Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0006882-70.2021.2.00.0000
Requerente: JACIEL GONZAGA DE FARIAS
Requerido: CORREGEDORIA DAS COMARCAS DO INTERIOR DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA - CCIBA e outros

 


EMENTA. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. SUPOSTAS IRREGULARIDADES NA CONDUÇÃO DE PAD INSTAURADO EM FACE DE SERVENTUÁRIO E ALEGAÇÃO DE DESPROPORCIONALIDADE DA PENA APLICADA. INCOMPETÊNCIA DO CNJ PARA APRECIAR O PEDIDO.

1.   Relato de irregularidades na condução do processo administrativo disciplinar instaurado contra serventuário que resultou em seu afastamento preventivo e, posteriormente, na perda de sua delegação.

2. Inexistência de flagrante ilegalidade a justificar a intervenção deste Conselho, porquanto solidamente fundamentada a decisão local que decretou a perda de delegação.

3.    A revisão de processos disciplinares instaurados em face de serventuários não está inserida no âmbito da competência disciplinar do CNJ, em razão da inexistência de repercussão geral para o Poder Judiciário.

RECURSO ADMINISTRATIVO CONHECIDO E AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.

 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Plenário Virtual, 27 de maio de 2022. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luiz Fux, Maria Thereza de Assis Moura, Vieira de Mello Filho (Relator), Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, Sidney Madruga, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Não votou, em razão da vacância do cargo, o Conselheiro representante do Ministério Público Estadual.

1. RELATÓRIO

O CONSELHEIRO MINISTRO LUIZ PHILIPPE VIEIRA DE MELLO FILHO (RELATOR):

Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo, com pedido liminar, proposto por JACIEL GONZAGA DE FARIAS, Tabelião de Notas e Protestos do Ofício Único de Notas e Protestos da Comarca de Amélia Rodrigues, Estado da Bahia, em que se insurge contra atos, omissões e decisões proferidas pela CORREGEDORIA DAS COMARCAS DO INTERIOR DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA nos autos do Processo Administrativo Disciplinar nº 72372/2019 e nos procedimentos nº 0001096-89.2020.2.00.0805 (Id. 4472477).

Na inicial, o Requerente relatou diversas irregularidades na condução do processo administrativo disciplinar instaurado contra si que resultaram em seu afastamento preventivo e posteriormente na perda de sua delegação.

Liminarmente, requereu que o Tribunal efetuasse o pagamento da remuneração devida durante o período de seu afastamento, na forma do artigo 36, §2º, da Lei nº 8.935/1994 e que fossem suspensas as decisões exaradas nos autos do Processo Administrativo Disciplinar nº 72372/2019 e no procedimento nº 0001096-89.2020.2.00.0805 com o consequente retorno à mencionada Serventia. No mérito, pugnou pela confirmação da medida liminar.

O presente feito foi inicialmente autuado como Pedido de Providências e distribuído à Corregedoria Nacional de Justiça, que determinou a livre redistribuição do feito (Id. 4491696)

O feito foi distribuído a este Gabinete no período da vacância, sendo então encaminhado ao substituto regimental, Conselheiro Luiz Fernando Tomasi Keppen, nos termos do inciso I do art. 24 do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça (Id. 4494908).

Intimado o Requerido para manifestação, informou que  

Por meio de decisão monocrática (ID 4517900), o Conselheiro substituto regimental não conheceu do pedido, determinando seu arquivamento.

O Requerente formulou embargos de declaração – recebidos como recurso administrativo – sustentando que: a) o Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, através da Corregedoria das Comarcas do Interior, vem aplicando o afastamento preventivo dos tabeliães e notários por prazo superior ao definido nos arts. 35, § 1º c/c art. 36 da Lei n 8.935/94; b) o Tribunal justifica a decisão com fundamento na isonomia ao disposto na LOMAN e à revelia do art. 26 da Resolução CNJ n. 135 c/c do art. 147 da Lei n 8.112/90, assim como do disposto no art. 8, § 2º da Lei Estadual nº 12.352/11 e do PCA n 0002676-57.2014.2.00.0000; c) o Recorrente reside a 80 (oitenta) quilômetros da serventia por que responde; d) a decisão monocrática que não conheceu do pedido - sob o argumento do caráter nitidamente individual, destituído de repercussão geral - há de ser reformada, porquanto o Tribunal vem julgado casos similares no mesmo sentido; e) pede o recebimento e acolhimento dos presentes embargos de declaração, para que sejam corrigidos o erro e a omissão existentes, e que se determine o prosseguimento deste PCA

Recebidos os embargos de declaração como recurso administrativo, determinei a notificação da Requerida para apresentação de contrarrazões (ID 4582699), que as prestou no ID 4607067.

É o relatório.

 

 

2. FUNDAMENTAÇÃO

O EXMO. CONSELHEIRO MINISTRO LUIZ PHILIPPE VIEIRA DE MELLO FILHO (RELATOR):

Trata- de recurso administrativo em face da decisão proferida pelo Relator do feito em substituição, então Conselheiro Luiz Fernando Tomasi Keppen, nos seguintes termos (ID 4517900):

 Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo, com pedido liminar, proposto por JACIEL GONZAGA DE FARIAS, Tabelião de Notas e Protestos do Ofício Único de Notas e Protestos da Comarca de Amélia Rodrigues, Estado da Bahia, em que se insurge contra atos, omissões e decisões proferidas pela CORREGEDORIA DAS COMARCAS DO INTERIOR DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA nos autos do Processo Administrativo Disciplinar nº 72372/2019 e nos procedimentos nº 0001096-89.2020.2.00.0805 (Id. 4472477).

Em suas razões, o Requerente relatou diversas irregularidades na condução do processo administrativo disciplinar instaurado contra ele que resultaram em seu afastamento preventivo e posteriormente na perda de sua delegação.

Liminarmente, requereu que o Tribunal efetuasse o pagamento da remuneração devida durante o período de seu afastamento, na forma do artigo 36, §2º, da Lei nº 8.935/1994 e que suspendesse as decisões exaradas nos autos do Processo Administrativo Disciplinar nº 72372/2019 e no procedimento nº 0001096-89.2020.2.00.0805 com o consequente retorno à mencionada Serventia. No mérito, pugnou pela confirmação da medida liminar.

O presente feito foi inicialmente autuado como Pedido de Providências e distribuído à Corregedoria Nacional de Justiça. Em 27 de setembro de 2021, entretanto, foi determinada a alteração da classe processual e a redistribuição livre do feito (Id. 4491696).

Redistribuídos os autos à Relatoria do Conselheiro ocupante da vaga de membro do Tribunal Superior do Trabalho, a Secretaria Processual certificou a sua remessa para minha análise, em virtude da vacância do referido cargo, nos termos do inciso I do art. 24 do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça (Id. 4494908).

Diante das peculiaridades do caso em análise, determinei a intimação dos Requeridos para manifestação, no prazo de 05 dias, tendo em vista que há pedido liminar (Id. 4495351).

O Requerido informou que “esta Representação se encontra intimamente relacionada ao Processo Administrativo Disciplinar TJPAD 2019/72372 e demais decorrências diretas de novos fatos surgidos durante a instrução do mencionado procedimento” (Id. 4506419), tendo relatado exaustivamente as faltas funcionais praticadas pelo Requerente.

DECIDO.

Extrai-se da leitura dos autos que a pretensão do Requerente perpassa necessariamente pelo exame de supostas irregularidades na condução do Processo Administrativo Disciplinar nº 72372/2019 instaurado contra o então Tabelião de Notas e Protestos do Ofício Único de Notas e Protestos da Comarca de Amélia Rodrigues/BA.

Conquanto inarredável a competência do CNJ para a análise de questões disciplinares, nos termos do parágrafo 4º do artigo 103- 2 Conselho Nacional de Justiça B da Constituição Federal, é certo que, tal se circunscreve a juízes e membros de Tribunais. Portanto, não cabe a este Conselho analisar procedimento disciplinar em face de titular de serventia extrajudicial nos estritos termos constitucionais. Além disso, a pretensão aqui deduzida reveste-se de nítido caráter individual, não restando configurada repercussão geral apta a ensejar o controle por parte deste Conselho, sob pena de desvirtuamento de sua competência estabelecida constitucionalmente conforme entendimento reiterado deste Conselho Nacional de Justiça sobre o tema:

“RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO (TJSP). REVISÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR CONTRA DELEGATÁRIO DE SERVIÇO NOTARIAL E DE REGISTRO. PEDIDO NÃO CONHECIDO. INCOMPETÊNCIA DO CNJ. AUSÊNCIA DE INTERESSE GERAL.

1. Irresignação contra decisão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) que, ao julgar Processo Administrativo Disciplinar (PAD) instaurado em desfavor de delegatário de serviço extrajudicial, determinou a reversão ao Estado da renda líquida da unidade que excedesse 90,25% dos subsídios dos Ministros do STF durante o cumprimento da pena de suspensão. 2. Pretensão que encerra interesse meramente individual.

3. Ausência do interesse geral necessário a legitimar o conhecimento do pedido pelo CNJ.

4. O CNJ tem entendimento firmado de não lhe competir revisar procedimentos disciplinares instaurados em desfavor de delegatários de serviço extrajudicial de notas e de registro.

5. A inexistência de argumentos novos e suficientes a alterar a decisão monocrática impede o provimento do recurso administrativo.

6. Recurso administrativo conhecido e improvido” (CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0007690- 12.2020.2.00.0000 - Rel. RUBENS CANUTO - 80ª Sessão Virtual - julgado em 12/02/2021).

 

“RECURSO ADMINISTRATIVO EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SERGIPE. PROCEDIMENTO DISCIPLINAR EM FACE DE TITULAR DE SERVENTIA EXTRAJUDICIAL. SUPOSTAS ILEGALIDADES NA CONDUÇÃO DO PROCESSO. CARÁTER REVISIONAL. TEMA DE CARÁTER PARTICULAR E DE INTERESSE EXCLUSIVO DO REQUERENTE. INCOMPETÊNCIA DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1. Não compete ao CNJ a análise dos processos administrativos disciplinares instaurados em face de delegatário de serviço notarial, tampouco a revisão da penalidade que lhe seja imposta. 2. A competência para a análise de questões disciplinares está circunscrita à verificação da conduta de juízes e membros de Tribunais, conforme dispõe o artigo 103-B, § 4º, inciso V, da Constituição Federal. 3. Ao CNJ cabe emitir juízo em demandas cujos interesses repercutam no âmbito de todo o Poder Judiciário, e não em controvérsias de viés notadamente individual. 4. Ausência, nas razões recursais, de argumentos capazes de abalar os fundamentos da decisão combatida. 5. Recurso conhecido e, no mérito, não provido” (CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA - Procedimento de Controle Administrativo - 0009619- 4 Conselho Nacional de Justiça 51.2018.2.00.0000 - Rel. LUCIANO FROTA - 48ª Sessão Virtual - julgado em 14/06/2019).

Cabe, portanto, ao Requerente utilizar-se, da via judicial própria, dos competentes mecanismos processuais para a defesa dos seus interesses pessoais.

Não é a outra a razão a existência do Enunciado Administrativo CNJ nº 17/2018: “Não cabe ao CNJ o exame de pretensões de natureza individual, desprovidas de interesse geral, compreendido este sempre que a questão ultrapassar os interesses subjetivos da parte em face da relevância institucional, dos impactos para o sistema de justiça e da repercussão social da matéria”.

Tratando-se, portanto, de matéria estranha às finalidades institucionais do CNJ, impõe-se o arquivamento deste pedido de providências, nos termos do inciso X do art. 25 do Regimento Interno:

“Art. 25. São atribuições do Relator:

X - determinar o arquivamento liminar do processo quando a matéria for flagrantemente estranha às finalidades do CNJ, bem como a pretensão for manifestamente improcedente, despida de elementos mínimos para sua compreensão ou quando ausente interesse geral”;

Pelo exposto, não conheço do Procedimento de Controle Administrativo, e determino o arquivamento dos autos, nos termos dos artigos 25, X, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, diante da absoluta incompetência deste Conselho para deliberar sobre a matéria.

Prejudicado o exame do pedido liminar.

À Secretaria Processual para as providências cabíveis.   

Verifica-se que o argumento do Recorrente para vencer a fundamentação central da decisão monocrática – a inexistência de repercussão geral para o Poder Judiciário – não se sustenta, já que não foram trazidos elementos que comprovem que o “Tribunal vem aplicando o afastamento preventivo dos tabeliães e notários por prazo superior ao definido nos arts. 35, § 1º c/c art. 36 da Lei n 8.935/94”.

Ainda que houvesse trazido aos autos casos semelhantes, o argumento não prospera, já que a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça dá sustentação ao afastamento por prazo superior ao previsto na lei, desde que a decisão seja fundamentada, conforme consignado nos precedentes citado na decisão da origem (ID 4506420).

Ademais, a leitura atenta da decisão proferida pela Corregedoria local que decretou a perda de delegação está suficientemente fundamentada, havendo enfrentando todas as questões postas à discussão (ID 4506420, fls. 17). 

Pelas razões acima expostas, entendo que a questão trazida pelo Recorrente, ainda que possua relevância pessoal, está adstrita à esfera exclusivamente individual do serventuário, afastando assim, na linha da iterativa e já referida jurisprudência, a atuação deste Conselho.

Ante o exposto, conheço do recurso administrativo interposto e, no mérito, nego-lhe provimento. 

 

Ministro LUIZ PHILIPPE VIEIRA DE MELLO FILHO

Conselheiro Relator

Gmlpvmf/1