Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0001358-92.2021.2.00.0000
Requerente: ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SECCÃO DO ESTADO DE SERGIPE
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO SERGIPE - TJSE

 


PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SERGIPE. RESOLUÇÕES N. 11/2020 E N. 5/2021. CADASTRO DE PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PÚBLICO E DE DIREITO PRIVADO. RECEBIMENTO DE CITAÇÕES E INTIMAÇÕES ELETRÔNICAS. REITERADAS INTIMAÇÕES FÍSICAS POR FALTA DE CADASTRO. RECOMENDADA A ANÁLISE, NO CASO CONCRETO, DA POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DE MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. LEGALIDADE. ALINHAMENTO COM O DISPOSTO NOS ARTS. 77, IV, 80, IV, 246, §§ 1º E 2º E 270 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - CPC. ALINHAMENTO COM A RESOLUÇÃO CNJ N. 234. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 

I Recurso Administrativo interposto contra decisão que julgou improcedente o Procedimento de Controle Administrativo e determinou seu arquivamento liminar, a teor do art. 25, X, do Regimento Interno. 

II – A obrigatoriedade de cadastramento de pessoas jurídicas de direito público e de direito privado nos sistemas de processo em autos eletrônicos, para efeito de recebimento de citações e intimações, está prevista, de forma taxativa, no art. 246 do CPC.

III – Ao Conselho Nacional de Justiça - CNJ coube a regulamentação da prática e da comunicação oficial de atos processuais por meio eletrônico e, de forma supletiva, essa competência foi estendida aos Tribunais, na forma do art. 196 do CPC.

IV – A Resolução CNJ n. 234 disciplinou a Plataforma de Comunicações Processuais (Domicílio Eletrônico) e, até sua efetiva implantação, cabe aos Tribunais regulamentarem suas comunicações processuais eletrônicas, inclusive por meio da utilização de sistemas eletrônicos próprios.

V – A Resolução n. 11/2020, com as alterações promovidas pela Resolução n. 5/2021, editadas pelo TJSE, estão perfeitamente alinhadas com a norma de regência.

VI – A recomendação a que o Magistrado(a) condutor do processo avalie, no caso concreto, a possibilidade de aplicação de multa por litigância de má-fé às pessoas jurídicas de direito público e de direito privado que, de forma reiterada, tenham criado óbice à realização do cadastramento no processo eletrônico se alinha com o disposto nos arts. 77, IV, e 80, IV, do CPC.

VII – O ato administrativo questionado não colide com a lei de regência, tampouco com os princípios constitucionais norteadores da Administração Pública, a teor do disposto no art. 37, caput, c/c art. 103-B, § 4º, II, da Constituição Federal de 1988.

VIII – As razões recursais carecem de argumentos capazes de abalar a decisão combatida. 

IX – Recurso conhecido e não provido.

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora. Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Plenário Virtual, 22 de outubro de 2021. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luiz Fux, Maria Thereza de Assis Moura, Luiz Fernando Tomasi Keppen, Tânia Regina Silva Reckziegel, Mário Guerreiro, Flávia Pessoa, Sidney Madruga, Ivana Farina Navarrete Pena, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, André Godinho, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Não votaram o Excelentíssimo Conselheiro André Godinho e, em razão das vacâncias dos cargos, os representantes do Tribunal Superior do Trabalho, do Tribunal Regional Federal e da Justiça Federal.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0001358-92.2021.2.00.0000
Requerente: ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SECCAO DO ESTADO DE SE
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO SERGIPE - TJSE


RELATÓRIO

 

Trata-se de RECURSO ADMINISTRATIVO interposto pelo CONSELHO SECCIONAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL DE SERGIPE – OAB/SE, em face da decisão terminativa que julgou improcedente o pedido deduzido no PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO sob exame, com fundamento no artigo 25, inciso X, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça – RICNJ (ID n. 4463495).

O relatório da decisão monocrática recorrida descreve adequadamente o objeto da controvérsia, como se vê a seguir:

Trata-se de PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO – PCA proposto pelo CONSELHO SECCIONAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL DE SERGIPE OAB/SE, em face do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SERGIPE- TJSE, por meio do qual requer a alteração da Resolução 11/2020, lançada por aquela Corte de Justiça, no ponto em que “equipara a pessoa jurídica de direito público, ou de direito privado, não cadastrada no Portal de Acesso à Justiça ao litigante de má-fé (ID n. 4272421).

Alega que na edição do art. 4° da Resolução referida, o TJSE imputa à pessoa jurídica não cadastrada no Portal de Acesso à Justiça “a marca de litigante de má-fé, sujeito, inclusive, às penas que lhes cabem” (ID n. 4272423).

Afirma, para tanto, que o Código de Processo Civil – CPC e a Lei n. 11.419/06 não determinam sanções para pessoas jurídicas, sejam de direito público ou de direito privado, que não promovem o credenciamento nos sistemas de notificação eletrônica e, por isso, “não se mostra justificável o TJ/SE impor medidas punitivas por meio de ato administrativo regulamentador” (ID n. 4272423).

Requer, de modo sintético, a revogação do § 2º, constante do art. 4º, da Resolução 11/2020, no qual se lê, em destaque:

 

“Art. 2º As empresas públicas e privadas registradas no Estado de Sergipe, o Estado de Sergipe, seus Municípios e as entidades da administração indireta que ainda não possuírem cadastro nos termos dos artigos 246, §§ 1º e 2º, e 270, ambos do Código de Processo Civil, deverão efetuá-lo junto ao Tribunal de Justiça, no prazo de 30 (trinta) dias, para fins de recebimento de citações e intimações de forma eletrônica, sendo facultativo o cadastro para as microempresas e as empresas de pequeno porte.

(...)

Art. 4º O descumprimento do artigo 2º ensejará o recebimento das intimações, inclusive as pessoais, através do Diário da Justiça eletrônico, nos termos do artigo 272 do Código de Processo Civil.

(...)

§2º Quando realizada citação física por falta de cadastro nos termos desta resolução, fica recomendada a aplicação do disposto nos artigos 77, IV, e 80, IV do Código de Processo Civil. (...)”

 

Intimado para prestar esclarecimentos (ID n. 4275677), o TJSE entendeu  que assiste razão à OAB/SE, em vista da inexistência de formação de relação processual que admita a aplicação do disposto nos arts. 77, IV e 80, IV, do CPC, os quais tratam de conduta abusiva de partes que se abstenham, propositalmente, de realizar o cadastramento para o recebimento de citações e intimações eletrônicas.

Ponderou, não obstante, que do “ponto de vista prático, se o dispositivo apenas lança sugestão interpretativa a ser avaliada nos casos concretos pelo Magistrados, tanto mais fica clara sua prescindibilidade normativa” (ID n. 4290068). 

A Corregedoria Geral de Justiça daquele Estado, após detido exame, propôs a seguinte redação ao citado § 2º:

 

“§2º Quando realizada reiteradas intimações físicas por falta de cadastro nos termos desta resolução, fica recomendada a aplicação do disposto nos artigos 77, IV, e 80, IV do Código de Processo Civil, mediante análise do caso concreto pelo julgador.” (ID n. 4290068)

 

Essa unidade correcional pontuou, ainda, que o intuito da norma é assegurar a razoável duração dos procesos e a celeridade na prestação jurisdicional, impedindo a prática de conduta abusiva de quaisquer partes que, propositalmente, se abstenham de realizar o cadastramento para recebimento de citações e intimações eletrônicas.

Em ato subsequente, o TJSE informou que “a redação do § 2º, do artigo 4º, da Resolução nº 11/2020, do TJSE foi alterada, por maioria, na Sessão Administrativa do Pleno deste Tribunal, por Videoconferência, realizada no dia 24.03.2021 (ID n. 4308272).

Na data de 17/04/2021, o TJSE juntou aos autos o Ofício n. 5164/2021 (ID n. 4327525), que trata da alteração da redação dos §§ 1° e 2°, art. 4º, da Resolução n. 11/2020, trazida pela superveniente Resolução n. 05/2021, também anexada (ID n. 4327526).

Assim restou devidamente aprovada a redação do referido artigo:

“[...]

Art. 4º O descumprimento do artigo 2º ensejará o recebimento das intimações, inclusive as pessoais, através do Diário da Justiça eletrônico, nos termos do artigo 272 do Código de Processo Civil.

§1º O magistrado poderá, ao receber a petição inicial ou contestação e constatada a ausência de cadastro nos termos desta Resolução, intimar a pessoa jurídica ou ente federado a providenciá-lo, no prazo de 5 (cinco) dias, sem prejuízo de outras medidas que entender cabíveis ao caso concreto, conforme legislação em vigor.

§2º Quando realizadas reiteradas intimações físicas por falta de cadastro nos termos desta Resolução, fica recomendada a aplicação do disposto nos artigos 77, IV, e 80, IV do Código de Processo Civil, mediante análise do caso concreto pelo julgador.”  

 

Tendo em vista a tramitação de outros procedimentos que, em alguma medida, questionavam os critérios estabelecidos por tribunais para impulsionar o credenciamento de pessoas jurídicas de direito público e de direito privado, para fins de citação e intimações eletrônicas, formulei questionamento à Presidencia do Conselho Nacional de Justiça, no intuito de elidir dúvida a respeito da competência para o exame da matéria (ID n. 4344381).

Sobreveio, em resposta, orientação no sentido da ausência de óbice a que esta Relatorta prossiga na análise do feito (ID n. 4351889).

Concluída a análise deste procedimento foi formulado pedido para sua inclusão em pauta de julgamento virtual (ID n. 4376731). Sobreveio, entretanto, pedido da Requerente para realização de sustentação oral, pleito acolhido nos termos do art. 118-A, V, do RICNJ.

Enquanto aguardava sua inclusão em pauta de julgamento presencial, atribuição a cargo do Presidente do Conselho Nacional de Justiça, conforme dispõe o art. 6º, IV e X, do RICNJ (ID n. 4433531), o Plenário desta Casa negou provimento a Recursos Administrativos interpostos às Decisões Monocráticas Terminativas proferidas no exame dos Procedimentos de Controle Administrativo n. 0005347-43.2020.2.00.0000 e n. 0004981-04.2020.2.00.0000, no curso da 91ª Sessão Virtual, de 27 de agosto de 2021, os quais contemplam impugnações semelhantes a que se examina neste expediente.

 Os argumentos deduzidos na peça inaugural deste procedimento foram reiterados, não sendo apresentado fundamento ou fato novo relativo ao objeto da controvérsia (ID n. 4483763).

Requer-se, em suma, a reconsideração da decisão monocrática ou a submissão do Recurso Administrativo ao Plenário do CNJ a fim de que se revogue “o indigitado parágrafo 2º, do artigo 4º, da Resolução n. 11/2020, do egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe”.

É o relatório.


 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0001358-92.2021.2.00.0000
Requerente: ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SECCÃO DO ESTADO DE SERGIPE
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO SERGIPE - TJSE

 


VOTO

 

I – CONHECIMENTO

 

Não vislumbro razão para reconsiderar a Decisão proferida, mesmo porque o Recorrente não apresentou nenhum fundamento ou fato novo capaz de provocar a modificação do entendimento adotado.

Por outro lado, o Recurso em tela é cabível na espécie e foi manejado tempestivamente, razão pela qual dele conheço, nos termos do artigo 115, §1º, do RICNJ.

 

II – MÉRITO

 

O Recorrente busca reformar a Decisão Monocrática que concluiu pela improcedência do pedido formulado ao CNJ. Por inteira pertinência, transcrevo-a (ID n. 4463495):

Conforme relatado, o Requerente se insurge contra o § 2º do art. 4º da Resolução n. 11/2020 do TJSE e pretende o afastamento da possibilidade de aplicação desse dispositivo às pessoas jurídicas não cadastradas no sistema do Portal de Acesso à Justiça (ID n. 4324213).

Entende que a regra processual prevista nesse dispositivo, a qual prevê a possibilidade de aplicação do disposto nos artigos 77, IV, e 80, IV do Código de Processo Civil, tornaria a parte integrante do processo judicial, antes mesmo de ter havido citação regular, litigante de má-fé.

Pois bem.

O Código de Processo Civil de 2015 delegou ao Conselho Nacional de Justiça – CNJ a competência para regulamentar a prática de atos e a comunicação oficial dos atos processuais por meio eletrônico. Confira-se:

Art. 196. Compete ao Conselho Nacional de Justiça e, supletivamente, aos tribunais, regulamentar a prática e a comunicação oficial de atos processuais por meio eletrônico e velar pela compatibilidade dos sistemas, disciplinando a incorporação progressiva de novos avanços tecnológicos e editando, para esse fim, os atos que forem necessários, respeitadas as normas fundamentais deste Código.” (grifo nosso)

 

No cumprimento do mister, o CNJ implementou o Sistema Processo Judicial eletrônico – PJE, nos termos da Resolução CNJ n. 185, o que concretizou a atribuição estabelecida na primeira parte do dispositivo destacado e, em cumprimento à segunda parte – “comunicação oficial de atos processuais” – editou a Resolução CNJ n. 234, a qual instituiu o Diário de Justiça Eletrônico Nacional (DJEN), a Plataforma de Comunicações Processuais (Domicílio Eletrônico) e a Plataforma de Editais do Poder Judiciário.

Desse segundo normativo extraem-se os dispositivos que auxiliarão a análise da matéria em tela:

“Art. 8º A Plataforma de Comunicações Processuais do Poder Judiciário é o ambiente digital próprio do destinatário da comunicação processual, mantido pelo CNJ na rede mundial de computadores.

§ 1º O cadastro na Plataforma de Comunicações Processuais do Poder Judiciário é obrigatório para a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as entidades da administração indireta, bem como as empresas públicas e privadas, com exceção das microempresas e empresas de pequeno porte, para efeitos de recebimento de citações, constituindo seu domicílio judicial eletrônico, conforme disposto no art. 246, § 1º, da Lei 13.105/2015.

§ 2º O cadastro na Plataforma de Comunicações Processuais do Poder Judiciário, para o recebimento de citações, é facultativo para as pessoas físicas e jurídicas não previstas no parágrafo anterior.

[...]

Art. 15. A partir da disponibilização da Plataforma de Comunicações Processuais prevista nesta Resolução, os interessados terão prazo de 90 (noventa) dias para atualização dos dados cadastrais a serem utilizados pelo sistema, na forma do art. 9º desta Resolução.

Art. 17. O CNJ publicará os requisitos mínimos exigidos para transmissão eletrônica dos atos processuais destinados à Plataforma de Comunicações Processuais do Poder Judiciário.

Parágrafo único. A contar da publicação dos requisitos previstos no caput, os órgãos do Poder Judiciário terão o prazo de 90 (noventa) dias para adequação de seus sistemas de Processo Judicial Eletrônico, de modo a utilizar os serviços instituídos nesta Resolução.” (grifou-se)

 

Em vista da regulamentação expedida e da possibilidade de os Tribunais, de forma supletiva, regulamentarem “a prática e a comunicação oficial de atos processuais por meio eletrônico” (art. 196 do CPC), o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SERGIPE – TJSE editou a Resolução n. 11/2020, posteriormente alterada pela Resolução n. 5/2021, que vigora com a seguinte redação:

“Art. 2º As empresas públicas e privadas registradas no Estado de Sergipe, o Estado de Sergipe, seus Municípios e as entidades da administração indireta que ainda não possuírem cadastro nos termos dos artigos 246, §§ 1º e 2º, e 270, ambos do Código de Processo Civil, deverão efetuá-lo junto ao Tribunal de Justiça, no prazo de 30 (trinta) dias, para fins de recebimento de citações e intimações de forma eletrônica, sendo facultativo o cadastro para as microempresas e as empresas de pequeno porte.

(...)

Art. 4º O descumprimento do artigo 2º ensejará o recebimento das intimações, inclusive as pessoais, através do Diário da Justiça eletrônico, nos termos do artigo 272 do Código de Processo Civil.

§1º O magistrado poderá, ao receber a petição inicial ou contestação e constatada a ausência de cadastro nos termos desta Resolução, intimar a pessoa jurídica ou ente federado a providenciá-lo, no prazo de 5 (cinco) dias, sem prejuízo de outras medidas que entender cabíveis ao caso concreto, conforme legislação em vigor.

§2º Quando realizadas reiteradas intimações físicas por falta de cadastro nos termos desta Resolução, fica recomendada a aplicação do disposto nos artigos 77, IV, e 80, IV do Código de Processo Civil, mediante análise do caso concreto pelo julgador.” (grifo nosso) 

 

Ao exame em curso convém agregar as disposições processuais destacadas no § 2º do art. 4º da Resolução 5/2021, notadamente porque nesse ponto reside o debate e a insurgência do Requerente.

A litigância de má-fé é regida pelo disposto nos seguintes artigos do Código de Processo Civil:

“Art. 79. Responde por perdas e danos aquele que litigar de má-fé como autor, réu ou interveniente.

Art. 80. Considera-se litigante de má-fé aquele que:

I - deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso;

II - alterar a verdade dos fatos;

III - usar do processo para conseguir objetivo ilegal;

IV - opuser resistência injustificada ao andamento do processo;

V - proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo;

VI - provocar incidente manifestamente infundado;

VII - interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório.

Art. 81. De ofício ou a requerimento, o juiz condenará o litigante de má-fé a pagar multa, que deverá ser superior a um por cento e inferior a dez por cento do valor corrigido da causa, a indenizar a parte contrária pelos prejuízos que esta sofreu e a arcar com os honorários advocatícios e com todas as despesas que efetuou. (...)” (grifo nosso)

 

Os dispositivos em destaque têm por finalidade evitar, impreterivelmente, que ocorra abuso do direito de recurso, ou que uma das partes do processo litigue de maneira intencionalmente desleal.

Trago à baila brevíssimas considerações feitas pelo Ministro Marco Buzzi acerca do tema:

A simples interposição de recurso não caracteriza litigância de má-fé, salvo se ficar comprovada a intenção da parte de obstruir o trâmite regular do processo (dolo), a configurar uma conduta desleal por abuso de direito.” (grifo nosso) (Aglnt no AREsp 1.427.716.)

 

Como visto, a litigância de má-fé ocorre quando a parte adota postura que obstrui, intencionalmente, o andamento regular do processo judicial e, em vista das disposições contidas no art. 80, do CPC, uma dessas condutas ocorre quando há “resistência injustificada ao andamento do processo” (art. 80, inc. IV, do CPC.)

Nesse cenário, compreendidas as disposições normativas aplicáveis à prática e à comunicação oficial de atos processuais por meio eletrônico, editadas pelo CNJ e pelo TJSE, bem assim as condutas que caracterizam a litigância de má-fé, passa-se ao exame do objeto da controvérsia.

A Requerente impugna a aplicação do disposto no § 2° do art. 4º da Resolução 5/2021 porque, conforme sustenta, não haveria legalidade em condenar as pessoas jurídicas não cadastradas no sistema do Portal de Acesso à Justiça, ainda em fase na qual não integram o processo judicial, à litigância de má-fé.

No entender da Requerente, a aplicação do dispositivo combatido só seria possível quando já houver citação por meio válido e quando a parte já compuser, de forma oficial, a lide.

Cotejadas as disposições aplicáveis ao caso e os fundamentos da impugnação, tenho não assistir razão ao Requerente. Explico.

Após exame, constato que o TJSE não fixou regras supletivas que contrariam aquelas estabelecidas, previamente, pelo CNJ, no tocante à necessidade de realização do cadastramento eletrônico de pessoas jurídicas de direito público e de direito privado, para fins de recebimento de citações e intimações eletrônicas, no âmbito do Poder Judiciário do Estado de Sergipe.

A norma editada pelo Tribunal estabelece uma gradação de momentos nos quais o Magistrado competente para a direção do processo dará a essas pessoas a oportunidade para a realização do cadastramento, caso esse ainda não tenha sido providenciado.

Apenas de forma derradeira exsurge a possibilidade de, avaliadas as condições do caso concreto, após “reiteradas intimações físicas por falta de cadastro”, avaliar a possibilidade de aplicação das disposições atinentes à litigância de má-fé.

Assim, em que pese o esforço argumentativo do Requerente, não se vislumbra a ocorrência da hipótese aventada na inicial, porquanto o Poder Judiciário – CNJ e TJSE – estabeleceu inúmeras oportunidades para a realização do cadastramento eletrônico de pessoas jurídicas de direito público e de direito privado, para fins de recebimento de citações e intimações eletrônicas, medida necessária à efetividade e celeridade na prestação jurisdicional.

Há de se destacar, ademais, que a norma sob impugnação não possui aplicação imediata, vigendo apenas como uma recomendação, mediante análise do caso concreto pelo julgador, conforme destacou de modo enfático o Tribunal requerido.

Prevalece-se, à toda evidência, que a norma contida na Resolução n. 5/2021 do TJSE prestigia o princípio da celeridade processual.

Agrego à análise os seguintes precedentes:

 

PRECEDENTE 1

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO AMAZONAS E DE RORAIMA. COMUNICAÇÃO ELETRÔNICA DE ATOS PROCESSUAIS. RESOLUÇÃO CNJ 234/2016. AUSÊNCIA DA PLATAFORMA DE COMUNICAÇÕES PROCESSUAIS DO PODER JUDICIÁRIO. COMPETÊNCIA PLENA DOS TRIBUNAIS. IMPROCEDENTE.

1. A questão cinge-se em perquirir se a ausência da Plataforma de Comunicações Processuais do Poder Judiciário, prevista pela Resolução CNJ 234/2016, tem a força de impedir os tribunais de manter normativos e sistemas próprios com o fim de realizar as comunicações oficiais de atos processuais.

2. O Conselho Nacional de Justiça, com o fim de dar cumprimento aos aludidos dispositivos processuais, editou a Resolução CNJ 234/2016 e, por seu art. 8º, previu a Plataforma de Comunicações Processuais do Poder Judiciário, que tem por escopo ser “o ambiente digital próprio do destinatário da comunicação processual, mantido pelo CNJ na rede mundial de computadores”, não estando, entretanto, em operação.

3. Nos termos dos arts. 196 e 246, §§ 1º e 2º, ambos do CPC, da Lei nº 11.419/2016 (Lei do processo eletrônico) e da Resolução CNJ 234/2016, enquanto a Plataforma de Comunicações Processuais do Poder Judiciário não estiver em operação, os tribunais dispõem de competência para regular as comunicações processuais eletrônicas no âmbito do órgão local ou regional, inclusive se utilizando de sistemas eletrônicos próprios.

4. A ausência de sistema nacional do Conselho Nacional de Justiça permite que os tribunais, localmente, desenvolvam os seus sistemas de comunicação oficial de atos processuais, nos termos da legislação processual civil. Se assim não fosse, os tribunais estariam impedidos de dar cumprimento ao disposto na Lei nº 11.419/2016, que versa sobre o a informatização do processo judicial.

5. A exigência de cadastro prévio nos sistemas locais dos tribunais não está condicionada à existência da Plataforma prevista na Resolução CNJ nº 234/16. Isso porque ela decorre do mandamento legal do art. 246, § 1º, do CPC. A intenção legislativa, por força do art. 196 do CPC e da Resolução CNJ nº 234/16, foi a de centralizar as comunicações processuais eletrônicas, com o fim de facilitar a prestação jurisdicional, mas não a de inviabilizar a comunicação na ausência da Plataforma de Comunicações Processuais do Poder Judiciário.

6. Os atos administrativos atacados não esbarram em nenhuma lei em sentido estrito ou em algum dos princípios da administração pública (art. 37, caput, c/c art. 103-B, § 4º, inc. II, da CF/88), razão pela qual o Conselho Nacional de Justiça não dispõe de competência para anular os atos.

7. Pedido julgado improcedente. (grifo nosso)

(CNJ – PP 0006460-03.2018.2.00.0000, Relator: Valtércio Ronaldo de Oliveira, 56ª Sessão Virtual, Data de Julgamento: 14/11/2019)

 

Nesse procedimento, o Relator, Desembargador Valtércio de Oliveira, então Conselheiro, acrescentou em seu voto os seguintes argumentos, os quais a meu ver são relevantes à matéria sob exame:

“18. Ademais, não se pode dizer que a exigência de cadastro prévio nos sistemas locais dos TRIBUNAIS é condicionada à existência da Plataforma prevista na Resolução CNJ nº 234/16. Isso porque ela decorre do mandamento legal do susodito art. 246, § 1º, do CPC. A intenção legislativa, como facilmente se denota do art. 196 do CPC e da Resolução CNJ nº 234/16, foi a de centralizar as comunicações processuais eletrônicas, com o fim de facilitar a prestação jurisdicional, mas não a de inviabilizar a comunicação na ausência da plataforma prevista.

19. Lado outro, ao Conselho Nacional de Justiça é permitido realizar o controle de legalidade dos atos administrativos, só podendo desconstituí-los quando infringirem a lei em sentido estrito ou os princípios da administração pública (art. 37, caput, c/c art. 103-B, § 4º, inc. II, da CF/88).

20. Tendo isso em mente não se pode dizer que os atos administrativos dos TRIBUNAIS MANUARA, ACREANO e RORAIMENSE são ilegais, porquanto não desrespeitam nenhuma norma. Se há um órgão a quem se possa creditar a mora, este órgão é o próprio Conselho Nacional de Justiça, razão pela qual cabe-nos envidar os esforços para realização tão logo possível da Plataforma de Comunicações Processuais.” (grifo nosso)

 

PRECEDENTE 2

RECURSOS EM PROCEDIMENTOS DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAIS DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO, DO MATO GROSSO, DO PARÁ E DE MINAS GERAIS. CADASTRAMENTO DE PESSOAS JURÍDICAS DE DIREITO PÚBLICO E PRIVADO EM SISTEMAS ELETRÔNICOS. REGRA PROCESSUAL ESTABELECIDA NOS ARTS. 246, § 1º, 270, 1.051 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL – CPC. RESOLUÇÕES N. 185 E N. 234 DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA – CNJ. REGULAMENTAÇÃO SUPLETIVA DOS TRIBUNAIS. ATOS NORMATIVOS EDITADOS EM CONSONÂNCIA COM A LEGISLAÇÃO DE REGÊNCIA. FOMENTO À ADESÃO AO SISTEMA ELETRÔNICO. CADASTRAMENTO CONCEBIDO COMO DEVER PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADES. RECURSOS CONHECIDOS E NÃO PROVIDOS.

I – Recursos Administrativos interpostos contra decisão que julgou manifestamente improcedentes os Procedimentos de Controle Administrativo n. 0005347-43.2020.2.00.0000 e n. 0004981-04.2020.2.00.0000 e determinou seus arquivamentos liminares, a teor do art. 25, X, do Regimento Interno.

II – O art. 246, § 1º, e o art. 270 do CPC estabeleceram a obrigatoriedade de as empresas públicas e privadas manterem cadastro nos sistemas de processo em autos eletrônicos, para efeito de recebimento de citações e intimações, as quais devem ser feitas, sempre que possível, por meio eletrônico.

III – O cadastramento eletrônico, a teor da norma processual, deve ser feito no prazo de 30 (trinta) dias, a contar da data de inscrição do ato constitutivo da pessoa jurídica, perante o juízo onde tenha sede ou filial.

IV – Em cumprimento à delegação de competência processual estabelecida no art. 196 do CPC, o CNJ regulamentou a prática e a comunicação oficial de atos processuais por meio eletrônico, nos termos das Resoluções CNJ n. 185 e n. 234.

V – A regulamentação expedida pelo Conselho previu a possibilidade de os Tribunais de Justiça editarem, de forma supletiva, normas atinentes à prática e à comunicação oficial de atos processuais por meio eletrônico, tendo sido assinalado o prazo de 90 (noventa) dias para a adequação do sistema de Processo Judicial Eletrônico.

VI – O CNJ assegurou, na forma de seus regulamentos, a operabilidade dos sistemas de Processo Judicial eletrônico implantado nos Tribunais, até que se ultime a implantação definitiva da Plataforma de Comunicações Processuais do Poder Judiciário.

VII – Os atos normativos e as comunicações administrativas expedidas pelos Tribunais de Justiça, estas últimas endereçadas às pessoas jurídicas de direito público e de direito privado, para fins de realização do cadastramento eletrônico, dão concretude ao dever processual de cadastramento nos sistemas de Processo Judicial eletrônico e estão em consonância com a regra processual vigente.

VIII –Razões recursais carecem de argumentos capazes de abalar os fundamentos da decisão combatida.

IX – Recurso conhecido e não provido. (grifo nosso)

(CNJ – PCA 0004981-04.2020.2.00.0000, Relatora: Flávia Pessoa, 91ª Sessão Virtual, Data de Julgamento: 27/08/2021)

 

A decisão colegiada proferida no julgamento do PCA n. 0004981-04.2020.2.00.0000 coincide com a do PCA n. 0005347-43.2020.2.00.0000 pois, em ambos, a insurgência se dava em relação às determinações expedidas por diversos Tribunais de Justiça para impulsionar o cadastramento eletrônico de pessoas jurídicas nos sistemas eletrônicos dos respectivos órgãos do Poder Judiciário.

Nos dois procedimentos o entendimento predominante foi o de que não há ilegalidade nas regulamentações providenciadas pelos Tribunais arrolados, uma vez que se destinam a “buscar meios para concretizar o comando contido no § 1º do art. 246 do CPC/2015”.

Convém registrar, em acréscimo, tal qual postulado em artigo publicado pelo Correio Forense, intitulado “Citação e intimação por meio eletrônico no Novo CPC”, que se entende o dever de cadastramento em sistema judicial eletrônico como um dever processual, equiparado aos deveres de informar o endereço na petição inicial (art. 319, II, CPC/2015) e, bem assim, a mudança de endereço no curso do processo (art. 77, V e art. 274, p. ú., CPC/2015). Tanto é importante o cadastramento prévio que sua ausência, de acordo com os arts. 1.050 e 1.051 do CPC, impediria o prosseguimento do modelo de citações e intimações eletrônicas com a devida eficácia. Destacam-se os seguintes levantamentos do referido artigo:

Por isso, acredita-se que o descumprimento precitado dever ao fim do prazo fixado no art. 15 da Resolução CNJ 234/2016, eventualmente implica a incidência de sanções processuais pela prática de ato atentatório à dignidade da justiça e litigância de má-fé (arts. 77, § 2º e 81, ambos do CPC/2015). A administração direta (União, Estados, DF, Municípios e quem por eles fala, isto é, a advocacia pública), bem como as empresas públicas/privadas (salvo MEs e EPPs), ao não se cadastrar, passam a criar embaraço à efetivação da decisão judicial que ordena a citação/intimação (art. 77, IV), além de opor resistência injustificada ao andamento do processo por conta da dificuldade no estabelecimento da comunicação processual. Algo que viola, respectivamente, os artigos 77, IV e art. 80, IV, do CPC/2015.” (https://correio-forense.jusbrasil.com.br/noticias/417462814/citacao-e-intimacao-por-meio-eletronico-no-novo-cpc#:~:text=A%20pr%C3%A1tica%20de%20atos%20de,a%20regra%20do%20CPC%2F2015.&text=270%20e%20par%C3%A1grafo%2C%20estabelecem%20que,6%C2%BA%20da%20Lei%2011.419%2F2006.)

 

Por fim, a teor do artigo 25, inciso X, do RICNJ, o (a) Conselheiro (a) Relator (a) tem o dever de arquivar monocraticamente os procedimentos desprovidos de interesse geral, manifestamente improcedentes e/ou que veicularem matéria flagrantemente estranha às finalidades deste Conselho.

Trata-se de importante regra de gestão processual e organização interna, cujo intuito é de não sobrecarregar o Plenário com temas desnecessários, irrelevantes ou repetitivos.

Por todo o exposto, reunidas as condições necessárias para decidir monocraticamente, considerando a ausência de flagrante ilegalidade que desafie a intervenção deste Conselho, julgo manifestamente improcedente o PCA n. 0001358-92.2021.2.00.0000 e determino o seu arquivamento liminar. 

 

III – CONCLUSÃO

 

Considerando que não foram submetidos à análise novos fatos ou razões diversas capazes de infirmar a Decisão Monocrática e que todos os argumentos articulados pelo Requerente no curso deste procedimento foram especificamente analisados, mantenho aquele decisum integralmente.

Pelo exposto, conheço do Recurso e, no mérito, nego-lhe provimento.

É como voto. 

Após as comunicações de praxe, arquivem-se. 

À Secretaria Processual para as providências.  

Brasília-DF, data registrada no sistema.

 

FLÁVIA PESSOA 

Conselheira