Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0003927-66.2021.2.00.0000
Requerente: CARLOS ANDRE BUSANELLO DOS SANTOS
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL - TJRS

 

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL - TJRS. RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. EDITAL 01/2013-CECPODNR. CANDIDATOS APROVADOS. PARTICIPAÇÃO NA AUDIÊNCIA DE ESCOLHA, POR SI OU POR REPRESENTANTE CONSTITUÍDO. RENÚNCIA OU DECLÍNIO AO DIREITO DE ESCOLHA. AUSÊNCIA DE POSSE OU ENTRADA EM EXERCÍCIO NA DELEGAÇÃO ESCOLHIDA. AUDIÊNCIA DE REESCOLHA. CONVOCAÇÃO. NECESSIDADE. PRECEDENTES DO STF E DO CNJ. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.

1. A participação do aprovado em concurso público para delegação de provas e títulos na primeira audiência de escolha, por si ou por preposto regularmente constituído, ainda que não opte por nenhum dos serviços oferecidos, que não assuma a delegação porventura escolhida ou que renuncie posteriormente à delegação de que foi efetivamente investido, é condição suficiente para garantir a participação desses candidatos em audiências de reescolha posteriores, desde que a seleção seja restrita a cartórios não oportunizados anteriormente.

2 A coisa julgada administrativa não se traduz em direito à perpetuação do desacerto. É dever da Administração, fixado por Lei e consolidado por enunciado da Súmula do Supremo Tribunal Federal, anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, ou revogá-los por motivo de conveniência e oportunidade, ressalvada a apreciação judicial.

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, convalidou o não conhecimento do recurso interposto pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, por intempestivo; e conheceu e negou provimento ao recurso interposto pelos terceiros interessados, nos termos do voto do Relator. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário Virtual, 14 de outubro de 2022. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, Sidney Madruga, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello (Relator).

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0003927-66.2021.2.00.0000
Requerente: CARLOS ANDRE BUSANELLO DOS SANTOS
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL - TJRS


RELATÓRIO

  

O notário Carlos André Busanello dos Santos questionou, neste Procedimento de Controle Administrativo, decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul que indeferiu sua convocação para a participação em audiência de reescolha no concurso público de provas e títulos para o ingresso e remoção nos serviços notariais e de registro daquela Unidade Federativa, regido pelo Edital n.º 1, de 2013.

Informou, em síntese, que comunicou ao Tribunal de Justiça que não assumiria a delegação selecionada na audiência de escolha de serventias realizada em 16 de dezembro de 2017, como de fato não assumiu. Por conta de deliberação do Conselho Nacional de Justiça que determinou a reclassificação dos candidatos aprovados, participou e fez uso da palavra na nova audiência parcial de escolha.

Registrou que o Tribunal de Justiça o considerou como desistente e, por isso, não promoveu sua convocação para a participação de audiência de reescolha das serventias ainda vagas no concurso.

Teceu considerações sobre a preservação dos princípios da meritocracia, da segurança jurídica e da proteção da confiança. Citou jurisprudência a embasar sua tese.

Requereu, ao final, a concessão de medida acautelatória para suspensão da audiência pública de reescolha pelo TJRS. No mérito, pugnou por sua convocação para referida sessão, quando realizada.

Em 27 de maio de 2021, indeferi a medida acautelatória vindicada e solicitei informações do tribunal requerido (id 4369473).

Nas informações prestadas pelo Tribunal de Justiça, afirmou-se a autonomia da Corte, com fundamento em precedentes deste Conselho Nacional, para estabelecer o procedimento a ser seguido nas audiências de reescolha, o que inclui o universo de candidatos chamados à nova oportunidade de seleção.

O autor reiterou o pedido liminar em 2 de novembro de 2021, por conta da designação da audiência de reescolha para o dia 3 de dezembro daquele ano.

Em 2 de dezembro de 2021, julguei monocraticamente o feito, com fundamento no art. 25, XII, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, reconhecendo a procedência dos pedidos formulados pelo autor (id 4557229).

Decidi, naquela oportunidade, que a despeito da autonomia garantida aos tribunais para a organização de seus serviços auxiliares e dos respectivos concursos públicos para a outorga de delegações, o certame deveria seguir parâmetros orientativos fixados por este Conselho.

No caso particular, a jurisprudência do Conselho Nacional de Justiça, questionada e mantida no Supremo Tribunal Federal, assinala que a única condição para a convocação de candidatos aprovados para a audiência de reescolha era a participação (ou o envio de representante constituído) na primeira sessão pública de escolha das serventias vagas.

Por essa razão, considerei impróprias as limitações impostas pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul que deixou de convocar para a sessão de reescolha os candidatos que, mesmo tendo participado da audiência originária, renunciaram ou declinaram do direito de escolha, não assumiram a delegação escolhida ou renunciaram à delegação de que foram efetivamente investidos.

Em 9 de dezembro de 2021, o TJRS interpôs recurso contra a decisão monocrática (id 4563161). Na mesma data, em decisão posterior, determinei o arquivamento dos autos, tendo em vista o transcurso do prazo regimental sem insurgência (id 4562696).

Peticionou o TJRS informando da interposição de recurso administrativo contra o deferimento singular do requerido em 13 de dezembro de 2021 (id 4566512).

Em 15 de dezembro de 2021, os terceiros interessados Cássio Antônio Butignol Mariani, Eliana Toshie Morita Okamura, Samuel Menezes Oliveira, Maurício Vannoni Pereira e Solange Guterres Beheregaray requereram sua admissão no feito e interpuseram recurso contra a decisão proferida em 2 de dezembro (id 4568974).

Alegam que a decisão teria violado coisa julgada administrativa constituída nos Procedimentos de Controle Administrativo de autos n. 0001985-04.2018.2.00.0000 e 0001414-33.2018.2.00.0000 e que a previsão editalícia de desclassificação pelo declínio do direito de escolha não foi impugnada a tempo e modo.

Contrarrazões aos recursos interpostos oferecidas espontaneamente pelo autor, ora recorrido, em 16 de dezembro de 2021 (id 4571867).

Em 26 de janeiro de 2022, reconheci a intempestividade dos recursos administrativos formulados tanto pelo Tribunal de Justiça quanto pelos terceiros interessados encimados por Cássio Mariani (id 4566972).

Os terceiros interessados opuseram embargos de declaração contra a decisão de não conhecimento do recurso em 31 de janeiro de 2022 (id 4599804).

Em 31 de março, reconsiderei a decisão proferida em 26 de janeiro para afirmar a tempestividade do recurso interposto pelos terceiros Cássio Antônio Butignol Mariani, Eliana Toshie Morita Okamura, Samuel Menezes Oliveira, Maurício Vannoni Pereira e Solange Guterres Beheregaray e determinar a intimação do TJRS e do recorrido para nova manifestação (id 4656550).

Manifestação do Desembargador Corregedor-Geral da Justiça (id 4670458) juntada em 4 de abril. Reiteração das contrarrazões recursais pelo recorrido aportada nos autos em 7 de abril (id 4674704).

É o relatório.

 

Luiz Fernando BANDEIRA de Mello
Conselheiro Relator

 

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0003927-66.2021.2.00.0000
Requerente: CARLOS ANDRE BUSANELLO DOS SANTOS
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL - TJRS

 


VOTO

   

A despeito dos respeitáveis argumentos lançados pelos recorrentes, a decisão monocrática lançada em 2 de dezembro de 2021 enfrentou adequadamente as questões colocadas na petição inicial, razão porque mantenho-a, na parte recorrida, em sua integralidade.

Transcrevo os fundamentos da decisão:

A jurisprudência deste Conselho tem admitido a possibilidade de realização de audiência de reescolha, reconhecendo-a como medida eficiente e eficaz para a prestação dos serviços extrajudiciais.

Os julgados também afirmam que a ausência de regulamentação específica do tema pela Resolução n.º 81, de 2009, do CNJ, dá aos tribunais considerável margem de discricionariedade para disciplinar seu proceder em tais ocasiões.

Veja-se:

RECURSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. ANÁLISE DE ATO PRATICADO PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA. ORDEM DE ESCOLHA DE SERVENTIA EXTRAJUDICIAL. AUTONOMIA DO TRIBUNAL. IMPOSSIBILIDADE DE SE PROCEDER A UMA SEGUNDA ESCOLHA DE SERVENTIA. CARÁTER DEFINITIVO. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1. Recurso Administrativo em Pedido de Providências contra ato praticado pelo Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJBA), que cancelou escolha serventia, com a sua consequente outorga, em razão de escolha anterior.

2. Observadas as diretrizes gerais da Resolução CNJ 81/2009, a escolha do modus operandi dos concursos para preenchimento de serventias extrajudiciais, que por óbvio abarca a audiência de escolha, é prerrogativa que se insere no poder discricionário do Tribunal.

3. A escolha de serventia extrajudicial, seja ela destinada às Pessoas com Deficiência ou à ampla concorrência, tem caráter definitivo, sendo vedada a possibilidade de qualquer modificação.

4. Inexistência de fato novo ou de elementos capazes de infirmar os fundamentos que lastreiam a decisão impugnada.

5. Recurso Administrativo conhecido e não provido. (CNJ. RA no PP 0000417-84.2017.2.00.0000. Rel. Cons. BRUNO RONCHETTI. 25ª Sessão Virtual. j. 21 set. 2017) (g. n.).

Resta verificar se a perda de delegação por renúncia é causa justa para a eliminação do candidato da convocação para audiência de reescolha.

A prestação do serviço notarial e registral é de destacado interesse público. Seu funcionamento escorreito empresta segurança jurídica a atos e negócios de natureza pública ou privada.

Há regra constitucional expressa, prevista no § 3º do art. 236 da Constituição da República, impondo ao administrador judiciário o dever de zelar pela adequada prestação do serviço cartorial e registral que, embora exercido em caráter privado, é fiscalizado e controlado pelo poder público.

Sabe-se que os precedentes deste Conselho privilegiam a autonomia dos tribunais para, diante de peculiaridades circunstanciais e locais, organizarem o concurso público de delegação de serviços de notas e de registros em busca da maior eficácia possível.

É dizer: sabedores das notórias dificuldades para a realização de processo seletivo para a delegação da atividade, dota-se a gestão judiciária de meios para garantir, na maior medida possível, o oferecimento dos serviços extrajudiciais a todos os cidadãos em conformidade com a determinação constitucional.

Um desses instrumentos é, justamente, a audiência de reescolha. O instrumento não é previsto na legislação de regência tampouco nas normas regulamentares gerais estabelecidas pelo CNJ. Contudo, reconhece-se sua utilidade para atingir o máximo preenchimento dos serviços de notas e registros vagos por delegatários admitidos por concurso público e garantir a prestação dos serviços em conformidade com o que determina a Constituição.

Trata-se de procedimento, como já visto, ínsito ao âmbito de autonomia do Tribunal de Justiça, cujo agir não desprestigia o postulado constitucional do concurso público para a delegação do serviço de notas e de registro — em verdade, complementa-o e aperfeiçoa-o.

A jurisprudência confirma esse entendimento em situação relativa a este mesmo concurso público:

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO RECURSO ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL. CONCURSO PÚBLICO DE PROVAS E TÍTULOS PARA OUTORGA DE DELEGAÇÕES DE SERVIÇO NOTARIAL E REGISTRAL. EDITAL 1/2013. PRECLUSÃO. REESCOLHA DE SERVENTIAS. PROCEDIMENTO NÃO DISCIPLINADO PELA RESOLUÇÃO CNJ 81/2009. AUTONOMIA DO TRIBUNAL. PARÂMETROS ESTABELECIDOS PELO PLENÁRIO DO CNJ. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

1. Embargos de Declaração recebidos como Recurso Administrativo nos autos de Procedimento de Controle Administrativo proposto contra ato do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, que optou por ofertar na sessão de reescolha apenas as serventias com delegação frustrada.

2. Conquanto o Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça estabeleça que dos atos e decisões do Plenário não cabe recurso (arts. 4º, § 1º e 115, § 6º), referida previsão não se confunde com a oposição de embargos de declaração contra decisões monocráticas, que são tradicionalmente recebidos no CNJ como recurso administrativo em observância ao princípio da fungibilidade. Precedentes.

3. Eventuais inconformidades com os termos do edital devem ser alegadas no prazo de 15 (quinze) dias contados da primeira publicação, sob pena de preclusão.

4. Dado que a possibilidade de reescolha de serventias não foi disciplinada pela Resolução CNJ 81/2009, a eleição das unidades cartorárias que serão ofertadas nessa audiência se encontra inserta na autonomia administrativa dos Tribunais, observados os parâmetros fixados pelo Plenário do CNJ.

5. Recurso Administrativo conhecido e provido. (CNJ. RA em PCA 0001414-33.2018.2.00.0000. Rel. p/ acórdão Cons. Márcio Schiefler Fontes. 49ª Sessão Virtual. j. em 28 jun. 2019) (g. n.)

Embora ampla, o precedente citado indica que a liberalidade do administrador para a realização de tal solenidade deve seguir parâmetros orientativos firmados por este Conselho.

E, na situação descrita nos autos, há tal parâmetro orientativo quanto àqueles que devem ser convocados para a participação da audiência de reescolha.

Em 2014, este Conselho proferiu decisão paradigmática a respeito da possibilidade da realização da chamada audiência de reescolha. Já naquele momento, deferiu-se a possibilidade de realização de nova sessão com vistas ao preenchimento das delegações frustradas, ou seja, dos serviços que não foram escolhidos na primeira audiência ou que, escolhidos, não foram aperfeiçoados.

Transcrevo a diretriz:

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO PARA OUTORGA DE SERVIÇOS NOTARIAIS E DE REGISTRO. REALIZAÇÃO DE NOVA AUDIÊNCIA PÚBLICA PARA ESCOLHA DAS SERVENTIAS QUE PERMENECERAM VAGAS. POSSIBILIDADE. RESOLUÇÃO CNJ N. 81. ART. 236, § 3º DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. INTERESSE PÚBLICO E ECONOMICIDADE.

I. O ato administrativo que determina a inclusão em novo certame das serventias oferecidas em concurso público que permaneceram vagas, mesmo havendo candidatos remanescentes na lista de aprovados, não encontra respaldo no art. 236, § 3º da Constituição Federal, na Resolução CNJ n. 81, e tampouco atende aos princípios da prevalência do interesse público e da economicidade.

II. A delegação concedida e não aperfeiçoada perde os seus efeitos, retroagindo a situação jurídica ao ato de escolha que originou a “delegação frustrada”, a exigir nova oferta das serventias vagas aos aprovados, em outra audiência pública, sob pena de favorecer interinos em detrimento daqueles legitimamente habilitados no certame.

III. Necessidade de convocação, para a nova audiência de escolha, dos candidatos aprovados que tenham comparecido ou enviado mandatário na audiência anterior, inclusive aqueles que se encontram em exercício mas que, em razão de sua classificação, não tiveram oportunidade de optar pelas serventias que permanecem vagas.

IV. Pedido julgado procedente para anular o ato administrativo atacado, assim como o artigo 63 da Resolução n. 28 do TJMA, determinando-se a realização de nova audiência pública, no prazo de 60 dias. (CNJ. PCA 0007242-83.2013.2.00.0000. Rel. Cons. RUBENS CANUTO. 196ª Sessão Ordinária. j. em 7 out. 2014) (g. n.)

Este entendimento foi referendado, em decisão monocrática, pelo Supremo Tribunal Federal. Ao analisar mandado de segurança impetrado contra o precedente acima transcrito, registrou o Excelentíssimo Senhor Ministro Gilmar Mendes:

Com fundamento nesses dispositivos, conclui tornar-se imperiosa a convocação dos candidatos aprovados no certame que compareceram à primeira audiência ou enviaram mandatário habilitado e que não tiveram a oportunidade de optar por quaisquer das serventias vagas, observada a ordem de classificação e o tipo de provimento (ingresso ou remoção). Foi expressamente excluída dessa regra apenas os aprovados que tiveram a oportunidade de optar pelas serventias que permaneceram vagas, mas decidiram por outras, confira-se:

(...)

Cumpre registrar, ademais, que a convocação dos candidatos que compareceram ou enviaram mandatários para representá-los na primeira audiência, mas que optaram por renunciar ou declinar ao direito de escolha, bem como aqueles que não tomaram posse ou não entraram em exercício na serventia escolhida, obedecida a ordem de classificação, homenageia a meritocracia, por oferecer aos candidatos melhor classificados a oportunidade de optar pelas delegações frustradas, que não lhes foram oferecidas na primeira oportunidade. Entender de modo diverso para acolher a tese da impetrante importaria na afronta ao tratamento isonômico e à igualdade de oportunidades que deve reger os concursos públicos, destinados a avaliar e a classificar os candidatos quanto à sua melhor qualificação para o desempenho dos encargos a serem cumpridos no exercício do seu mister. (...) (STF. MS 33.533/DF. Rel. Min. GILMAR MENDES. j. em 10 mar. 2017)

Em caso similar àquele sob análise, este Conselho reconheceu o direito à participação em reescolha de candidatos que, tendo manifestado seu interesse na audiência de escolha e sido efetivamente investidos na delegação, a ele renunciaram posteriormente:

RECURSO ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ. AUDIÊNCIA DE REESCOLHA. INSTITUTO QUE SE COMPATIBILIZA COM AS DIRETRIZES GERAIS DA RESOLUÇÃO CNJ Nº 81/2009. CLAUSULA EDITALÍCIA QUE PREVÊ A REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIA DE REESCOLHA. PRINCÍPIOS DA VINCULAÇÃO ÀS NORMAS DO INSTRUMENTO CONVOCATÓRIO, DA CONFIANÇA LEGÍTIMA E O DEVER DE BOA FÉ DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. PRECEDENTES DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA E DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF). RECURSO DESPROVIDO.

1. Recurso administrativo contra decisão que determinou a realização de audiência de reescolha, no prazo de 30 (trinta) dias, conforme previsto nos itens 15.10.1 e 15.10.2 do Edital que rege o concurso para serviços notariais e registrais (Edital 001/2015 e alterações).

2. A inexistência de expressa previsão quanto às audiências de reescolha não impede que os Tribunais, no âmbito da sua autonomia administrativa, optem pela realização do referido ato, haja vista a compatibilidade do instituto com as diretrizes gerais da Resolução CNJ nº 81/2009.Precedentes do CNJ.

3. A irretratabilidade da escolha da serventia prevista na Resolução CNJ nº 81/2009 harmoniza-se com a audiência de reescolha, desde que o direito de opção seja garantido aos candidatos habilitados no certame que tenham comparecido (ou enviado mandatário na audiência anterior) e que, em razão da sua classificação, não tenham tido oportunidade de escolher algumas das serventias que permaneceram vagas. Precedentes do CNJ.

4.O exercício legitimo do poder discricionário de conveniência e oportunidade pelos Tribunais para instrumentalizar os concursos para preenchimento das serventias deve observar os princípios da vinculação às normas do instrumento convocatório, da confiança legítima e do dever de boa-fé da Administração Pública.

5. Recurso a que se nega provimento. (CNJ. PP 0000506-39.2019.2.00.0000. Rel. p/ acórdão Cons. FERNANDO MATTOS. 49ª Sessão Virtual. j. em 28 jun. 2019.) (g. n.)

A dinâmica dos concursos públicos para o oferecimento de delegações de serviços de notas e de registros guarda peculiaridades que a diferem dos demais habitualmente realizados pelo Poder Judiciário.

Nas seleções para a prestação de serviços públicos no Poder Judiciário, regidos por disposições estatutárias específicas, há distinção clara entre o cargo, feixe institucional de competências delegadas a um agente mediante remuneração, e a lotação, o local do exercício do cargo. Os cargos públicos, organizados em carreiras e reunidos em quadros, são distribuídos de acordo com a necessidade do serviço público. Há regras específicas que regulamentam até mesmo a remoção de determinado agente para outra unidade de serviço em virtude de relevante interesse público, sem que isso desnature o conjunto de atribuições fixadas por lei.

O serviço de notas e de registros públicos é, todavia, explorado por particular em regime privado, mediante delegação do poder público. Não há carreira para o exercício da atividade notarial e registral.

O serviço também não comporta remoções em sentido estrito: o instituto da remoção nas delegações de serviços extrajudiciais é, na verdade, um concurso público com limitação quanto à qualidade dos candidatos que podem se inscrever à concorrência. Não é por outra razão que a perfectibilização da remoção dos aprovados em concurso específico não demanda mero procedimento burocrático de alteração de lotação, senão renúncia ao serviço titularizado anteriormente e assunção de nova delegação, sem preservação de vínculos senão aqueles expressa e especificamente definidos por lei.

Não se pode exigir dos candidatos que assumam alguma das delegações oferecidas, ainda que não sejam de seu interesse, como condição para garantir a continuidade da participação no concurso público. A aprovação em concurso público não se desnatura pelo fato de o candidato não ter escolhido, não ter assumido ou ter renunciado à serventia escolhida.

Ante todo o exposto, verifica-se que o Conselho Nacional de Justiça fixou entendimento, já consolidado, a respeito da matéria sob debate.

A participação do aprovado em concurso público para delegação de provas e títulos na primeira audiência de escolha, por si ou por preposto regularmente constituído, ainda que não opte por nenhum dos serviços oferecidos, que não assuma a delegação porventura escolhida ou que renuncie posteriormente à delegação de que foi efetivamente investido, é condição suficiente para garantir a participação desses candidatos em eventuais seleções posteriores, desde que a seleção seja restrita a cartórios não oportunizados anteriormente.

Portanto, é de se reconhecer que o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul promoveu indevida limitação no universo dos candidatos, que merece imediato reparo. 

Posto que respeitáveis, não me sensibilizam os argumentos lançados pelos terceiros interessados no recurso administrativo quanto à suposta ocorrência da coisa julgada administrativa.

Em primeiro lugar, a decisão proferida nos Procedimentos de Controle Administrativo de autos n. 0001414-33.2018.2.00.0000 e 0001985-04.2018.2.00.0000 tratam não do universo de candidatos a que se possibilita a realização da re-escolha, senão do universo de serventias que poderão ser objeto de nova opção.

A norma questionada, na verdade, é aquela contida no item II, “c”, do Edital n. 50, publicado em 17 de setembro de 2020 — mais de um ano depois da prolação de decisão final no PCA de autos n. 1414-33.2018. É esta disposição que amplia as limitações à participação em audiência de re-escolha e que deve ser controlada por este Conselho.

Ainda que houvesse falar em coisa julgada administrativa, o que não há, não se pode pretender que o instituto de estabilização de demandas administrativas revele, por via transversa, direito à perpetuação do desacerto.

É dever da Administração, fixado por Lei e consolidado por enunciado do Supremo Tribunal Federal, anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, ou revoga-los por motivo de conveniência e oportunidade, ressalvada a apreciação judicial.

A segurança jurídica que se pretende aqui deve ser lida em sentido amplo: a preservação de um posicionamento já rechaçado pelo Supremo Tribunal Federal acabará por conduzir a discussão às barras do Poder Judiciário, atravancando ainda mais o andamento do concurso público e a definitiva solução das questões pendentes para garantir tranquilidade aos delegatários e estabilidade à atividade notarial e registral do Estado do Rio Grande do Sul.

Em virtude do exposto:

a) convalido o não conhecimento do recurso interposto pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, por intempestivo, nos termos da decisão saneadora de 31 de março de 2022 (id 4566972); e

b) conheço o recurso administrativo interposto pelos terceiros interessados Cássio Antônio Butignol Mariani, Eliana Toshie Morita Okamura, Samuel Menezes Oliveira, Maurício Vannoni Pereira e Solange Guteres Beheregaray para, no mérito, negar-lhe provimento, mantendo a decisão monocrática nos exatos termos em que proferida.

Intimem-se. Arquivem-se independentemente de nova ordem.


Luiz Fernando BANDEIRA de Mello
Conselheiro Relator