VOTO 

4.         De plano, registro que o expediente não atende integralmente aos requisitos de admissibilidade das normas do art. 89, do RICNJ, já que não veicula questionamento em tese, mas sim caso concreto envolvendo o interesse do consulente.  

5.         No entanto, a relevância do tema para o Judiciário Nacional é indiscutível, tanto que as normas foram agrupadas em um único normativo de cumprimento compulsório pelos Tribunais Pátrios, sendo esse o motivo pelo qual entendo conveniente ultrapassar o requisito regimental. 

6.         A presente Consulta apresenta questionamentos em torno da aplicação das disposições da Resolução CNJ nº 169/2013 que trata da retenção de provisões de encargos trabalhistas, previdenciários e outros a serem pagos às empresas contratadas para prestar serviços, com mão de obra residente nas dependências de unidades jurisdicionadas ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ). 

7.         Para subsidiar a tomada de decisão, solicitei manifestação da Secretaria de Auditoria (SAU) que ofertou o parecer técnico, erigido nos seguintes termos (Id nº 3594918):

[...]

A Consulta foi proposta pela empresa AGROSERVICE EMPREITEIRA AGRÍCOLA LTDA por meio da qual expõe questionamentos a respeito da liberação de verbas trabalhistas contingenciadas, nos termos da Resolução CNJ n. 169/2013.

A consulente, em petição inicial (Id 3161123), formula as seguintes indagações:

Havendo a opção de o pagamento das verbas trabalhistas serem efetuadas diretamente ao funcionário, no caso da multa do FGTS, poderemos emitir a Guia, enviar ao nosso contratante para o mesmo encaminhar ao banco conveniado para que seja efetuado o recolhimento?

Também como sugestão para Férias e 13º Salario, consultamos sobre a possibilidade das verbas serem devolvidas a empresas antes da ocorrência e após o pagamento apresentarmos os comprovantes de pagamento, sob pena não recebermos a fatura do mês corrente, em caso de contratos ainda em vigência?

Poderemos apresentar ao Contratante Garantia que comtemple Verba Trabalhista, pois no tipo de garantia tem validade de até 02 (dois) anos após o encerramento do contrato e assim os eventuais saldos seja liberado imediatamente o encerramento do contrato?

 

Sobre a questão, temos a expor o que se segue.

Primeiramente, mostra-se oportuna a transcrição de excerto retirado da Cartilha sobre Conta-Depósito Vinculada, elaborada pelo Ministério do Planejamento, que pontua a importância da utilização da conta vinculada nas contratações de serviços terceirizados no âmbito da Administração Pública:

A utilização da Conta-Depósito Vinculada bloqueada para movimentação é ferramenta já institucionalizada e sedimentada na Administração Pública como mecanismo de proteção e gestão de riscos na execução de contratos de prestação de serviço com dedicação exclusiva de mão de obra, contribuindo para assegurar os recursos necessários para o cumprimento das obrigações sociais e trabalhistas em caso de inadimplemento da contratada, bem como para a segurança jurídica dos gestores e fiscais de contrato[1][1].

 

Para o âmbito do Poder Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou a Resolução n. 169, de 31 de janeiro de 2013, a fim de dispor sobre as provisões de encargos trabalhistas a serem pagos pelos Tribunais às empresas contratadas para prestar serviços de forma contínua.

No que se refere aos questionamentos da consulente, cite-se, de início, o art. 12 da referida Resolução, que traz previsão atinente à possibilidade de a conta vinculada ser movimentada de duas formas, a saber:

Art. 12. A empresa contratada poderá solicitar autorização do Tribunal ou do Conselho para:

I - resgatar da conta-depósito vinculada – bloqueada para movimentação –, os valores despendidos com o pagamento de verbas trabalhistas e previdenciárias que estejam contempladas nas mesmas rubricas indicadas no art. 4º desta Resolução, desde que comprovado tratar-se dos empregados alocados pela empresa contratada para prestação dos serviços contratados; e

II - movimentar os recursos da conta-depósito vinculada – bloqueada para movimentação –, diretamente para a conta-corrente dos empregados alocados na execução do contrato, desde que para o pagamento de verbas trabalhistas que estejam contempladas nas mesmas rubricas indicadas no art. 4º desta Resolução.

§ 1º Para resgatar os recursos da conta-depósito vinculada – bloqueada para movimentação –, conforme previsto no inciso I deste artigo, a empresa contratada, após pagamento das verbas trabalhistas e previdenciárias, deverá apresentar à unidade competente do tribunal ou do conselho os documentos comprobatórios de que efetivamente pagou a cada empregado as rubricas indicadas no art. 4º desta Resolução.

§ 2º Os tribunais ou os conselhos, por meio de seus setores competentes, expedirão, após a confirmação do pagamento das verbas trabalhistas retidas, a autorização de que trata o inciso I deste artigo encaminhando a referida autorização ao banco público no prazo máximo de dez dias úteis, a contar da data da apresentação dos documentos comprobatórios pela empresa.

§ 3º Na situação descrita no inciso II deste artigo, o Tribunal ou o Conselho solicitará ao banco público oficial que, no prazo de dez dias úteis, contados da data da transferência dos valores para a conta-corrente do beneficiário, apresente os respectivos comprovantes de depósitos.

 

Nos termos do art. 12, inciso II, supracitado, a Resolução em tela apresenta como opção a movimentação dos recursos depositados na conta-depósito diretamente para a conta corrente do empregado vinculado ao contrato, para fins de pagamento de verbas trabalhistas arroladas no art. 4º do mesmo ato normativo.

Sobre o assunto, esta Secretaria de Auditoria já proferiu parecer, nos autos da Consulta 0000838-40.2018.2.00.0000 (Id 2369009), cuja transcrição de parte dele se faz relevante:

No entanto, se a opção da empresa for pela movimentação de valores da conta-depósito vinculada, conforme previsto no art. 12, II, da Resolução CNJ nº 169/2013, a contratada deverá adotar as seguintes providências:

a) elaborar folha de pagamento por ocasião da ocorrência de cada uma das rubricas indicadas no art. 4º da Resolução CNJ nº 169/2013. Na folha de pagamento deverá constar, no mínimo:

a.1) nome do funcionário;

a.2) número da matrícula, ou da identidade ou do CPF do funcionário;

a.3) a quantidade de meses do ano em que o funcionário laborou nas dependências do tribunal ou conselho por força contratual;

a.4) dados bancários para depósito do valor líquido indicado na folha de pagamento: banco, número da agência e indicação do número da conta corrente do funcionário;

a.5) indicação do valor do salário bruto;

a.6) indicação do valor proporcional do salário bruto, resultante da divisão do valor do salário bruto por 12 e o resultado multiplicado pela quantidade de meses do ano em que o funcionário laborou nas dependências do tribunal ou conselho por força contratual;

a.7) indicação dos valores a serem deduzidos do salário bruto proporcional: descontos legais (previdência social, Imposto de Renda etc.) e outros descontos autorizados pelo funcionário; e

a.8) valor do salário líquido a ser pago.

b) encaminhar a folha de pagamento para o tribunal ou conselho e solicitar autorização para que a instituição financeira promova a transferência da conta-depósito vinculada diretamente para a conta corrente de cada funcionário, observados os valores líquidos apurados na folha de pagamento.

(...).

Assim, concluída as análises requeridas no parágrafo anterior, o tribunal ou conselho deverá emitir autorização para que a instituição financeira promova a transferência de valores da conta-depósito vinculada diretamente para cada uma das contas correntes dos funcionários indicados na folha de pagamento.

Após a emissão da autorização a que se refere o parágrafo anterior, o tribunal ou conselho deverá oficiar a instituição financeira para que apresente, no prazo de 10 dias, a contar da transferência dos valores, os comprovantes dos depósitos realizados.

É importante enfatizar que a responsabilidade de elaborar corretamente a folha de pagamento é da empresa contratada e não do tribunal ou conselho, razão pela qual não se vislumbra a necessidade de a unidade técnica do tribunal ou conselho avaliar se os cálculos efetuados a título de descontos legais (previdência social e imposto de renda) ou descontos autorizados pelo funcionário estão ou não corretos.

A responsabilidade da unidade técnica é verificar se o valor do salário, dos direitos trabalhistas e dos benefícios estão em conformidade com o previsto no contrato e se a empresa cumpre os prazos legais para pagamento das verbas trabalhistas, direitos e benefícios.

O fato de a empresa não receber os valores faturados antes das datas previstas para quitação do direito trabalhista do funcionário não transfere para a Administração Pública a responsabilidade que a empresa tem perante o empregado.

Dessa forma, no que se refere à primeira indagação apresentada pela consulente, considerando o exposto na citada Resolução, bem como as elucidações constantes no parecer supratranscrito, verifica-se que, na hipótese do art. 12, inciso II, a responsabilidade do órgão contratante se resume em emitir a autorização para que a instituição financeira promova a transferência em questão, a par da documentação repassada pela empresa para o devido fim. O mencionado encargo não inclui o repasse, pelo órgão contratante, de guias relativas às multas do FGTS ao banco conveniado, conforme requer o autor neste procedimento.

Ademais, a prática ora sugerida não tem guarida na Resolução CNJ n. 169/2013, motivo pelo qual não seria possível, s.m.j., a permissão para execução.

No tocante à segunda questão posta pela consulente, considerando os motivos ensejadores da criação da Resolução CNJ n. 169/2013, forçoso é concluir pela impossibilidade de resgate antecipado, pela empresa contratada, das verbas constantes na conta-vinculada.

Recorde-se que a sistemática de retenção das mencionadas rubricas decorreu da “necessidade de a Administração Pública manter rigoroso controle das despesas contratadas e assegurar o pagamento das obrigações trabalhistas de empregados alocados na execução de contratos quando a prestação dos serviços ocorrer nas dependências de unidades jurisdicionadas ao CNJ”, conforme registrado nos “considerandos” da citada Resolução.

A preocupação pela correta quitação das verbas trabalhistas decorre da possibilidade de responsabilização subsidiária da Administração Pública nos casos de inadimplemento das mencionadas rubricas, caso se comprove conduta culposa na fiscalização do contrato, conforme o contido na Súmula n. 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), item V, abaixo transcrita:

Súmula nº 331 do TST

CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS. LEGALIDADE (nova redação do item IV e inseridos os itens V e VI à redação) - Res. 174/2011, DEJT divulgado em 27, 30 e 31.05.2011

(...).

V - Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada.

 

Dessa forma, o abatimento dos valores retidos e, por consequência, o possível comprometimento do pagamento das verbas trabalhistas rescisórias poderia levar ao acionamento judicial da Administração Pública, em virtude de sua responsabilidade subsidiária, de modo a arcar com valores porventura devidos.

Outrossim, tal como a questão antecedente abordada neste parecer, por ausência de previsão na Resolução regente, não se pode admitir, s.m.j., a prática sugerida pela consulente.

Com relação ao último questionamento formulado pela consulente, impende destacar a regra contida no art. 14, § 4º, da Resolução CNJ n. 169/2013, a qual estabelece o prazo de cinco anos, a contar do encerramento do contrato de terceirização, para que haja a liberação das verbas contingenciadas:

Art. 14. Quando os valores a serem liberados da conta-depósito vinculada – bloqueada para movimentação –, se referirem à rescisão do contrato de trabalho entre a empresa contratada e o empregado alocado na execução do contrato, com mais de um ano de serviço, o Tribunal ou Conselho deverá requerer, por meio da contratada, a assistência do sindicato da categoria a que pertencer o empregado ou da autoridade do Ministério do Trabalho para verificar se os termos de rescisão do contrato de trabalho estão corretos.

(...).

§ 4º Se realizados os pagamentos explicitados nos parágrafos anteriores, e ainda assim houver saldo na conta-depósito vinculada, o Tribunal ou Conselho com fundamento na parte final do § 2º do art. 1º desta resolução, somente autorizará a movimentação da referida conta pela contratada após cinco anos da data de encerramento da vigência do contrato administrativo. (Grifo nosso)

 

Por fim, uma vez mais, reitere-se que, s.m.j., o requerimento do consulente não merece acolhimento por não encontrar respaldo na Resolução CNJ n. 169/2013.

À vista do exposto, encaminho a presente manifestação para avaliação dos seus termos.

 

ANDERSON RUBENS DE OLIVEIRA COUTO

Secretário de Auditoria

 

8.         Pelo exposto, acolho integralmente o parecer da SAU e respondo aos questionamentos propostos no seguinte sentido:

a)      A responsabilidade do órgão público contratante se resume em emitir a autorização para que a instituição financeira promova a transferência dos valores depositados na conta-depósito vinculada – bloqueada para movimentação – a par da documentação fornecida pela empresa, nos termos do art. 12, inciso II, da Resolução CNJ nº 169/2013, e não inclui o repasse e guias relativas às multas do FGTS ao banco conveniado, além de não haver previsão nesse sentido no normativo deste Conselho;

b)     Não é possível o resgate antecipado de férias e 13º salário ou das verbas constantes na conta-depósito vinculada – bloqueada para movimentação –, mesmo com a comprovação do pagamento, pois é necessário que se mantenha um rigoroso controle das despesas contratadas e se assegure o pagamento das obrigações trabalhistas dos empregados alocados na execução do contrato, de modo a evitar a responsabilidade subsidiária da Administração Pública no caso de inadimplemento das rubricas em referência, caso se comprove conduta culposa na fiscalização do contrato, além de não existir previsão na Resolução CNJ nº 169/2013;

c)      Não é possível a apresentação de garantia com o objetivo de liberação imediata de saldo dos valores retidos após o encerramento do contrato, uma vez que o art. 14, § 4º, da Resolução CNJ nº 169/2013 estabelece o prazo de cinco anos, a contar do encerramento do contrato de terceirização, para a liberação das verbas contingenciadas.

É como voto.

Intimem-se todos os órgãos integrantes da estrutura do Poder Judiciário Nacional, com exceção do Supremo Tribunal Federal, para efeitos do disposto no art. 89, § 2º, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça.

Brasília, data registrada no sistema.

 

Conselheiro Valtércio de Oliveira

Relator