Portaria n. 9.341/2016, que fixou o prazo de 2 (dois) anos para renovação do pedido de reaproveitamento, na hipótese de seu indeferimento.

Quanto às recomendações:

c)     Em relação à frequência em cursos oficiais oferecidos pela Escola da Magistratura, recomendou o então Relator:

Diante da necessidade de reformulação da sistemática atualmente adotada nos arts. 9º e 10 da Portaria 9.429/2017, recomenda-se, na mesma linha definida no âmbito do PCA n. 5442-15.2016, a previsão de frequência em curso(s) oficial(is) oferecido(s) por Escola da Magistratura, in casu, pela Escola Paulista da Magistratura, com posterior avaliação da aptidão do magistrado para o retorno imediato ou gradual e adaptativo ao exercício da judicatura, por meio de avaliação desprovida de natureza seletiva.

d)   Por fim, o Relator recomendou ao Tribunal a divulgação dos critérios a serem utilizados na avaliação:

Recomenda-se que o tribunal disponibilize ao magistrado que será avaliado, com antecedência, quais os critérios que serão considerados para efeito de avaliação, adotando preferencialmente indicadores objetivos e observadas as regras estabelecidas pela ENAFM na Resolução n. 02/2016.

Interposto recurso pelo Eg. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo em face da decisão, prevaleceu no Plenário do CNJ o voto da Relatora, agora Conselheira Tânia Rieckziegel, em 11 de maio de 2020, (ID 3969742), que desproveu o recurso – reafirmando os termos da decisão monocrática, adicionando uma única ressalva, especificamente quanto à forma de avaliação de magistrado em disponibilidade.

Entendeu a Relatora que a complexa questão relativa à forma e os limites da avaliação do magistrado em disponibilidade deveria ser respondida primeiramente no processo paradigma, o PCA nº 0005442-15.2016.2.00.0000, em que se discute a legalidade da portaria que igualmente regulamenta o reaproveitamento do Marcello Holland Neto.

Após o julgamento do recurso administrativo e o arquivamento do presente feito, os Requerentes novamente peticionaram nos autos para relatar descumprimento do acórdão pelo TJSP (Id 3966916), que teria reprovado o Magistrado após a realização da avaliação técnica e jurídica e determinado o arquivamento do procedimento de reaproveitamento, além de não ter promovido condições para que o magistrado participasse de cursos na Escola da Magistratura.

Após instruir o feito, a Relatora traz a Plenário seu voto, na forma de questão de ordem, em que conclui:

a)    Que o acórdão de proferido em maio de 2020 havia determinado ao TJSP: a) a exclusão do caráter seletivo da terceira etapa avaliativa (prevista no art. 2º e 10 da Portaria n. 9.429/2017); b) o afastamento do art. 15 da Portaria n. 9.429/2017, relativo ao cerceamento do direito ao reaproveitamento pelo prazo de, no mínimo, dois anos do indeferimento do pedido; c) nova avaliação do magistrado com proposta de frequência a cursos oficias ministrados pela Escola da Magistratura;

b)   Apesar disso, o TJSP arquivou o Pedido de Reaproveitamento do magistrado sob o fundamento de que a avaliação já realizada havia atendido às orientações do CNJ;

c)    Todavia, em 07 de julho de 2020, o CNJ editou a Resolução n. 323/2020que dispõe sobre a uniformização de normas relativas ao procedimento administrativo disciplinar aplicável aos magistrados, e tornou obrigatória a reavaliação da capacidade técnica e jurídica, por meio de frequência obrigatória a curso oficial ministrado pela Escola da Magistratura.

d)   O acórdão do dia 11/05/2020 também estabeleceu a necessidade de o TJSP observar a definição que seria feita pelo CNJ, no âmbito do PCA n. 0005442-15.2016, dos critérios de avaliação dos magistrados em disponibilidade, já que ainda não havia sido editada a Resolução n. 323/2020. Contudo, o referido PCA foi incluído na pauta virtual no dia 18/08/2020, mas houve pedido de vista e o processo foi retirado de sessão, não tendo sido finalizada a deliberação do Plenário quanto à questão de ordem nele contida.

e)   Propõe então que o presente feito seja julgado em conjunto com o PCA n. 000544215.2016, de modo a que sejam proferidas decisões harmônicas em ambos os feitos. 

f)      “Considerando que o descumprimento do acordão enseja tomada de providências por parte deste Conselho”, determina ao Tribunal que “promova a reavaliação da capacidade técnica e jurídica do magistrado em disponibilidade, por meio de frequência a curso oficial ministrado pela Escola da Magistratura, nos termos do art. 6º da Resolução CNJ n. 135/2011, prestadas as devidas informações ao magistrado quanto ao novo procedimento, considerando que neste feito o Requerente ainda não frequentou cursos vinculados à Escola da Magistratura.

Passo a votar.

Pedi vista dos autos porquanto a questão aqui discutida, assim como no PCA 0005442-15.2016, merece análise minuciosa por parte deste Conselho, em razão de seu ineditismo.

Inicialmente, deixo de plano registrado minha intenção de acompanhar o oportuno encaminhamento dado pela Relatora ao feito, a partir do judicioso voto apresentado, no sentido de determinar ao Tribunal que promova a inscrição do Magistrado em cursos vinculados à Escola da Magistratura e que o julgamento deste procedimento ocorra em conjunto com o processo paradigma (PCA 0005442-15.2016), entendo imprescindível tecer algumas considerações adicionais.

Gostaria, entretanto, de tecer algumas considerações sobre a fundamentação, adicionando alguns novos argumentos ao debate.

S.m.j., entendo que o TJSP não descumpriu eventual determinação deste Conselho para oferecer cursos ao Requerente, posto que: a) o acórdão supostamente vergastado, proferido neste feito em maio de 2020, não determinou tal providência – mas cingiu-se a recomendá-la, nos termos da decisão monocrática do então Relator, Conselheiro Valtércio Oliveira, transcrita acima; b) a Resolução que instituiu a obrigatoriedade dos cursos só foi publicada após a publicação do acordão, em julho de 2020.

Não havia, portanto, determinação categórica dirigida ao Tribunal para que oferecesse cursos por intermédio da Escola da Magistratura, como se fez consignar.  

 A publicação ulterior da Resolução CNJ n. 323/2020 tampouco criou obrigação de seu cumprimento, posto não ter havido deliberação plenária neste sentido, havendo dúvida razoável sobre sua aplicabilidade imediata ao caso concreto.

Em segundo lugar, o cerne da questão, seja neste procedimento, seja no PCA 0005442-15.2016, é justamente definir a natureza e os critérios relativos à avaliação da capacidade técnica e jurídica do magistrado, o que ainda não foi feito em nenhum dos procedimentos.

Não se pode, portanto, imputar ilegalidade à atuação do Tribunal, se ainda não foram estabelecidas balizas seguras para este procedimento.

Importante relembrar que este Conselho está lidando com questão inédita, ainda não sido submetida à sua apreciação, inexistindo precedentes a firmar o caminho seguro a ser trilhado.

Parece-me que a questão crucial deste procedimento é de fato – como bem pontuou o Ministro Presidente na RGD 0001398-79.2018.2.00.0000, relativa ao PCA 0005442-15.2016 – discutir em que exatamente, a par da frequência obrigatória a curso oficial ministrado pela Escola da Magistratura, consistiria a avaliação a que o Tribunal deve submeter o reclamante?”

Importa definir precisamente o significado da natureza não-seletiva do procedimento avaliativo. O que isso implica, concretamente? Que o magistrado não poderá ser reprovado no processo avaliativo? E se o for, o que lhe acontecerá? Será reaproveitado sob supervisão, de forma gradual e adaptativa, ou deverá permanecer em disponibilidade, frequentando novos cursos, até que adquira condições técnicas de voltar à atividade?

Em sua manifestação na RGD referida, o Ministro Presidente relembra que o “voto condutor do acórdão paradigma observou que competiria à Escola de Magistratura (ou a outro órgão do Tribunal, na dicção da maioria), ‘por meio de sua equipe técnica e observados os parâmetros fixados na Resolução ENFAM n. 2/2016, avaliar a aptidão do magistrado para retorno imediato ou a adequação/oportunidade do retorno gradual e adaptativo ao exercício da função judicante.”

Ressalta ainda que “o art. 6º da Resolução ENFAM nº 2/2016, ao tratar do programa de formação inicial de magistrados, impõe a “frequência integral como um dos requisitos para a aprovação”, o que significa dizer que outros requisitos, em tese, poderiam vir a ser impostos.”

A leitura minuciosa deste procedimento, desde seu nascedouro, assim como do PCA 0005442-15.2016, pode levar a diferentes respostas para essas mesmas perguntas, o que revela a complexidade e o ineditismo da matéria aqui tratada.

A proposta inovadora do Tribunal de elaborar um procedimento avaliatório prévio ao aproveitamento do magistrado em disponibilidade não tem previsão legal, mas foi acolhida pelo CNJ como perfeitamente compatível com o regramento, tanto é que editou-se a Resolução 323/2020 que instituiu um procedimento antes inexistente sobre a questão.

O leading case trazido à análise possui, portanto, os ônus e bônus de sua própria condição, que são os acertos e erros no caminho, e as necessárias e consequentes correções de rota.

Com as ressalvas de fundamentação acima traçadas, acompanho a Relatora relativamente ao encaminhamento formulado em seu voto, para que o TJSP viabilize a participação do Magistrado em cursos oferecidos pela Escola da Magistratura paulista.

É como voto.

 

LUIZ FERNANDO TOMASI KEPPEN

Conselheiro Vistor

GLFTK/1