Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0007674-87.2022.2.00.0000
Requerente: YURI REIS BARBOSA
Requerido: CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA - CGJBA e outros

 

 

RECURSO ADMINISTRATIVO EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA. QUEBRA DE CONFIANÇA. REVOGAÇÃO DE INTERINIDADE DE CARTÓRIO EXTRAJUDICIAL. CARÁTER PRECÁRIO DA DESIGNAÇÃO. PRETENSÃO DE ANÁLISE DE SINDICÂNCIA INSTAURADA EM DESFAVOR DE DELEGATÁRIO. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. NATUREZA INDIVIDUAL DA DEMANDA. INDEVIDA UTILIZAÇÃO DO PROVIMENTO CNJ N. 77 PARA ASSEGURAR O ACÚMULO DE INTERINIDADES. DESPROVIMENTO DO RECURSO ADMINISTRATIVO INTERPOSTO. 

I – O vínculo estabelecido entre o Estado e o delegatário interino possui natureza precária, passível de ser revogada a qualquer tempo pela Administração, em caso de quebra de confiança ocasionada pela constatação de irregularidades.

II – À luz de jurisprudência pacífica e consolidada, a competência do CNJ para a análise de questões disciplinares está circunscrita à verificação da conduta de juízes e membros de Tribunais, conforme dispõe o artigo 103-B, § 4º, inciso V, da Constituição Federal, se restringindo a hipóteses excepcionais de ilegalidade flagrante em feitos disciplinares instaurados em face de delegatários.

III – Não compete a este Conselho se substituir ao Órgão censor e analisar o mérito das imputações, sobretudo porque não demonstrada flagrante ilegalidade na condução da apuração.

IV – O Provimento CNJ n. 77 visa proporcionar a melhor prestação do serviço extrajudicial, garantindo a observância dos princípios da supremacia do interesse público, da eficiência, da continuidade do serviço público e da segurança jurídica.

V – O mencionado Provimento não pode ser utilizado como instrumento de salvaguarda de delegatários que passam a disputar entre si as interinidades, apresentando ao CNJ demandas com nítida pretensão individual, calcadas na necessidade de garantir incremento de remuneração e de não tolerar eventuais prejuízos ao serem destituídos.

VI – Além de não atacar, motivadamente, os fundamentos da decisão recorrida, ofendendo os princípios da dialeticidade e da congruência, as razões recursais carecem de argumentos capazes de abalar os fundamentos da decisão combatida.

VII – Recurso conhecido e não provido.

 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário Virtual, 24 de março de 2023. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, Sidney Madruga, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0007674-87.2022.2.00.0000
Requerente: YURI REIS BARBOSA
Requerido: CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA - CGJBA e outros

 

RELATÓRIO

 

Trata-se de RECURSO ADMINISTRATIVO interposto por YURI REIS BARBOSA, em face da decisão que não conheceu do PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO sob exame e determinou seu arquivamento liminar, com fundamento no artigo 25, inciso X, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça (RICNJ) (ID n. 4991828).

O relatório da Decisão monocrática recorrida descreve adequadamente o objeto da controvérsia, como se vê a seguir (ID n. 4981040):

 

Trata-se de PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO (PCA), com pedido liminar, apresentado por YURI REIS BARBOSA, em face da CORREGEDORIA-GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA (CGJ/BA), por meio do qual se insurge contra atos praticados pelo “Corregedor das Comarcas do Interior dos Serviços Extrajudiciais da Bahia, Desembargador Jatahy Junior, praticado nos autos do processo 0000453-16.2022.2.00.0853” (ID n. 4958940).

O Requerente alega, em síntese:

i) “é Oficial Titular (concursado) do Cartório de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas de Utinga-Ba”;

ii) “foi nomeado pelo Tribunal de Justiça da Bahia para exercer como interino os cargos de Oficial do Registro Civil de Utinga-Ba, de Wagner e de Bonito, estes dois últimos com função notarial”;

iii) “no final do ano passado (2021), por meio de decisão do próprio Tribunal, sob a alegação de estar cumprindo o Provimento n. 77, de 2018, deste r. CNJ, o requerente foi destituído das interinidades retro apontadas, tendo entregue os cartórios aos novos interinos agora em janeiro deste ano”;

iv) após se habilitar a responder interinamente pelos Cartórios de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas de Iraquara, Souto Soares e Palmeiras, todas na Bahia, “foi designado interino para responder pelas duas primeiras pela Corregedoria das Comarcas do Interior do Tribunal de Justiça baiano”;

v) “foi obrigado a interpor 3 (três) PCAs” para garantir a interinidade dos Cartórios de Iraquara/BA e Souto Soares/BA, oportunidade em que requereu a apuração da legalidade da concessão de interinidade em 10 (dez) cartórios ao Oficial de Registro Civil de Caeté-Açu, Francisco Motta Macedo Neto;

vi) em 22/6/2022, entrou em exercício no Cartório de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas de Iraquara/BA, e, em 27/9/2022, no Cartório de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas de Souto Soares/BA;

vii) no dia 27/10/2022, “foi surpreendido com uma extraordinária correição na Serventia de Utinga”, a qual “de fato foi realizada pela servidora do Tribunal de Justiça Cleidinea Alves Marques Louzada, sem a presença da Juíza de Direito Corregedora Permanente de Utinga, Dra. Flávia Araújo da Silva e também do assessor especial Dr. Antonio, o qual compareceu ao final” (grifos no original);

viii) não lhe foi oportunizado o direito de se manifestar e corrigir eventuais erros encontrados na Correição, sendo determinado de imediato seu afastamento dos Cartórios de Iraquara/BA e Souto Soares/BA, os quais “nenhuma ligação tem com o Cartório de Utinga” (grifos no original);

ix) muito embora tenha peticionado duas vezes, demonstrando “que não cometeu qualquer falta grave e que as pequenas incongruências foram e seriam resolvidas no prazo concedido” e pugnando pela revogação de decisão, não houve apreciação dos pedidos e foi instaurada a Sindicância n. 001825-06.2022.2.00.0851;

x) foram feitas anotações em sua ficha disciplinar;

xi) “houve manifesta supressão de instância, na medida que o ato deveria ter sido realizado pelo Juiz de Direito Corregedor Permanente, que como se sabe é o Juiz de Direito da Comarca, no caso, de Utinga e não da Corregedoria, que somente deve atuar excepcionalmente” (grifos no original);

xii) “o autor está sofrendo uma implacável e terrível perseguição da Corregedoria das Comarcas do Interior”, porque trouxe ao conhecimento do CNJ diversas irregularidades, notadamente a designação de Francisco Motta Macedo Neto para responder interinamente por 10 (dez) serventias, em contrariedade ao art. 4º do Provimento TJBA n. 8, de 2017, que veda a concessão de mais de 3 (três) interinidades para cada interessado;

xiii) mesmo acumulando mais serventias do que o permitido, não detendo as especialidades necessárias e residindo fora da Comarca da qual é titular, o delegatário Francisco Motta Macedo Neto não sofreu qualquer punição;

xiv) a Sindicância será presidida pelo Juiz Auxiliar que subscreveu a Ata da Inspeção, o Assessor Especial Antonio Maron Agle Filho, o que significa que “a condenação do autor é certa”;

xv) “o autor não praticou qualquer falta grave e as pequenas irregularidades foram e estão sendo corrigidas no prazo concedido e nenhum prejuízo se causou a ninguém” (grifos no original);

xvi) “a servidora que fez a inspeção Cleidinea Marques Louzada, ao contrário do autor, que detém DUAS Pós-Graduação na área (sic), não tem conhecimentos suficientes e específicos na área de registros públicos, notadamente de registro de imóveis, títulos e documentos e civil das pessoas jurídicas” (destaques no original);

xvii) “assim como a nomeação do autor foi realizada com observância do Provimento 77, de 2018, deste r. CNJ, a destituição também deve seguir o mesmo e bem assim o § 1º, do art 3º, da Resolução n. 80-2009 [...], não sendo mais admitida a revogação do ato sem motivos jurídicos concretos e comprovados”; e

xviii) “o autor fez investimentos consideráveis para a instalação e funcionamento dos Cartórios”.

 

Diante disso e, após discorrer sobre o conteúdo de algumas das condutas apuradas, o Requerente pugnou pela concessão de medida liminar para suspender a Decisão objurgada e, no mérito, pela procedência do PCA, “para garantir a sua manutenção nas interinidades de Iraquara e Souto Soares até que sejam empossados os novos titulares, via de concurso público, e bem assim seja declarada nula a insubsistente ata em questão e o inusitado processo de sindicância instaurado em consequência dela, ordenando seu arquivamento (grifos no original).

Considerando o teor da Certidão expedida pela Secretaria Processual (ID n. 4959044), os autos foram encaminhados ao gabinete do Conselheiro Mário Goulart Maia, para análise de possível prevenção, à luz do art. 44, § 5º, do Regimento Interno do CNJ (ID n. 4959332).

Em 5/12/2022, denegada a prevenção (ID n. 4963301), o procedimento foi feito concluso.

A seguir, determinei a inclusão do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJBA) no polo passivo deste procedimento, intimando-o para apresentar as informações que entendesse necessárias à cognição preliminar do pleito (ID n. 4963850).

Na oportunidade, determinei a intimação do Requerente para que acostasse aos autos documentos necessários ao peticionamento, os quais foram encartados aos IDs n. 4964192/1964193.

Nos dias 2, 5, 6 e 8/12/2022, o Requerente peticionou nos autos, ora reiterando o pedido liminar, ora acrescendo novas informações, com inovação do pedido (IDs n. 4960317, 4963910, 4964267, 4968084).

O TJBA se manifestou por meio dos documentos encartados aos IDs n. 4971498/4971506, oportunidade em que explicitou:

[...] o fato que balizou a revogação das interinidades decorreu dos inúmeros procedimentos de usucapião em que o Bel. Yuri figura como interessado, sem a devida observância nos respectivos processos dos requisitos previstos na Lei 13.105/15, a exemplo da ausência de declaração pelos confrontantes dos imóveis usucapidos, de manifestação pelo município onde localizados os imóveis, bem como o decurso do tempo na posse das áreas, vez que dito delegatário somente fixou residência no município de Utinga no ano de 2017, quando da assunção na delegação extrajudicial, sendo que as usucapiões analisadas foram registradas no ano de 2020, em evidente desacordo com os preceitos do citado diploma legal.

Aliado a isto, de igual modo, realizou-se correição extraordinária no Distrito de Wagner, pertencente à comarca de Utinga, no qual o requerente exerceu a interinidade até janeiro do corrente ano, tendo sido verificadas, na oportunidade do evento correicional, inúmeras incongruências praticadas durante a gestão do Bel. Yuri Reis Barbosa também nesta unidade, consoante pode ser constatado do Processo nº 0000455-83.2022.2.00.0853.

Como é cediço, outrossim, a interinidade prevista no art. 39, da Lei n. 8.935/1994 e no art. 3º, da Resolução CNJ nº 80/2009, revela natureza precária dessa designação, circunstância que torna passível sua revogação, a qualquer tempo, pelo Poder Público.

Assim, já que houve quebra de confiança entre esta Corregedoria e o então designado, decorrente das constatações alhures especificadas, foi decidido pela revogação da designação do Bel. Yuri Reis Barbosa para responder provisoriamente pelas serventias extrajudiciais de Registro de Imóveis de Iraquara e de Souto Soares.

[...]. (grifo nosso)

 

Por fim, o Requerente se manifestou em relação às informações prestadas pelo TJBA (ID n. 4973398).

É o relatório.

Em sua peça recursal, o Recorrente reiterou os argumentos apresentados na petição inicial, bem como os pedidos inicialmente formulados.

Instado a apresentar contrarrazões ao Recurso Administrativo interposto, o Tribunal requerido alegou, em síntese, “que o intento do Recorrente é rediscutir matéria já analisada e decidida internamente pelo Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, recorrendo, ilegitimamente, ao Conselho Nacional de Justiça, para que adentre em questão despida de repercussão geral ao Poder Judiciário, fato que, conforme exaustivamente pontuado, não se insere dentre as suas relevantes competências constitucionais, insculpidas no §42 do art. 103-B da Carta Maior” (ID n. 5040472).

Na oportunidade, informou que os delegatários Manuela Mutti Carvalho Almeida de Santana e Francisco Motta Macedo Neto foram cientificados da Decisão encartada ao ID n. 4981040 e apenas a primeira confirmou recebimento (ID n. 5040473).

É o relatório.

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0007674-87.2022.2.00.0000
Requerente: YURI REIS BARBOSA
Requerido: CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA - CGJBA e outros

 

VOTO

 

O CONSELHEIRO GIOVANNI OLSSON (Relator):

 

I – DO CONHECIMENTO

Não vislumbro razão para reconsiderar a decisão proferida, mesmo porque o Recorrente não apresentou nenhum fundamento ou fato novo capaz de provocar o juízo de retratação do entendimento adotado.

 Por outro lado, o Recurso em tela é cabível na espécie na medida em que foi protocolado no quinquídio regimental, motivo pelo qual dele conheço, nos termos do artigo 115, §1º, do RICNJ[1].

 

 

II – DO MÉRITO

Conforme relatado, o Recorrente busca reformar a Decisão monocrática que concluiu pela impossibilidade de conhecimento da matéria pelo CNJ. Por inteira pertinência, transcrevo-a (ID n. 4981040):

 

 

Verifica-se, preliminarmente, que o feito está instruído a tal ponto que a cognição exauriente é perfeitamente possível na espécie, sobretudo diante de entendimento já pacificado pelo Plenário do CNJ quanto à matéria vertida nos presentes autos, pelo que deixo de analisar o pedido de liminar.

Conforme relatado, Yuri Reis Barbosa acorre ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) com vistas a suspender a Decisão que o destituiu da interinidade dos Cartórios de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas das Comarcas de Iraquara/BA e de Souto Soares/BA.

O Requerente é delegatário titular do Registro de Imóveis e Hipotecas, Títulos e Documentos e Civil das Pessoas Jurídicas da Sede da Comarca de Utinga/BA, serventia na qual “foram identificadas inúmeras irregularidades em atos cartorários, notadamente quanto à inobservância dos preceitos legais que embasam e dão segurança jurídica aos atos registrais, além de constatações outras por parte dos servidores deste Órgão censor” (ID n. 4958958).

Diante disso, nos autos do Processo n. 0000453-16.2022.2.00.0853, o Corregedor das Comarcas do Interior, Desembargador Jatahy Júnior, determinou a abertura de sindicância para apuração das irregularidades constatadas na Correição Extraordinária, “por suposta infringência aos comandos estabelecidos nas Leis 8.935/94,6.015/73, 13.105/15 e 7.433/85, bem assim do Código de Normas e Procedimentos deste Estado da Bahia” e, por consequência, o afastamento do mencionado delegatário das interinidades que lhe foram designadas por entender que os fatos narrados ensejam quebra da confiança depositada.

Pois bem.

Não se vislumbra possibilidade de intervenção do CNJ no caso submetido à análise.

 

I – DA QUEBRA DE CONFIANÇA E DA POSSIBILIDADE DE REVOGAÇÃO DAS INTERINIDADES

Note-se, a princípio, que o vínculo estabelecido entre o Estado e o delegatário interino possui natureza precária, passível de ser revogada a qualquer tempo pela Administração, em caso de quebra de confiança ocasionada pela constatação de irregularidades.

Destaque-se que a confiança é atributo relacionado à pessoa do delegatário e, por óbvio, eventual atuação irregular na condução de uma das serventias por ele conduzidas gera fundadas dúvidas na das demais e autoriza a cassação da interinidade.

Com efeito, os fatos noticiados são graves e suficientes para qualificar a quebra de confiança do Tribunal para com o Requerente. Vale destacar excerto da Decisão impugnada:

[...] Na oportunidade, foram identificadas inúmeras irregularidades em atos cartorários, notadamente quanto à inobservância dos preceitos legais que embasam e dão segurança jurídica aos atos registrais, além de constatações outras por parte dos servidores deste Órgão censor, dentre as quais destaco:

1. Não implantou sistema de automação para a prática dos atos registrais;

2. O acervo da unidade ainda não está digitalizado, em afronta às Recomendações 009 e 011, do Conselho Nacional de Justiça;

3. Deixou de comunicar ao Juiz Corregedor Permanente da Comarca acerca da designação da substituta legal;

4. Descumprimento do prazo legal para envio das Declarações sobre Operações Imobiliárias à Receita Federal;

5. Ausência da descrição dos emolumentos e taxas recolhidos no final de cada ato registral, consoante previsto no artigo 820, do Código de Normas e Procedimentos;

6. Não inclusão dos confrontantes constantes nos memoriais descritivos apresentados, a exemplo do quanto observado na Matrícula 2005, protocolizada sob nº 4.226;

7. Especialidade objetiva e subjetiva precárias;

8. Desatenção quanto à descrição na identificação das partes interessadas, consoante verificado na Matrícula 1923, em que figura como vendedor o prefeito da cidade, quando, na verdade, o alienante é o próprio município (Ente Público);

9. Inserção nos livros de protocolos de RI, RTD e RPJ de títulos estranhos à atribuição pertinente;

10. Ausência de apuração do remanescente nas áreas desmembradas, consoante verificado na Matrícula 2005;

11. Verificou-se, ainda, existência de inúmeros registros de usucapião em nome do Oficial Bel. Yuri Reis Barbosa, sem observância dos requisitos previstos na Lei 13.105/15;

12. Constatado, de igual forma, que o oficial fixou domicílio na cidade de Utinga no ano de 2017, quando da assunção no Registro de Imóveis daquele município, contudo, os registros de usucapião mencionados foram de forma extraordinária, previsto no art.1.238, do Código Civil, que tem como característica a inexigibilidade de justo título ou boa fé a posse ininterrupta por 15 (quinze) anos, exercida de forma mansa e pacífica com intenção de dono, que poderá ser reduzida para 10 (dez) anos, nos casos em que o possuidor estabelecer no imóvel sua moradia habitual ou nele tiver realizado obras e serviços de caráter produtivo;

13. Ademais, não restou evidenciada no respectivo processo de aquisição declaração dos confrontantes, manifestação pelo município de Utinga, certidões negativas pertinentes, bem assim comprovação robusta de posse dos imóveis usucapidos;

14. Observou-se, ainda, através da Matrícula 1.871, adquirida pelo Oficial através de Regularização Fundiária Urbana junto àquele Município, transmissão de imóvel para sua companheira, Sra. Islaine Santos Carvalho, cuja averbação se dera no R-4, da mencionada Matrícula, financiamento junto ao Banco do Brasil para levantamento do valor de R$ 71.327,34 (setenta e hum mil, trezentos e vinte e sete reais e trinta e quatro centavos);

15. Conforme previsto na Portaria 205/2022, que estabeleceu correição extraordinária no âmbito da Comarca de Utinga, foram correicionadas as serventias localizadas nos Distritos de Wagner e Bonito e, na ocasião, foram identificados atos notariais cuja parte interessada refere ao titular desta unidade, então interino daquelas, bem como de pessoas de sua família, com aparente ausência dos requisitos legais para lavratura dos mesmos;

16. Inobservância acerca do recolhimento prévio do Imposto de Transmissão Inter Vivos - ITIV junto ao Órgão Municipal competente, conforme dispõem os artigos 1º, §2º, da Lei 7.433/85,297 e 1.279, do Código de Normas dos Serviços Notariais e de Registro do Estado da Bahia, e 30, inciso XIV, da Lei 8935/94;

17. Certidão negativa de ônus com prazo já expirado, consoante se vê da escritura de compra e venda lavrada no Distrito de Bonito, no livro de Escrituras Diversas de nº 01, fls. 135/136, em afronta ao quanto estabelecido no artigo 829, do Código de Normas e Procedimentos. [...]. (ID n. 4958958 - grifo nosso)

 

Assim, considerada a apuração em curso das condutas supostamente irregulares do interino, bem como o exercício da delegação a título precário, o Tribunal, no exercício do poder discricionário, tem autonomia para a cassação da interinidade.

Outro não é o entendimento reiterado do CNJ:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO OPOSTOS NO PRAZO DE RECURSO ADMINISTRATIVO. FUNGIBILIDADE RECURSAL. RECEBIMENTO. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS. DESTITUIÇÃO DE SUBSTITUTO QUE RESPONDIA INTERINAMENTE POR SERVIÇO NOTARIAL. IRREGULARIDADES APURADAS EM INSPEÇÃO CORRECIONAL. APLICAÇÃO DO ART. 3º, §1º, DA RESOLUÇÃO CNJ N. 80. JUDICIALIZAÇÃO PRÉVIA DA DESTITUIÇÃO. NÃO CONHECIMENTO. DESIGNAÇÃO DE PESSOA DE CONFIANÇA DO JUÍZO PARA O EXERCÍCIO PRECÁRIO DO ENCARGO. APLICAÇÃO DAS REGRAS DO PROVIMENTO N. 77 DA CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA. LEGALIDADE DA DESIGNAÇÃO DO NOVO INTERINO. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1. Os Embargos de Declaração se dirigem a impugnar os fundamentos da decisão monocrática terminativa e foram opostos no prazo fixado no art. 115, § 2º, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, razões pelas quais são recebidos como Recurso Administrativo, por força da aplicação do princípio da fungibilidade recursal.

2. A interinidade amparada no art. 39 da Lei n. 8.935/1994 e no art. 3º da Resolução CNJ n. 80/2009 revela a natureza precária de designação ultimada nesses termos, circunstância que torna possível a sua revogação, a qualquer tempo, pelo Poder Outorgante, notadamente quando verificada a quebra de confiança decorrente de constatação de irregularidades apuradas em inspeção correcional, como é o caso dos autos. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça – STJ e do Conselho Nacional de Justiça – CNJ.

3. Noticiada tempestivamente a prévia judicialização do ato administrativo que destitui substituto interino das funções exercidas à frente do Cartório de Registro de Imóveis de Martinho Campos-MG, impõe-se a aplicação do Enunciado Administrativo n. 16, que determina a impossibilidade de discussão da matéria pelo Conselho. Não conhecimento. Precedentes do CNJ.4. A designação de delegatário de serviço notarial que venha a exercer o encargo em interinidade deve observar rigorosamente o disposto no Provimento n. 77 editado pela Corregedoria Nacional de Justiça, hipótese regularmente observada nos autos.5. Razões recursais carecem de argumentos e provas capazes de abalar os fundamentos da decisão combatida.6. Recurso conhecido e, no mérito, não provido. (CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA – Procedimento de Controle Administrativo - 0000011-58.2020.2.00.0000 -Rel. FLÁVIA PESSOA - 81ª Sessão Virtual - julgado em5/3/2021) (grifo nosso)

 

RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ. REVOGAÇÃO DA INTERINIDADE DO CARTÓRIO DO 1º OFÍCIO DA COMARCA DE MARABÁ/PA. IRREGULARIDADES CONSTATADAS PELA CORREGEDORIA. CARÁTER PRECÁRIO DA DESIGNAÇÃO INTERINA. NOTIFICAÇÕES PRÉVIAS À OCUPANTE DO CARGO. DESNECESSIDADE DE INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO PRÉVIO. RECURSO NÃO PROVIDO.

1. A designação de tabelião interino de serviço de notas e registro, nos casos de extinção da delegação, nos termos da Lei n. 8.935/94, possui natureza precária, passível de ser revogada a qualquer tempo pela Administração, em caso de quebra de confiança ocasionada pela constatação de irregularidades na condução da serventia.

2. Apesar de a revogação da interinidade ter sido motivada por irregularidades constatadas em relação aos selos de segurança do Tribunal, não há necessidade de instauração de processo administrativo disciplinar prévio, em razão da inocuidade do processo, diante da impossibilidade de aplicação de pena, pelo Poder Judiciário, a serventuário interino.

3. Não há violação ao devido processo legal, nem às garantias do contraditório e da ampla defesa, se a decisão foi fundamentada na inadimplência em que se encontrava a serventia, após o transcurso do prazo conferido à serventuária, devidamente notificada, para correção das irregularidades apontadas.

4. Se a declaração de vacância da serventia extrajudicial (levada acabo nos termos da Resolução CNJ n. 80/2009) foi confirmada pelo Supremo Tribunal Federal, em mandado de segurança impetrado pela interina, revela-se descabida a alegação de impossibilidade da revogação da interinidade em virtude da condição sub judice atribuída ao cartório por decisão proferida em ação declaratória do vínculo da interina com o Estado.

5. Recurso não provido.(CNJ - RA – Recurso Administrativo em PCA – Procedimento de Controle Administrativo - 0004291-77.2017.2.00.0000 -Rel. DALDICE SANTANA - 31ª Sessão Virtual - julgado em15/2/2018) (grifo nosso)

 

II – DA ATUAÇÃO EXCEPCIONAL DO CNJ EM PROCESSOS DISCIPLINARES INSTAURADOS EM FACE DE DELEGATÁRIO

É de se ver que o Requerente discorre longamente sobre as condutas investigadas na Sindicância n. 0001825-06.2022.2.00.0851, apresenta documentos sobre os negócios jurídicos mencionados e alega estar sofrendo retaliação por ter denunciado condutas supostamente ilegais da Corregedoria local.

Pretende que este Conselho reconheça a nulidade da Ata da Inspeção e da Sindicância instaurada e o mantenha na interinidade das serventias de Iraquara/BA e Souto Soares/BA.

De igual forma, a questão submetida à análise não atrai a intervenção do CNJ.

A uma, porque, à luz da jurisprudência pacífica e consolidada do CNJ, a competência para a análise de questões disciplinares está circunscrita à verificação da conduta de juízes e membros de Tribunais, conforme dispõe o artigo 103-B, § 4º, inciso V, da Constituição Federal.

Desse modo, mesmo em caso de processos administrativos disciplinares instaurados e julgados em face de delegatário, a atuação do CNJ se restringe a hipóteses excepcionais de ilegalidade flagrante. Vale colacionar recentíssimo julgado:

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SANTA CATARINA. ANÁLISE DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR INSTAURADO EM DESFAVOR DE DELEGATÁRIA. INVIABILIDADE. AUSÊNCIA DE FLAGRANTE ILEGALIDADE. ATUAÇÃO DO CONSELHO PARA ATUAR COMO MERA INSTÂNCIA RECURSAL. IMPOSSIBILIDADE. NATUREZA INDIVIDUAL DA DEMANDA QUE AFASTA A INTERVENÇÃO DO CNJ. PEDIDOS NÃO CONHECIDOS.

1. Procedimento de controle administrativo em que se questionam atos praticados em processo administrativo disciplinar (PAD) instaurado em desfavor da requerente, delegatária de serviço extrajudicial, sobretudo no que tange à aplicação da sanção de multa e de devolução de valores.

2. Consoante jurisprudência pacífica e consolidada deste Conselho, descabe ao CNJ analisar processos administrativos disciplinares deflagrados em face de delegatário de serviço notarial, tampouco revisar penalidade que lhe seja imposta, salvo nos casos de flagrante ilegalidade, hipótese não verificada nos autos.

3. Os argumentos desenvolvidos pela requerente foram objeto de exaustivo debate no âmbito local, notadamente por órgãos colegiados do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, dos quais se constata a existência de motivação idônea.

4. A atuação do CNJ como mera instância recursal de toda e qualquer decisão proferida pelos tribunais é rechaçada pelos reiterados precedentes deste Conselho.

5. Por fim, não se pode olvidar que a demanda em apreço possui nítida natureza individual, o que afasta a atuação do CNJ. Precedentes.

6. Pedidos não conhecidos. (CNJ - PCA - Procedimento de Controle Administrativo -0008346-32.2021.2.00.0000 - Rel. MAURO PEREIRAMARTINS - 114ª Sessão Virtual - julgado em 27/10/2022) (grifo nosso)

 

A duas, porque os argumentos apresentados na inicial, que visam demonstrar a alegada insubsistência da apuração levada a efeito por meio da Sindicância instaurada em face do Requerente, são todos meritórios e ainda não foram avaliados pelo Órgão de origem.

Assim, não compete a esta Casa se substituir ao Órgão censor e analisar o mérito das imputações, sobretudo porque não demonstrada flagrante ilegalidade na condução da apuração.

Nesse ponto, cumpre anotar que o Requerente não apresenta qualquer documento que comprove as ilações sobre a perseguição que estaria sofrendo, bem assim acerca da alegada imparcialidade por parte do Corregedor das Comarcas do Interior.

Ao revés, apenas relata inúmeros acontecimentos que envolvem outros delegatários, na tentativa de provar que condutas mais graves do que as cometidas por ele deixaram de ser apuradas pela Corregedoria local.

Vale destacar que, em petição incidental, inova o pedido, agregando notícia de que a interina designada para responder pelas serventias de Iraquara/BA e Souto Soares/BA, Manuela Mutti Carvalho Almeida de Santana, teria invadido o Cartório da primeira e se apropriado das instalações e móveis, mesmo não havendo recusa na entrega.

Aduz que sua esposa sofreu um aborto e não pôde esperar a chegada da nova interina para acompanhar os trabalhos. Diante disso, requer ao CNJ que determine à CGJ/BA que apure os fatos narrados.

Não obstante, além de não provar as alegações, afere-se da documentação juntada pelo próprio Requerente que havia Decisão do Juiz Corregedor Permanente, Dimas Braz Gaspar, no seguinte sentido:

[...]

A título de esclarecimento, destaco que a entrada em exercício da Sra. Manuela foi agendada para a data de 5 de dezembro de 2022, em virtude de a serventia da qual esta é titular, em Itaberaba, passar por correição extraordinária na semana antecedente. Tal data foi informada a ambos os delegatários, inclusive ao Sr. Yuri, o qual dispôs de grande período de tempo, desde a publicação da decisão de sua destituição (10 de novembro de 2022) para organizar as questões que julgasse necessárias quanto ao acervo e às pendências verificadas. Assim, a Sra. Manuela efetivamente entrou em exercício nas referidas Serventias na data de 5 de dezembro de 2022, assinando os respectivos termos na presença do Juiz Corregedor Permanente.

Logo, desde a data em questão, é a Sra. Manuela quem responde efetivamente pelo serviço público prestado pelas unidades extrajudiciais, para todos os efeitos. Importante esclarecer isso porque não poderia, desde então, o Sr. Yuri seguir praticando atos registrais e notariais, ainda que pendentes e apresentados anteriormente, por ter sido efetivamente destituído da interinidade que anteriormente ocupava.

De outro giro, no presente momento está também impedida de praticar os referidos atos a Sra. Manuela, tendo em vista que, diante da não transferência dos selos e do acervo, não pode sequer solicitar os cadastros nos sistemas pertinentes, a fim de desenvolver os trabalhos.

Fixadas essas premissas, destaca-se que o princípio da continuidade dos serviços públicos tem relevância especial e deve pautar a análise do presente caso, tendo em vista que a demora na transmissão ocasionará, inevitavelmente, a interrupção da prestação de serviço público essencial.

Por oportuno, registro que este Juízo se solidariza com a triste situação de que acometeu a família do Sr. Yuri.

No entanto, em que pese a justificativa apresentada para não se fazer presente na data designada, não se pode permitir que a situação pessoal comprometa a continuidade do serviço público.

Registro que, em ambas as Serventias que estão em processo de transmissão – o Cartório de Registro de Imóveis de Iraquara e o Cartório de Registro de Imóveis de Souto Soares – há Oficiais Substitutas designadas, sendo que, por definição, sua função é praticar os atos necessários nas ausências e impedimentos do Oficial titular ou interino.

Diante do exposto, DETERMINO que:

a) O Bel. Yuri Reis Barbosa se abstenha de realizar quaisquer atos notariais ou registrais referentes aos Cartórios em questão;

b) O Bel. Yuri Reis Barbosa providencie imediatamente os atos de levantamento e transmissão dos selos eletrônicos, bem como de transmissão do acervo, possibilitando o desenvolvimento integral dos trabalhos pela atual delegatária interina, a Bela. Manuela Mutti Carvalho Almeida de Santana. Para tanto, fica a critério do delegatário anterior comparecer aos Cartórios para acompanhar os atos de transmissão, nos dias 7 e 8 de dezembro de 2022, a partir das 9h, a iniciar pela sede de Iraquara.

c) Em caso de ausência do Bel. Yuri Reis Barbosa, por impedimento de ordem pessoal, os atos de levantamento e transmissão dos selos eletrônicos, bem como de transmissão do acervo, deverão ser realizados pelas respectivas Oficialas Substitutas, quais sejam, Sra. Suélen Oliveira da Conceição (Iraquara) e Natacha Bellorio Ruiz(Souto Soares).

d) Todos os atos relativos à transmissão do acervo e conferência de livros sejam realizados na presença das Oficialas Substitutas, a quem deve ser permitida a conferência das atas e relatórios.

[...]

Fica designado Oficial de Justiça para acompanhar a transmissão, cuja presença poderá ser solicitada por qualquer dos interessados.

[...]. (ID n. 4968085 - destaques no original).

 

Assim, além de não atraírem a intervenção deste Conselho, haja vista que são questões afetas à gestão da Corregedoria local, a quem compete organizar e acompanhar a transmissão do acervo em situações como a analisada, parecem infundadas as alegações de Yuri Reis Barbosa.

No que respeita à alegada antecipação da pena, o Requerente se limita a apresentar uma Certidão que indica a realização das “devidas anotações na ficha disciplinar” (ID n. 4958963), mas não explicita quais anotações seriam essas, tampouco apresenta o documento propriamente dito.

Nesse cenário, não há justa causa para a intervenção do CNJ em procedimento recém-instaurado para apuração de supostas irregularidades encontradas em Correição na serventia, no bojo do qual nem sequer foi emitido juízo valorativo.

Ainda que fosse possível ao CNJ intervir, o êxito no reconhecimento de eventual nulidade na instauração da Sindicância não aproveitaria ao fim almejado pelo Requerente. Vale dizer: não seria possível atribuir o efeito automático pretendido, qual seja, a reintegração à interinidade das serventias de Iraquara/BA e Souto Soares/BA.

Ora, como explicitado, os fatos em apuração são graves e, mesmo que ainda não comprovadas autoria e materialidade, foram compreendidos pelo TJBA como suficientes para a configuração de quebra de confiança, o que não poderia ser rechaçado pelo CNJ em sede de controle administrativo.

 

III – DA NATUREZA INDIVIDUAL DA DEMANDA E DA INDEVIDA UTILIZAÇÃO DO PROVIMENTO CNJ N. 77 PARA ASSEGURAR O ACÚMULO DE INTERINIDADES

Por fim, impõe-se ressaltar a insistência do Requerente em ter supostos direitos à interinidade reconhecidos pelo CNJ.

Em pesquisa no sistema PJe foram constatados mais de 10 (dez)procedimentos em que Yuri Reis Barbosa acorre a este Órgão de Controle Administrativo do Poder Judiciário a fim de validar suas pretensões de ocupar interinamente alguma serventia.

Com efeito, o Provimento CNJ n. 77 visa proporcionar a melhor prestação do serviço extrajudicial, garantindo a observância dos princípios da supremacia do interesse público, da eficiência, da continuidade do serviço público e da segurança jurídica.

O mencionado Provimento não pode ser utilizado como instrumento de salvaguarda de delegatários que passaram a disputar entre si as interinidades, apresentando ao CNJ demandas com nítida pretensão individual, calcadas na necessidade de garantir incremento de remuneração e de não tolerar eventuais prejuízos ao serem destituídos.

Vale ilustrar trecho da petição inicial em que a disputa pelas interinidades se revela inequívoca:

 

 

Também na Petição encartada ao ID n. 4964267 verifica-se a disputa:


 

Destarte, tal como apresentada, a controvérsia posta nos autos não é vocacionada a gerar repercussão geral no âmbito do Poder Judiciário nacional.

Causas como a discutida neste procedimento são reservadas a órgãos imbuídos de competência jurisdicional, aos quais a Constituição Federal atribuiu o poder-dever de dizer o direito no caso individual em concreto.

A atuação constitucional do Conselho Nacional de Justiça visa ao interesse coletivo do Poder Judiciário e de toda a sociedade, o que afasta a natureza de instância recursal ou originária para questões judiciais ou administrativas de caráter individual.

Nessa toada, tem-se que a demanda em apreço possui caráter nitidamente individual, não comportando conhecimento, nos termos do Enunciado Administrativo CNJ n. 17/2018:

Enunciado Administrativo CNJ 17/2018

“Não cabe ao CNJ o exame de pretensões de natureza individual, desprovidas de interesse geral, compreendido este sempre que a questão ultrapassar os interesses subjetivos da parte em face da relevância institucional, dos impactos para o sistema de justiça e da repercussão social da matéria.” (grifo nosso)

 

Recorde-se, por fim, que, a teor do artigo 25, inciso X, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça (RICNJ), deve o relator arquivar monocraticamente o procedimento quando a matéria for flagrantemente estranha às finalidades do CNJ e a pretensão for manifestamente improcedente ou contrária a precedentes do Plenário do CNJ ou do STF, regra de organização interna com o nítido propósito de não sobrecarregar desnecessariamente o Plenário deste Conselho sobre questões amplamente debatidas e decididas precedentemente.

Por todo o exposto, considerando a ausência de ilegalidade que desafie a intervenção deste Conselho, não conheço do presente Procedimento de Controle Administrativo e determino seu arquivamento liminar.

Intimem-se as partes quanto ao teor desta Decisão, devendo o TJBA providenciar a intimação de Manuela Mutti Carvalho Almeida de Santana e Francisco Motta Macedo Neto, para ciência da tramitação do presente feito e eventual ingresso na condição de terceiros interessados, a teor das disposições contidas no inciso II do art. 9º da Lei n. 9.784/99.

À Secretaria Processual, para as providências a seu cargo.

Brasília-DF, data registrada em sistema.

Conselheiro GIOVANNI OLSSON

Relator 

 

A princípio, impõe-se ressaltar que o Recorrente se limitou a reforçar as teses inicialmente expostas, reproduzindo nas razões recursais idênticos trechos da petição inicial e deixando de atacar, motivadamente, os fundamentos da decisão recorrida.

Nesse cenário, a peça recursal ofende os princípios da dialeticidade e da congruência, o que por si só seria causa para o não provimento do Recurso.

No mesmo sentido, destaca-se recente precedente do Plenário:

RECURSO ADMINISTRATIVO EM RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. MATÉRIA DE NATUREZA ESTRITAMENTE JURISDICIONAL. FATOS QUE NÃO CONSTITUEM INFRAÇÃO DISCIPLINAR. RECURSO NÃO PROVIDO.

1. O princípio da dialeticidade exige que as razões recursais estejam associadas à decisão recorrida e ataquem, motivadamente, seus fundamentos, o que não acontece no presente caso.

2. Não há nos autos indícios que demonstrem a prática de qualquer infração disciplinar ou falta funcional que pudessem ensejar a instauração de processo administrativo disciplinar.

3. Os argumentos desenvolvidos pela parte reclamante demonstram insatisfação em face do conteúdo de decisão proferida nos autos judiciais.

4. O Conselho Nacional de Justiça possui competência adstrita ao âmbito administrativo do Poder Judiciário, não podendo intervir em decisão judicial com o intuito de reformá-la ou invalidá-la. A revisão de ato judicial não se enquadra no âmbito das atribuições do CNJ, nos termos do art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal.

5. Recurso administrativo a que se nega provimento. (CNJ - RA – Recurso Administrativo em RD - Reclamação Disciplinar - 0002242-87.2022.2.00.0000 - Rel. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA - 107ª Sessão Virtual - julgado em 10/6/2022) (grifo nosso)

 

Ainda que assim não fosse, é de se ver, conforme especificamente indicado na Decisão recorrida, que o Recorrente não logrou êxito em demonstrar que a questão ultrapassa os contornos meramente individuais do pleito, o que impede a incursão deste Órgão Constitucional de Controle Administrativo do Poder Judiciário.

Ao revés, toda a argumentação reforça o caráter individual da demanda, indica que o eventual conhecimento da matéria implicaria em revisão da sindicância instaurada e ainda não julgada, a despeito da ausência de flagrante ilegalidade na atuação da CGJ/BA, além de demonstrar o interesse financeiro em se manter à frente de inúmeras serventias como interino mediante indevida utilização do Provimento CNJ n. 77.

Diante disso, considerando que não foram submetidos à análise novos fatos ou razões diversas, capazes de infirmar os fundamentos da Decisão monocrática, mantenho-a integralmente.

Por todo o exposto, conheço do Recurso e, no mérito, nego-lhe provimento.

É como voto.

Após as comunicações de praxe, arquivem-se.

À Secretaria Processual para as providências. 

Brasília-DF, data registrada no sistema.

 

Conselheiro GIOVANNI OLSSON

Relator



[1] Art. 115. A autoridade judiciária ou o interessado que se considerar prejudicado por decisão do Presidente, do Corregedor Nacional de Justiça ou do Relator poderá, no prazo de cinco (5) dias, contados da sua intimação, interpor recurso administrativo ao Plenário do CNJ. § 1º São recorríveis apenas as decisões monocráticas terminativas de que manifestamente resultar ou puder resultar restrição de direito ou prerrogativa, determinação de conduta ou anulação de ato ou decisão, nos casos de processo disciplinar, reclamação disciplinar, representação por excesso de prazo, procedimento de controle administrativo ou pedido de providências.