Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0008361-98.2021.2.00.0000
Requerente: CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO - CGJRJ
Requerido: CLAUDIO ANTONIO MATTOS DE SOUZA

 

EMENTA

EXTRAJUDICIAL. RECURSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. PRESCRIÇÃO RECONHECIDA TENDO COMO TERMO INICIAL A DATA DOS FATOS. MANIFESTA ILEGALIDADE DA DECISÃO DA CGJ/RJ. APLICAÇÃO DA LEI N. 8.112/90. TERMO INICIAL DA PRESCRIÇÃO. PRINCÍPIO DA ACTIO NATA. DATA DO CONHECIMENTO DO FATO PELA AUTORIDADE COMPETENTE. MANUTENÇÃO DA DECISÃO MONOCRÁTICA. RECURSO NÃO PROVIDO. 

1. É constitucional a competência do Conselho Nacional de Justiça para receber e conhecer, de forma originária, as reclamações contra serventias e órgãos prestadores de serviços notariais e de registro, bem como para avocar processos disciplinares em curso.

2. A intervenção deste Conselho em processo disciplinar instaurado contra delegatário de serventia extrajudicial é excepcional e está circunscrita ao controle de legalidade dos atos praticados pelo Tribunal, velando pelo cumprimento do disposto no art. 37 da Constituição Federal e afastando evidente teratologia, mas não revisando ou anulando decisão administrativa da origem.

3. Há no ato administrativo do Poder Judiciário local manifesta ilegalidade a autorizar a intervenção deste Conselho Nacional de Justiça para exercer o constitucional controle da legalidade (CF, art. 103-B, §4º, II).

4. O regime de prestação dos serviços extrajudiciais de notas e registros em caráter privado, mediante delegação do Poder Público, tem como norma fundamental o disposto no artigo 236 da Constituição Federal.

5. A Lei Federal n. 8.935/1994 fixou os deveres e as penalidades a que estão sujeitos os notários e registradores (arts. 30, 31 e 32), sem, no entanto, dispor acerca dos prazos prescricionais. Em sendo as penalidades estabelecidas por Lei Federal, deve o vazio legislativo quanto ao prazo prescricional e o termo inicial ser preenchido por lei de igual origem.

6. Nas sanções disciplinares destinadas a notários e registradores, previstas na Lei n. 8.935/1994, se aplica, por analogia, a previsão de prazos prescricionais do art. 142 da Lei n. 8.112/1990, bem como a regra do seu §1º, que adota a teoria ou princípio da actio nata, segundo o qual o termo inicial da prescrição da pretensão punitiva disciplinar estatal é a data do conhecimento do fato pela autoridade competente.

7. Recurso administrativo a que se nega provimento.  

 ACÓRDÃO

O Conselho, por maioria, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. Vencidos os Conselheiros Marcos Vinicius Jardim Rodrigues e Mário Goulart Maia, que davam provimento ao recurso. Manifestaram ressalva de entendimento pessoal os Conselheiros Mauro Pereira Martins, Marcello Terto e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Votou a Presidente. Ausente, justificadamente, o Conselheiro Sidney Madruga. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário, 11 de abril de 2023. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão (Relator), Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0008361-98.2021.2.00.0000
Requerente: CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO - CGJRJ
Requerido: CLAUDIO ANTONIO MATTOS DE SOUZA

 

RELATÓRIO 

O EXM. DR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO, CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA (Relator):

1. Trata-se de recurso administrativo em pedido de providências interposto por CLAUDIO ANTONIO MATTOS DE SOUZA em face de decisão monocrática que afastou a prescrição reconhecida pela Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Rio de Janeiro, consoante a seguinte ementa (Id. 4590376):

EXTRAJUDICIAL. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. IRREGULARIDADES ATRIBUÍDAS AO TITULAR DA SERVENTIA EXTRAJUDICIAL DO 10º OFÍCIO DE NOTAS DA COMARCA DA CAPITAL/RJ. PRESCRIÇÃO RECONHECIDA TENDO COMO TERMO INICIAL A DATA DOS FATOS. REVISÃO DA DECISÃO DA CGJ-RJ. ILEGALIDADE PATENTE. AFERIÇÃO DA LEGALIDADE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS PRATICADOS POR ÓRGÃOS DO PODER JUDICIÁRIO. CF, ARTIGO 103-B PARÁGRAFO 4º, II. RICNJ, ARTIGO 8º, I. POSSIBILIDADE. PRESCRIÇÃO AFASTADA.  

  

Na oportunidade, a eminente ex-Corregedora Nacional de Justiça afastou a prescrição reconhecida pela Corregedoria do TJRJ referente à conduta do ora recorrente por falta disciplinar prevista no art. 30, I, V e VI, c/c 31, I, II. IV e V, da Lei n. 8.935/94, afirmando haver manifesta ilegalidade no ato administrativo do Poder Judiciário local ao aplicar o prazo prescricional previsto em normativo estadual, entendendo ela que “deve o vazio legislativo quanto à prescrição ser preenchido por lei de igual origem, na hipótese, a Lei Federal nº 8.112/90, que trata do regime jurídico único dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais  

No presente recurso administrativo, Claudio Antonio alegou, em síntese, que: a) jamais foi intimado da decisão proferida no âmbito do CNJ, o que importaria em violação ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa; b) houve classificação equivocada do feito perante o CNJ, não sendo hipótese de pedido de providências, mas sim, de revisão disciplinar; c) não seria possível a autuação do pedido de providências, uma vez que “um Corregedor não pode buscar a revisão de suas próprias decisões, razão pela qual o presente procedimento deveria ter sido indeferido de plano”; d) há outros precedentes do Superior Tribunal de Justiça que estão em sintonia com o entendimento adotado na decisão proferida no âmbito da CGJ/RJ; e) há ocorrência de prescrição mesmo que se considere o raciocínio advindo da Lei nº 8.112/90; f) a imputação feita na origem em desfavor do recorrente é genérica, restando ausente embasamento para a instauração de processo administrativo disciplinar, matéria que, no seu entender, o CNJ pode conhecer por intermédio desse recurso.

Por fim, pleiteia a atribuição de efeito suspensivo à presente insurgência impugnativa.

Incluído o processo em Sessão Virtual, houve destaque regimental para julgamento em Sessão Presencial.

É, no essencial, o relatório.

 

F49/J9

           

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0008361-98.2021.2.00.0000
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Requerido: CLAUDIO ANTONIO MATTOS DE SOUZA

 

 

VOTO


O EXMO. DR. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO, CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA (Relator):  

2. Preliminarmente, cumpre observar que não há se falar em violação do contraditório, uma vez que aberta a via do recurso administrativo, por meio da qual o ora recorrente pôde exercitar sua defesa plenamente, não só suscitando todas as teses que entendeu pertinentes, mas também impugnando a decisão monocrática. 

Ademais, é bem de ver que não houve produção de provas novas no âmbito deste Conselho Nacional de Justiça, tendo havido tão somente o controle de legalidade, à luz dos elementos produzidos no âmbito da administração pública local.

De mais a mais, o fato de, após a suscitação de todas as teses do recorrente no presente recurso, não ter ocorrido o exercício do juízo de retratação, patenteia a inexistência de prejuízo decorrente de ter havido a – frise-se – sua regular intimação posterior à prolação da decisão impugnada.

3. Quanto à alegação de vício referente à comunicação, pelo Corregedor-Geral da Justiça ao Conselho Nacional de Justiça, acerca da decisão administrativa, ao contrário do que sustenta o recorrente, é dever daquela autoridade, tendo em vista o que dispõe que o art. 27, § 3º, do Provimento CNJ 100/2020, que estabelece que as decisões de suspensão ou perda de delegação de pessoa com atribuição notarial, ainda que sujeitas a recursos, as nomeações de interinos, interventores e prepostos e a outorga e renúncia de delegação, deverão ser comunicadas, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, à Corregedoria Nacional de Justiça para fins de atualização no sistema Justiça Aberta.

Não fosse isso, é comum o envio, por parte das Corregedorias-Gerais dos Estados e do Distrito Federal, a este Órgão Nacional, de cópias de processos que tramitaram sob sua administração para fins de conhecimento e aferição da legalidade dos atos administrativos praticados na origem.

Recebida no Conselho Nacional de Justiça, aludida documentação é autuada, consoante disposto no art. 26 do Regulamento Geral da Corregedoria Nacional de Justiça, que prevê classificar como “Pedido de Providências”: a) as propostas e sugestões tendentes à melhoria da eficiência e eficácia do Poder Judiciário e dos extrajudiciais; e b) todo e qualquer expediente que não tenha classificação específica nem seja acessório ou incidente.

4. Não há previsão regimental a obstar a prolação da decisão unipessoal ora impugnada, sendo certo que, ainda que assim não fosse, o vício estaria sanado com o julgamento do presente recurso pelo Plenário deste Conselho.

Colaciono precedente do Superior Tribunal de Justiça nesse sentido:

“Inexiste ofensa ao princípio da colegialidade nas hipóteses em que a decisão monocrática foi proferida em obediência ao art. 932 do Código de Processo Civil - CPC e art. 3º do Código de Processo Penal - CPP, por se tratar de recurso que impugnava julgado contrário à jurisprudência desta Corte. Ademais, o julgamento colegiado do agravo regimental supre eventual vício da decisão agravada” (AgInt no AREsp n. 1.478.370/SP, Ministro Joel Ilan Paciornik).

 

5. A decisão monocrática recorrida efetuou o controle de legalidade do ato administrativo, haja vista que o entendimento perfilhado na origem acerca da norma aplicável ao caso e do termo inicial e prazo de prescrição são manifestamente ilegais.

Em relação às atribuições do Conselho Nacional de Justiça, dispõe o art. 103-B, § 4º, I, II e III, da Constituição Federal:

Art. 103-B. O Conselho Nacional de Justiça compõe-se de 15 (quinze) membros com mandato de 2 (dois) anos, admitida 1 (uma) recondução, sendo:

[...]

§ 4º Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura:

I - zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, podendo expedir atos regulamentares, no âmbito de sua competência, ou recomendar providências;

II - zelar pela observância do art. 37 e apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade dos atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário, podendo desconstituí-los, revê-los ou fixar prazo para que se adotem as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, sem prejuízo da competência do Tribunal de Contas da União;  

III - receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, inclusive contra seus serviços auxiliares, serventias e órgãos prestadores de serviços notariais e de registro que atuem por delegação do poder público ou oficializados, sem prejuízo da competência disciplinar e correicional dos tribunais, podendo avocar processos disciplinares em curso, determinar a remoção ou a disponibilidade e aplicar outras sanções administrativas, assegurada ampla defesa; (os grifos não constam do original)

 

Ainda, a Resolução CNJ n. 67/2009, que aprovou o Regimento Interno do Conselho, atribuiu à Corregedoria Nacional competência para receber as reclamações e denúncias de qualquer interessado, relativas aos magistrados e tribunais e aos serviços judiciários auxiliares, serventias e órgãos prestadores de serviços notariais e de registro (art. 8º, I).

Portanto, vê-se com nítida clareza, que é constitucional a competência do Conselho Nacional de Justiça para receber e conhecer, de forma originária, as reclamações contra serventias e órgãos prestadores de serviços notariais e de registro, bem como para avocar processos disciplinares em curso.

Também é constitucional a competência do CNJ para exercício do controle de legalidade sobre atos produzidos pelos tribunais, inclusive sobre aqueles atos produzidos por tribunais em processos administrativos disciplinares instaurados em face de serventias extrajudiciais, de notários e de registradores. Este específico controle, no entanto, por reiterada jurisprudência desta Casa, firmada também em respeito à autonomia dos tribunais, vem sendo autolimitada para abarcar, tão-somente, ilegalidades flagrantes ou teratologias evidentes, em contextos nos quais o CNJ não esteja sendo usado como instância recursal.

Para ilustrar, colaciono alguns julgados do Plenário do CNJ que respaldam essa assertiva:

A revisão de sanção disciplinar aplicada a titular de serventia extrajudicial não se insere no rol de competências constitucionais do CNJ. Inteligência do inciso V, § 4º do artigo 103-B da Constituição Federal de 1988. (Recurso Administrativo em REVDIS n. 0005653-17.2017.2.00.0000, Conselheira Daldice Santana).

 

“RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIEMNTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TJPE. SUSPOSTA IRREGULARIDADE NA INSTRUÇÃO DO PAD N. 565/2018, INSTAURADO EM FACE DE DELEGATÁRIA DE SERVIÇO NOTARIAL. MATÉRIA EMINETEMENTE INDIVIDUAL. AUTONOMIA DO TRIBUNAL. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 

1. Procedimento que questiona suposta irregularidades no trâmite do PAD n. 565/2018, instaurado em desfavor de delegatária de serviço extrajudicial. 

2. Ao CNJ, órgão de cúpula de fiscalização administrativa e financeira do Poder Judiciário nacional, não compete avaliar questões que não transcendem o interesse individual da parte litigante (artigo 25, inciso X do RICNJ). 

3. Conforme precedente, a intervenção do Conselho em processo disciplinar contra delegatário é excepcional e se limita a análise de eventual ilegalidade manifesta.

4. No caso dos autos, não há vício que justifique a atuação do CNJ, uma vez que o PAD foi regularmente instaurado e a demora na instrução se deu por culpa exclusiva da recorrente.” (PCA n. 0002015-05.2019.2.00.0000, Conselheira Maria Cristiana Simões Amorim Ziouva - sem grifos no original) 

 

“PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO. TITULAR DE SERVENTIA EXTRAJUDICIAL. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. INTERVENÇÃO. EXCEPCIONALIDADE PENA. PERDA DA DELEGAÇÃO. REFORMA. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. 

1. Recurso contra decisão que julgou improcedente pedido para reforma de decisão de Tribunal que aplicou a pena de perda da delegação a titular de serventia extrajudicial. 

2. A intervenção deste Conselho em processo disciplinar instaurado contra ex-delegatário de serventia extrajudicial é excepcional e está circunscrita ao controle de legalidade dos atos praticados pelo Tribunal. Precedente PCA 0005970-15.2017.2.00.0000.

3. O Tribunal paulista instaurou dois procedimentos disciplinares contra a requerente. No primeiro foram apuradas condutas praticadas no ano de 2017 e aplicada a pena de suspensão por 90 (noventa) dias. No segundo, foram examinados fatos ocorridos nos anos de 2014, 2015 e 2016, tendo sido aplicada a pena de perda da delegação.

4. O exame dos autos revela que o Tribunal fundamentou a aplicação da pena mais gravosa exclusivamente em razão da reiteração das condutas ao longo dos anos 2014, 2015 e 2016. Portanto, descabe acolher a alegação de que a decisão do TJSP foi indevidamente fundamentada na reincidência e, por isso, deveria ser anulada.

5. Recurso a que se nega provimento. (Recurso Administrativo em PCA n 0010933-32.2018.2.00.0000, Conselheiro Fernando Mattos – sem grifos no original)

 

Para a compreensão do que pode caracterizar ilegalidade flagrante, deve-se ter em mente o que dispõe o art. 37, caput, da Lei Maior, que contém os princípios basilares da Administração Pública, consignando que qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da administração direta e indireta, deverá obedecer aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. 

 Assim, a violação a quaisquer desses princípios importa, em sentido amplo, violação à legalidade, o que permite dizer que a atuação correicional do CNJ, nesses casos, é subsidiária e de controle de legalidade, devendo agir em situações pontuais nas quais se constante que a atuação, no âmbito correicional local, implique malferimento do art. 37 da Constituição Federal, notadamente dos princípios supramencionados, a exemplo de abuso ou desvio na apreciação do processo disciplinar e da inobservância da razoabilidade e da proporcionalidade.

Impedir que o CNJ realize, de forma subsidiária, o controle de legalidade de proceso administrativo disciplinar instaurado contra titular de serventia extrajudicial, a meu ver, seria retirar-lhe sua atribuição constitucional prevista no citado art. 103-B, §4º. 

É certo que, muito embora o CNJ possua competência para apurar denúncias, inclusive para a instauração de sindicâncias, inspeções e correições, deve-se privilegiar a atuação dos órgãos correicionais locais, em razão do princípio da subsidiariedade.

Dessa forma, definindo o que também poderia ser considerada teratologia evidente, esta "deve se fazer presente nas hipóteses em que, por exemplo, verificam-se inércia, simulação ou procrastinação injustificada nas investigações ou procedimentos administrativos, bem como qualquer outro indício de ausência de capacidade ou independência dos órgãos locais para o cumprimento de seus deveres" (MORAES, Alexandre de [et al.]. Constituição federal comentada. Rio de Janeiro: Forense, 2018, p. 962-963).

Resta, portanto, a meu juízo, incontroverso que o CNJ tem competência para, originariamente, conhecer, processar e julgar procedimentos instaurados em face de serventias extrajudiciais, de notários ou registradores. O CNJ também tem competência para avocar processos disciplinares em curso.

Noutro extremo da mesma perspectiva constitucional, apesar de ter competência para apreciar, de ofício ou mediante provocação, a legalidade de atos administrativos praticados por membros ou órgãos do Poder Judiciário, o CNJ, escusando-se de servir como sucedâneo recursal, não deve conhecer de procedimentos tendentes à revisão de processos administrativos disciplinares, instaurados contra notários ou registradores e julgados pelos Tribunais, salvo naquelas situações que eventualmente se associem a ilegalidade flagrante e/ou a teratologia evidente, o que é o caso dos presentes autos.

6. Com efeito, in casu, a decisão limitou-se a afastar as ilegalidades constadas, cassando a decisão administrativa proferida na origem que, indevidamente, reconheceu a prescrição, para que nova apreciação ocorra sobre o mérito da causa.

Nesse passo, o regime de prestação dos serviços extrajudiciais de notas e registros em caráter privado, mediante delegação do Poder Público, tem como norma fundamental o disposto no artigo 236 da Constituição Federal. O seu §1º estabelece que a “Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e de seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário”.

Assim, para esta regulamentação, a Lei Federal n. 8.935/1994 fixou os deveres e as penalidades a que estão sujeitos os notários e registradores (arts. 30, 31 e 32), sem, no entanto, dispor acerca dos prazos prescricionais.

Diante da ausência de previsão de prazos prescricionais para aplicação das sanções disciplinares a notários e registradores na Lei n. 8.935/1994, deve-se aplicar, por analogia, a Lei n. 8.112/1990, que trata do Regime Jurídico Único dos Servidores Públicos Civis da União, das Autarquias e das Fundações Públicas Federais, e assim dispõe:

Art. 142. A ação disciplinar prescreverá:

I - em 5 (cinco) anos, quanto às infrações puníveis com demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo em comissão;

II - em 2 (dois) anos, quanto à suspensão;

III - em 180 (cento e oitenta) dias, quanto à advertência.

§ 1º O prazo de prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhecido. (os grifos não constam do original)

 

Nesse sentido, é a doutrina especializada de Ricardo Dip:

A norma do § 1º do art. 236 da vigente Constituição Federal - "Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, dos oficiais de registro e seus prepostos, e definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário" - não remeteu, explicitamente, à legislação subconstitucional o tratamento da responsabilidade disciplinar dos notários e registradores públicos, mas a Lei nº 8.935, de 1994, versou o tema "das infrações disciplinares e das penalidades" (arts. 31 a 36), sem referência alguma à prescrição.

A necessidade de recorrer à analogia para preencher a lacuna da regência especial da Lei nº 8.935 tem induzido, não raro, à aplicação do disposto no art. 142 da Lei n. 8.112, de 11 de dezembro de 1990, normativa referente ao regime único dos servidores públicos civis. Esse aludido art. 142 prevê o prazo prescritivo de (i) cinco anos, quanto aos ilícitos puníveis com demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade, e destituição de cargo em comissão - espécies similares à da perda de delegação notarial ou registral; (ii) dois anos, no que concerne aos ilícitos suscetíveis de penalidade de suspensão; (iii180 dias, relativamente às infrações atrativas de possível advertências - punição paralela, de algum modo, à de repreensão.

Dispõe ainda o mesmo art. 142 sobre o termo a quo do curso prescricional - o prazo começará a correr da data que o ilícito se tornar conhecido (§ 1º) -, interrupção do fluxo prescricional (com a abertura de sindicância ou instauração do processo disciplinar - § 3º) e seu recomeço (§ 4º), acolhendo, ainda, os prazos prescricionais da lei penal comum nos casos em que as infrações disciplinares sejam capituláveis como crimes (§ 2º).

[...]

Por enquanto, aparenta mais segura a adoção dos parâmetros analógicos da Lei nº 8.112 (DIP, Ricardo. Conceito e natureza da responsabilidade disciplinar dos registradores públicos. São Paulo: Quartier Latin, 2017, p. 114-116)

 

De fato, em sendo as penalidades estabelecidas por Lei Federal, deve o vazio legislativo quanto ao prazo prescricional e o termo inicial ser preenchido por lei de igual origem. Assim, aplica-se à hipótese presente os prazos prescricionais do art. 142 da Lei n. 8.112/1990, bem como a regra do seu §1º, que adota a teoria ou princípio da actio nata, segundo o qual o termo inicial da prescrição da pretensão punitiva disciplinar estatal é a data do conhecimento do fato pela autoridade competente.

A respeito do tema, dispõe o enunciado 635 da Súmula do Superior Tribunal de Justiça:

“Os prazos prescricionais previstos no artigo 142 da Lei 8.112/1990 iniciam-se na data em que a autoridade competente para a abertura do procedimento administrativo toma conhecimento do fato, interrompem-se com o primeiro ato de instauração válido – sindicância de caráter punitivo ou processo disciplinar – e voltam a fluir por inteiro, após decorridos 140 dias desde a interrupção.”

 

No campo do direito público estrito, foi nesse sentido que concluiu o Superior Tribunal de Justiça no julgamento do RMS 46.311/SP, firmando o entendimento de que a contagem do prazo prescricional deve ter início a partir da ciência inequívoca dos fatos, à luz do que disciplina a Lei n. 8.112/90:

ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. DISCIPLINAR. CARTÓRIO. MULTA. ATO DE PREPOSTO. FRAUDE. FALTA DE FISCALIZAÇÃO DO TITULAR. ALEGAÇÃO DE PRESCRIÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. MÉRITO. DEVER DE FISCALIZAÇÃO. ART. 21 E 22 DA LEI 8.935/94. PRECEDENTE. FALHA DE FISCALIZAÇÃO. EVIDENCIADA. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO.

1. Recurso ordinário interposto contra acórdão no qual foi denegada a ordem ao mandado de segurança impetrado para anular penalidade administrativa aplicada em razão de deficiência na fiscalização de cartório por seu titular. O recorrente alega a prescrição da pretensão punitiva e a ausência de responsabilidade do delegatário pelos atos de seu preposto.

2. Não há falar em prescrição da pretensão punitiva na multa aplicada pela Corregedoria, uma vez que o prazo bienal se iniciou com a ciência inequívoca de irregularidades havidas no 1º Tabelionato; a ciência de outras irregularidades cometidas pelo mesmo preposto, quando vinculado ao 2º Tabelionato não são aptas a justificar o início do prazo prescricional em questão.

3. O Superior Tribunal de Justiça tem jurisprudência no sentido de que os arts. 21 e 22 da Lei n. 8.935/94 atribuem a responsabilidade dos titulares de cartórios pelos atos praticados por seus prepostos: RMS 23.587/RJ, Rel. Ministro Francisco Falcão, Rel. p/ Acórdão Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 3.11.2008.

4. No caso concreto, está clara a falta administrativa do cartório em relação à fiscalização dos atos praticados pelos seus prepostos, que se consubstanciaram na falsificação de guias de recolhimento de impostos, com recibos dados com a aposição do timbre da serventia extrajudicial; logo, afigura lícita a atribuição de responsabilidade administrativa, com a aplicação de multa, com base no art. 33, II, da Lei n. 8.935/94. Recurso ordinário improvido.

(Min. Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 24/2/2015, DJe de 3/3/2015).

 

Ainda, é importante ressaltar que esta solução contempla o princípio constitucional da isonomia, uma vez que, em sendo deveres e penalidades estabelecidas por regra federal, não se pode conceber que casos idênticos de malferimento à mesma lei federal tenham tratamento diferenciado por parte da administração pública, notadamente em se tratando de sua função sancionadora.

Por outro lado, ainda que fosse possível admitir a incidência da regra estadual, como no caso em questão, de igual importância é definir o termo inicial da prescrição, fator decisivo para a solução do imbróglio.

 Na origem, a par de ter havido ilegal aplicação, também por analogia, do Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado do Rio de Janeiro (DL n. 220/1975, art. 57, § 2º), promoveu a Administração Pública local equivocada interpretação literal do mencionado dispositivo, de forma totalmente incompatível com o instituto da prescrição em Direito Administrativo.

Isso porque, como é de sabença, no regime jurídico administrativo - também no civil e comercial -, para que se configure a prescrição, em linha de princípio, deve haver a violação de um direito ou dever (actio nata), a ciência da violação a caracterizar inércia, o decurso do prazo previsto em lei e a ausência de causa interruptiva, impeditiva ou suspensiva do prazo.

Sobre a aplicação desse entendimento às regras que regem o Direito Administrativo, colaciono didático e esclarecedor julgado da lavra do eminente Ministro Luiz Fux, enquanto integrante do Superior Tribunal de Justiça:

(...) ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE. SERVIDOR PÚBLICO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. CIÊNCIA PELO TITULAR DA DEMANDA. ACÓRDÃO MANTIDO.

1. O termo a quo do prazo prescricional da ação de improbidade conta-se da ciência inequívoca, pelo titular de referida demanda, da ocorrência do ato ímprobo, sendo desinfluente o fato de o ato de improbidade ser de notório conhecimento de outras pessoas que não aquelas que detém a legitimidade ativa ad causam, uma vez que a prescrição presume inação daquele que tenha interesse de agir e legitimidade para tanto.

[...]

3. A declaração da prescrição pressupõe a existência de uma ação que vise tutelar um direito (actio nata), a inércia de seu titular por um certo período de tempo e a ausência de causas que interrompam ou suspendam o seu curso.

[...]

5. "Se a inércia é a causa eficiente da prescrição, esta não pode ter por objeto imediato o direito, porque o direito, em si, não sofre extinção pela inércia de seu titular. O direito, uma vez adquirido, entra como faculdade de agir (facultas agendi), para o domínio da vontade de seu titular, de modo que o seu não-uso, ou não-exercício, é apenas uma modalidade externa dessa vontade, perfeitamente compatível com sua conservação.(...) Quatro são os elementos integrantes, ou condições elementares, da prescrição: 1º - existência de uma ação exercitável (actio nata) 2º - inércia do titular da ação pelo seu não exercício; 3º - continuidade dessa inércia durante um certo lapso de tempo; 4º - ausência de algum fato ou ato a que a lei atribua eficácia impeditiva, suspensiva ou interruptiva do curso prescricional. (Antônio Luís da Câmara Leal, in "Da Prescrição e da Decadência", Forense, 1978, p. 10-12)

[...]

12. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta parte, desprovido. (REsp n. 999.324/RS, julgado em 26/10/2010, DJe de 18/11/2010 - os grifos não constam do original)

 

A título ilustrativo, além da expressa previsão do art. 142, §1º, da Lei n. 8.112/1990, que embasa a decisão monocrática recorrida, a novel Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei n. 14.133/2021) também dispõe no art. 158, § 4º, que, para a aplicação das sanções previstas nos incisos III e IV do caput do art. 156, "a prescrição ocorrerá em 5 (cinco) anos, contados da ciência da infração pela Administração".

Nessa linha de intelecção, embora o art. 57, § 2º, do Decreto-Lei estadual n. 220/1975, invocando pelo Conselho da Magistratura do Rio de Janeiro, em interpretação literal, estabeleça que, no tocante à falta disciplinar de servidores públicos, o curso da prescrição começa a fluir da data do evento punível, a literalidade, neste caso, é incompatível com a disciplina da prescrição em Direito Administrativo, pois ignora o necessário pressuposto da constatação da inércia para a fluência da prescrição.

É assim que o art. 189 do Código Civil, reconhecido pela doutrina como a disposição que consagra a actio nata no Diploma Civilista, na mesma linha do mencionado dispositivo estadual, também estabelece que, "violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206 do CC".

Malgrado a disposição, em interpretação literal, novamente remeta o termo inicial da prescrição ao momento da violação de um direito ou dever, consoante remansosa jurisprudência do STJ, a interpretação é outra, qual seja: que o termo inicial é aquele em que se pode efetivamente cogitar/caracterizar inércia, senão vejamos:

Esta Corte Superior de Justiça possui o entendimento de que o prazo prescricional está submetido ao princípio da actio nata, segundo o qual a prescrição se inicia quando possível ao titular do direito reclamar contra a situação antijurídica. Precedentes: REsp 825.925/RS, Rel. Ministro Carlos Fernando Mathias, Desembargador convocado do TRF 1ª Região, Segunda Turma, DJe 23/4/2008; REsp 718.269/MA, Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJ 29/3/2005 (AgReg. No Resp n. 1348756 2012.02.16774-4, Min. Benedito Gonçalves).   

 

Com base na teoria da actio nata, o termo inicial da prescrição é contado a partir do momento em que o titular do direito subjetivo violado obtém plena ciência da lesão e de toda sua extensão, que, no caso, ocorreu na data em que os autores, ora agravados, tomaram conhecimento do levantamento do alvará pelo advogado agravante. Precedentes (AgInt no AREsp n. 2.078.177/RS, Min. Antonio Carlos Ferreira).

 

Termo inicial da prescrição: Segundo a teoria da "actio nata", conforme destacado pelo juízo de primeiro grau e reconhecido pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a pretensão de cobrança do credor nasce com a ciência inequívoca da lesão e de sua extensão pelo titular do direito violado (REsp n. 1.919.523/DF, Min. Paulo de Tarso Sanseverino).

 

Como dito, com a devida vênia, a invocação indevida de dispositivo estadual, assim como sua interpretação ao arrepio da jurisprudência sedimentada, ignorando a necessidade, imposta pela própria dogmática jurídica, da imprescindível presença de elemento essencial à fluência da prescrição administrativa (inércia), ensejaria que, na atividade notarial e de registro, no que concerne à prescrição correlata ao regime disciplinar, diferentes parâmetros sejam adotados, nos diferentes Entes da Federação, para o tratamento devido à infrações de idêntica natureza.

Tal contexto, no qual violações ao princípio constitucional da igualdade podem converter-se em praxe administrativa, deve ser imediatamente corrigido, pois ilegal.

Registro, ainda, para afastar a alegação do recorrente nesse sentido, que não há que se cogitar na existência de analogia in malam partem ou mesmo de violação da autonomia dos Estados, mas sim de solução que contempla a dogmática jurídica e atende a um só tempo aos princípios constitucionais da moralidade e da isonomia, a impor a adoção de critério uniforme para aplicação de penas disciplinares estabelecidas em Lei Federal, na atividade notarial e de registro, em todo o território nacional, critério este pautado no princípio da igualdade, previsto no artigo 5º, caput, da Constituição Federal.

 7. Por fim, cumpre ressaltar que, no julgamento do Mandado de Segurança 38.416, impetrado em face de decisão proferida por esta Corregedoria Nacional nos autos do Pedido de Providências n. 0005442-39.2021.2.00.0000, que também afastou a prescrição com base nos mesmos fundamentos aqui apresentados, o Ministro Dias Toffoli considerou que “inexiste qualquer teratologia, ilegalidade ou injuridicidade na decisão apontada como coatora, a qual aplicou, justificadamente, instituto do direito civil (analogia) para melhor dirimir a questão relativa à omissão existente na lei federal”.

Por oportuno, transcrevo excerto da decisão do mandamus:

“(...) tem-se que a Corregedora Nacional de Justiça afastou a prescrição aplicada pelo Conselho da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, tendo em vista que, existindo omissão acerca do tema na Lei Federal nº 8.935/94, a qual fixa os deveres e as penalidades a que estão sujeitos os notários e registradores, deveria ser utilizada, por analogia, a Lei Federal dos Servidores Públicos (Lei nº 8.112/90) e não lei estadual como a aplicada pelo Tribunal de origem.

Portanto, entendo que inexiste qualquer teratologia, ilegalidade ou injuridicidade na decisão apontada como coatora, a qual aplicou, justificadamente, instituto do direito civil (analogia) para melhor dirimir a questão relativa à omissão existente na lei federal.

Registre-se, ainda, que o CNJ nada dispôs acerca do mérito da controvérsia posta nos autos do Recurso Hierárquico que tramita no âmbito do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, apenas afastando a aplicação da prescrição com fundamento em lei estadual, por ilegalidade, e devolvendo os autos para continuidade do julgamento pelo órgão competente”.

 

Destarte, diante de todo o exposto, chega-se à inegável conclusão de há no ato administrativo do Poder Judiciário local manifesta ilegalidade a autorizar a intervenção deste Conselho Nacional de Justiça para exercer o constitucional controle da legalidade (CF, art. 103-B, §4º, II).

Sendo assim, cabe a este Conselho assentar que se aplica, por analogia, a previsão de prazos prescricionais do art. 142 da Lei n. 8.112/1990 para as sanções disciplinares destinadas a notários e registradores previstas na Lei n. 8.935/1994, bem como a regra do seu §1º, que adota a teoria ou princípio da actio nata, segundo o qual o termo inicial da prescrição da pretensão punitiva disciplinar estatal é a data do conhecimento do fato pela autoridade competente. 

 Ainda, quanto às considerações do recorrente de que a prescrição estaria consumada mesmo considerando a data do conhecimento dos fatos pelo poder público e que a imputação formulada no caso presente é genérica, porque falta justa causa para a instauração da persecução disciplinar, importante salientar que tais temas devem ser analisados na instância de origem, por meio próprio e em tempo oportuno, não sendo cabível a aferição de tais elementos originariamente pelo Conselho Nacional de Justiça.

Por fim, quanto ao pedido de atribuição de efeito suspensivo ao presente recurso administrativo, nota-se que pela redação do artigo 115, § 4º, do RICNJ, “o recurso administrativo não suspende os efeitos da decisão agravada, podendo, no entanto, o Relator dispor em contrário em caso relevante”. No caso em apreço, não se verificou o requisito da relevância que recomendasse a atribuição de efeito suspensivo à decisão monocrática anteriormente proferida.

 8. Diante dessas considerações, nego provimento ao recurso administrativo.

É como voto. 

 

 

 

 

Autos:               PP 0008361-98.2021.2.00.0000

Requerente:       Corregedoria Geral da Justiça do Estado do Rio de Janeiro

Requerido:         Claudio Antonio Mattos de Souza

 

 

 

VOTO DIVERGENTE 

 

O SENHOR CONSELHEIRO MARCOS VINÍCIUS JARDIM:

 

Adoto o relatório lançado pelo eminente Corregedor, Luís Felipe Salomão, pedindo licença, porém, para discordar de sua conclusão, apresentando respeitosa divergência, conforme fundamentos a seguir expostos.

A questão versada nos Pedidos de Providência[1] levados a julgamento, ora apreciados conjuntamente, cinge-se à aferição de “ilegalidade patente” e “teratologia evidente” nas decisões do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ), que considerou a data da prática do fato como termo inicial do prazo prescricional para aplicação das sanções disciplinares aos notários e registradores, nos termos da legislação estadual.

Para suprir a lacuna na Lei Federal n. 8.935/1994, que não dispõe sobre prazos prescricionais, o Poder Judiciário do Estado do Rio de Janeiro tem aplicado, nestes e noutros casos, a legislação estadual sobre o assunto. Vale dizer, fez incidir a lei aplicável aos servidores públicos daquele Estado.

É o que determina o Código de Normas da Corregedoria Geral da Justiça – Parte Extrajudicial, em seu art. 82[2]:

Art. 82. A sindicância ou processo administrativo funcional, para verificação do cumprimento dos deveres atinentes ao exercício da função pública delegada e eventual imposição das penalidades previstas na Lei n.º 8.935/94, obedecerão às disposições do Decreto-Lei Estadual n.º 220/75 e seu Regulamento, no que não conflitarem com o disposto no Título II, Capítulos V e VI, ambos da Lei n.º 8.935/94 e, subsidiariamente, às disposições processuais penais e civis e também da Lei nº 9.784/99, assegurados o contraditório e a ampla defesa.

A norma estadual aludida, por seu turno, é expressa quanto a contar-se o prazo prescricional da data do fato punível disciplinarmente, confira-se:

Art. 57 - Prescreverá:

I - em 2 (dois) anos, a falta sujeita às penas de advertência, repreensão, multa ou suspensão;

II - em 5 (cinco) anos, a falta sujeita:

1) à pena de demissão ou destituição de função;

2) à cassação da aposentadoria ou disponibilidade.

§ 1º - A falta também prevista como crime na lei penal prescreverá juntamente com este.

§ 2º - O curso da prescrição começa a fluir da data do evento punível disciplinarmente e interrompe-se pela abertura de inquérito administrativo. (Grifou-se) 

 

O Tribunal Carioca, com base nessa previsão, firmou orientação no sentido da aplicação dessa norma em casos que tais, como revela a ementa do seguinte julgado:

RECURSO ADMINISTRATIVO HIERÁRQUICO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. DELEGATÁRIA DO CARTÓRIO DO OFÍCIO ÚNICO DA COMARCA DE SÃO JOÃO DA BARRA QUE RECORRE DA DECISÃO DE INSTAURAÇÃO DO PAD, PELA INFRAÇÃO, EM TESE, DO DISPOSTO NOS ARTIGOS 30, II E VIII E 31, I, II, III, E V, DA LEI FEDERAL Nº 8.935/1994, MOTIVADA NA COBRANÇA INDEVIDA DE EMOLUMENTOS. FATOS QUE REMONTAM A ABRIL DE 2013 E MARÇO DE 2017.

1- A Portaria Conjunta CGJ nº 565/2021 de instauração do PAD foi publicada em 05/04/2021 e o recurso hierárquico, no qual se pleiteia o arquivamento do processo disciplinar, sob o argumento de bis in idem e, sucessivamente, de prescrição, foi interposto em 13/05/2021. Logo, manifesta sua intempestividade, pois extravasado o prazo de 8 dias previsto no art. 49 do Regimento Interno deste Conselho da Magistratura, não se conhece do recurso.

2- A despeito disso, sobressai a prescrição da pretensão punitiva, a qual ora se declara de ofício.

3- Ora, este Conselho da Magistratura definiu, por maioria, a aplicação do Estatuto dos Servidores Públicos Civis do Estado do Rio de Janeiro (Decreto-Lei nº 220/75) no tocante aos prazos prescricionais para sanção de atos ilícitos perpetrados por notários e registradores (Proc. nº 0000241-66.2020.8.19.0810, rel. Des. MARCUS HENRIQUE PINTO BASÍLIO, DJe 26/04/2021); tese que, inclusive, encontra respaldo em precedentes do STJ.

4- No caso, seja com suporte em precedentes deste Conselho da Magistratura, seja em razão de parecer agregado aos autos, a punição, em tese, aplicável à delegatária corresponderia a pena de multa ou de suspensão, como recomendado no aludido parecer.

5- Nessa perspectiva, estabelece-se a aplicação do prazo prescricional de 2 anos, contado da prática do fato punível, ex vi art. 57, I c/c §2º do Decreto-Lei nº 220/75.

6- Extrai-se dos autos que os fatos imputados à delegatária na portaria de instauração do PAD, publicada em 05/04/2021, foram praticados em abril de 2013, março de 2017 e abril de 2015. Consequentemente, forçoso concluir pela perda da pretensão punitiva.

NÃO SE CONHECE DO RECURSO, DECLARANDO-SE, DE OFÍCIO, A PRESCRIÇÃO. (Grifou-se) (Id 4514074 do PP 0007861-32.2021.2.00.0000)

 

Não há ilegalidade patente ou teratologia evidente a justificar a intervenção excepcional do CNJ na revisão dos procedimentos disciplinares deflagrados pelo Tribunal Carioca contra os delegatários de serviços extrajudiciais. Ao contrário, trata-se de interpretação razoável, a partir de exegese sistemática das fontes normativas do direito administrativo brasileiro.

Importante consignar que, embora o direito civil tenha antecedência histórica na disciplina de temas como prescrição e decadência, a definição de marco a partir do qual inicia o prazo prescricional para o exercício do poder/dever da Administração de apurar infrações disciplinares e punir seus agentes é tema de direito público, do qual cuidam o direito constitucional e administrativo.

Como sintetiza Fernanda Marinela[3], “o Direito Administrativo é composto por um conjunto de normas esparsas, normas não sistematizadas em cum Código geral, regras elaboradas em momentos históricos, contextos e demandas sociais completamente diferentes”, que disciplinam as atividades da administração pública, seus os órgãos e respectivos agentes.

Em função da estrutura federativa brasileira tripartite, da qual decorre a competência de auto-organização de cada um de seus entes, há normas de direito administrativo federais, estaduais e municipais, todas com o mesmo grau de importância. Isso implica que, em regra, os agentes e as atividades da administração pública são regidos pelas leis do ente federado ao qual estão vinculados.

Com efeito, a Constituição da República adotou modelo federativo lastreado na descentralização da repartição de competências, e, norteado por critérios de predominância do interesse, concentrou no âmbito da União a maioria das matérias legislativas mais importantes. Não se afastou, porém, do princípio da autonomia, da participação política e da existência de competências legislativas próprias dos entes subnacionais.

Sobre o tema, pontua Leonardo Quintiliano:[4] 

[A Constituição Federal de 1988] optou pelo federalismo cooperativo, próximo do modelo alemão, em que, ao invés de uma pura transferência de competências da União para os Estados-Membros, preferiu-se ampliar o rol de competências comuns, cabendo à União da competência para editar normas gerais e aos Estados e Municípios a competência para editar normas particularizantes. Com esse sistema, conjuga-se a necessidade de uma legislação que atenda às peculiaridades locais e regionais, com a edição pelos Estados de normas específicas, com a existência de um certo controle e, em muitos casos, de uma mínima homogeneização, a serem estabelecidas pela União, quando da elaboração das normas gerais. (Grifou-se) 

Nessa configuração, torna-se essencial o respeito da competência dos entes federativos para dispor sobre as matérias que lhe são reservadas segundo os critérios constitucionais, com a preservação da sua autonomia e sem intervenção dos demais entes federados.

Pois bem. Guiada pelo critério da predominância do interesse, foi editada pela União a Lei dos Cartórios para regulamentar o disposto no caput do art. 236[5] da Constituição Federal, a qual dispõe sobre os aspectos mais importantes da atividade, sem esgotar a matéria. O parágrafo 2º[6] do dispositivo constitucional citado confere à União a competência (dever) de fixar normas gerais sobre emolumentos relativos aos atos praticados pelos servidos de notas e de registro.

Quanto à responsabilidade administrativa, a Lei Fundamental republicana nada disse; e embora a Lei dos Cartórios tenha dedicado capítulo específico às infrações disciplinares e respectivas penalidades, não avançou no tema, a permitir a suplementação pela legislação estadual – afinal, tais agentes são organicamente vinculados aos Estados e ao Distrito Federal. Tem-se, pois, que a lei dos cartórios tratou daquilo que a União, na sua competência, considerou essencial (normas gerais), cabendo aos Estados a suplementação.

Nessa ordem de ideias, é natural e compatível com o federalismo que o regramento detalhado da matéria seja levado a cabo na esfera estadual, quando assim não o fez – mesmo podendo – o legislador ordinário federal, tampouco o constituinte.

Não há como recusar aos estados-membros a atribuição de editar legislação com o propósito de regular o desempenho de suas competências administrativas, entre as quais se insere a de apurar as faltas disciplinares dos agentes públicos a ele vinculados, bem como o de disciplinar como essa atividade será desempenhada.

Com isso, quer-se dizer que cabe ao ente federado delimitar o prazo durante o qual pode punir seus servidores. Se o estado-membro, como no caso, estabeleceu, por lei, que a prescrição para exercer seu poder disciplinar flui da prática do ato, e não do conhecimento, tal decisão política há de ser preservada em função de sua autonomia, na medida em que não há vinculação necessária e automática com a disciplina normativa federal.

Por consequência, a integração normativa com a utilização da Lei n. 8.112/1990, no caso, além de inadequada, sequer é necessária, haja vista a disciplina da matéria pelo Estado do Rio de Janeiro.

Não se vislumbra, portanto, ilegalidade ou teratologia na decisão do TJRJ que aplicou, por determinação expressa do Código de Normas da Corregedoria Geral da Justiça – Parte Extrajudicial, a Lei Estadual que rege os servidores públicos do Estado.

A alteração dessa sistemática, com a aplicação da Lei Federal n. 8.112/1990 no lugar da legislação estadual, somente é legítima se observados alguns pressupostos, em especial os princípios da legalidade e da segurança jurídica.

Sobre isso, importante consignar que, de acordo com Fernanda Marinela, “a atividade administrativa deve não apenas ser exercida sem contraste com a lei, mas, inclusive, só pode ser exercida nos termos da autorização contida no sistema legal.[7] Com efeito, tratando-se de direito administrativo sancionador, a gerar relevantes restrições a direitos individuais pelo Estado, tem-se que é imprescindível a observância da reserva legal. Vale dizer, a alteração da norma limitadora da atuação estatal há de ser feita pelos meios legais e regulamentares, tal como ocorreu quando se editou a Resolução CNJ 135/2011.

Em relação à Magistratura, não obstante haver normas estaduais sobre a matéria, o caráter nacional e unitário do Poder Judiciário e o papel central do CNJ no controle do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, entre outras questões, orientou a edição, pela União, de norma nacional sobre o tema, qual seja, a Resolução CNJ n. 135/2011, que, em seu art. 24[8], adotou a mesma regra prevista para os demais servidores públicos federais sobre o início do prazo prescricional: o conhecimento do fato.

Nessa linha de entendimento, para a aplicação dessa regra aos processos disciplinares de notários e registradores é imprescindível sua regulamentação prévia por parte deste Conselho.

Importante registrar que a aplicação, ao caso, do Estatuto dos Servidores Públicos Federais não se trata de colmatação de lacuna normativa, mas de mudança das regras aplicáveis por escolha política. Escolha essa – ressalte-se – salutar, ao se considerar a importância prática da uniformização da questão em âmbito nacional, até mesmo por questões isonômicas.

Com essa roupagem, reputa-se imprescindível a observância não só do princípio da legalidade como também o da segurança jurídica, que, aliás, é um dos escopos da prescrição.

Como se verifica na doutrina de Rui Stoco, “prescrever é pacificar”, e o instituto em discussão tem por objetivo preservar e dar concretude à segurança jurídica. Pontua esse autor que:

O instituto da prescrição nasceu com o propósito protetivo de não eternizar o direito de punir do Estado, de sorte que o servidor público não poderá ficar sujeito a eventual aplicação de penalidade por prazo indeterminado, submetido sine dia à espada de Dâmocles. [...]

Do que se infere que a necessidade de alcançar a pacificação social e de assegurar a segurança jurídica nas relações entre os cidadãos são fundamentos de validade dos institutos da prescrição e da decadência e encontram plena ressonância, também e principalmente, no âmbito do Direito Administrativo Disciplinar. (Grifou-se)

 

Não obstante louvável o intento de conferir uniformidade ao tratamento da matéria, a aplicação do critério previsto no art. 142, §2º, da Lei Federal n. 8.112/1990 em relação ao início do prazo prescricional aplicado à espécie configura alteração de interpretação administrativa pela Administração, cuja aplicação retroativa é expressamente vedada pelo direito positivo pátrio, por causar insegurança jurídica (Lei de Processo Administrativo Federal n. 9.784/1999, art. 2º, parágrafo único, inciso XIII[9]).

Também por esse motivo entende-se não ser adequada, nos casos já apreciados pelo TJRJ, a aplicação da Legislação Federal.

Consigne-se, ainda, que a questão não está pacificada nos tribunais pátrios. Com efeito, a 1ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) já reconheceu, mais de uma vez, a validade da aplicação da lei Estadual para integração da lacuna da Lei dos Cartórios sobre a questão, confira-se:

ADMINISTRATIVO. RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. TABELIÃO DE NOTAS. JUNTADA DE VOTO VENCIDO. DESNECESSIDADE, EM FACE DA PECULIARIDADE DO CASO: AUSÊNCIA DE PREJUÍZO E NÃO CABIMENTO DE EMBARGOS INFRINGENTES. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. PRAZO. INEXISTÊNCIA DE LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA. POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DE LEI ESTADUAL. COMERCIALIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DE TABELIONATO. PRÁTICA INCOMPATÍVEL COM A FUNÇÃO DELEGADA. PENALIDADE ADMINISTRATIVA. MULTA. PROPORCIONALIDADE DA PENA. AFASTAMENTO DA MULTA 538 DO CPC/1973.

1. Recurso contra acórdão que denegou a ordem em mandado de segurança, o qual, por sua vez, atacava ato praticado pelo Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça do Paraná, consistente na aplicação de multa em razão da comercialização dos serviços de tabelionato, caracterizada essencialmente pela contratação de representante comercial para angariar clientes, com distribuição de brindes, carimbos e descontos pela contratação dos serviços, além da adoção de sistema de malote, que incluía, além de outras práticas, o cadastramento de firmas fora das dependências do cartório e sem a presença do titular do serviço.

2. (...)

3. Esta Corte já se manifestou que, sendo omissa a Lei Federal 8.935/1994 quanto ao prazo prescricional aplicável às sanções administrativas imputáveis aos notários e oficiais de registro, é possível a aplicação das disposições previstas em legislação estadual, como ocorreu no caso dos autos. Precedentes: RMS 23.587/RJ, Rel. Min. Francisco Falcão, Rel. p/ Acórdão Min. Luiz Fux, Primeira Turma, DJe 03/11/2008; RMS 26.350/PR, Rel. Min. Denise Arruda, Primeira Turma, DJe 23/11/2009; AgRg no RMS 30.498/PR, Rel. Min. Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 05/09/2012.

4.(...)

(RMS n. 36.490/PR, relator Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 28/9/2017, DJe de 16/10/2017.) (Grifou-se)

Contudo, a questão não é unânime no Tribunal responsável por interpretar a legislação federal do País. Nesse ponto, relevante destacar a existência precedentes da 2ª Turma do Tribunal da Cidadania no sentido de que, sendo omissas a lei estadual e a Lei Federal n. 8.935/1994 quanto à data em que se iniciaria o lapso prescricional das sanções administrativas, aplica-se, por analogia, a Lei 8.112/1990, a fim de suprir omissão (RMS 22.935/DF, Rel. Min. Castro Meira, Segunda Turma, DJe de 6/12/2012). Situação que não se verifica, entretanto, no Estado do Rio de Janeiro, cuja legislação não é omissa em relação à temática em discussão.

Dessas premissas, é possível afirmar a validade das decisões do Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) ao aplicar a Estatuto dos Servidores Públicos Civis do Estado do Rio de Janeiro (Decreto-Lei nº 220/75), no tocante aos prazos prescricionais, para integrar a legislação aplicável aos delegatários de serviços de notas e registro.

Ausentes ilegalidade ou teratologia patentes em tais decisões, a mudança do critério proposto pela Eminente relatora há de ser feita por meio de ato normativo a ser aprovado pelo Plenário deste Conselho, vedada sua aplicação retroativa, a respeitar, a um só tempo, a divisão de competências constitucionalmente estabelecida, o princípio da legalidade e da segurança jurídica.

DISPOSITIVO

Diante do exposto, apresento respeitosa divergência e VOTO pelo provimento dos recursos administrativos para, reformando a decisão impugnada, manter as decisões do Conselho da Magistratura do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro ao aplicar a Estatuto dos Servidores Públicos Civis do Estado do Rio de Janeiro (Decreto-Lei nº 220/75) no tocante ao início da contagem dos prazos prescricionais.

É como voto.

 

Conselheiro Marcos Vinícius Jardim

 

 



[1] PP 0005442-39.2021.2.00.0000, PP 0005865-96.2021.2.00.0000, PP 0005916-10.2021.2.00.0000, PP 0007009-08.2021.2.00.0000, PP 0007861-32.2021.2.00.0000, PP 0008105-58.2021.2.00.0000, PP 0008361-98.2021.2.00.0000

[2] A norma foi revogada pelo Provimento n. 38/2021, de 01/06/2021, da Corregedoria Geral da Justiça, mas estava em vigor à época prática dos fatos apurados.

[3] Fernanda Marinela. Direito Administrativo. 10ª edição. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 50.

[4] Leonardo David Quintiliano. Autonomia federativa: delimitação no Direito Constitucional brasileiro. São Paulo: L.D. Quintilian, 2012. Tese (Doutorado) – Faculdade de Direito do largo São Francisco, USP, 2012. p. 175 <https://www.al.sp.gov.br/repositorio/bibliotecaDigital/20443_arquivo.pdf>)

[5] Art. 236. Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público.

[6] § 2º Lei federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro.

[7] Fernanda Marinela. Direito Administrativo. 10ª edição. São Paulo: Saraiva, 2016, p. 70.

[8] Art. 24. O prazo de prescrição de falta funcional praticada pelo magistrado é de cinco anos, contado a partir da data em que o tribunal tomou conhecimento do fato, salvo quando configurar tipo penal, hipótese em que o prazo prescricional será o do Código Penal.

[9] Art. 2º A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência. Parágrafo único. Nos processos administrativos serão observados, entre outros, os critérios de:

XIII - interpretação da norma administrativa da forma que melhor garanta o atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova interpretação.