Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0000552-52.2024.2.00.0000
Requerente: LORENA CARLA SANTOS VASCONCELOS SOTTO MAYOR
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA - TJSC

 

 

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. LIMINAR E MÉRITO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA. EXTRAJUDICIAL. CONCURSO PÚBLICO. PARA DELEGAÇÃO DE NOTAS E REGISTROS PÚBLICOS. PROVA DE TÍTULOS. MINUTA ANEXA À RES. CNJ 81/2009. SERVIÇO ELEITORAL. ENCARGO DE PRESIDENTE DA JUNTA ELEITORAL. CUMULAÇÃO COM EXERCÍCIO DA FUNÇÃO DE JUIZ ELEITORAL. FUNÇÕES DISTINTAS. CONVOCAÇÃO DA JUSTIÇA ELEITORAL. ATIVIDADE NÃO REMUNERADA. MEDIDA ANTECIPATÓRIA DEFERIDA EM PARTE. EFEITOS CIRCUNSCRITOS AO CASO CONCRETO. LIMINAR RATIFICADA. REMESSA À COMISSÃO DE EFICIÊNCIA OPERACIONAL, INFRAESTRUTURA E GESTÃO DE PESSOAS.

1. A atividade dos integrantes da Junta Eleitoral é considerada um serviço público relevante, instituído por convocação da Justiça Eleitoral, e exercida de forma voluntária, sem a percepção de qualquer vantagem pecuniária.

2. A presidência de Junta Eleitoral é atividade específica, a ser exercida por juiz de Direito no exercício, ou não, de atribuições eleitorais. Ainda que o juiz eleitoral cumule a jurisdição eleitoral e a atividade administrativa na junta eleitoral, os deveres de ofício daquele não contemplam os deste.

3. Ratificada a medida liminar para determinar ao TJSC que considere como válidos os serviços prestados à Justiça Eleitoral pelos integrantes da Junta Eleitoral, inclusive por seu presidente, independentemente do exercício concomitante da jurisdição eleitoral. Extensão em cumprimento à liminar proferida pelo STF no MS 39.629/DF-MC.

4. Efeitos da decisão limitados ao caso sob exame em virtude das peculiaridades do juízo de cognição de provimentos liminares. Remessa à Comissão Permanente de Eficiência Operacional, Infraestrutura e Gestão de Pessoas sugerindo a incorporação da tese à proposta de revisão da Resolução CNJ n. 81, de 2009.

 

 ACÓRDÃO

O Conselho decidiu: I - por unanimidade, incluir em pauta o presente procedimento, nos termos do § 1º do artigo 120 do Regimento Interno; II - por maioria, ratificar a liminar, nos termos do voto do Relator. Vencidos os Conselheiros Renata Gil, José Rotondano, Alexandre Teixeira, Giovanni Olsson, Pablo Coutinho Barreto e o Presidente, que não ratificavam a liminar. Presidiu o julgamento o Ministro Luís Roberto Barroso. Plenário16 de abril de 2024. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Luís Roberto Barroso, Luis Felipe Salomão, Caputo Bastos, José Rotondano, Mônica Autran Machado Nobre, Alexandre Teixeira, Renata Gil, Daniela Madeira, Giovanni Olsson, Pablo Coutinho Barreto, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Daiane Nogueira e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0000552-52.2024.2.00.0000
Requerente: LORENA CARLA SANTOS VASCONCELOS SOTTO MAYOR
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA - TJSC


RELATÓRIO


Trata-se de procedimento de controle administrativo formulado por Lorena Carla Santos Vasconcelos Sotto Mayor contra ato praticado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (TJSC).

Em resumo, a autora contesta a recusa de conceder a pontuação referente ao serviço eleitoral em sete eleições no exame de títulos do concurso público para a concessão de delegações de notas e registros públicos no Estado de Santa Catarina, conforme estipulado no Edital nº 5, de 2020.

Alega que não baseou seu pedido na possível atuação nos pleitos como juíza eleitoral, já que foi convocada pelo Tribunal Regional Eleitoral para participar do processo eleitoral como Presidente da Junta Eleitoral em virtude do cargo de juíza de direito.

Solicita a concessão de uma medida antecipatória para que seja reconhecido o direito à pontuação estabelecida no item 13.10, "h", das normas do concurso, medida que busca que seja confirmada definitivamente no julgamento do mérito.

O processo, inicialmente foi designado ao e. Conselheiro Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, foi encaminhado a este gabinete para análise de possível prevenção para o processamento e julgamento do caso (id 5441744).

Na mesma data, ordenei a redistribuição do processo por dependência aos expedientes anteriores relacionados ao mesmo edital de concurso e solicitei à autora que complementasse a petição inicial com os documentos necessários para comprovar suas alegações. Além disso, solicitei a notificação do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (TJSC) e do Tribunal Regional Eleitoral do Estado de Alagoas (TRE-AL) para que prestassem informações sobre o assunto alegado (id 5442038).

Os documentos solicitados foram anexados pela requerente em 11 de fevereiro (id 5443266). Neles, consta a informação de que sua participação nas Juntas Eleitorais nos anos de 2008, 2010 e 2014 foi desconsiderada porque a candidata exercia jurisdição eleitoral na época, e que o encargo assumido nos anos de 2020 e 2022 não pôde ser considerado devido ao prazo final para a aquisição dos títulos (17.07.2020).

Em 16 de fevereiro, os Tribunais forneceram as informações solicitadas. O TRE-AL (id 5446859) anexou ao processo uma certidão registrando a participação da requerente nas eleições de 2008 (como juíza eleitoral e presidente de Junta Apuradora), 2010 (como juíza eleitoral, integrante da Comissão de Repressão aos Delitos Eleitorais e presidente de Junta Eleitoral), 2014 (como juíza eleitoral e presidente de Junta Apuradora), 2016 (como presidente de Junta Eleitoral, sem jurisdição eleitoral), 2018 (como presidente de Junta Eleitoral, sem jurisdição eleitoral), 2020 (como presidente de Junta Apuradora, sem jurisdição eleitoral) e 2022 (como juíza eleitoral e presidente de Junta Eleitoral).

O TJSC, por sua vez (id 5447010), defendeu a decisão da banca examinadora, entendendo que a autora havia comprovado validamente sua atuação como presidente de Junta Eleitoral sem exercer jurisdição eleitoral apenas nos pleitos de 2016 e 2018.

Em 19 de fevereiro, Marcus Resende Neves Guimarães solicitou sua inclusão no processo, na qualidade de terceiro interessado, e apoiou a regularidade do ato impugnado (id 5448973).

Em 21 de fevereiro, deferi parcialmente a medida acautelatória requerida, para que o TJSC reconheça como válidos, para fins de concessão da pontuação prevista no item 7.1, inciso VI, da Resolução CNJ n. 81, de 9 de junho de 2009, replicado no item 13.10, alínea H, do Edital n. 5, de 17 de julho de 2020, de convocação do concurso público para ingresso, por provimento e/ou remoção, na atividade notarial e registral e de registro do Estado de Santa Catarina, os serviços prestados à Justiça Eleitoral pelos integrantes da Junta Eleitoral, inclusive por seu presidente, independentemente do exercício concomitante da jurisdição eleitoral.

Em 22 de fevereiro, Artur César de Souza solicitou a extensão da liminar também para os casos de atuação dos promotores e promotoras de Justiça Eleitoral (id 5453767). Indeferi o requerimento em 5 de março, argumentando que a Lei Complementar n. 75, de 20 de maio de 1993, prevê que o desempenho da atividade do Ministério Público perante as Juntas Eleitorais é vinculada inerente e diretamente aos deveres funcionais impostos aos Promotores Eleitorais (id 5545752).

Em 1º de março, o TJSC prestou informações sobre o processado (id 5464451). Sustentou que o critério utilizado foi “alicerçado nas disposições da Resolução CNJ n. 81/2009, assim como em precedentes” deste Conselho (idem, p. 2).

Em 8 de março, Gustavo Henrique Moreira do Valle requereu seu ingresso no feito, na qualidade de terceiro interessado, e informou o descumprimento da decisão de revisão ampla da documentação apresentada por juízes eleitorais que desempenharam, concomitantemente, a função de presidente de Junta Eleitoral (id 5472861).

Em 12 de março, Artur César de Souza requereu a reconsideração da decisão que indeferiu a extensão da liminar para promotores e promotoras eleitorais (id 5477130).

 

É o relatório.


 

Luiz Fernando BANDEIRA de Mello
Conselheiro Relator

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0000552-52.2024.2.00.0000
Requerente: LORENA CARLA SANTOS VASCONCELOS SOTTO MAYOR
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VOTO


Submeto à ratificação do Plenário a decisão liminar proferida nestes autos (id 5452767), lançada nos seguintes termos:

Na etapa de títulos do concurso público para a delegação de notas e de registros do Estado de Santa Catarina, a requerente apresentou certidão circunstanciada expedida pelo Diretor-Geral do Tribunal Regional Eleitoral do Estado de Alagoas (id 5441689) comprovando sua participação nas eleições gerais, na qualidade de presidente de Junta Eleitoral (JE) (art. 36 do Código Eleitoral) nos anos de 2008 (70ª JE), 2010 (74ª JE), 2014 (11ª JE), 2016 (11ª JE), 2018 (22ª JE), 2020 (22ª JE) e 2022 (11ª JE). Por sua atuação, requereu a concessão de 0,5 ponto pela alínea “h” do item 13.10 do Edital n. 5, de 17 de julho de 2020, que rege o certame, garantidos nos termos do art. 8º da Resolução CNJ n. 81, de 9 de junho de 2009, e do item 7.1, inciso VI, da minuta de edital anexa ao regulamento citado.

A cláusula tem a seguinte redação:

Período igual a 3 (três) eleições, contado uma só vez, de serviço prestado, em qualquer condição, à Justiça Eleitoral. Nas eleições com dois turnos, considerar-se-á um único período, ainda que haja prestação de serviços em ambos.

O indeferimento do pleito motivou a interposição de recurso à Comissão do Concurso (Edital TJSC 5/2020, item 17.1.2, alínea “g”). O colegiado manteve a decisão de indeferimento (id 5443268) por dois fundamentos: a) a impossibilidade de se computar como serviço prestado o encargo de presidente de junta eleitoral exercido concomitantemente com a jurisdição eleitoral (2008, 2010 e 2014); b) o termo aquisitivo final (17.7.2020, data da primeira publicação do edital) impossibilita o cômputo como serviço prestado do encargo de presidente de junta eleitoral nos anos de 2020 e 2022, não concomitante com o da jurisdição eleitoral. Desta feita, o Tribunal compreendeu que a requerente comprovou a prestação de serviço à Justiça Eleitoral em apenas duas eleições (2016 e 2018), não cumprindo o requisito regulamentar.

Sendo esses os contornos fáticos da demanda, e considerando ainda a natureza dos pedidos formulados na petição inicial (“conceder a pontuação devida à requerente”, “atribuição de 0,5 (zero vírgula cinco) pontos” (id 5441682), poder-se-ia questionar o cabimento do exame do Procedimento de Controle por este Conselho Nacional.

Afinal, como disse em diversas outras oportunidades, o CNJ tem reiteradamente decidido que causas que não importem repercussão coletiva não estão contempladas pelo exercício da sua competência constitucional de controle administrativo, em conformidade com o entendimento externado no Enunciado Administrativo nº 17, de 10 de setembro de 2018:

Não cabe ao CNJ o exame de pretensões de natureza individual, desprovidas de interesse geral, compreendido este sempre que a questão ultrapassar os interesses subjetivos da parte em face da relevância institucional, dos impactos para o sistema de justiça e da repercussão social da matéria.

Entretanto, é de se rechaçar a alegação que, num olhar menos profundo, considera a demanda como desprovida de interesse transcendental a justificar a atuação deste Conselho Nacional.

Ainda que a deliberação possa vir a beneficiar diretamente a ora requerente, noto que o ineditismo dos fundamentos apresentados faz com que os efeitos da decisão, ao apreciar o dispositivo invocado como lastro para a pretensão, possa vir a servir como paradigma para a fixação de definitiva interpretação sobre a regra editalícia. E, ao submeter esta demanda ao Plenário, surge a possibilidade de se fixar o entendimento desta Casa a respeito da matéria, motivando sua aplicação em outros casos análogos e orientando a atuação dos Tribunais a respeito da controvérsia, o que certamente escapa à mera esfera individual de interesses da autora.

Nesse sentido, a jurisprudência admite a análise de pedidos que, ainda que partam da interpretação de caso concreto, entreguem solução de potencial transindividual. Este tipo de decisão cumpre a vocação institucional deste Conselho Nacional, conferindo segurança jurídica aos administradores judiciários e à população interessada.

Transcrevo o precedente:

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. OFICIAL DE JUSTIÇA DO TJPE. FILHO COM TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. RESOLUÇÃO Nº 343/2020. REGIME ESPECIAL DE TRABALHO MEDIANTE REDUÇÃO DO NÚMERO DE MANDADOS DISTRIBUÍDOS. COMPATIBILIDADE. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.

1. O cerne da controvérsia reside em saber se o meirinho faz jus ou não ao exercício da atividade em regime especial de teletrabalho (home office) ou redução de jornada de trabalho, na forma de redução do número de mandados distribuídos.

2. Interesse ou direito que, embora materializado no caso concreto, estende-se, conforme reconhecido pelo Conselheiro Mário Goulart Maia, no PCA nº 0005447-27.2022.2.00.0000, a outras hipóteses difusas, em razão da sua natureza indivisível e titularidade de pessoas indeterminadas e ligadas por circunstâncias de fato individual e social (transindividualidade).

[...]

 8. Procedência do pedido. (CNJ. PCA 0005797-15.2022.2.00.0000. Rel. Cons. MARCELLO TERTO E SILVA. j. em 24 fev. 2023.)

Supero, assim, o óbice de não-conhecimento para escrutinar a questão de fundo, a começar pela reafirmação do ineditismo da tese e a necessária distinção deste caso dos precedentes que versam sobre a concessão de pontos, em provas de títulos, pela prestação de serviços à Justiça Eleitoral.

À primeira vista, a matéria aparenta similitude com demandas já apreciadas por este Conselho Nacional relativas ao exercício do serviço eleitoral considerado válido para fins de obtenção de pontos na prova de títulos dos concursos para cartórios. É ponto pacífico que o desempenho de atividade eleitoral inerente aos deveres funcionais não enseja o reconhecimento dos pontos, que se destinam a retribuir o serviço prestado voluntariamente aos pleitos. Incluem-se na hipótese tanto magistrados quanto promotores eleitorais.

Decidiu este Conselho recentemente quanto à atividade do Parquet eleitoral:

RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. CONCURSO DE CARTÓRIOS. FASE DE TÍTULOS. ATRIBUIÇÃO DE PONTUAÇÃO A CANDIDATOS QUE ATUARAM NA JUSTIÇA ELEITORAL NA CONDIÇÃO DE PROMOTOR ELEITORAL. DELIBERAÇÃO DA COMISSÃO DE CONCURSO NO SENTIDO DE INDEFERIR A PONTUAÇÃO CORRESPONDENTE. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADES. APLICAÇÃO LÓGICA DE PREMISSAS FIXADAS EM PRECEDENTE DESTE CONSELHO ÀS SITUAÇÕES DOS PROMOTORES ELEITORAIS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. Recurso administrativo interposto contra decisão terminativa que não conheceu de pedidos relacionados a atos praticados no Concurso Público de Provas e Títulos para a Outorga de Delegação de Serviços Notariais e Registrais do Estado do Rio Grande do Sul (Edital nº 002/2019).

2. A controvérsia suscitada diz respeito, essencialmente, à atribuição de pontuação, na fase de títulos, a candidatos que atuaram na Justiça Eleitoral na condição de Promotor Eleitoral.

3. Quando da propositura do presente procedimento, constatou-se que o requerente interpôs recurso em face do resultado da prova de títulos no âmbito local, que ainda se encontrava pendente de julgamento. Desse modo, embora não fosse desconhecida a competência concorrente do CNJ, reconheceu-se, na esteira de precedentes do Conselho, a inconveniência de dar prosseguimento à análise da demanda no caso de as vias ordinárias administrativas ainda não restarem exauridas.

4. Não obstante esse cenário ter sido superado em razão do julgamento do recurso interposto na origem, avançando-se sobre o mérito da causa, não se vislumbra ilegalidades na atuação da Comissão do Concurso, que deliberou pela impossibilidade de atribuição de pontuação a Promotor Eleitoral quando no exercício do próprio cargo/função.

5. O Conselho, nos autos do PCA 0005933-90.2014.2.00.0000, sedimentou a orientação de que objetivo da Resolução CNJ nº 81/2009, ao conceder pontuação extra aos candidatos que tenham prestado serviços à Justiça Eleitoral, não foi beneficiar magistrados e servidores da Justiça Eleitoral, que nela atuam no cumprimento da sua obrigação legal e institucional, mas incentivar e valorizar o trabalho voluntário ou o atendimento às convocações dessa Justiça.

6. Conquanto a aludida deliberação colegiada tenha se limitado a analisar a situação dos magistrados e servidores da Justiça Eleitoral, é inegável que as premissas ali definidas se aplicam aos membros do Ministério Público que atuam perante a Justiça Eleitoral, no pleno cumprimento de sua obrigação legal e institucional, nos termos, sobretudo, da Lei Complementar nº 75/1993, que “dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União”.

7. Recurso conhecido e, no mérito, desprovido. (CNJ. RA no PCA 0003723-85.2022.2.00.0000. Rel. Cons. MAURO MARTINS. 113ª Sessão Virtual j. em 14 out. 2022.

O precedente citado, de 2015, já havia tratado do tema quanto à atividade dos magistrados e servidores da Justiça Eleitoral:

PROCEDIMENTOS DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. LIII CONCURSO PÚBLICO DE PROVAS E TÍTULOS PARA OUTORGA DAS DELEGAÇÕES DAS ATIVIDADES NOTARIAIS E/OU REGISTRAIS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. PROVA DE TÍTULOS.

I – O exercício de delegação de serviços notariais e/ou registrais não é atividade privativa de bacharel em Direito, nos termos do § 2º do artigo 15 da Lei n. 8.935, de 1994, não se enquadrando, portanto, na hipótese do inciso I do item 7.1 da minuta de edital anexa à Resolução CNJ n. 81;

II – É vedada a contagem cumulativa dos pontos atribuídos aos títulos previstos nos incisos I e II do item 7.1 da minuta de edital anexa à Resolução CNJ n. 81, a teor de previsão clara e expressa contida no referido ato normativo;

III – Uma vez preenchidos os requisitos previstos nas Resoluções CNJ n. 62 e 81, a prestação de assistência jurídica voluntária por estagiários inscritos na OAB deve ser considerada como título no concurso público de provas e títulos para a outorga de delegações de notas e de registro;

IV – O objetivo da Resolução CNJ n. 81, ao conceder pontuação extra aos candidatos a titulares de serviços extrajudiciais que tenham prestado serviços à Justiça Eleitoral (inciso VI do item 7.1 da minuta de edital anexa à Resolução CNJ n. 81), não foi beneficiar magistrados e servidores da Justiça Eleitoral, que nela atuam no cumprimento da sua obrigação legal e institucional, mas incentivar e valorizar o trabalho voluntário ou o atendimento às convocações dessa Justiça, notadamente para viabilizar a realização das eleições;

V – O pedido de publicidade dos títulos dos candidatos e consequente abertura de prazo para impugnação cruzada foi enfrentado e rejeitado pelo Plenário do CNJ para o concurso sub examine quando do julgamento do PCA n. 0004433-86.2014.2.00.0000.

VI – Correto o ato administrativo do Tribunal ao indeferir a aplicação da Súmula 266 do STJ a situação jurídica diversa daquela para a qual foi editada e com o objetivo de alterar previsão expressa da Resolução CNJ n. 81.

VII – Pedidos julgados parcialmente procedentes. (CNJ. PCA 0005933-90.2014.2.00.0000. Rel. Cons. RUBENS CANUTO. j. em 3 mar. 2015).

Nos citados julgados, também se discutia a adequada interpretação que se deve dar à expressão “em qualquer condição”, que qualifica a locução “serviço prestado à Justiça Eleitoral”. A cláusula abrangeria ou não os juízes, promotores e servidores da Justiça Eleitoral, que atuam nos pleitos por dever de ofício?

A resposta é não.

Todavia, o que se discutia nos precedentes é o desempenho de atividade eleitoral vinculada inerente e diretamente aos deveres funcionais impostos. E é nesse sentido que o Conselho tratou a questão, tanto para integrantes e servidores da Justiça Eleitoral quanto do Ministério Público Eleitoral:

Parece-me claro que o objetivo da Resolução CNJ n. 81, ao conceder pontuação extra aos candidatos a titulares de serviços extrajudiciais que tenham prestado serviços à Justiça Eleitoral, não foi beneficiar magistrados e servidores da Justiça Eleitoral, que nela atuam no cumprimento da sua obrigação legal e institucional, mas incentivar e valorizar o trabalho voluntário ou o atendimento às convocações dessa Justiça, notadamente para viabilizar a realização das eleições.

Note-se que o inciso anterior (inciso V) tratou do incentivo a duas outras hipóteses de trabalho voluntário (conciliador voluntário e assistência jurídica voluntária). Em continuidade, o inciso VI buscou fomentar esse mesmo tipo de dedicação altruísta, agora em benefício da Justiça Eleitoral.

Recorde-se que, nos termos do artigo 118, inciso III, da Constituição Federal, os juízes eleitorais são órgãos da Justiça Eleitoral. Tecnicamente, portanto, eles não “prestam serviços” à Justiça Eleitoral, mas atuam em nome dela – e recebem remuneração por isso -, o que é bem diverso. (PCA 5933-90.2014)

E:

A permissão de pontuação pela atuação como Promotor Eleitoral, no cumprimento de obrigação legal e institucional, proporcionaria vantagem aos concorrentes que se enquadram nessa situação, violando, assim, o princípio basilar da isonomia que deve reger os concursos públicos. (PCA 3723-85.2022)

O que se extrai dos trechos transcritos é que a concessão de pontos pela atividade prestada à Justiça Eleitoral deve atender a dois requisitos: a) o motivo da atuação no processo eleitoral não ser o cumprimento de dever funcional; e b) ser a atividade voluntária ou exercida em atendimento às convocações da Justiça Eleitoral.

Acontece que o debate aqui travado não diz respeito ao exercício das funções inerentes à função de juiz eleitoral, e sim de presidente da Junta Eleitoral.

A Junta Eleitoral é um órgão temporário fundamental no processo de sufrágio, com atribuições e arranjo institucional estabelecidos pelo Código Eleitoral. A Junta Eleitoral é constituída para cada zona eleitoral e tem como principal função a apuração dos votos em eleições, plebiscitos e referendos. Além da apuração — sua atividade precípua, razão por que também é chamada de Junta Apuradora —, este órgão de composição colegiada é responsável por resolver as dúvidas e problemas que surgem durante a contagem dos votos, garantindo a lisura e a legalidade do processo eleitoral.

O órgão funciona durante o período eleitoral, sendo desativada após a conclusão de suas atividades. A apuração dos votos é realizada após o encerramento da votação, e a junta é responsável por contabilizar, conferir e validar os votos de cada seção eleitoral de sua zona. Esse processo é feito de maneira transparente e aberta ao público, com a presença de fiscais de partidos políticos e candidatos, representantes do Ministério Público e qualquer cidadão interessado em acompanhar. A junta também tem o poder de decidir sobre a validade dos votos contestados, garantindo que apenas os votos válidos sejam contabilizados.

A composição da Junta Eleitoral varia de acordo com a zona eleitoral, mas geralmente é formada por um juiz de direito, que a preside, e por dois ou quatro cidadãos de notória idoneidade nomeados sessenta dias antes do pleito, vedada a participação de candidatos e seus parentes, membros de diretoria de partidos políticos, autoridades e agentes policiais e servidores no desempenho de cargos de confiança no Poder Executivo e atuantes no serviço eleitoral.

Estes cidadãos são nomeados pelo juiz eleitoral da respectiva zona, a partir de uma lista tríplice elaborada pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE) de cada Estado. Os membros da junta não podem ter filiação partidária e devem ser pessoas com reputação ilibada e conhecimento para a função. A existência da Junta Eleitoral é uma garantia de que o processo de apuração dos votos é realizado de maneira independente, transparente e imparcial, fundamentais para a democracia e a confiança nesta modalidade de direta manifestação da democracia.

Ocorre que a atividade desempenhada pelos membros da Junta Eleitoral — o que inclui seu presidente — no Brasil é considerada um serviço público relevante e, como tal, não é remunerada. A instituição do corpo se dá por convocação da Justiça Eleitoral, do que resulta que seus componentes exercem suas funções de forma voluntária, sem receber qualquer tipo de remuneração por isso.

E, para além disso, a atividade do presidente de Junta Eleitoral, apesar de reservada a juízes de direito, não é privativa de juízes eleitorais, não comporta retribuição pecuniária tampouco representa exercício de função jurisdicional eleitoral, senão de múnus público de natureza administrativa.

Portanto, observando-se a hipótese ora posta a partir das lentes que nos são cedidas pelo precedente de 2014 deste Plenário, chega-se à desenganada conclusão que o encargo de presidente da Junta é autônomo da função eleitoral típica legada aos juízes eleitorais e satisfaz ambos os requisitos para a concessão de pontos pela atividade prestada à Justiça Eleitoral.

A partir da constatação de que a presidência de juntas eleitoral não está incluída dentre as atribuições funcionais de magistrados e servidores da Justiça Eleitoral ou do Ministério Público Eleitoral e que é exercida de forma voluntária, mediante convocação e sem o pagamento de remuneração ou retribuição pecuniária, o título é devido.

Na decisão liminar ora submetida a ratificação, indeferi o pedido de extensão dos efeitos da medida acautelatória ao terceiro interessado Artur César de Souza, por entender que a atividade de promotor perante a Junta Eleitoral é, nos termos da Lei Complementar n. 75/1993, exercida pelo Promotor Eleitoral (id 5455752):

A despeito dos judiciosos argumentos lançados pelo interveniente, rejeito o pedido de extensão de liminar, tendo em vista que as atribuições do Promotor Eleitoral contemplam, de modo expresso, seu funcionamento “perante os Juízes e Juntas Eleitorais”, nos termos do art. 78 da Lei Complementar n. 75, de 20 de maio de 1993 (Lei Orgânica do Ministério Público da União – LOMPU).

[...]

O desempenho de atividade do Parquet perante as juntas eleitorais é vinculada inerente e diretamente aos deveres funcionais impostos aos Promotores Eleitorais. Não há a necessária distinção entre os atores, com específico feixe de atribuições, como há no caso da Presidência da Junta Eleitoral — que pode, inclusive, ser cominado a magistrados sem jurisdição eleitoral.

Indefiro, pois, o pedido de extensão de liminar.

Todavia, recebida em meu gabinete a informação de deferimento de liminar em Mandado de Segurança impetrado contra a decisão a referendar no Supremo Tribunal Federal, constatei que o Ministro Flávio Dino, relator da Medida Cautelar no Mandado de Segurança de autos n. 39.629, impetrado no Supremo Tribunal Federal por Artur César de Souza, apreciou em 1º de abril de 2024 o requerimento de revisão deste provimento, impugnado por alegadamente patrocinar “’discriminação odiosa’ entre as carreiras da Magistratura e do Ministério Público”.

Na liminar, determinou-se a reavaliação da decisão sob exame, “uma vez que não foi dado tratamento isonômico aos candidatos de um mesmo certame, em idênticas situações” (MS 39.629/DF-MC, p. 4).  

Transcrevo os fundamentos utilizados na análise dos requisitos materiais que justificaram o deferimento da tutela:

Verifico a demonstração do fumus boni iuris, uma vez que não foi dado tratamento isonômico aos candidatos de um mesmo certame, em idênticas situações. Não há razão para tratamento distinto, sob pena de discriminação irrazoável e manifestamente inconstitucional entre as carreiras (art. 5º, caput, CF).

Também está presente o periculum in mora. O Impetrante comprovou que a Comissão de Concurso irá marcar, em breve, a audiência de escolha de serventia, conforme Resolução GP nº 17 de fevereiro de 2024 do TJ-SC. A prioridade na escolha da serventia é daqueles que têm as maiores pontuações. Com efeito, é necessário que a matéria seja reanalisada pelo CNJ, com urgência.

Esta preocupação, a propósito, é compartilhada pela eminente Conselheira Renata Gil, ao pontuar em sua respeitosa manifestação divergente que "no caso concreto, a adoção de solução diversa entre membros do Judiciário e do Ministério Público não me parece adequada, principalmente porque tal solução viola o princípio constitucional da isonomia."

Por esta razão, estendi os efeitos do deferimento da reavaliação dos pontos ao impetrante, nos seguintes termos: 

Em respeito ao quanto decidido pela Corte Suprema, é de rigor se promover a reavaliação dos fundamentos que conduziram ao indeferimento da extensão da liminar a Artur César de Souza levando-se em especial consideração os termos do Código Eleitoral, que regulava a atividade dos membros do Ministério Público oficiantes perante as Juntas Eleitorais antes da entrada em vigor da Lei Complementar n. 75/1993. Como esclareceu o requerente, tratava-se de função que, à época, não era exclusiva de membro do Ministério Público Eleitoral.

Assim, em cumprimento à determinação de reanálise da decisão antecipatória da tutela final pretendida neste Procedimento de Controle, reconsidero as decisões proferidas em 5 de março e em 3 de abril de 2024 (ids 5545752 e 5506527, respectivamente) a fim de determinar ao Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina que promova a reavaliação da pontuação conferida a Artur César de Souza, impetrante do Mandado de Segurança de autos n. 39.629/DF, pelo desempenho de atividade perante as Juntas Eleitorais na qualidade de integrante do Ministério Público em oportunidades anteriores à vigência da Lei Complementar n. 75/1993, nos termos da decisão liminar anteriormente proferida (id 5452767). 

Assim, registro a revisão do entendimento neste ponto e submeto ao Plenário, em mesa, também a ratificação desta medida de extensão da liminar.

Por último, é importante registrar que os efeitos da tese aqui referendada se circunscrevem ao caso concreto sob exame.

A tutela de urgência antecipatória caracteriza-se pela concessão de parte ou de todo o pedido final baseando-se em uma cognição sumária, que não esgota o mérito da questão. Portanto, os requisitos para concessão desses provimentos são menos exigentes do que aqueles necessários para o provimento final de mérito, focando-se primariamente na probabilidade do direito e no perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.

Esta modalidade de pronunciamento judicialiforme, cuja natureza é essencialmente provisória e ajustável, não se aprofunda em todas as nuances do caso, como ocorreria em uma análise exaustiva típica do julgamento definitivo. Assim, os fundamentos desta decisão devem ser compreendidos como circunscritos à específica situação do concurso para a delegação de serviços extrajudiciais do Estado de Santa Catarina regido pelo Edital n. 5, de 2020, diante das peculiaridades e do estado do certame em questão. Por este motivo, a extensão dos parâmetros estabelecidos neste caso para a interpretação do inciso VI do item 7.1 da minuta de edital anexa à Res. CNJ 81/2009 deve ser condicionada à adequação do ato normativo que regulamenta o tema, conferindo maior previsibilidade à administração judiciária e à comunidade jurisdicionada.

Em virtude de todo o exposto, voto no sentido de ratificar a medida antecipatória deferida monocraticamente em 21 de fevereiro de 2024, com efeitos estendidos por decisão de 8 de abril de 2024 em benefício de Artur César de Souza, de modo a determinar ao Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina que considere como válidos, para fins de concessão da pontuação prevista no item 7.1, inciso VI, da Resolução CNJ n. 81, de 9 de junho de 2009, replicado no item 13.10, alínea H, do Edital n. 5, de 17 de julho de 2020, de convocação do concurso público para ingresso, por provimento e/ou remoção, na atividade notarial e registral e de registro do Estado de Santa Catarina, os serviços prestados à Justiça Eleitoral pelos integrantes da Junta Eleitoral, inclusive por seu presidente, independentemente do exercício concomitante da jurisdição eleitoral.

Remeta-se cópia desta decisão à Comissão Permanente de Eficiência Operacional, Infraestrutura e Gestão de Pessoas sugerindo análise da conveniência de inclusão da tese à proposta de revisão da Res. CNJ n. 81, de 2009.

Luiz Fernando BANDEIRA de Mello
Conselheiro Relator

 

 

Voto Divergente 


 

Adoto o relatório bem lançado pelo e. Conselheiro Relator, Luiz Fernando Bandeira de Mello Filho.

Contudo, peço vênia para divergir quanto à ratificação da liminar deferida.

Em resumo, consta dos autos que a autora contesta a recusa da concessão da pontuação no exame de títulos do concurso público para a concessão de delegações de notas e registros públicos do Estado de Santa Catarina, conforme estipulado no Edital n. 5, de 2020, referente ao serviço eleitoral em sete eleições.

A controvérsia suscitada diz respeito à interpretação do inciso VI do item 7.1 do Anexo da Resolução CNJ n. 81, ou seja, a pontuação dos candidatos que prestaram serviço à Justiça Eleitoral na qualidade de juízes eleitorais.

O mencionado dispositivo assim estabelece:

  

7.1. O exame de títulos valerá, no máximo, 10 (dez) pontos, com peso 2 (dois), observado o seguinte: 

(...) 

VI - período igual a 3 (três) eleições, contado uma só vez, de serviço prestado, em qualquer condição, à Justiça Eleitoral (0,5). Nas eleições com dois turnos, considerar-se-á um único período, ainda que haja prestação de serviços em ambos. 

 

                 A jurisprudência do CNJ é firme no sentido de não conceder pontuação extra aos magistrados da Justiça Eleitoral, que nela atuam no cumprimento da sua obrigação legal e institucional, senão vejamos:

PROCEDIMENTOS DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. LIII CONCURSO PÚBLICO DE PROVAS E TÍTULOS PARA OUTORGA DAS DELEGAÇÕES DAS ATIVIDADES NOTARIAIS E/OU REGISTRAIS DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. PROVA DE TÍTULOS. 

(...) 

IV – O objetivo da Resolução CNJ n. 81, ao conceder pontuação extra aos candidatos a titulares de serviços extrajudiciais que tenham prestado serviços à Justiça Eleitoral (inciso VI do item 7.1 da minuta de edital anexa à Resolução CNJ n. 81), não foi beneficiar magistrados e servidores da Justiça Eleitoral, que nela atuam no cumprimento da sua obrigação legal e institucional, mas incentivar e valorizar o trabalho voluntário ou o atendimento às convocações dessa Justiça, notadamente para viabilizar a realização das eleições; 

(CNJ. PCA 0005933-90.2014.2.00.0000. Rel. Cons. RUBENS CANUTO. j. em 3 mar. 2015). 

  

No mesmo sentido, por aplicação lógica, é firme o entendimento do CNJ pela não concessão da pontuação de títulos aos candidatos que atuaram na Justiça Eleitoral na condição de promotores eleitorais:

RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. CONCURSO DE CARTÓRIOS. FASE DE TÍTULOS. ATRIBUIÇÃO DE PONTUAÇÃO A CANDIDATOS QUE ATUARAM NA JUSTIÇA ELEITORAL NA CONDIÇÃO DE PROMOTOR ELEITORAL. DELIBERAÇÃO DA COMISSÃO DE CONCURSO NO SENTIDO DE INDEFERIR A PONTUAÇÃO CORRESPONDENTE. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADES. APLICAÇÃO LÓGICA DE PREMISSAS FIXADAS EM PRECEDENTE DESTE CONSELHO ÀS SITUAÇÕES DOS PROMOTORES ELEITORAIS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

(...)

2. A controvérsia suscitada diz respeito, essencialmente, à atribuição de pontuação, na fase de títulos, a candidatos que atuaram na Justiça Eleitoral na condição de Promotor Eleitoral.

(...)

4. Não obstante esse cenário ter sido superado em razão do julgamento do recurso interposto na origem, avançando-se sobre o mérito da causa, não se vislumbra ilegalidades na atuação da Comissão do Concurso, que deliberou pela impossibilidade de atribuição de pontuação a Promotor Eleitoral quando no exercício do próprio cargo/função.

5. O Conselho, nos autos do PCA 0005933-90.2014.2.00.0000, sedimentou a orientação de que objetivo da Resolução CNJ nº 81/2009, ao conceder pontuação extra aos candidatos que tenham prestado serviços à Justiça Eleitoral, não foi beneficiar magistrados e servidores da Justiça Eleitoral, que nela atuam no cumprimento da sua obrigação legal e institucional, mas incentivar e valorizar o trabalho voluntário ou o atendimento às convocações dessa Justiça.

6. Conquanto a aludida deliberação colegiada tenha se limitado a analisar a situação dos magistrados e servidores da Justiça Eleitoral, é inegável que as premissas ali definidas se aplicam aos membros do Ministério Público que atuam perante a Justiça Eleitoral, no pleno cumprimento de sua obrigação legal e institucional, nos termos, sobretudo, da Lei Complementar nº 75/1993, que “dispõe sobre a organização, as atribuições e o estatuto do Ministério Público da União”.

7. Recurso conhecido e, no mérito, desprovido. (CNJ. RA no PCA 0003723-85.2022.2.00.0000. Rel. Cons. MAURO MARTINS. 113ª Sessão Virtual j. em 14 out. 2022).

 

 

Na decisão que defere a liminar, o e. Relator afirmou se extrair do entendimento do CNJ que a concessão de pontos pela atividade prestada à Justiça Eleitoral deve atender a dois requisitos: a) o motivo da atuação no processo eleitoral não ser o cumprimento de dever funcional; e b) ser a atividade voluntária ou exercida em atendimento às convocações da Justiça Eleitoral (Id 5452767, pág. 8).

A meu sentir, para a solução do caso temos que buscar a mens legis da norma destacada, que é a de vedar que a atividade na justiça eleitoral por magistrado investido na função eleitoral inviabiliza a concessão da pontuação extra.

Saliente-se que, na linha do entendimento do CNJ, o magistrado (eleitoral ou não) já recebe pontuação específica pelo exercício do cargo, desde que por período mínimo de 3 anos, na forma do inciso I do item 7.1 da Resolução CNJ n. 81/2009. Conferir aos juízes eleitorais a pontuação extra do inciso VI representaria a possibilidade de bis in idem, ou seja, dupla pontuação pelo mesmo fato, qual seja, o exercício da judicatura[1]. Tal situação se afigura privilégio odioso em detrimento dos outros concorrentes.

Com a devida vênia à tese contrária, entendo que a regra constante do inciso VI do item 7.1 da Resolução CNJ n. 81/2009 não visa a alcançar juízes da própria Justiça Eleitoral, estejam investidos na qualidade de presidentes de junta eleitoral ou não, mas sim aquele cidadão que atua em colaboração à Justiça Eleitoral, incentivando os brasileiros na atuação cívica.

 Os magistrados eleitorais integram a estrutura orgânica da Justiça Eleitoral. Não se afigura adequado afirmar que eles prestam serviços à Justiça Eleitoral, pois são os próprios condutores do processo eleitoral, inclusive convocando cidadãos para o exercício de funções eleitorais. Os magistrados eleitorais presentam a Justiça Eleitoral, dão rosto ao poder judiciário eleitoral, inclusive investidos na função de presidentes de Junta Eleitoral.

Em que pese o e. Conselheiro sustentar que o caso concreto não diz respeito ao exercício das funções inerentes ao ofício de juiz eleitoral e sim à presidência da junta eleitoral, é certo que a junta é presidida por um juiz de Direito, como se lê na própria decisão que concedeu a liminar ora analisada (Id 5452767, pág. 9):

 

A composição da Junta Eleitoral varia de acordo com a zona eleitoral, mas geralmente é formada por um juiz de direito, que a preside, e por dois ou quatro cidadãos de notória idoneidade nomeados sessenta dias antes do pleito, vedada a participação de candidatos e seus parentes, membros de diretoria de partidos políticos, autoridades e agentes policiais e servidores no desempenho de cargos de confiança no Poder Executivo e atuantes no serviço eleitoral.

 

Além disso, o e. Relator deferiu a liminar para a concessão da pontuação à requerente, por ter sido investida na função de presidente de junta eleitoral, mas indeferiu o pleito de terceiro interessado investido na função de promotor eleitoral, sob o argumento de que há distinção no desempenho das atividades de ambos.

Nesse ponto, é importante esclarecer que o Supremo Tribunal Federal deferiu tutela de urgência para determinar a reapreciação das decisões proferidas neste PCA, com urgência, uma vez que não foi dado tratamento isonômico aos candidatos de um mesmo certame, em idênticas situações.

Conforme elucida o e. Relator do writ, Ministro Flávio Dino, não há razão para tratamento distinto, sob pena de discriminação irrazoável e manifestamente inconstitucional entre as carreiras (art. 5º, caput, CF)[2].

Nessa direção, no caso concreto, a adoção de solução diversa entre membros do Judiciário e do Ministério Público não me parece adequada, principalmente porque tal solução viola o princípio constitucional da isonomia.

Não conceder a pontuação por títulos ao membro do Ministério Público e conceder a pontuação à magistrada presidente da Junta Eleitoral, por sustentar que a atividade do parquet perante as juntas eleitorais é vinculada diretamente aos deveres funcionais impostos aos promotores eleitorais, é um argumento que não merece acolhida. 

Em linhas finais, a função de presidente da Junta Eleitoral está atrelada ao exercício da magistratura, razão pela qual o presidente não presta serviço voluntário à Justiça Eleitoral, mas atua em nome dela.

Sob essa perspectiva, pouco importa se a função de presidente da Junta Eleitoral é remunerada ou não, pois ele está ali em decorrência da sua investidura na magistratura, atuando em nome da Justiça Eleitoral, além do que somente um magistrado pode ser presidente da junta, o que afasta peremptoriamente a alusão de voluntariedade do múnus e, consequentemente, o direito à pontuação extra.

Dessa forma, entendo que o caso em questão não apresenta peculiaridades a exigir, na espécie, o distinguishing.

Após o lançamento do meu voto divergente, o e. Conselheiro Relator aditou o voto anteriormente lançado, estendendo os efeitos do deferimento da pontuação extra ao membro do Ministério Público impetrante do Mandado de Segurança de n. 39.629/DF, nos seguintes termos: 

Em respeito ao quanto decidido pela Corte Suprema, é de rigor se promover a reavaliação dos fundamentos que conduziram ao indeferimento da extensão da liminar a Artur César de Souza levando-se em especial consideração os termos do Código Eleitoral, que regulava a atividade dos membros do Ministério Público oficiantes perante as Juntas Eleitorais antes da entrada em vigor da Lei Complementar n. 75/1993. Como esclareceu o requerente, tratava-se de função que, à época, não era exclusiva de membro do Ministério Público Eleitoral.

Assim, em cumprimento à determinação de reanálise da decisão antecipatória da tutela final pretendida neste Procedimento de Controle, reconsidero as decisões proferidas em 5 de março e em 3 de abril de 2024 (ids 5545752 e 5506527, respectivamente) a fim de determinar ao Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina que promova a reavaliação da pontuação conferida a Artur César de Souza, impetrante do Mandado de Segurança de autos n. 39.629/DF, pelo desempenho de atividade perante as Juntas Eleitorais na qualidade de integrante do Ministério Público em oportunidades anteriores à vigência da Lei Complementar n. 75/1993, nos termos da decisão liminar anteriormente proferida (id 5452767). 

Ocorre que, com a devida vênia, não me parece que a reapreciação da decisão exarada pelo e. Relator observou as premissas fixadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no MS 39.629 MC/DF.

Na novel decisão, o e. Relator concede a pontuação extra ao membro do Ministério Público, tal qual havia feito com a magistrada requerente, mas em contrariedade ao que determinou o STF.  

Por inteira pertinência, transcrevo trechos da decisão proferida pelo e. Ministro Flávio Dino, em 1º/4/2024:

(...)

A finalidade da norma prevista na Resolução n.º 81 do CNJ é justamente estimular os cidadãos a trabalharem voluntariamente à Justiça Eleitoral. Esse ponto é pacífico na jurisprudência do CNJ, conforme precedente a seguir transcrito:

“(...) o objetivo da Resolução CNJ n. 81, ao conceder pontuação extra aos candidatos a titulares de serviços extrajudiciais que tenham prestado serviços à Justiça Eleitoral, não foi beneficiar magistrados e servidores da Justiça Eleitoral, que nela atuam no cumprimento da sua obrigação legal e institucional, mas incentivar e valorizar o trabalho voluntário ou o atendimento às convocações dessa Justiça, notadamente para viabilizar a realização das eleições.

(...)

Note-se que o inciso anterior (inciso V) tratou do incentivo a duas outras hipóteses de trabalho voluntário (conciliador voluntário e assistência jurídica voluntária). Em continuidade, o inciso VI buscou fomentar esse mesmo tipo de dedicação altruísta, agora em benefício da Justiça Eleitoral.” (PCA 5933-90.2014)”.

Ocorre que a autoridade coatora concedeu pontuação à magistrada Lorena Carla Santos Vasconcelos Sotto Mayor, sob o fundamento de que a Presidência da Junta Eleitoral deve ser considerada uma convocação não remunerada da Justiça Eleitoral.

Entendo que a magistrada foi convocada pela Justiça Eleitoral por ser juíza de Direito. O art. 36 do Código Eleitoral prevê que a Junta será composta por um juiz de direito, que, por dever inerente ao cargo, exerce a referida função.

Daí por que não parece adequado desvincular o exercício da Presidência da Junta aos deveres inerentes ao cargo de juiz, o que afastaria a voluntariedade, a natureza altruística da atividade e, consequentemente, o direito à pontuação.

Portanto, a magistrada Lorena Carla Santos Vasconcelos Sotto Mayor e o Impetrante atuaram perante a Justiça Eleitoral em razão de dever funcional, e não de mera atividade voluntária. A partir dessa premissa que deve ser analisado o direito à pontuação de ambos os candidatos com base no item h do Edital n.° 5/2020.

Como se vê, o STF, literalmente, entendeu pela não superação do entendimento sedimentado do CNJ em não conceder pontuação extra aos magistrados e membros do MP que oficiam perante a Justiça Eleitoral.

A decisão proferida no writ é clara ao estabelecer como premissa para a reanálise do caso a não concessão da pontuação extra tanto para magistrados como para membros do Ministério Público, razão pela qual não deveria o CNJ dar interpretação diferente da letra da lei e do entendimento do STF.

Privilegiar e proteger a carreira em detrimento de uma ordenança da Corte Suprema me parece enfraquecer o Judiciário e incorrer, pela via transversa, em abalo democrático.

Por tais fundamentos e rogando vênias ao Relator, divirjo do e. Conselheiro Luiz Fernando Bandeira de Mello para não ratificar as liminares concedidas, indeferindo-as.

É como voto.

 

Conselheira Renata Gil

Relatora



[1] PCA 0005933-90.2014.2.00.0000. Rel. Cons. Rubens Canuto, julgado em 3 mar. 2015.

 [2] STF. MS 39.629/DF Relator Min. Flávio Dino, DJe 2/4/2024.

 

 

 

VOTO DIVERGENTE

EXMO. CONSELHEIRO ALEXANDRE TEIXEIRA (VISTOR):

Trata-se de procedimento de controle administrativo formulado por Lorena Carla Santos Vasconcelos Sotto Mayor contra ato praticado pelo Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (TJSC).

O cerne da questão resume-se a verificar se a Requerente tem, ou não, direito a obter pontuação como título por sua atuação como Presidente de junta eleitoral, ainda que não atuasse na jurisdição eleitoral.

Pedido semelhante foi formulado pelo terceiro interessado Artur César de Souza, que atuou na jurisdição eleitoral na condição de integrante do Ministério Público, levando-se em especial consideração os termos do Código Eleitoral, que regulava a atividade dos membros do Ministério Público oficiantes perante as Juntas Eleitorais antes da entrada em vigor da Lei Complementar n. 75/1993, função que, à época, não era exclusiva de membro do Ministério Público Eleitoral. 

O quesito em análise está previsto no inciso VI do item 7.1 da Resolução CNJ n. 81/09:

7.1. O exame de títulos valerá, no máximo, 10 (dez) pontos, com peso 2 (dois), observado o seguinte: 

(...) 

VI – período igual a 3 (três) eleições, contado uma só vez, de serviço prestado, em qualquer condição, à Justiça Eleitoral (0,5). Nas eleições com dois turnos, considerar-se-á um único período, ainda que haja prestação de serviços em ambos.

  

A mesma cláusula foi replicada no Edital nº 5, de 2020, do concurso em questão:

Período igual a 3 (três) eleições, contado uma só vez, de serviço prestado, em qualquer condição, à Justiça Eleitoral. Nas eleições com dois turnos, considerar-se-á um único período, ainda que haja prestação de serviços em ambos.

 

O Relator, Conselheiro Luiz Fernando Bandeira de Mello, relembra a iterativa jurisprudência deste Conselho, que fixou o entendimento de que o objetivo da Resolução CNJ n. 81, ao conceder pontuação extra aos candidatos que tenham prestado serviços à Justiça Eleitoral não foi beneficiar magistrados e servidores da Justiça Eleitoral, que nela atuam no cumprimento da sua obrigação legal e institucional, mas incentivar e valorizar o trabalho voluntário ou o atendimento às convocações dessa Justiça, notadamente para viabilizar a realização das eleições.

Entretanto, o Relator entendeu que a hipótese dos autos é diversa, pois a Requerente atuou como Presidente da Junta Eleitoral, embora não exercesse a jurisdição eleitoral à época.

Em voto bastante percuciente, questiona o próprio cabimento do presente PCA, considerando a natureza individual dos pedidos formulados na inicial (conceder a pontuação devida à requerente”, “atribuição de 0,5 (zero vírgula cinco) pontos” (id 5441682), posto ser iterativa a jurisprudência deste Conselho no sentido do não conhecimento quando não houver repercussão geral, nos termos do Enunciado Administrativo nº 17, de 10 de setembro de 2018.

Entretanto, supera a preliminar, por entender que a questão é inédita, com potencial para repercutir em casos futuros, trazendo à lume precedentes pera corroborar sua afirmativa.

Fixa, então, as premissas a serem observadas para a concessão de pontos pela atividade prestada à Justiça Eleitoral: a) a atuação no processo eleitoral não pode decorrer do cumprimento de dever funcional; e b) a atividade deve ser voluntária ou exercida em atendimento às convocações da Justiça Eleitoral.

Considerando que a Presidência da Junta Eleitoral deve ser exercida por juiz de direito (ainda que não exerça a jurisdição eleitoral), de forma não remunerada, em decorrência da convocação da Justiça Eleitoral, conclui que a atuação da Requerente atende às premissas exigíveis para a obtenção da pontuação pretendida.  

Após conceder a liminar pleiteada pela Requerente, o Relator tomou ciência da decisão proferida pelo Ministro Flávio Dino, relator da Medida Cautelar no Mandado de Segurança de autos n. 39.629, por meio da qual S. Exa. determinou a reavaliação da decisão sob exame, por entender “que não foi dado tratamento isonômico aos candidatos de um mesmo certame, em idênticas situações” (MS 39.629/DF-MC, p. 4). 

Assim, o Relator – que inicialmente entendera que a atividade do Promotor Eleitoral estaria vinculada diretamente aos deveres funcionais impostos à função, sendo distinta, portanto, da atuação do magistrado no exercício da presidência de Junta Eleitoral -  ampliou os efeitos da liminar que concedera, de modo a determinar, ao Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, a reavaliação da pontuação conferida a Artur César de Souza, impetrante do Mandado de Segurança de autos n. 39.629/DF, pelo desempenho de atividade perante as Juntas Eleitorais, na qualidade de integrante do Ministério Público em oportunidades anteriores à vigência da Lei Complementar n. 75/1993, quando a função eleitoral não era exclusiva de membro do Ministério Público Estadual.

Em voto lançado no sistema, a Conselheira Renata Gil diverge do entendimento do Relator, por entender que a liminar trazida à ratificação não concretiza a mens legis da norma.

Destaca que a Presidência da Junta será sempre exercida por um juiz de Direito (eleitoral ou não), que já recebe pontuação específica pelo exercício do cargo, desde que por período mínimo de 3 anos, na forma do inciso I do item 7.1 da Resolução CNJ n. 81/2009. Pontuar a candidata, na hipótese dos autos, configuraria, a seu ver, bis in idem.

Ademais, ressalta que a função de presidente da Junta Eleitoral está atrelada ao exercício da magistratura, razão pela qual o Presidente não presta serviço voluntário à Justiça Eleitoral, mas atua em nome dela, pouco importando se a função é remunerada, ou não.

Faz referência à decisão proferida pelo Ministro Flávio Dino, nos autos do MS retromencionado, a corroborar o seu entendimento, concluindo que o caso em questão não apresenta peculiaridades que justifiquem o distinguishing. 

Passo a votar.

Inicialmente, manifesto minha contundente preocupação com a atuação deste Conselho em casos individuais, especialmente relacionados a pedidos formulados por candidatos em concursos públicos, por tratarem de questões pontuais, desprovidas de relevância jurídica e que não repercutem na fixação das balizas gerais que este Conselho deve estabelecer para os Tribunais.

Não verifico, no caso concreto, violação frontal às Resoluções deste Conselho, a justificar minimamente sua interferência em situação estritamente individual, que pugna pela adoção de interpretação da jurisprudência que, com a devida vênia, acaba por mais tumultuar do que esclarecer.

Tenho em mente a necessidade de estar sempre atento à vocação constitucional deste órgão administrativo, responsável pela elaboração de políticas judiciárias, o que o desincumbe do tratamento amiúde de casos pontuais, que terão sempre, a seu dispor, a via jurisdicional para a resolução de conflitos específicos.

Dito isso, imbuído do espírito programático que vislumbro para este Conselho, tomei conhecimento da decisão proferida pelo Exmo. Ministro Flávio Dino, à qual dispensei especial atenção na apreciação do caso.

E, após a leitura dos termos da decisão, com respeitosa vênia, não me parece que a solução encontrada pelo Eminente Relator seja a mais adequada para a solução do caso.

Nesse sentido, a meu ver, o Ministro Flávio Dino estabeleceu premissa contrária àquela adotada pelo Relator deste PCA, no sentido de que a magistrada foi convocada pela Justiça Eleitoral em razão da condição de juíza de Direito, por determinação do Código Eleitoral e em decorrência dos deveres inerentes ao cargo, o que afasta a voluntariedade e a natureza altruística da atividade. Por conseguinte, refuta o direito à pontuação.

Transcrevo, da decisão, o trecho que importa, para melhor elucidação, com grifos acrescidos:

Ocorre que a autoridade coatora concedeu pontuação à magistrada Lorena Carla Santos Vasconcelos Sotto Mayor, sob o fundamento de que a Presidência da Junta Eleitoral deve ser considerada uma convocação não remunerada da Justiça Eleitoral.

Entendo que a magistrada foi convocada pela Justiça Eleitoral por ser juíza de Direito. O art. 36 do Código Eleitoral prevê que a Junta será composta por um juiz de direito, que, por dever inerente ao cargo, exerce a referida função.

Daí por que não parece adequado desvincular o exercício da Presidência da Junta aos deveres inerentes ao cargo de juiz, o que afastaria a voluntariedade, a natureza altruística da atividade e, consequentemente, o direito à pontuação.

Portanto, a magistrada Lorena Carla Santos Vasconcelos Sotto Mayor e o Impetrante atuaram perante a Justiça Eleitoral em razão de dever funcional, e não de mera atividade voluntária. A partir dessa premissa que deve ser analisado o direito à pontuação de ambos os candidatos com base no item h do Edital n.° 5/2020.

Verifico a demonstração do fumus boni iuris, uma vez que não foi dado tratamento isonômico aos candidatos de um mesmo certame, em idênticas situações. Não há razão para tratamento distinto, sob pena de discriminação irrazoável e manifestamente inconstitucional entre as carreiras (art. 5º, caput, CF).

Também está presente o periculum in mora. O Impetrante comprovou que a Comissão de Concurso irá marcar, em breve, a audiência de escolha de serventia, conforme Resolução GP nº 17 de fevereiro de 2024 do TJ-SC. A prioridade na escolha da serventia é daqueles que têm as maiores pontuações. Com efeito, é necessário que a matéria seja reanalisada pelo CNJ, com urgência.

Por esses motivos, defiro, em parte, a tutela de urgência para determinar a reapreciação das decisões no Processo Administrativo nº 0000552-52.2024.2.00.0000 (eDoc 4 e 5), com base nas premissas fixadas nesta decisão.

 

Avançando na compreensão da decisão, verifica-se que o Ministro tampouco determina que o impetrante seja pontuado na condição de promotor, mas que o CNJ aprecie a questão com urgência, considerando que a decisão liminar, nos termos em que concedida, violaria o princípio da igualdade e proporcionaria discriminação indevida.

A essa altura, impõe-se fazer duas considerações.

A uma, ainda que eu, pessoalmente, estivesse inclinado a proferir voto pelo não conhecimento do feito, a determinação emergente da decisão proferida pelo Ministro Flávio Dino impõe a este Conselho o prosseguimento da análise de fundo de direito.

E, a duas, de que não se está tratando, no caso dos autos, do desempenho regular de integrante do Ministério Público perante as Juntas eleitorais, mas sim de momento anterior à vigência da Lei Complementar n. 75/1993, quando a função eleitoral não era exclusiva do membro do Ministério Público Estadual.

De todo modo, em qualquer das hipóteses individuais sobre as quais a decisão do Eminente Relator repercute, tanto em relação à atuação da magistrada quanto do promotor, não me parece que a atuação na Junta Eleitoral possa estar dissociada do exercício decorrente dos deveres inerentes ao cargo, o que afasta a voluntariedade e a natureza altruística da atividade levada a efeito por ambos.

Nesse contexto, no caso específico da magistrada, atribuir-lhe pontuação, tal como pretendido, significa aboná-la indevida e duplamente, com todo respeito a quem entenda de maneira diversa.

Por conseguinte, não vislumbro a possibilidade, sob pena inclusive de descumprimento da decisão proferida no MS em referência, de ratificação da liminar, nos termos em que proposta pelo Relator.

Diante do exposto, acompanho a divergência, com acréscimo de fundamentos.

 

ALEXANDRE TEIXIEIRA

Conselheiro

 

GCAT/1