Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0009201-11.2021.2.00.0000
Requerente: ANDRE WILLIAMS FORMIGA DA SILVA
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ - TJPA

 

EMENTA: RECURSO EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. SERVENTIA EXTRAJUDICIAL. NOMEAÇÃO DE INTERINO. INEXISTÊNCIA DE SUBSTITUTO FORMALMENTE DESIGNADO À ÉPOCA DA VACÂNCIA. OBSERVÂNCIA DOS CRITÉRIOS ESTABELECIDOS NO PROVIMENTO CNJ N.º 77/2018. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. Recurso em Procedimento de Controle Administrativo em que se questiona decisão monocrática que julgou procedente o pedido formulado na inicial. 

2. Inexistindo substituto mais antigo formalmente designado à época da vacância de serventia extrajudicial, deve-se nomear interino, de acordo com os critérios estabelecidos no Provimento CNJ n.º 77/2018.

3. Recurso conhecido, mas que se nega provimento.

 

 

 ACÓRDÃO

Após o voto do Conselheiro Luiz Fernando Bandeira de Mello (Vistor), o Conselho, por maioria, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. Vencidos os Conselheiros Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Mário Goulart Maia e Marcello Terto, que davam provimento ao recurso para julgar improcedentes os pedidos. Votou a Presidente. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário, 28 de março de 2023. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, Sidney Madruga (Relator), João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0009201-11.2021.2.00.0000
Requerente: ANDRE WILLIAMS FORMIGA DA SILVA
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ - TJPA


RELATÓRIO

  

O CONSELHEIRO SIDNEY PESSOA MADRUGA (Relator): 

Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo (PCA), com pedido liminar, proposto por André Williams Formiga da Silva, em que se questiona a Portaria n.º 2110/2021 expedida pela Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA), que não o designou como responsável interino do Cartório do 2º Ofício de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civis das Pessoas Jurídicas do Município de Canaã dos Carajás-PA.

Narra que, em razão do falecimento do titular da mencionada serventia, o TJPA determinou a abertura de procedimento para nomeação do interino, haja vista que, à época, não havia funcionário que atendesse aos requisitos do Provimento CNJ n.º 77/2018, o que resultou em dois candidatos, o ora requerente e Antônio Carlos Apolinário de Souza, terceiro interessado.

Alega, contudo, que o TJPA, por meio da Decisão/Ofício n.º 796, designou Antônio Carlos Apolinário de Souza apenas pelo critério da rentabilidade da serventia, o que vai de encontro as disposições contidas no Provimento CNJ n.º 77/2018.

Pugna, em caráter liminar, a suspensão dos efeitos da Portaria n.º 2110/2021-GP e da Decisão/Ofício n.º 796 até o julgamento definitivo do presente PCA e a consequente designação do requerente como responsável interino do Cartório do 2º Ofício de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civis das Pessoas Jurídicas do Município de Canaã dos Carajás-PA.

No mérito, pede a revogação da Portaria n.º 2110/2021-GP.

Solicitadas informações, a Presidência do Tribunal respondeu que a vacância da mencionada serventia transcorreu em razão do falecimento de seu oficial titular e que não nomeou a substituta mais antiga, por ser a genitora do delegatário.

Informou também, que a escrevente juramentada, Raiane Costa e Silva, não foi designada, em observância ao quanto decidido pelo Supremo Tribunal Federal, nos autos da Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 1.183/DF.

Consignou, por fim, que foi aberto procedimento administrativo para a ocupação da referida interinidade, no qual foram selecionados dois titulares que detêm as mesmas atribuições do serviço vago e exercem o ofício em Municípios contíguos ao de Canaã dos Carajás, porém, foi indicado Antônio Carlos Apolinário de Souza, em detrimento do requerente, devido à arrecadação média das serventias ocupadas pelos candidatos (Id. 4612074).

À vista da complexidade da matéria e a natureza da questão suscitada no feito, determinei a remessa dos autos à Coordenadoria de Gestão de Serviços Notariais e de Registro, para emissão de parecer (Id. 4613179).

A Confederação Nacional de Notários e Registradores (CNR) requereu sua admissão como terceira interessada e manifestou-se contrária à decisão do TJPA, uma vez que teria utilizado o critério da arrecadação não previsto na legislação de regência sobre o tema para a indicação de interino. (Id. 4618688).

Antônio Carlos Apolinário de Souza Cardozo também pugnou pela sua admissão no feito como terceiro interessado e manifestou-se no sentido da legalidade da decisão do TJPA, uma vez que teria atendido às diretrizes do Provimento CNJ n.º 77/2018. (Id. 4624862).

A Coordenadoria de Gestão de Serviços Notariais e de Registro apresentou parecer no sentido da necessidade da interinidade ser deferida à escrevente substituta mais antiga e caso haja impedimento, ao delegatário de serventia em Município contíguo mais próximo (Id. 4621369), no que foi posteriormente aprovado pela Excelentíssima Senhora Ministra Corregedora Nacional de Justiça. (Id. 4631545).

Na sequência, determinou-se a habilitação da CNR no feito como terceiros(as) interessado(as); de Antônio Carlos Apolinário de Souza Cardozo e Raiane Costa e Silva, como também a intimação da última para manifestação (Id. 4639279).

Antônio Carlos Apolinário de Souza Cardozo apresentou petição contra a inclusão no presente procedimento da CNR (Id. 4662627).

Raiane Costa e Silva sustentou que a condição de substituta do serviço registral foi implicitamente reconhecida pela Corregedoria do TJPA, o que, por si só, autoriza a sua nomeação como interina. Aduziu, ainda, que o parecer da Coordenadoria de Gestão de Serviços Notariais e de Registro fundamentou-se em premissa equivocada quanto à substituta mais antiga, à época da vacância da serventia (Id. 4670411).

O requerente destaca fato novo consubstanciado no entendimento recente da Corregedoria do TJPA quanto à utilização do critério da menor distância entre as serventias. Aduziu, ainda, que Raiane Costa e Silva é apenas escrevente autorizada, e não substituta (Id. 4673582).

A CNR reiterou os argumentos anteriormente explicitados (Id. 4681967).

Antônio Carlos Apolinário de Souza Cardozo alegou que a Corregedoria do TJPA tem se utilizado do critério arrecadatório para a designação de interinos(as) e que a Resolução CNJ n.º 80/2009, que previa a menor distância, foi revogada.

Por fim, informou que o Cartório do Único Ofício da Comarca de Curionópolis possui todas as atribuições da serventia vaga, e por essa razão atenderia ao princípio da eficiência e que faleceria competência do CNJ para análise do tema (Id. 4685393).

Em 02/05/2022, o pedido foi julgado procedente (Id. 44698056).

A Presidência do TJPA informou que cumpriu integralmente os termos da decisão supra (Id. 4706121).

Inconformado, Antônio Carlos Apolinário de Souza Cardozo interpôs recurso administrativo (Id. 4707790).

As partes apresentaram contrarrazões (Ids. 4747714 e 4813423).

É o relatório.


 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0009201-11.2021.2.00.0000
Requerente: ANDRE WILLIAMS FORMIGA DA SILVA
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ - TJPA

 


VOTO


O CONSELHEIRO SIDNEY PESSOA MADRUGA (Relator): 

Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo, com pedido liminar, proposto por André Williams Formiga da Silva, em que se questiona a Portaria n.º 2110/2021 expedida pela Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA), que não o designou como responsável interino do Cartório do 2º Ofício de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civis das Pessoas Jurídicas do Município de Canaã dos Carajás-PA.

Compulsando-se os autos, verifica-se que a parte recorrente não trouxe qualquer elemento novo ou razão jurídica capaz de alterar o entendimento proferido anteriormente, razão pela qual conheço do recurso, porquanto tempestivo, todavia mantenho a decisão monocrática por seus próprios fundamentos, a qual submeto ao egrégio Plenário do CNJ para apreciação: 

[...]

A pretensão do requerente cinge-se ao exame da legalidade da Portaria n.º 2110/2021 expedida pela Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA), que designou Antônio Carlos Apolinário de Souza Cardozo como responsável interino pelo Cartório do 2º Ofício de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civis das Pessoas Jurídicas do Município de Canaã dos Carajás-PA, em razão de a serventia, da qual é titular, possuir arrecadação média inferior às demais unidades (Id. 4576105).

Entretanto, o Provimento CNJ n.º 77/2018, em seu artigo 2º, § 1º e § 2º, determina que a designação de responsável interino(a) deverá recair no substituto mais antigo na data da declaração da vacância da serventia, desde que não seja cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau do antigo delegatário ou de magistrados do tribunal local.

No caso, extrai-se dos autos que o falecimento do titular da mencionada serventia ocorreu em 11/03/2021 e que a sua substituta legal era sua mãe, a incidir na vedação legal, ante a caracterização de nepotismo (Id. 4576105).

Igualmente, consta do documento de Id. 3911088 que a segunda substituta legal, Gilvana Feitosa Sousa foi exonerada em 2020, portanto, antes do falecimento do titular.

Por sua vez, Raiane Costa e Silva, ora terceira interessada, é apenas escrevente e não foi indicada formalmente como substituta, o que impede a sua designação, conforme reiterados precedentes do CNJ, in verbis:

RECURSO EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. SERVENTIA EXTRAJUDICIAL VAGA. DESIGNAÇÃO DE INTERINO. SEGUNDO SUBSTITUTO MAIS ANTIGO. POSSIBILIDADE. PRECEDENTE DESTE CONSELHO. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DA GRADUAÇÃO EM DIREITO OU EXPERIÊNCIA. DESNECESSIDADE. ENTENDIMENTO RECENTE DO STJ SOBRE O TEMA. RECURSO DESPROVIDO.

I – Recurso em sede de Procedimento de Controle Administrativo interposto em face de decisão monocrática, que julgou procedente o pedido.

II – O Plenário deste Conselho Nacional de Justiça, historicamente, possui entendimento no sentido de que, na hipótese de impossibilidade de designação do substituto legal, deve ser nomeado como responsável interino, o segundo substituto, desde que formalmente designado pelo antigo titular da serventia (RA em PCA nº 0004821-47.2018.2.00.0000, j. 16/11/2018; PCA nº 0007971-65.2020.2.00.0000, j. 18/12/2020; PCA nº 0009640-90.2019.2.00.0000, j. 05/03/2020).

III – O Superior Tribunal de Justiça, em recente julgado, decidiu que não se aplicam aos interinos os requisitos da graduação em Direito ou experiência, nos moldes dos artigos 14 e 15 da Lei nº 8.935/1994 (RMS 59.647/GO). IV – Recurso em Procedimento de Controle Administrativo conhecido, uma vez que tempestivo, e, no mérito, desprovido.(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0000551- 72.2021.2.00.0000 - Rel. VIEIRA DE MELLO FILHO - 99ª Sessão Virtual - julgado em 11/02/2022). (grifou-se).

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. SERVENTIA EXTRAJUDICIAL VAGA. INTERINO. SEGUNDO SUBSTITUTO MAIS ANTIGO. POSSIBILIDADE. CONFORMIDADE À LEI DE REGÊNCIA.

1. O art. 20 da Lei dos Cartórios confere ao delegatário o poder de contratar escreventes, dentre eles escolhendo os seus substitutos. Destaque-se que a mencionada norma expressamente reconhece a possibilidade de nomeação de mais de um substituto, a critério de cada notário ou oficial de registro.

2. Existindo mais de um substituto formalmente designado para funcionar em conjunto ou nas ausências do titular, impõe-se ao Tribunal a nomeação do substituto mais antigo no momento vacância e que sobre ele não recaia qualquer impedimento ou quebra de confiança.

3. Procedimento administrativo que se julga procedente. (PCA nº 0007971-65.2020.2.00.0000, Rel. Conselheiro André Godinho, j. 18/12/2020). (grifou-se).

O artigo 20 da Lei n.º 8.935/1994 autoriza os delegatários a “contratar escreventes, dentre eles escolhendo os substitutos” e expressamente enuncia que “haverá tantos substitutos quantos forem necessários”.

Deve-se, ainda, encaminhar ao juízo competente os nomes dos substitutos, uma vez que estes praticam os atos próprios às atividades dos oficiais, salvo exceções legais, enquanto que os escreventes apenas aqueles que houver autorização do titular.

Vê-se que a lei estabelece clara distinção entre os empregados contratados para o desempenho de funções em cada serviço notarial, entre eles, os escreventes e os auxiliares, considerados prepostos dos delegatários. Os escreventes, ainda, podem ser indicados como substitutos.

Nesse aspecto, convém ressaltar a doutrina Walter Ceneviva que bem estabelece a diferenciação entre o escrevente e o substituto, ad litteris:

Escrevente é o empregado com capacitação técnica para o serviço, habilitado, nos ofícios de registro, a examinar títulos, a autorizar o assentamento ou devolvê-los ao interessado, com as exigências legais, dar buscas e promover ou certificar assentamentos existentes.

[...]

Escrevente substituto é o empregado com capacitação técnica plena, a critério do titular, habilitado a praticar, simultaneamente com o titular, todos os atos da atividade tabelioa ou os relacionados na Lei de Registros Públicos e na legislação extraordinária pertinente. Todos os atos é expressão tomada na lei em sentido literal: o escrevente substituto é apto para exercer funções próprias do titular que este lhe determine (exceto para a indelegável lavratura de testamento) sem diminuir, porém, os encargos da delegação. (grifou-se).

Portanto, Raiane Costa e Silva, sequer indicada formalmente como escrevente substituta, não atende às disposições contidas no Provimento CNJ n.º 77/2018 e na Lei n.º 8.935/1994.

Ultrapassada essa primeira análise, remanesce a inserta no artigo 5º do Provimento CNJ nº 77/2018, que possui caráter subsidiário por ser aplicável apenas nos casos em que não subsista nenhum dos substitutos formalmente designados pelo anterior titular do cartório, em condição viável para o exercício da interinidade.

Nos termos do mencionado dispositivo, estabeleceu-se que a designação deva recair no delegatário em exercício no mesmo município ou em município contíguo que detenha uma das atribuições do serviço vago.

Considerando os requisitos em questão, apesar de haver delegatário no Município de Canaã dos Carajás, a serventia não possui qualquer das atribuições do serviço vago, fato impeditivo para a designação da interinidade.

Restaram, pois, dois interessados pela serventia vaga: Antônio Carlos Apolinário de Souza, titular do Cartório do Único Ofício da Comarca de Curionópolis e André Williams Formiga da Silva, titular do 1º Ofício de Registro de Imóveis de Parauapebas, ora requerente. Ambos são delegatários com exercício em municípios contíguos ao de Canaã dos Carajás e detêm uma das atribuições do serviço vago, o que os habilita para o referido encargo.

Nota-se que a Presidente do Tribunal se valeu do critério da menor arrecadação da serventia para determinar a nomeação de Antônio Carlos Apolinário de Souza em detrimento do requerente. Contudo, inexiste previsão no ordenamento pátrio para adoção do mencionado critério, assim, considerada a circunstância retro, a Portaria n.º 2110/2021 está em desconformidade com a legislação regente sobre o tema.

Em relação à pequena distância entre as comarcas contíguas do serviço vago, constata-se que a contiguidade almejada pelo artigo 5º do mencionado normativo baseia-se na eventual ocorrência de acumulação dos serviços de dois cartórios e que não venha a prejudicar a regular prestação dos serviços de qualquer deles. E, nesse aspecto, ainda que a diferença de quilometragem seja, de fato, ínfima entre as serventias, deve-se priorizar o que está previsto na legislação, isto é, a delegação deve recair sobre o delegatário em exercício no município mais próximo.

Assim, o critério utilizado de maior proximidade dos municípios em relação ao serviço vago não ofende o Provimento CNJ n.º 77/2018, pelo contrário, é o mais justo, adequado e obedece estritamente o princípio da legalidade constitucional (art. 37, caput, CF/88), na medida que que a contiguidade tem por parâmetro a diminuição da distância entre as serventias acumuladas.

Não é por outra razão que a Resolução CNJ n.º 80/2009, ao declarar a vacância de serventias em desacordo com a Constituição da República Federativa do Brasil e estabelecer regras para a organização dos serviços vagos, definiu no artigo 7º, § 2º, f, que será designado para responder pela serventia vaga o titular de unidade mais próxima.

Ante o exposto, julgo procedente o pedido, para declarar a nulidade da Portaria n.º 2110/2021 do TJPA e determinar à Presidência daquela Corte de Justiça que proceda a designação imediata de André Williams Formiga da Silva, titular do 1º Ofício de Registro de Imóveis de Parauapebas, como responsável interino pelo Cartório do 2º Ofício de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civis das Pessoas Jurídicas do Município de Canaã dos Carajás, caso inexista quaisquer outros impedimentos legais, até que seja realizado concurso público para o provimento das vagas existentes e/ou revogação da interinidade por eventual quebra de confiança. Prejudicado o exame do pedido liminar.

Outrossim, fica determinado que referida designação seja cumprida a partir do dia do recebimento da intimação respectiva da Excelentíssima Presidente do TJPA, a qual, igualmente, deverá comunicar a formalização de referido ato a este Relator (Id. 4698056). 

 

Conforme antes explicitado na decisão recorrida, o TJPA valeu-se de critério não previsto na legislação de regência sobre o tema para proceder à nomeação de Antônio Carlos Apolinário de Souza, terceiro interessado, em detrimento do requerente. O Tribunal, porém, deve se ater estritamente aos termos do Provimento CNJ n.º 77/2018 e da Resolução CNJ n.º 80/2009, ou seja, a delegação recairá sobre o delegatário em exercício no município mais próximo. 

Assim, considerando as circunstâncias apresentadas, tem-se que a decisão monocrática se amolda de forma adequada ao disposto no art. 25, X, do RICNJ[1]. 

Ex positis, conheço do recurso interposto, mas nego-lhe provimento, nos termos da fundamentação supra.

É como voto.

Publique-se nos termos do art. 140 do RICNJ[2]. Em seguida, arquive-se independentemente de nova conclusão. 

Brasília/DF, data registrada em sistema. 

SIDNEY PESSOA MADRUGA

Conselheiro Relator

 



[1] Art. 25. São atribuições do Relator: [...] X - determinar o arquivamento liminar do processo quando a matéria for flagrantemente estranha às finalidades do CNJ, bem como a pretensão for manifestamente improcedente, despida de elementos mínimos para sua compreensão ou quando ausente interesse geral;

[2] Art. 140. As decisões, atos regulamentares e recomendações do CNJ serão publicados no Diário da Justiça da União e no sítio eletrônico do CNJ.

 

 

 

VOTO DIVERGENTE

 

RECURSO EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ. PORTARIA N.º 2110/2021-GP. REGULARIDADE. CRITÉRIOS. ARRECADAÇÃO VERSUS DISTÂNCIA. ESPECIALIDADE (PCA 882-88.2020.2.00.0000). DESIGNAÇÃO. EXERCÍCIO DA INTERINIDADE. AUTONOMIA DO TRIBUNAL.   RECURSO PROVIDO E IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS DA EXORDIAL.

 

O EXMO. CONSELHEIRO MARCOS VINÍCIUS JARDIM:

 Adoto o relatório do Eminente Relator, contudo, peço vênia para divergir de Sua Excelência, propondo o provimento do recurso administrativo e a improcedência dos pedidos veiculados neste PCA, pelas razões a seguir esposadas.

O presente procedimento fora instaurado para impugnar a Portaria nº 2110/2021, expedida pela Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, pela qual se designou - como responsável interino do Cartório do 2º Ofício de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civis das Pessoas Jurídicas do Município de Canaã dos Carajás/PA – o senhor Antônio Carlos Apolinário de Souza, em decorrência do falecimento do titular. 

O Tribunal nortista, entendendo haver apenas dois registradores aptos ao exercício da interinidade, concedeu-a a Antônio Carlos Apolinário, titular do Cartório do Único Ofício da Comarca de Curionópolis/PA, fundamentando na equivalência de funções e serviços das serventias, bem como no equilíbrio das remunerações dos registradores. 

Irresignado com tal escolha, o requerente solicitou, na exordial, a anulação do ato e a sua designação para a interinidade em questão, sob a premissa de violação ao princípio da eficiência, pois, em sua interpretação acerca do Provimento CNJ nº 77/2018, o cartorário geograficamente mais próximo é que deve ser nomeado, argumentando, ainda, a violação ao princípio da impessoalidade, por entender que foi a única oportunidade em que o TJPA adotou critério diverso - menor distância - para a solução da questão. 

Ultimados os trâmites típicos deste procedimento, inclusive a manifestação de terceiro interessado, foi proferida decisão de procedência da pretensão inaugural, com a anulação da Portaria TJPA nº 2110/2021 e da Decisão/Ofício n.º 796, determinando-se a imediata designação de André Williams Formiga da Silva (autor), titular do Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Parauapebas, como interino do Cartório do Único Ofício da Comarca de Curionópolis/PA.

Em apertada síntese, os fundamentos apontados para o acolhimento do pedido foram: a) inexiste lei para a adoção do critério da menor arrecadação da serventia; b) o critério de maior proximidade não ofende o Provimento CNJ nº 77/2018, é o mais justo, adequado, e obedece ao princípio da legalidade constitucional (art. 37, caput, CF/88); c) A Resolução CNJ nº 80/2009 prevê, em seu art. 7º, §2, a adoção do critério de maior proximidade.

Entretanto, permissa vênia, tais fundamentos não parecem aptos à reforma da decisão do TJPA, pela qual atribuiu a interinidade em tela a Antônio Carlos Apolinário de Souza Cardoso, porquanto o critério adotado pelo Estadual não malogra normas ou legislação da espécie, razão pela qual, no resguardo de sua autonomia, deve prevalecer sua decisão.

De início, truísmo que a menor distância não é critério exclusivo, decisivo ou até preponderante na escolha da interinidade, considerando que, segundo o Provimento CNJ n. 77/2018:

Art. 5º Não havendo substituto que atenda aos requisitos do § 2º do art. 2º e do art. 3º, a corregedoria de justiça designará interinamente, como responsável pelo expediente, delegatário em exercício no mesmo município ou no município contíguo que detenha uma das atribuições do serviço vago. 

Não há, na norma, a determinação direta, expressa e incisiva de que “a delegação deve recair sobre o delegatário em exercício no município mais próximo”, sendo conclusivo - com a máxima vênia - que a decisão do relator, sob o fundamento de atender ao princípio da legalidade, acabou por feri-lo.  

Caso se optasse pelo critério da menor distância como decisivo para a solução de situações como a presente, assim deveria constar expressamente do Provimento CNJ n. 77/2018, o que – contudo - não ocorre. Lado outro, o regramento, para o caso trazido à baila, prevê dois parâmetros que devem ser observados (e foram): i) ser a comarca contígua e; ii) exercer atribuição correspondente à do cartório vago.

Revela-se, portanto, adequada a decisão do Tribunal de Justiça Paraense, pois deliberou sobre a presente questão sob o esteio de sua autonomia, sem ofender, de igual forma, o princípio da legalidade, razão pela qual há de se reformar a r. decisão do Relator para julgar improcedentes os pedidos autorais.

Em acréscimo, registro que, para o caso em comento, a adoção do critério da menor distância como fundamento preponderante (em contexto com outras variáveis), destoa do posicionamento deste Conselho no PCA nº 0000882-88.2020.2.00.0000, em que restou consignado que o critério da especialidade, por interferir diretamente na qualidade dos serviços prestados, deve nortear a escolha da interinidade.

RECURSO EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. SERVENTIA EXTRAJUDICIAL VAGA. DESIGNAÇÃO DE INTERINO. PROVIMENTO Nº 77/2018 DA CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA. AVALIAÇÃO POR ESPECIALIDADE. RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. Não havendo substituto mais antigo para o primeiro enquadramento sinalizado na Lei nº 8.935/94 (art. 39, §2º), o Provimento nº 77/2018 deste Conselho assinala que o encargo deverá recair sobre o delegatário de outra unidade extrajudicial, do mesmo município ou de município contíguo, que detenha uma das atribuições do serviço vago (art. 5º, caput).

2. Dada as diversas atribuições estabelecidas na Lei dos Cartórios (art. 5º), cada qual com suas peculiaridades e rotinas diferentes, a norma deste Conselho buscou manter não só a regularidade do serviço, como, também, a necessária qualidade na execução dos atos de sua competência, circunstância que enseja a designação de responsável interino com igual expertise.

3. Independentemente de o delegatário ser da mesma comarca ou de comarca contígua, há a exigência de que detenha uma das atribuições do serviço vago. Precedente deste Conselho.

4. Recurso que se conhece e nega provimento.

(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0000882-88.2020.2.00.0000 - Rel. ANDRÉ LUIZ GUIMARÃES GODINHO - 87ª Sessão Virtual - julgado em 28/05/2021). 

No particular, a serventia vaga objeto da presente demanda é o Cartório do 2º Ofício de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Pessoas Jurídicas do Município de Canaã dos Carajás/PA, cujos serviços também são prestados pelo Cartório do Único Ofício da Comarca de Curionópolis (em que o titular é o recorrente), uma vez que acumula, para além do registro de imóveis, o registro de títulos e documentos e de pessoas jurídicas. Por seu turno, o cartório titularizado pelo autor exerce apenas o registro de imóveis.

Assim, evidencia-se que, por preencher a totalidade das atribuições da serventia vaga, o Cartório de titularidade do recorrente é dotado de maior expertise e de mais subsídios, inclusive estrutura física e pessoal, para atender às demandas dos usuários de Canaã dos Carajás.

Ademais, observa-se que é ínfima a distância entre as comarcas, como admitiu o próprio relator, arrefecendo, sobremaneira, a contundência do presente critério, devendo a escolha pautar-se, deste modo, na busca da maior eficiência. Nesse desiderato, a maior afinidade de atribuições deve se sobrepor ao fator distância, notadamente quando muito próximas as serventias extrajudiciais.

Por fim, vale frisar que a argumentação tecida pelo TJPA sobre a menor arrecadação da serventia titularizada pelo recorrente igualmente não ofende o Princípio da Legalidade, pois se é verídico que “inexiste previsão no ordenamento pátrio para adoção do mencionado critério”, igualmente não há vedação e quiçá não contraria o Provimento CNJ nº 77/2018, que, inclusive, reconheceu em seu art. 7º que há situações que escapam à regulação[1].

A escolha de critérios não previstos no Provimento supra, por si só, não ofende o princípio da legalidade, considerando que a norma não é numerus clausus, conferindo certa dose de discricionariedade à administração para o equacionamento. Portanto, a ponderação sobre a equidade na renda não fere a Constituição Federal ou outra norma, se demonstrando, assim, razoável e pertinente, inclusive já utilizada em oportunidades diversas pela Corregedoria do TJPA, com o fito de evitar que cartórios percebam valores tão díspares, especialmente quando um deles, no caso o recorrido, tem a serventia em cidade muito mais desenvolvida do que a do recorrente; de modo que deve ser prestigiada a autonomia do TJPA na escolha do critério, pois lícito e regular.

Do exposto, convenço-me de que o ato emanado pelo TJPA atende ao princípio da eficiência administrativa e à orientação recentemente emanada pelo Plenário deste Conselho, destacando, ainda, que o precedente constituído no PCA nº 0000882-88.2020.2.00.0000 foi desafiado por Mandado de Segurança impetrado perante o Supremo Tribunal Federal (MS 37.939), tendo o Ministro Edson Fachin, ao negar a liminar pleiteada, exortado que a decisão desta Casa comporta interpretação razoável das normas aplicáveis, fato que reforça a orientação firmada pelo CNJ.

Assim, merece reforma a decisão recorrida para que a escolha feita pelo Tribunal de Justiça Paraense seja respeitada.

Dispositivo

Do exposto, pelas razões supra, lastrado, ainda, nos termos descritos no PCA 882-88.2020.2.00.0000[2], apresento este respeitoso VOTO DIVERGENTE, para DAR PROVIMENTO AO RECURSO interposto por Antônio Carlos Apolinário e reformar a decisão recorrida para julgar IMPROCEDENTES os pedidos formulados no PCA, mantendo-se hígidos os atos praticados pelo TJPA no exercício de sua autonomia constitucional.

É o voto que submeto ao Egrégio Plenário.

Brasília, 11 de fevereiro de 2023.

 

Conselheiro Marcos Vinícius Jardim



[1] Art. 7º Os casos omissos serão decididos pela Corregedoria de Justiça local e deverão ser comunicados à Corregedoria Nacional de Justiça no prazo de 30 (trinta) dias.

[2] Trecho do voto no PCA 882-88:

Não havendo substituto mais antigo para o primeiro enquadramento sinalizado na Lei nº 8.935/94 (art. 39, §2º), o Provimento nº 77/2018 deste Conselho assinala que o encargo deverá recair sobre delegatário de outra unidade extrajudicial, do mesmo município ou de município contíguo, que detenha uma das atribuições do serviço vago (art. 5º, caput).

Dadas as diversas atribuições estabelecidas na Lei dos Cartórios (art. 5º), cada qual com suas peculiaridades e rotinas diferentes, a norma deste Conselho buscou manter não só a regularidade do serviço, como, também, a necessária QUALIDADE na execução dos atos de sua competência, circunstância que enseja a designação de responsável interino COM IGUAL EXPERTISE. (...)

Dentre as diversas atribuições constantes da Lei nº 8.935/94 (notas, protesto de títulos, registro de imóveis, registro civil das pessoas naturais, registro de títulos e documentos das pessoas jurídicas e registro de distribuição), qual teria a preferência para responder como interino?

Essa questão, por evidente, não constou no Provimento nº 77/2018. Como visto, o art. 5º do mencionado normativo direciona a interinidade para delegatário de outra unidade que possua uma das atribuições do serviço vago. Impõe, portanto, a exigência de que detenha A MESMA EXPERTISE da unidade extrajudicial cujas atribuições irá desenvolver a título precário, como interino. [...]

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0009201-11.2021.2.00.0000
Requerente: ANDRE WILLIAMS FORMIGA DA SILVA
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ - TJPA

VOTO-VISTA CONVERGENTE

Cuidam os autos de Procedimento de Controle Administrativo instaurado a requerimento de André Williams Formiga da Silva, oficial registrador do 1º Ofício de Registro de Imóveis de Parauapebas-PA (CNS 06.681-1), em que postula o controle de aparente ilegalidade cometida pelo Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA) na edição da Portaria n° 2.110, de 16 de dezembro de 2021, expedida pela Desembargadora Presidente da Corte paraense.

O ato administrativo impugnado designou Antônio Carlos Apolinário de Souza Cardoso, titular do cartório do Ofício Único da comarca de Curionópolis-PA (CNS 06.708-2), para responder, interinamente, pelo serviço do cartório do 2º Ofício de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civis das Pessoas Jurídicas do Município de Canaã dos Carajás-PA (CNS 06.782-7).

Em 2 de maio de 2022, o Conselheiro Sidney Madruga, relator sorteado, proferiu decisão monocrática julgando procedentes os pedidos formulados. Declarou-se a nulidade da portaria que nomeou Antônio Carlos Apolinário como serventuário interino do 2º Ofício de Canaã dos Carajás, com determinação de designação de André Williams Formiga da Silva para o exercício do encargo.

A decisão foi desafiada por recurso administrativo interposto tempestivamente por Antônio Carlos Apolinário de Souza Cardoso.

Adoto, no mais, o relatório lançado pelo eminente Relator do feito.

 

Após detida análise dos autos, convenci-me do acerto do voto apresentado pelo Conselheiro Relator, que nega provimento ao recurso administrativo interposto por Antônio Carlos Apolinário para manter a decisão monocrática de procedência dos pedidos formulados na petição inicial.

O poder de fiscalização dos atos e dos serviços notariais e registrais é conferido a este Conselho por força do art. 103-B, § 4º, I e III da Constituição da República e, em caráter complementar, pelos arts. 37 e 38 da Lei n. 8.935, de 18 de novembro de 1994.

Na repartição de competências estabelecida no Regimento Interno deste Conselho Nacional, ato normativo primário cujo fundamento de validade emana diretamente do texto constitucional1, conferiu-se à Corregedoria Nacional de Justiça atribuição de expedir, dentre outros atos normativos e regulamentares, provimentos destinados “ao aperfeiçoamento das atividades (...) dos serviços notariais e de registros” (RICNJ, art. 8º, X).

É este, em resumo, o arcabouço normativo que sustentou a edição do Provimento n° 77, de 7 de novembro de 2018, da Corregedoria Nacional de Justiça. O regulamento tem por objetivo disciplinar a designação de responsável, em caráter interino, pelo expediente de serventias extrajudiciais vagas, exatamente o caso dos autos.

Por sua vez, o parágrafo segundo do art. 39 da Lei n. 8.935, de 18 de novembro de 1994 (Lei dos Cartórios), que regulamenta o art. 236 da Constituição da República, estabelece regra única de sucessão em casos de extinção da delegação e de declaração de vacância do serviço: recai sobre o respondente substituto mais antigo o dever de manter a prestação do serviço.

Ocorre que a prática demonstrou, ao longo de mais de três décadas de vigência de nossa atual ordem constitucional e da Lei dos Cartórios, que a regra de substituição do titular pelo oficial substituto mais antigo é insuficiente para dar conta de múltiplas externalidades incidentes sobre o exercício interino da atividade notarial e registral.

É de difícil efetivação o comando constitucional que impede a vacância por mais de seis meses e impõe a abertura de reiterados concursos públicos de provas e títulos para a outorga de delegações sem titular. Tais certames, regulados pela Resolução n. 81, de 9 de junho de 2009, do CNJ, são sobremaneira complexos, frequentemente desafiados por recursos e medidas de controle judicial ou mesmo perante este Conselho Nacional, o que constantemente inviabiliza sua conclusão no prazo “impreterível” de doze meses fixado pelo parágrafo primeiro do art. 2º do ato normativo mencionado.

Essa complexidade envolve não apenas o grau de dificuldade e o número de etapas do processo seletivo. A natureza sui generis da seleção, que se destina à delegação de serviço e não ao provimento de cargo, sobreleva a importância da classificação final, de que depende a rentabilidade do serviço — como a atividade é exercida em caráter privado e remunerada por emolumentos, não há incidência do limite remuneratório previsto no art. 37, XI, da Constituição da República. É essa parte da razão pela qual se identifica um incremento considerável na litigiosidade patrocinada tanto por candidatos quanto por outros interessados em manter situação de fato que lhes beneficia; disso, resultam frequentes ajustes no cronograma previsto para a conclusão da seleção, emperrando seu desfecho.

Como resultado dos fatores que arrolei acima, a situação excepcional da interinidade acaba se prolongando por muito mais tempo que o esperado pelo constituinte e pelo administrador judiciário — há lugares em que a prestação de serviços notariais e registrais por não titulares é a regra. E, ao prolongar-se no tempo, naturalmente gera retorno financeiro que permeia a disputa entre delegatários por tais interinidades. Trata-se de uma disputa legítima e compreensível, para a qual o CNJ vem buscando dar respostas satisfatórias.

A regra prevista no art. 20, § 2º, da Lei de Cartórios, portanto, não é suficiente para solucionar a questão da interinidade do expediente de serviços notariais e registrais vagos. E é este o âmbito de incidência do art. 5º do Provimento n° 77, de 2018, da Corregedoria Nacional de Justiça, que regula a presente demanda.

Na hipótese da inexistência de substituto mais antigo apto a responder pelo serviço — e, se tornada definitiva a referida decisão do Supremo Tribunal Federal, decorridos seis meses ininterruptos desde o início da substituição —, impõe-se pelo Provimento n° 77, de 2018, a designação de “delegatário em exercício no mesmo município ou no município contíguo que detenha uma das atribuições do serviço vago”. Não havendo delegatário nesta condição, a designação recairá sobre “substituto de outra serventia bacharel em direito com no mínimo 10 (dez) anos de exercício em serviço notarial ou registral”.

Nota-se logo que os critérios sucessivos eleitos pelo fiscalizador do serviço para a indicação de respondente atendem a determinada ordem: a designação deve cair entre outros delegatários titulares; na ausência destes, entre substitutos com formação em direito e com período mínimo de exercício na atividade notarial e registral.

Dentre a classe apontada como preferencial para a ocupação da substituição, demanda-se a satisfação concomitante de duas condições necessárias. A primeira delas é de ordem geográfica: o postulante deve estar em exercício no mesmo município ou em município contíguo. A segunda exigência é de ordem material: é suficiente que o indicado exerça uma das atribuições do serviço vago.

A partir dessas premissas é que devemos ler a causa de pedir remota neste procedimento de controle. É possível que o tribunal, responsável imediato pela supervisão da atividade notarial e registral, eleja um critério de desempate não previsto pela regulamentação nacional de regência para, diante de dois interessados que atendem às condições necessárias para a designação, escolher qual responderá interinamente pelo serviço?

A resposta a esta pergunta pode ser positiva.

Mas, no caso concreto, a resposta é negativa.

Verifica-se, na hipótese dos autos, que não há efetiva igualdade de condições concorrenciais entre os dois pleiteantes que justifique a adoção de um critério exógeno à regulamentação incidente. Isso sem prejuízo da justiça do critério eleito pelo Tribunal de Justiça do Pará, que pode vir a ser adotado no futuro, com aperfeiçoamentos.

Como relatado na petição inicial e bem apontado pelo relator em sua decisão monocrática — e no voto a que adiro —, o critério geográfico eleito pela regra incidente deve prevalecer na resolução de eventuais conflitos entre delegatários interessados em responder interinamente por outro serviço notarial e/ou registral. Se atendido critério da competência (exercício de uma das atribuições do serviço vago), deve prevalecer a designação de titular de serventia no mesmo município sobre a de titular de serventia localizada em município contíguo. Não havendo interessado no mesmo município e havendo mais de um em localidades contíguas, deve-se preferir o titular da delegação em sítio mais próximo ao do mais distante.

A preferência do autor da norma pelo critério geográfico, a propósito, se revela também em outros instrumentos deste Conselho que tratam da responsabilidade pelo serviço vago. A Resolução n° 80, de 9 de junho de 2009, embora se destine a situações diversas, prevê em seu art. 7º, § 2º, “f” que, na inexistência de candidato aprovado em concurso público interessado em receber a delegação de serviço de registro civil de pessoas naturais, a designação para responder pelo serviço vago deve recair sobre, justamente, o titular da unidade de registro mais próxima. Trata-se, pois, de critério eleito pelo Plenário do Conselho e, posteriormente, seguido pela Corregedoria Nacional ao regulamentar, de modo mais amplo, o tema da interinidade pelo expediente de serventias extrajudiciais vagas.

Como se infere do mapa abaixo, a sede do município de Parauapebas2 não apenas se situa mais próxima de Canaã dos Carajás3 que Curionópolis4. O único acesso entre Curionópolis e Canaã dos Carajás se dá, justamente, com passagem obrigatória pelo município de Parauapebas:

 

Fonte: https://www.google.com/maps

A título de comparação, o percurso entre Curionópolis e Canaã dos Carajás (94km) é quase 30 km maior que a distância a percorrer entre Parauapebas e Canaã dos Carajás (66 km).

Perceba-se: não há dúvida de que os municípios são contíguos; de fato o são. No entanto, não se trata de região conurbada, com várias vias de acesso ligando os diferentes municípios. O que se verifica na localidade, vizinha à conhecida região garimpeira de Serra Pelada, é que uma única rodovia estadual, a PA-160, liga Canaã dos Carajás a Parauapebas. Para chegar até Curionópolis, no entanto, cujo delegatário o TJPA designou para responder pela serventia de Canaã, além de percorrer todos os 66km na PA-160, será necessário pegar uma outra rodovia, a PA-275, e trafegar mais 29km.

De fato, em se tratando do Sul do Pará, a diferença das distâncias não é grande. No entanto, não há ligação direta entre Canãa dos Carajás e Curionópolis, o que mitiga a contiguidade entre os municípios em favor da proximidade verificada por meio da rodovia que efetivamente faz a ligação entre as sedes dos municípios. Além disso, seria de se questionar: por que fazer o cidadão deslocar-se mais, se em Parauapebas existe delegatário titular que preenche os requisitos do Provimento n° 77, de 2018?

Transcrevo trecho do parecer da Corregedoria Nacional de Justiça que secunda a ideia de que o critério de contiguidade é indissociável da verificação de proximidade entre os serviços:

Contiguidade é critério objetivo que tem o comprimento como unidade de medida. Quanto maior for a distância entre o município com serventia vaga e o município com serventia provida (cujo titular pretenda interinidade), menor será a contiguidade entre um município e outro, menor será a carga de direito à designação. (id 4621369, p. 4)

Importante registrar que não identifico antijuridicidade per se no critério adicional de equilíbrio de rentabilidades entre os delegatários, como concebido no procedimento adotado pelo Tribunal de Justiça do Estado do Pará. Parece-me inclusive que tal critério poderia ser aplicado na hipótese de insuficiência dos demais para solucionar eventual impasse similar. Trata-se de boa solução engendrada a partir do permissivo constante do art. 7º do Provimento n. 77, de 2018, da Corregedoria Nacional de Justiça.

Contudo, havendo possibilidade de solução do empate com utilização de um critério discriminado na norma de regência, não me parece razoável recorrer à cláusula geral de omissão que autoriza a deliberação da corregedoria local para que se eleja outro fator de discrímen, a despeito de sua objetividade e razoabilidade.

Isso ocorre, também, porque a comparação de arrecadação bruta entre as serventias não é tão substancial a ponto de este critério sobrelevar, de modo acachapante, o de diferença entre distâncias. Ambas as serventias cujos titulares disputam a interinidade do serviço de Canãa dos Carajás perceberam importe superior a dois milhões de reais em 2022.

Em consulta às informações públicas constantes do portal Justiça Aberta, mantido pela Corregedoria Nacional de Justiça, verifica-se que a arrecadação auferida pelo Ofício Único de Curionópolis no ano passado (R$ 2.071.631,30) é 24% inferior à do 1º Ofício de Registro de Imóveis de Parauapebas no mesmo período (R$ 2.583.673,44).

O ponto que pretendo demonstrar com essa referência é que a designação do delegatário de Curionópolis para responder pelo serviço de Canaã dos Carajás não se mostra propriamente uma necessidade para manutenção da atratividade da serventia de Curionópolis, por si só já bastante atrativa.

Insisto: não combato a ideia de utilizar o critério de rentabilidade da serventia para compensar disparidades regionais e tornar uma ou outra delegação mais atrativa em razão de cumulações possíveis. A ideia parece razoável e inteligente, mas não creio que deva ser utilizada de forma pontual em um caso como este (cuja solução não demanda tal inovação), sem edição de norma regulamentar mínima que estabeleça ao menos critérios de apuração da rentabilidade no tempo e de escolha entre um e outro delegatário com situações semelhantes para exercer a interinidade. Observe-se que o Tribunal de Justiça do Maranhão utiliza esse critério de rentabilidade para designação de interinos, mas o faz mediante regulamentação própria.

No entanto, neste caso concreto, sem regulamentação prévia e com sensível prejuízo ao critério da proximidade para o cidadão, a inovação do tribunal paraense soa infeliz. Durante o prazo de vistas, verifiquei se em alguma outra designação de interinidade pelo TJPA tal critério de rentabilidade foi usado e encontrei outros dois precedentes, que não encontraram oposição de eventuais interessados.

Finalmente, enfrento um argumento adicional, o das atribuições. O delegatário de Curionópolis entende que poderia prestar um serviço de maior qualidade, por possuir, em sua serventia, as mesmas atribuições daquela de Canaã dos Carajás, e até outras adicionais, enquanto o autor do PCA teria apenas uma delas em sua delegação, a de registro de imóveis.

Ocorre que o número de atribuições equivalentes não é critério de escolha no Provimento n° 77, de 2018, que exige tão-somente que o interino possua uma das atribuições da serventia vaga.

Apesar de soar estranho para o leigo, essa norma tem razão de ser: existe uma sutil delicadeza no equilíbrio das serventias em uma determinada região. No caso de Canaã dos Carajás, por exemplo, existe um outro delegatário titular no mesmo município, mas que possui atribuições de notas, protesto de títulos, registro civil das pessoas naturais e interdições e tutelas, não concorrendo, portanto, à interinidade no cartório de vago, com atribuições de registro de imóveis e títulos de pessoas jurídicas.

O cartório de Parauapebas, por sua vez, possui apenas a competência de registro de imóveis, enquanto o de Curionópolis, por ser ofício único, detém todas as atribuições, inclusive de notas, que o cartório vago não possuía.

Qual a consequência, pois, da designação do cartório do ofício único de Curionópolis para exercer a interinidade em Canaã dos Carajás? Ele poderá pretender oferecer o serviço de notas, gerando uma possível concorrência predatória com o tabelionato de notas de Canaã.

Perceba-se a necessidade de que sejam estabelecidos parâmetros mínimos antes de inovar no tema das interinidades com um novo critério, como o da rentabilidade: sem um estudo cuidadoso, à guisa de equilibrar dois cartórios de grande porte, possivelmente estar-se-ia prejudicando um terceiro, eventualmente menos rentável, o que contraria o raciocínio pretendido pelo tribunal paraense.

Assim, e considerando todos esses elementos, parece acertada a decisão monocrática recorrida que julgou procedente o pedido de controle administrativo formulado por André Williams Formiga da Silva para: a) declarar a nulidade da Portaria n° 2.110, de 2021, do Tribunal de Justiça do Estado do Pará; e b) determinar à Presidência da Corte que promova a designação do autor para responder, interinamente, pelo Cartório do 2º Ofício de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civis das Pessoas Jurídicas do Município de Canaã dos Carajás.

Em virtude de todo o exposto, filio-me ao voto do eminente Conselheiro Sidney Madruga para conhecer do recurso administrativo interposto por Antônio Carlos Apolinário de Souza e, no mérito, negar-lhe provimento.

Luiz Fernando BANDEIRA de Mello
Conselheiro Nacional de Justiça



1 STF. ADC 12/DF. Rel. Min. CARLOS BRITTO. Pleno. j. em 20 ago. 2008.

2 Localidade onde o autor-recorrido é titular de serviço cartorial.

3 Localidade onde está situada a serventia vaga.

4 Localidade onde o recorrente, designado como interino de Canaã, é titular de ofício único.