Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: REVISÃO DISCIPLINAR - 0008678-96.2021.2.00.0000
Requerente: EDEVALDO DE MEDEIROS
Requerido: TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO - TRF 3

 

REVISÃO DISCIPLINAR PROPOSTA POR MAGISTRADO FEDERAL E REVISÃO DISCIPLINAR INSTAURADA DE OFÍCIO. CONEXÃO. ANÁLISE CONJUNTA. TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR QUE NA ORIGEM APENOU O JUIZ FEDERAL DA 39ª SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE SÃO PAULO COM SANÇÃO DE ADVERTÊNCIA. QUESTÃO DE ORDEM. LEVANTAMENTO DO SIGILO. OBSERVÂNCIA DO PRAZO DECADENCIAL.  PRELIMINARES E PREJUDICIAIS SUSCITADAS PELA DEFESA REJEITADAS. PRESCRIÇÃO NÃO CONSUMADA. PRETENSÃO FORMULADA PELO JUIZ REVISIONANTE QUE SE APRESENTA COMO SUCEDÂNEO RECURSAL. AUSÊNCIA DE ENQUADRAMENTO ÀS HIPÓTESES DISCRIMINADAS NO ART. 83 DO RICNJ. REVISÃO CONHECIDA E JULGADA IMPROCEDENTE. PROCEDIMENTO REVISIONAL INSTAURADO EX OFFICIO. MULTIPLICIDADE DE CONDUTAS QUE INFRINGIRAM O COMANDO VERTIDO NO ART. 35, INCISOS I E III, DA LOMAM E DISPOSITIVOS DO CÓDIGO DE ÉTICA DA MAGISTRATURA. INSUFICIÊNCIA DA PENA DE ADVERTÊNCIA (ART. 88, DO RICNJ). REVISÃO CONHECIDA E JULGADA PROCEDENTE PARA MODIFICAR A PENA E APLICAR AO REQUERIDO A SANÇÃO DE DISPONIBILIDADE COM VENCIMENTOS PROPORCIONAIS AO TEMPO DE SERVIÇO POR 180 (CENTO E OITENTA) DIAS.

1.      À luz da nova ordem constitucional, a publicidade dos atos processuais (na seara judicial e administrativa) é princípio basilar do Estado Democrático de Direito, ou seja, constitui regra geral, afastada apenas quando a defesa da intimidade das partes e/ou o interesse público e social o exigirem (art. 5º, LX, da Carta Magna), o que não se amolda à hipótese concreta, impondo-se o levantamento do sigilo. Questão de ordem aprovada

2.      Na linha de precedentes deste Conselho e do STF, o termo inicial de contagem do prazo decadencial (arts. 103-B, § 4º, V, da CF/88 e 82 do RICNJ) corresponde à data da publicação do acórdão no órgão oficial e/ou da ciência do CNJ quanto ao julgamento do PAD na Origem. Na hipótese, não havia transcorrido o prazo de 1 (um) ano entre a data da ciência inequívoca deste Conselho quanto ao desfecho do feito disciplinar e a autorização colegiada para abertura da revisão ex officio. Decadência não concretizada.

3.      O TRF-3 afastou a arguição de ofensa à coisa julgada administrativa sob o fundamento de que se cuidava de tema já superado, porquanto dirimido na fase prévia à instauração do PAD (art. 93, inciso IX, da Carta Magna) e, portanto, eventual equívoco na asserção daquela Corte é passível de reanálise nesta seara revisional. Arguição de negativa de prestação jurisdicional insubsistente.

4.      O indeferimento do pedido de ausência aos trabalhos na unidade judiciária e o ingresso da defesa técnica nos autos da reclamação disciplinar às vésperas da data originária do respectivo julgamento, por si só, não autorizam a conclusão de que o magistrado estivesse impedido de comparecer à sessão. Ademais, o representado já havia ingressado anteriormente com a defesa prévia (Súmula Vinculante nº 05, do STF) e o pleito sucessivo de adiamento do julgamento da RD foi acatado, afastando derradeiramente a alegada ofensa ao direito de audiência. Cerceamento de defesa não configurado.

5.      O arquivamento dos procedimentos prévios, por força de decisão monocrática do Órgão Censor local, não congrega os atributos indispensáveis à formação da coisa julgada administrativa. Nesse sentido, inexistia óbice ao reexame da questão envolvendo o descumprimento de acórdão prolatado em sede de recurso em sentido estrito pelo Órgão Especial do TRF3 na seara persecutória-disciplinar. Inexistência de ofensa à segurança jurídica.

6.      Diante da absoluta disparidade entre as medidas, a participação anterior dos 02 (dois) desembargadores federais, integrantes do Órgão Especial do TRF3, no julgamento da Correição Parcial interposta contra decisões proferidas pelo juiz representado, por si só, não induz ao impedimento desses magistrados para participação nas sessões de instauração e apreciação do mérito do PAD, independentemente da similitude e/ou identidade em parte dos fatos analisados em ambos os expedientes. Nulidade não caracterizada.

7.      A única falta funcional atribuída ao juiz requerido pelo acordão proferido pelo TRF3 não está respaldada nos depoimentos testemunhais. Ademais, o reconhecimento da suspeição nessa esfera revisional desencadeou unicamente a requalificação do depoimento, atribuindo-se à testemunha contraditada a conotação de mera informante, a ensejar o reexame do peso probatório eventualmente atribuído às suas declarações, sem com isso justificar o decreto de nulidade de todo o processado (“Pas de nullité sans grief”). Preliminar repelida.

8.      O art. 82 e seguintes, do RICNJ, não preveem no curso da revisão disciplinar qualquer fase específica dedicada à dilação probatória, incumbindo ao interessado a pronta instrução da medida com as peças necessárias à comprovação dos fatos alegados (artigo 85, §1º do RICNJ). Cerceamento de defesa não configurado.

9.      Não havia escoado o quinquênio extintivo no lapso compreendido entre as datas que a Corregedoria Local foi cientificada dos supostos atos faltosos (06/11/2017 e 03/07/2019) e a instauração do PAD pelo TRF-3 (12/02/2020), não se consumando a prescrição sob o ângulo abstrato.

10.   O prazo prescricional de 180 dias pela pena concreta aplicada ao requerido (advertência) teve início em 01/07/2020 (141º dia após a deflagração do PAD) e, portanto, transcorreria em 28/12/2020, o que não se concretizou, diante do julgamento definitivo ocorrido em 25/11/2020. Prejudicial afastada.

11.   Pedido revisional formulado pelo magistrado visando a desconstituição da advertência cominada pelo TRF3, em virtude da confirmação de prática de uma única infração funcional (resistência injustificada a cumprimento de acórdão), que se revela como mero sucedâneo recursal e não se amolda às hipóteses taxativas do art. 83, incisos I a III, do RICNJ. Revisão disciplinar conhecida e julgada improcedente.

12.   A garantia atrelada à independência funcional (art. 41, da LOMAN) não ostenta caráter absoluto, admitindo-se em caráter excepcional a relativização dos princípios da independência e da imunidade funcionais, a propiciar a responsabilização administrativo-disciplinar do magistrado quando, no exercício da atividade jurisdicional, resultar patenteada a ofensa aos deveres constitucionais e legais que norteiam o exercício da judicatura. Precedentes do CNJ e do STF.

13.   Na hipótese, à parte da falta funcional já reconhecida no PAD, os elementos dos autos demonstram a prática de graves transgressões mais abrangentes, consubstanciadas na mora processual injustificada, na desobediência aos comandos exarados dos Órgãos Superiores, na injustificada revogação de ofício de decisões proferidas por outros magistrados investidos do mesmo grau de jurisdição (relaxamento de prisão, anulação de provas e indeferimento de diligências), na rejeição sistemática de denúncias e na sucessiva prolação de outras decisões intuitivamente tumultuárias, desprovidas de fundamentação jurídica idônea, em detrimento da cautela, da prudência e da imparcialidade indissociáveis ao exercício da magistratura.

14.   Multiplicidade de condutas que refletem a ampla e reiterada infringência ao art. 35, incisos I e III, da LOMAN, bem assim ao art. 1º e a diversos enunciados do Código de Ética da Magistratura, evidenciando que o representado não cumpriu com serenidade e exatidão as disposições legais e os atos de ofício que lhe competiam, olvidando-se inclusive de determinar as providências necessárias para que os atos processuais se realizassem nos prazos legais.

15.   À luz da razoabilidade e da proporcionalidade, assoma imperativo o redimensionamento da sanção (art. 88, do RICNJ), modificando-se a pena de advertência para aplicar ao requerido a disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço, pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias (art. 93, VIII, da CF/1988, arts. 42, inc. IV, e 57, parágrafo 1º, da LOMAN, c.c art. 6º, da Resolução CNJ nº 135/2011).

16.   Revisão disciplinar proposta de ofício conhecida e julgada procedente.


 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade rejeitou as preliminares e, no mérito, julgou improcedente o pedido da Revisão Disciplinar nº 0008678-96.2021.2.00.0000 e procedente a Revisão Disciplinar nº 0000749-75.2022.2.00.0000 para aplicar ao magistrado a pena e disponibilidade com proventos proporcionais ao tempo de serviço, pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias, nos termos do voto da Relatora. Presidiu o julgamento o Ministro Luís Roberto Barroso. Plenário, 20 de fevereiro de 2024. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Luís Roberto Barroso, Luis Felipe Salomão, Caputo Bastos, José Rotondano, Mônica Autran Machado Nobre, Jane Granzoto, Renata Gil, Daniela Madeira, Giovanni Olsson, Pablo Coutinho Barreto, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Daiane Nogueira e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Sustentaram oralmente: o Subprocurador-Geral da República José Adonis Callou de Araújo Sá; e, pelo magistrado, o Advogado Rodrigo da Silva Castro - OAB/DF 22.829.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: REVISÃO DISCIPLINAR - 0008678-96.2021.2.00.0000
Requerente: EDEVALDO DE MEDEIROS
Requerido: TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO - TRF 3


 

RELATÓRIO

 

A EXCELENTÍSSIMA SENHORA CONSELHEIRA JANE GRANZOTO (RELATORA):

 

Ab initio, cumpre esclarecer que, diante da notória correlação entre os objetos das Revisões Disciplinares nº´s 0008678-96.2021.2.00.0000 e 0000749-75.2022.2.00.0000, ambos relacionados ao Exmo. Sr. Juiz Federal Edevaldo de Medeiros (vinculado ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região - TRF3) e ao desfecho do processo administrativo disciplinar outrora instaurado naquela Corte Local em seu desfavor (PAD nº 0029224-53.2019.03.8000), as referidas medidas serão relatadas e apreciadas em seu cerne conjuntamente na presente sessão.

 

REVDIS Nº 0008678-96.2021.2.00.0000 

 

Vistos, etc...

O Exmo. Sr. Juiz Federal EDEVALDO DE MEDEIROS, Titular da 1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Itapeva/SP, propôs a presente Revisão Disciplinar (RevDis) com espeque no art. 83, incisos I a III, do Regimento Interno deste Conselho Nacional de Justiça, visando o reexame do v. acórdão proferido pelo Egrégio Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), em 25 de novembro de 2020, nos autos do Processo Administrativo Disciplinar - SEI nº 0029224-53.2019.4.03.8000, que lhe resultou na aplicação da sanção de advertência (por maioria de votos,) por infração ao art. 35, inciso I, da Lei Complementar nº 35, de 14 de março de 1979, e ao art. 1º do Código de Ética da Magistratura Nacional (ids 4549822, 4549862 e 4549865).

Com a petição inicial (id 4549822), vieram os documentos de ids 4549862 até 4550203, correspondentes aos instrumentos de procuração e substabelecimento, bem como ao traslado das peças oriundas do citado Procedimento Administrativo Disciplinar SEI nº 0029224-53.2019.4.03.8000.

Processo distribuído por sorteio em 24 de novembro de 2021 à cadeira da então Eminente Conselheira IVANA FARINA NAVARRETE PENA.

Consoante exposições iniciais, o processo administrativo disciplinar em face do requerente foi instaurado pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), em razão de Representação Disciplinar apresentada pela Procuradoria-Geral da República (PAD nº SEI 0029224-53.2019.4.03.8000), que apontou a prática das seguintes infrações funcionais: i) excesso de prazo recorrente na condução de processos criminais; ii) descumprimento de decisões do Tribunal; iii) prolação de decisões teratológicas e com o intuito de tumultuar os processos; iv) cerceamento das atividades dos “órgãos do sistema de justiça e segurança pública”; v) violação dos deveres legais e éticos inerentes ao cargo. Nessa toada, reforçou que a “representação” ofertada pelo Órgão Ministerial “buscou fazer crer” que as decisões proferidas pelo ora requerente, associadas à suposta demora na tramitação processual, sintetizariam as seguintes irregularidades funcionais: “ausência de imparcialidade do julgador; não cumprimento com exatidão e serenidade dos atos de ofício; ausência de cautela no exercício da jurisdição; ausência de zelo com relação aos prazos processuais e; manifestação de opinião sobre processo pendente de julgamento.”

Esclareceu que as imputações em referência foram igualmente apresentadas perante este Conselho Nacional de Justiça, por intermédio da Reclamação Disciplinar distribuída sob nº 0005469-90.2019.2.00.0000, tratando-se de medida que, à época, restou sobrestada. Paralelamente, observou que o expediente disciplinar que tramitou perante a Corregedoria do TRF3 desdobrou-se, no âmbito deste CNJ, no Pedido de Providências nº 0010014-09.2019.2.00.0000, distribuído à Corregedoria Nacional de Justiça, já arquivado, porquanto tal expediente tinha objeto idêntico àquele versado na citada Reclamação Disciplinar distribuída sob nº 0005469-90.2019.2.00.0000.

Extrai-se, ainda, das tratativas lançadas na peça vestibular, que o Órgão Especial do TRF3, no julgamento do Processo Administrativo Disciplinar - SEI nº 0029224-53.2019.4.03.8000, acatou o voto da Relatora, Exma. Sra. Desembargadora Marisa dos Santos, reconhecendo a presença de falta funcional unicamente quanto à conduta relacionada ao descumprimento de decisão da C. 11ª Turma daquela Egrégia Corte, proferida em Recurso em Sentido Estrito (Processo nº 0001449-25.2016.4.03.6139), rejeitando as demais imputações, o que desaguou na aplicação da pena de advertência.

Registrou que a decisão do TRF3, no tocante ao desfecho do processo administrativo disciplinar e à aplicação da advertência ao requerente, foi comunicada à Corregedoria Nacional de Justiça, sem que o referido Órgão Censor tenha aquiescido ao entendimento adotado pela Corte local, de modo que foi concedido prazo ao requerente para apresentação de defesa "especificamente quanto à infração que restou reconhecida no procedimento de origem, bem como quanto à penalidade ali aplicada."

Disse que, além da advertência, viu-se impedido de participar de concurso de remoção, o que, em sua compreensão, caracterizaria bis in idem, pois a LOMAN não cumularia "a pena de proibição de remoção à advertência", em virtude do "mesmo fato".

Na seara preambular, suscitou a nulidade do procedimento administrativo disciplinar que tramitou no TRF3, em razão da suposta ofensa ao contraditório e à ampla defesa, valendo-se de argumentos das seguintes ordens:

a) vedação ao comparecimento pessoal do magistrado requerente à sessão de julgamento da medida embrionária que culminou na instauração do processo administrativo disciplinar no Tribunal de Origem, realizada em 12 de fevereiro de 2020;

b) desconsideração da preclusão consumativa, malferimento a coisa julgada administrativa e ofensa à segurança jurídica, tendo em vista que os fatos examinados pelo TRF3 já haviam sido analisados e desconsiderados como ilícito funcional pela Corregedoria Nacional de Justiça (Correição Parcial nº 0042082-87.2017.4.03.8000, Processo SEI nº 045326-24.2017.4.03.8000 e Pedido de Providências nº 0001145-91.2018.2.00.0000), sem identificação de qualquer elemento fático novo que autorizasse a reanálise de questões já anteriormente apuradas na seara administrativa;

c) impedimento de 02 (dois) magistrados para participação no julgamento do processo administrativo disciplinar (instauração e mérito) - Excelentíssimos Senhores Desembargadores Toru Yamamoto e Therezinha Astolphi Cazerta -, porquanto já teriam analisado anteriormente alguns dos fatos que constituíram objeto do feito disciplinar, considerada a participação dos citados desembargadores no julgamento da  Correição Parcial nº 0042082-87.2017.4.03.8000, da qual teria se desdobrado o Processo SEI nº 045326-24.2017.4.03.8000;

d) irregularidade na oitiva da testemunha Exmo. Sr. Procurador da República, Dr. Ricardo Tadeu Sampaio, nada obstante a contradita que lhe foi ofertada na audiência de instrução, ao relato de que se tratou do efetivo colaborador e co-autor “oculto” da representação interposta em face do requerente (da qual se originou o processo administrativo disciplinar), particularidade "que acabaria por reverberar seus posicionamentos e acarretaria patente interesse no desfecho da representação".

e) negativa de prestação jurisdicional, sob o fundamento de que a preliminar suscitada pela linha defensiva – concretização da preclusão consumativa e/ou da coisa julgada administrativa - não foi apreciada efetivamente pelo Órgão Especial do TRF3, seja por ocasião da instauração do processo administrativo disciplinar, seja ao final,  no momento de apreciação do próprio cerne do aludido procedimento.

 Relativamente ao mérito, argumentou que não houve atuação dolosa voltada ao descumprimento da decisão do TRF3, no julgamento do Recurso em Sentido Estrito interposto pelo Parquet no Processo nº 0001449-25.2016.4.03.6139, pontuando a inexistência de qualquer violação de conduta, pois teria atendido integralmente às ordens diretas emanadas do Órgão Colegiado, no regular exercício do seu dever funcional.

No afã de contextualizar os fatos, explicitou que no Inquérito Policial nº 0001359-17.2016.4.03.6139 foram requeridas medidas cautelares, entre as quais a decretação de prisão preventiva em desfavor do investigado Ilmo. Sr. Paulo Henrique Simões, sobrevindo, em 20/10/2016, a decisão do Exmo. Sr. Juiz Federal Substituto da 1ª Vara Federal de Itapeva/SP, Dr. Marcelo Leis Aguiar, deferindo todos os pedidos realizados – inclusive a expedição de mandado de busca e apreensão com prazo de 30 (trinta) dias para cumprimento, enviado em 21/10/2016 à Delegacia da Polícia Federal. Considerando que a diligência não foi cumprida em tal prazo, expôs que a D. Autoridade Policial solicitou a expedição de novo mandado, o que foi indeferido pelo requerente em 22/11/2016, desaguando na interposição de Recurso em Sentido Estrito pelo Ministério Público Federal, formando-se o instrumento em 29/11/2016, com remessa dos autos ao 02º Grau em 12/12/2016. Afirmou, ainda, que, em 28/03/2017, foi proferido o v. acórdão pela C. 11ª Turma do TRF3, acolhendo a insurgência do Parquet, com trânsito em julgado em 12/05/2017, restabelecendo a decisão anterior do Juiz Federal Substituto, na linha de deferir as medidas cautelares e determinar a expedição de novo mandado de busca e apreensão com prazo de 30 (trinta) dias. Tão logo os autos retornaram ao 01º Grau, em 30/05/2017, declinou que deu fiel cumprimento à aludida ordem do Colegiado, com a emissão de novo mandado de busca apreensão, enviado à Delegacia da Polícia Federal em Sorocaba em 02/06/2017, sem que a D. Autoridade Policial, uma vez mais, tenha logrado êxito em ultimar a diligência no prazo fixado.

Nesse trilhar, em 27/06/2017, foi solicitada nova renovação do expediente, o que foi indeferido pelo requerente por decisão exarada em 27/08/2017 – sem que o Ministério Público Federal tenha interposto recurso ou qualquer outra insurgência imediata em face de tal deliberação – destacando que o panorama fático-processual já havia sido alterado, desde a prolação do supra citado acórdão pelo TRF3, considerando, inclusive, o fato de que inexistiam naqueles autos diligências sinalizando que o investigado (Ilmo. Sr. Paulo Henrique Simões), transcorrido quase 01 (um) ano, residisse no mesmo local.

Salientou que o MPF, ciente do processado, manifestou-se somente em 27/10/2017, formulando novo requerimento dirigido à emissão de mandado de busca e apreensão, mas tal pretensão restou de pronto foi indeferida, pois já havia decorrido, sob a ótica do magistrado requerente, relevante lapso temporal desde a decisão do TRF3 (proferida em março/2017), que havia determinado o restabelecimento da decisão exarada pelo Juiz Federal Substituto. Repisou que inexistiam indícios de que a diligência almejada alcançaria elemento probatório apto a esclarecer a autoria do delito, enaltecendo, sob tal perspectiva, a considerável "passagem do tempo e potencial desnecessidade da providência investigativa". A teor dessa última deliberação, disse que o DD. Procurador da República que oficiava perante a 1ª Vara Federal de Itapeva apresentou Correição Parcial, no bojo da qual, sobreveio a "surpreendente" compreensão de que o mandando de busca e apreensão deveria ser deferido "quantas vezes se fizessem necessárias até o seu integral cumprimento".

Pontificou que se tratou de ato jurisdicional devidamente fundamentado, ainda que divergente das "teses da acusação", bem assim que o v. aresto proferido em sede de Recurso em Sentido Estrito teria determinado o "restabelecimento de uma decisão" e não a expedição do mandado de busca e apreensão de "forma perene e imotivada". Reiterou, nessa direção, a inexistência de qualquer ilícito funcional, na medida em que somente por ocasião da apreciação da Correição Parcial nº 0042082-87.2017.4.03.8000 deliberou-se pela renovação contínua da diligência, "quantas vezes se fizessem necessárias até o seu integral cumprimento", o que foi imediatamente acatado pelo requerente, nada obstante tal entendimento contrarie "o dever funcional do magistrado, que impõe o controle de legalidade dos atos processuais, bem como a avaliação periódica da manutenção do suporte fático autorizador de tais medidas, ante a obrigatória observância aos princípios constitucionais que garantem a inviolabilidade do domicilio e a intimidade da parte".

Finalmente, em caráter sucessivo, requereu o pronunciamento da prescrição pela pena em abstrato e em concreto, considerados os prazos estabelecidos pela Lei nº 8.112/90, merecendo ser afastado, no seu entender, o quinquídio de que trata o art. 24, da Resolução CNJ nº 135/2011, por se tratar de "ato infralegal" (princípio da hierarquia das normas).

Reportou que o TRF3 já tinha ciência das supostas acusações em seu desfavor desde a apresentação da Correição Parcial SEI nº 0042082-87.2017.4.03.8000, em 06/11/2017, tanto que  instaurado o procedimento de apuração disciplinar SEI nº 0045326-24.2017.4.03.8000 em 27/11/2017, ao passo que o Processo Administrativo Disciplinar foi instaurado em 03/04/2020, quando já teria se consumado o prazo de prescrição da pretensão punitiva administrativa - 180 (cento e oitenta) dias – considerado o teor da já citada Lei nº 8.112/90. Mesmo que assim não fosse, defendeu que igualmente já teria transcorrido tal prazo em relação à pena em concreto (advertência), pois iniciada a sua contagem após o 141º dia da deflagração do PAD, sem que a penalidade tenha sido efetivamente aplicada até a data de apresentação da presente Revisão Administrativa.

Com tais razões, requereu o pronunciamento das nulidades do processo administrativo disciplinar julgado pelo Órgão Especial do TRF3 (Processo SEI nº 0029224-53.2019.4.03.8000) e, quanto ao cerne, pugnou pelo reconhecimento da inexistência de qualquer ilícito funcional e, sucessivamente, pela extinção da punibilidade em face da consumação da prescrição em abstrato ou em concreto da penalidade.

Certidão da Secretaria Processual sob id 4550226, lavrada por ocasião da distribuição deste feito, apontando a existência da Reclamação Disciplinar nº 0005469-90.2019.2.00.0000, autuada neste Conselho Nacional de Justiça, que trataria de matéria semelhante àquela versada neste procedimento e arquivada consoante se constata da consulta à tramitação do PJE.

Em 20 de janeiro de 2022, após o transcurso do prazo de 90 (noventa) dias do término do mandato da Exma. Sra. Conselheira IVANA FARINA NAVARRETE PENA, os autos foram redistribuídos por sorteio à relatoria da minha antecessora, Eminente Conselheira TÂNIA RECKZIEGEL, nos termos do § 2º do art. 45-A do RICNJ (id 4592839).

Em despacho de 04 de março de 2022, deliberei pela intimação do Tribunal Regional Federal da 3ª Região para que se manifestasse sobre os fatos narrados pelo magistrado requerente no prazo de 15 (quinze) dias (id 4632215).

As informações do Tribunal Regional Federal da 3ª Região vieram aos autos em 25 de março de 2022  - INFORMAÇÃO Nº 8563207/2022 - GABPRES (ids 4659885 e 4659886).

Conforme deliberação de 29 de março de 2022, ordenou-se a intimação sucessiva da Procuradoria-Geral da República e do requerente para manifestação, à luz do parágrafo único, do art. 87, do RICNJ (id 4662322).

Razões finais apresentadas pelo Ministério Público Federal em 25 de abril de 2022, consignando que inexistiram nulidades aptas a macular a tramitação do processo administrativo disciplinar, bem assim que não havia se consumado a prescrição. Quanto ao cerne da medida interposta, o Parquet pronunciou-se no sentido de que o pleito não se amolda às hipóteses insculpidas nos incisos I a III, do art. 83, do RICNJ, acrescentando que a penalidade aplicada ao requerente guarda sintonia com os princípios da proporcionalidade, da razoabilidade e da finalidade. Nesse contexto, a D. Subprocuradoria-Geral da República concluiu pela improcedência do pedido, com a preservação da sanção de advertência imposta ao requerente (id 4689906).

Manifestação derradeira do requerente ofertada em 16 de maio de 2022, reiterando as exposições iniciais, pautadas na concretização das nulidades procedimentais, da coisa julgada administrativa e da prescrição, bem assim na inexistência de qualquer violação funcional, emergindo do processado, na sua concepção, que a decisão prolatada pelo Egrégio Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região contrariou todas as provas constantes dos autos, o que justificaria a revisão do julgado, com consequente cancelamento da sanção aplicada pelo TRF3 (ids 4715868 e 4715869).

Pedido de admissão na condição de amicus curiae formulado pela Associação Juízes para a Democracia, protocolizado em 04 de outubro de 2022, acompanhado de ata de assembleia e atos constitutivos (ids 4889037 até 4889047). Alegou, em suma, o preenchimento dos requisitos elencados no art. 138, do CPC: (i) relevância da matéria, especificidade do tema objeto da demanda, ou repercussão social da controvérsia; (ii) especialização e representatividade adequada do postulante. Por fim, requereu a vinculação dos Ilustres advogados constituídos ao sistema informatizado para fins de intimação dos atos processuais, sem prejuízo da autorização para realização da sustentação oral por ocasião do oportuno julgamento.

Em despacho de 11 de novembro de 2022, ordenou-se ao magistrado requerente que se manifestasse, em 05 (cinco) dias, quanto ao pedido de ingresso da Associação Juízes para Democracia (AJD) na qualidade de amicus curiae, registrando-se que eventual silêncio do magistrado será tomado como aquiescência à aludida pretensão (id 4936723).

Manifestação do juiz requerente, aos 18 de novembro de 2022, aquiescendo ao pedido de ingresso formulado pela terceira interessada (ids 4943354 e 4943355).

Deliberação exarada em 07 de dezembro de 2022, admitindo o ingresso da Associação Juízes para Democracia (AJD) na condição de amicus curiae, facultando-lhe a realização oportuna de sustentação oral nas hipóteses admitidas pelo RICNJ (id 4966218).

 

REVDIS Nº 0000749-75.2022.2.00.0000 

 

Vistos, etc...

Trata-se de Revisão Disciplinar instaurada de ofício por este CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ), por unanimidade, ao ensejo da 344ª Sessão Ordinária, realizada aos 8 de fevereiro de 2022, no julgamento da Reclamação Disciplinar nº 0005469-90.2019.2.00.0000, para reexame do v. acórdão proferido pelo Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), nos autos do Processo Administrativo Disciplinar (PAD) nº 0029224-53.2019.03.8000, que aplicou a pena de advertência ao Exmo. Sr. Juiz Federal Edevaldo de Medeiros (id 4610806, ids 4610800 a 4615937 e id 4615945).

A Revisão Disciplinar nº 0000749-75.2022.2.00.0000, ora relatada, foi distribuída por sorteio, em 10 de fevereiro de 2022, à relatoria do Eminente Conselheiro Luiz Fernando Bandeira de Mello.

Em despacho exarado em 04 de março de 2022, o então Relator de sorteio, Eminente Conselheiro Luiz Fernando Bandeira de Mello, determinou o desentranhamento dos documentos de ids 4610802, 4610803, 4610804 e 4610805, porquanto acostados aos autos por equívoco (id 4617564).

Aos 10 de março de 2022, sobreveio nova deliberação do Relator sorteado, ordenando a intimação do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) para que, no prazo de 15 (quinze) dias, apresentasse informações quanto aos fatos ocorridos, à luz do art. 85, §2º, do RICNJ (id 4637292).

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), aos 25 de março de 2022, encaminhou a INFORMAÇÃO Nº 8564026/2022 – GABPRES (ids 4659007 e 4659008).

Em 23 de maio de 2022, determinou-se a intimação do Ministério Público Federal para manifestação, em 10 (dez) dias, sobre os termos da revisão disciplinar instaurada ex officio, na forma do art. 87, parágrafo único, do RICNJ (id 4723617).

Manifestação primeira da Subprocuradoria-Geral da República, protocolizada em 13 de junho de 2023, requerendo a prorrogação de prazo, ao relato de que o Órgão Ministerial enfrentou problemas técnicos nos respectivos sistemas internos (id 4749071).

Deferida a prorrogação de prazo solicitada pelo Parquet, por 10 (dez) dias, na forma do despacho de 24 de junho de 2022 (id 4750969).

O Ministério Público Federal apresentou a sua manifestação em 27 de junho de 2022, tombada nos expedientes de ids 4762095 e 4762096, registrando que restou caracterizada não somente a desobediência aos comandos exarados por órgão superior, mas sobretudo o atraso reiterado e excessivo na prolação de sentenças/despachos pelo magistrado, tudo aliado à gestão deficitária da 1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Itapeva/SP, por considerável período de tempo. Concluiu pela procedência da revisão disciplinar instaurada de ofício, com consequente aplicação da sanção de censura ao Juiz Federal Edevaldo de Medeiros.

Aos 27 de junho de 2022, sobreveio aos autos o traslado da decisão exarada pelo Exmo. Sr. Ministro Dias Toffoli, com espeque no art. 21, § 1º, do RISTF, negando seguimento ao Mandado de Segurança nº 38.602 – DF, impetrado pelo Juiz Federal Edevaldo de Medeiros contra ato desta Conselho, consubstanciado na determinação de abertura da revisão disciplinar de ofício, sob o fundamento de que já havia escoado o prazo decadencial para tanto. Conforme consignado pelo Ministro Relator da ação mandamental em referência, não remanesceu evidenciada qualquer ilegalidade ou abuso de poder na atuação deste CNJ, pois não extrapolado o prazo constitucionalmente previsto para a instauração da revisão disciplinar, tornando-se prejudicado o exame do pedido liminar ali ofertado (ids 4762280 e 4762423).

À luz do despacho datado de 02 de agosto de 2022, o então Relator de sorteio, Eminente Conselheiro Luiz Fernando Bandeira de Mello, deliberou ao Juiz Federal Edevaldo de Medeiros que apresentasse as suas razões derradeiras, em 10 (dez) dias, nos termos do art. 87, parágrafo único, do RICNJ (id 4764639).

Alegações finais apresentadas pelo magistrado requerido aos 24 de agosto de 2022, acompanhadas de documentos, por intermédio das quais defendeu, de pronto, o reconhecimento da decadência do direito revisional deste CNJ, com consequente arquivamento da feito e, sucessivamente, a reabertura da fase de instrução processual, para fins de análise “integral dos processos, todos os seus andamentos processuais, bem como a oitiva dos servidores e dos magistrados envolvidos na gestão do próprio TRF da 3ª Região no período”. Ainda de modo preambular, protestou pelo sobrestamento do feito até o julgamento final do pedido revisional apresentado voluntariamente pelo ora representado (RevDis nº 8678/96), insistindo na concretização das nulidades e irregularidades ali ventiladas relativamente à condução do processo administrativo disciplinar pelo TRF3, calcadas na violação ao exercício do direito à audiência; na negativa de prestação jurisdicional, frente a preliminar de coisa julgada administrativa/preclusão consumativa (questões idênticas já dirimidas e decididas no Expediente SEI nº 045326-24.2017.4.03.8000); no impedimento dos Desembargadores que já haviam apreciados fatos idênticos em expediente anterior; na irregularidade envolvendo a oitiva de Procurador da República na condição de testemunha compromissada, diante da sua participação na elaboração da reclamação disciplinar da qual se desdobrou o PAD.  Reiterou o pleito dirigido à extinção da punibilidade em virtude da prescrição em abstrato ou em concreto. No mérito, pugnou pela absolvição no tocante à advertência que lhe foi aplicada pelo Órgão Especial do TRF3 e pela total improcedência da revisão disciplinar instaurada pelo Colegiado. Repisou que não houve qualquer ilícito funcional no sentido de transgredir dolosamente a ordem emanada da 11ª Turma da Corte Federal de Origem (Recurso em Sentido Estrito), mas sim atuou no regular exercício do seu dever funcional na condução do Processo nº 0001359-17.2016.4.03.6139 Reputou descaracterizada qualquer atuação dolosa ensejadora de excesso injustificado de prazo, aventando a adoção de providências saneadoras visando o aprimoramento da gestão administrativa, o que afastaria qualquer hipótese de responsabilização na esfera disciplinar. Quanto à anulação das decisões proferidas por magistrado substituto, aventou que se tratou de hipóteses excepcionais de nulidade, inserindo-se tal debate na esfera jurisdicional (ids 4838083, 4838084, 4838085 e 4838086).

Manifestação ofertada pela Associação Juízes para a Democracia - AJD, aos 04 de outubro de 2022, requerendo o ingresso no feito na qualidade de amicus curiae (id 4889053).

Decisão proferida pelo Relator de sorteio, Eminente Conselheiro Luiz Fernando Bandeira de Mello, em 26 de outubro de 2022, determinando o envio dos autos ao Gabinete desta Conselheira, para exame de possível prevenção para análise desta medida revisional (art. 44, §§ 4º e 5º, do RICNJ), considerando a distribuição anterior da Revisão Disciplinar 0008678-96.2021.2.00.0000 (id 4912970).

Em 27 de outubro de 2022, considerando a prévia distribuição da Revisão Disciplinar nº 0008678-96.2021.2.00.0000 à cadeira ocupada por esta Conselheira, bem assim a conexão do tema ali versado com os fatos examinados nesta medida revisional, reconheci a prevenção suscitada pelo então Relator de sorteio na deliberação de id 4912970, ordenando à Secretaria Processual que adotasse as medidas de praxe (id 4922243).

Redistribuídos os autos à Relatoria desta Conselheira, sobreveio a deliberação de 11 de novembro de 2022, no sentido de que as Revisões Disciplinares nºs 0008678-96.2021.2.00.0000 e 0000749-75.2022.2.00.0000 fossem associadas no Sistema PJE, para fins de tramitação conjunta, inclusão simultânea em pauta de julgamento e efetivação das publicações e intimações de modo igualmente concomitante. Ordenou-se, ainda, para fins de unificação de procedimentos, fosse atribuído sigilo à Revisão Disciplinar nº 0008678-96.2021.2.00.0000, visto que a presente medida já tramitava sigilosamente. Por derradeiro, determinou-se ao magistrado requerido que se posicionasse quanto ao pedido de ingresso da terceira interessada Associação Juízes para Democracia (AJD), no prazo de 05 (cinco) dias, registrando-se que eventual silêncio seria interpretado como aquiescência do magistrado à pretensão formulada pela citada entidade (id 4936357).

Manifestou-se o representado, em 18 de novembro de 2022, aquiescendo ao ingresso da terceira interessada (ids 4943352 e 4943353).

Aos 07 de dezembro de 2022, com lastro no art. 138, e parágrafos, da Lei Processual Civil, admitiu-se o ingresso da Associação Juízes para Democracia (AJD) na condição de amicus curiae, facultando-lhe a realização oportuna de sustentação oral nas hipóteses admitidas pelo RICNJ (id 4966220).

Certidão lavrada pela Secretaria Processual, em 07 de dezembro de 2022, encartando aos autos cópia do v. acórdão prolatado pela 1ª Turma do STF em sede de Embargos de Declaração, interposto no Agravo Regimental em Mandado de Segurança nº 38.602 – DF, negando provimento ao apelo (ids 4967585 e 4967653).

É o relatório.

Brasília, data registrada no sistema.

  

   JANE GRANZOTO

  Conselheira Relatora

 

 


 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: REVISÃO DISCIPLINAR - 0008678-96.2021.2.00.0000
Requerente: EDEVALDO DE MEDEIROS
Requerido: TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO - TRF 3

 

VOTO

 

A EXCELENTÍSSIMA SENHORA CONSELHEIRA JANE GRANZOTO (RELATORA):

 

Conforme já relatado, diante do notório entrelaçamento entre as questões versadas nas Revisões Disciplinares nºs 0008678-96.2021.2.00.0000 e 0000749-75.2022.2.00.0000, assoma imperativa a apreciação conjunta das medidas pelo Colegiado, o que ora se faz.

Remanesce despiciendo, portanto, o sobrestamento da RevDis 749-75 até o julgamento final do pedido revisional formulado pelo Juiz Federal Edevado de Medeiros (RevDis 8678-86), merecendo ser repelido, desde logo, o requerimento formulado pela defesa do magistrado nessa direção[1].

No mais, rememore-se que a Revisão Disciplinar nº 0008678-96.2021.2.00.0000 foi proposta pelo Exmo. Sr. Juiz Federal EDEVALDO DE MEDEIROS, Titular da 1ª Vara Federal da 39ª Subseção Judiciária de Itapeva/SP, visando o reexame do julgamento do Processo Administrativo Disciplinar - SEI nº 0029224-53.2019.4.03.8000, realizado em 25/11/2020 pelo Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), que lhe aplicou a sanção de advertência, em razão do descumprimento de acórdão proferido pela 11ª Turma daquela Corte de Origem em sede de Recurso em Sentido Estrito, caracterizando a hipótese de ofensa ao art. 35, inciso I, da Lei Complementar nº 35, de 14 de março de 1979, e ao art. 1º do Código de Ética da Magistratura Nacional.

A seu turno, o Processo Administrativo Disciplinar - SEI nº 0029224-53.2019.4.03.8000, instaurado por deliberação do Órgão Especial do TRF-3 na Sessão de Julgamento de 12/02/2020, acolhendo a proposta ofertada pela Corregedoria Local, derivou da reclamação disciplinar proposta pelo Ministério Público Federal da 3ª Região em face do magistrado suso nominado, subscrita por 8 (oito) Procuradores da República. Cumpre esclarecer, ainda, que o Parquet subscreveu a representação dirigida à Corregedoria do TRF3 em 26/06/2019 (id 4550167, da RevDis nº 0008678-96). Na sequência, ofereceu medida idêntica, em 23/07/2019, diretamente na Corregedoria Nacional de Justiça – Reclamação Disciplinar autuada sob nº 0005469-90.2019.2.00.0000 (id 4610940, da RevDis 749-75).

Em síntese, o Órgão Ministerial questionou a atuação do Juiz Federal Edevaldo de Medeiros alegando a prolação continuada e reiterada de decisões judiciais atípicas e tumultuárias, “em desacordo com padrões jurídicos de excelência normalmente exigidos”. Nos termos da representação do Parquet, a atuação do magistrado implicaria o deliberado propósito de inviabilizar a persecução penal nos processos e procedimentos investigatórios sob sua jurisdição, “toda vez que, não obstante a previsão legal, a atuação dos órgãos de Estado legitimados conflita com sua peculiar visão sobre a atuação da força policial e a aplicação da lei penal a réus que integram a categoria supostamente de pessoas de baixa renda, como se essa circunstância fosse critério para a criação de uma espécie de imunidade judicial”. Noticiou-se, ainda, que as supostas ilegalidades ocorreriam ao menos desde a investidura do magistrado Edevaldo de Medeiros na 39ª Subseção Judiciária de Itapeva-SP em 2015, não cessando até a data da propositura da medida disciplinar, “apesar dos repetidos casos de reforma de suas decisões pelo E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região, e da intervenção dessa D. Corregedoria em sede de correições parciais ou mesmo nos trabalhos de correição ordinária”.

Nessa linha, a Procuradoria Regional da República da 3ª Região reportou, entre outros pontos, a ocorrência de sucessivos incidentes os quais constituiriam óbice à boa marcha processual – recusa quanto à decretação de prisão preventiva, ou de medidas cautelares e indeferimento dos pedidos direcionados à quebra de sigilo e/ou à realização de busca e apreensão (nada obstante a fundamentação das pretensões ofertadas pelo Parquet), para além da rejeição indevida de inúmeras denúncias – sendo muitas das decisões proferidas tardiamente (algumas após anos de recebimento da acusação) – e prolação de sentenças de absolvição calcadas na ilicitude da prova quando o próprio Tribunal, em sede de Recurso em Sentido Estrito, já havia reconhecido o caráter lícito do instrumento. Denunciou a prolação de decisões teratológicas, a procrastinação de atos com o fim de que se concretizasse a prescrição da pretensão punitiva pela pena em concreto, o desrespeito às ordens emanadas pelo Tribunal e a anulação injustificada de decisões proferidas por Magistrados substitutos, tudo acarretando tumulto processual. 

Ainda no afã de respaldar a extensa representação, o MPF indicou diversos processos, indicativos de que as condutas ali externadas pelo juiz requerido demonstrariam o desvio do dever de accountability judicial comportamental e, portanto, a transgressão aos seguintes deveres: i) imparcialidade (art. 1º, do Código de Ética da Magistratura Nacional); ii) cumprir com exatidão e serenidade os atos de ofício (art. 35, I, da LOMAN);  iii) cautela (art. 25, do Código de Ética da Magistratura Nacional); iv) determinar as providências para que os atos processuais se realizem nos prazos legais (art. 35, III, da LOMAN); v) zelar pela observância de prazos razoáveis e reprimir condutas dilatórias ou atentatórias à boa fé processual (art. 20, do Código de Ética da Magistratura Nacional);  vi) não se manifestar por meio de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento (art. 12, II, do Código de Ética da Magistratura Nacional).  E, por fim, o MPF requereu a apuração dos fatos, a instauração de processo administrativo disciplinar e a aplicação da penalidade cabível.

À época, aos 26 de agosto de 2019, o então Corregedor Nacional de Justiça, Exmo. Sr. Ministro Humberto Eustáquio Soares Martins, determinou à Corregedoria-Geral Federal da 3ª Região que apurasse os fatos narrados pelo Parquet, informando o resultado dos trabalhos àquele Órgão Censor Nacional em 90 (noventa) dias [2].

Por sua vez, diante da identidade de questões veiculadas pelo MPF, a Corregedoria Regional informou que tais fatos já constituíam objeto de apuração no Procedimento SEI nº 0029224-53.2019.4.03.8000 (Reclamação Disciplinar), no bojo do qual o Juiz Federal Edevaldo de Medeiros já havia apresentado defesa preliminar, adiando-se o respectivo julgamento a pedido do magistrado, de modo que a investigação prosseguiria em um único procedimento. Diante do relatado pelo Órgão Censor Local, a Corregedoria Nacional de Justiça determinou o sobrestamento da RD CNJ nº 0005469-90.2019.2.00.0000 por 90 (noventa) dias. A seguir, a Corregedoria Regional da Justiça Federal da 3ª Região informou que, em sessão realizada em 12/02/2020, no julgamento do Procedimento SEI nº 0029224-53.2019.4.03.8000 (Reclamação Disciplinar), a maioria absoluta dos membros do Órgão Especial do TRF3 acolheu a proposta de abertura de PAD, para apuração de possível ofensa aos deveres insculpidos no art. 35, incs. I e III, da LOMAN[3].

Consoante informado pelo TRF3 (Ofício nº 110 – CORE), por força da decisão do Órgão Especial, foi editada a Portaria PAD/PRES nº 03, pela DD. Presidência daquela Corte, datada de 03 de abril de 2020, para apurar eventual descumprimento dos deveres da magistratura de: "cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício" e de “determinar as providências necessárias para que os atos processuais se realizem nos prazos legais” (artigo 35, I e III, da Lei Complementar 35/1979); com violação, outrossim, dos deveres de imparcialidade, cortesia, transparência, prudência, diligência e dedicação para celeridade e eficiência na prestação jurisdicional (Código de Ética da Magistratura, especialmente artigo 1.º).”, distribuindo-se o PAD à relatoria da Exma. Sra. Desembargadora Federal Marisa Ferreira dos Santos[4].

 Finalmente, no julgamento do mérito do PAD nº 0029224-53.2019.4.03.8000, ocorrido na Sessão de 25/11/2020, o Órgão Especial do TRF3 rejeitou as preliminares suscitadas pelo juiz requerido e, no mérito, julgou parcialmente procedentes as imputações, aplicando ao magistrado, consoante já acima ressaltado, a pena de advertência, em virtude do descumprimento de acórdão prolatado em sede de Recurso em Sentido Estrito. 

No mais, o Juiz Federal Edevaldo de Medeiros foi absolvido pelo Órgão Especial do TRF3 em relação às demais imputações, relacionadas à suposta violação dos deveres legais e éticos inerentes ao cargo de magistrado, envolvendo a falta de isenção, imparcialidade, independência, exatidão e serenidade, entre outros atributos na prolação das decisões e condução dos processos, a reforma e a anulação de ofício de decisões proferidas por magistrado substituto, o excesso de prazo injustificado e a morosidade processual intencional e deliberada, no intuito de fazer valer seu posicionamento político-ideológico, predisposição, preconceito ou concepção estritamente pessoal e/ou de natureza político-ideológica[5].

Para fins elucidativos, vale reproduzir o teor das informações apresentadas pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região nesta Revisão Disciplinar, subscritas pela Relatora do Processo Administrativo Disciplinar em questão, Exma. Desembargadora Federal MARISA FERREIRA DOS SANTOS[6], como seguem:


“INFORMAÇÃO Nº 8563207/2022 - GABPRES

 

Excelentíssima Senhora Relatora,

 

Em atendimento ao despacho proferido nos autos da Revisão Disciplinar n. 0008678-96.2021.2.00.0000, requerida pelo Juiz Federal Edevaldo de Medeiros, passo a prestar as informações que seguem:

 

Tramitou perante este Tribunal, Representação Disciplinar proposta pelo Ministério Público Federal contra o Juiz Federal Edevaldo de Medeiros, titular da 1.ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Itapeva/SP, pela prática de atos que, supostamente, configurariam descumprimento dos deveres da magistratura: “a) imparcialidade (art. 1° do Código de Ética da Magistratura); b) cumprir com exatidão e serenidade os atos de ofício (LOMAN, art. 35, I); c) cautela (Código de Ética da Magistratura, art. 25); d) determinar as providências para que os atos processuais se realizem nos prazos legais (LOMAN, art. 35, III); e) velar pelos prazos razoáveis e reprimir condutas dilatórias ou atentatórias à boa-fé processual (Código de Ética da Magistratura, art. 20); f) não se manifestar por meio de meios de comunicação, opinião sobre processo pendente de julgamento (art. 12, II, do Código de Ética da Magistratura)”.

 

O expediente teve seu regular andamento nos termos da Resolução CNJ n. 135/2011, que culminou com a apresentação de proposta, pelo então Corregedor Regional, de abertura de Processo Administrativo Disciplinar, perante o Órgão Especial desta Corte, diante da existência de indícios de que o magistrado incorreu, em tese e a princípio, em infração funcional, particularmente em relação aos deveres legais de "cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício" e de “determinar as providências necessárias para que os atos processuais se realizem nos prazos legais” (artigo 35, I e III, da Lei Complementar 35/1979); com violação, outrossim, dos deveres de imparcialidade, cortesia, transparência, prudência, diligência e dedicação para celeridade e eficiência na prestação jurisdicional (Código de Ética da Magistratura, especialmente artigo 1º).

 

Em sessão de julgamento realizada no dia 12/2/2020, o Órgão Especial deste Tribunal, por maioria, determinou a apuração da infringência aos deveres da magistratura insculpidos no artigo 35, I e III, da LOMAN e no Código de Ética da Magistratura Nacional (artigo 1.º).

 

Em 2/3/2020, tomei posse como Corregedora Regional da Justiça Federal da 3.ª Região, tendo assento no Órgão Especial desta Corte, como membro nato.

 

Os autos foram, então, distribuídos a minha relatoria, em 13/4/2020, como membro nato do Órgão Especial, e não como Corregedora Regional.

 

Devidamente processados os autos, nos termos da Resolução n. 135/2011 do Conselho Nacional de Justiça, designei audiência de instrução e interrogatório do magistrado, com a oitiva do Procurador da República Ricardo Tadeu Sampaio, na condição de testemunha do juízo e das testemunhas arroladas pelo magistrado, que se realizou em 10/8/2020.

 

Manifestou-se o Ministério Público Federal em alegações finais em 2/9/2020, sustentando que restaram comprovadas as alegações que motivaram a instauração do PAD. Teceu considerações sobre o garantismo penal, e repisou as demais alegações da representação disciplinar.

 

Alegações finais do magistrado representado apresentadas em 14/9/2020, arguindo preliminares de: (i) nulidade da sessão de julgamento que determinou a instauração do Processo Administrativo, por violação do direito de audiência, da coisa julgada administrativa e do impedimento de dois desembargadores em razão dos fatos julgados; (ii) nulidade da portaria de instauração do processo administrativo por ausência de apontamento específico dos fatos e mera remissão ao voto e ao acórdão da sessão em que instaurado o procedimento; (iii) tempestividade da manifestação apresentada em 27 de maio de 2020, nulidades suscitadas que jamais foram analisadas, com o consequente retorno dos autos à fase de razões de defesa; (iv) da necessária declaração de revelia, conforme art. 17 da Resolução CNJ n. 135/2011, com retorno dos autos à fase de razões de defesa; (v) da participação da testemunha do juízo nos presentes autos, sendo hipótese eventual de consideração apenas como informante, com o. reconhecimento de participação ativa na elaboração da representação que originou o processo; (vi) desentranhamento das razões finais do Ministério Público Federal, participação do Ministério Público como órgão acusador versus participação do Ministério Público como fiscal da lei, impossibilidade de apontamento de fatos novos.

 

No mérito, o magistrado sustentou: (i) o suposto excesso de prazo na tramitação de processos se refere a período anterior a março de 2018, e tomou providências tendentes a aprimorar a gestão administrativa, não configurada a atuação dolosa, inexistente responsabilidade disciplinar; (ii) as anulações, de ofício, de decisões de magistrado substituto configuram situações de excepcionalidade, em hipóteses de reconhecimento de nulidade, sem discussão efetiva do teor das decisões, inexistindo responsabilidade disciplinar; (iii) a possibilidade de rejeição de denúncias após a instrução, ocorridas também excepcionalmente, com previsão jurisprudencial, pretendendo os representantes a discussão efetiva do teor das decisões, inexistindo responsabilidade disciplinar; (iv) as anulações de prisões e provas em razão de abordagem policial tiveram fundamentação no art. 240 do Código de Processo Penal, com ausência de preconceito ou decisões genéricas, sendo que os representantes pretendem, na verdade, a discussão efetiva do teor das decisões, inexistindo responsabilidade disciplinar; (v) a rejeição de denúncias por inépcia não configura decisões tumultuárias, inexistente responsabilidade disciplinar e (vi) algumas questões levantadas na representação disciplinar já haviam sido apreciadas em sede de Correição Parcial.

 

Por fim, requereu o acolhimento das preliminares ou, no mérito, o reconhecimento da inexistência de infração à Lei Orgânica da Magistratura Nacional e ao Código de Ética da Magistratura.

 

Na sessão do Órgão Especial deste Tribunal, realizada na data de 25/11/2020, ao proferir o meu voto manifestei-me da seguinte forma:

 

‘(...)

 

O magistrado processado, que se diz garantista, tem posicionamentos rechaçados pela jurisprudência majoritária. Mas isso, a meu ver, não pode, por si só, ser visto como ilegalidade no exercício de suas funções.

 

A questão central está na ilegalidade da busca pessoal que, no entendimento do magistrado, não estaria baseada em fundada suspeita anterior. E desse entendimento advêm consequências como a anulação de prisões.

 

O posicionamento garantista tem respeitáveis seguidores na doutrina e adoção em diversos acórdãos dos tribunais superiores.

 

A análise da jurisprudência brasileira mostra que muitos entendimentos minoritários combatidos com veemência acabaram por ser adotados pelo Supremo Tribunal Federal e foram objeto de Súmulas, tanto no campo penal quanto nos demais ramos do Direito, de modo que a interpretação dada pelo magistrado à lei está protegida pela garantia da independência do juiz.

 

As provas colhidas, notadamente documentais, mostram que o entendimento é levado às últimas consequências pelo magistrado. Seu olhar para os processos criminais é voltado sempre, e em primeiro lugar, para esse aspecto da legalidade das prisões, das buscas pessoais e das provas produzidas, independentemente do fato, das pessoas e das consequências de sua decisão no caso concreto.

 

Não me parece que, neste aspecto, se lhe possa imputar violação ao princípio da imparcialidade: o mesmo entendimento é adotado em todos os casos e não se conseguiu tirar da prova colhida, em nenhum dos casos concretos apontados na representação, que tenha havido parcialidade na aplicação desse entendimento no sentido de favorecimento do réu ou de represália à atividade policial ou do Ministério Público Federal.

 

Aliás, não há notícias de que o Ministério Público Federal tenha se valido de exceções de suspeição contra o juiz processado em nenhum dos processos indicados.

 

O magistrado tem seu jeito de ver o mundo, o que não significa que não possa ser equidistante o suficiente para julgar. Fosse assim, os garantistas não poderiam julgar processos criminais.

 

Condenar o posicionamento garantista seria o mesmo que dar-lhe a reprovabilidade ética que se dá, por exemplo, ao racismo, à homofobia e à misoginia. Faria sentido, então, que os racistas não pudessem julgar processos de pessoas de raça diferente da sua, os homofóbicos tivessem que deixar a condução de processos em que fosse parte pessoa da comunidade LGBTQIA, e os misóginos não pudessem julgar os processos de violência doméstica.

 

Sob outro aspecto, ser garantista ou punitivista, por si só, não constitui infração disciplinar.

 

A insatisfação do Ministério Público Federal com os entendimentos adotados pelo magistrado, em todos os casos apontados, deve ser manifestada pela via recursal. Aliás, o MPF fez questão de salientar que “a maioria” de seus recursos são providos, o que significa que decisões do magistrado também são mantidas.

 

Está-se diante de um caso em que o magistrado põe em prática seus entendimentos contra majoritários em todos os casos, o que está de acordo com o seu dever de independência e imparcialidade, não havendo, nesse aspecto, infração disciplinar’.

 

Assim, o Órgão Especial deste Tribunal decidiu, por maioria, pela aplicação da pena de advertência ao Juiz Federal Edevaldo de Medeiros, por infração ao art. 35, I, da Lei Complementar n. 35, de 14 de março de 1979, e ao art. 1º do Código de Ética da Magistratura Nacional, por descumprir decisão da 11.ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3.ª Região proferida no Recurso em Sentido Estrito n. 0001449-25.2016.4.03.6139.

 

Após a apresentação das declarações de voto dos Desembargadores Federais Baptista Pereira e Nery Junior, o acórdão foi disponibilizado no Diário Eletrônico da Justiça Federal da 3.ª Região de 17/3/2021, no Caderno Judicial II, páginas 01 e 02.

 

O trânsito em julgado ocorreu em 12/4/2021 (doc. SEI 7587972).

 

Conforme certidão expedida pela Divisão de Assuntos da Magistratura (DMAG) deste Tribunal, nos autos do PAD instaurado em desfavor do magistrado, procedeu-se à conversão em formato PDF do acórdão, da certidão de julgamento e da certidão de trânsito em julgado, necessários aos registros nos assentamentos do magistrado (doc. SEI 7589665).

 

Informo, ainda, que, através do Edital n. 5, de 6/5/2021, do Presidente do Conselho da Justiça Federal da 3.ª Região, foi determinada a abertura de concurso destinado à remoção interna de magistrados, pelo critério da antiguidade, no qual se inscreveu o requerente (SEI n. 0274187-94.2021.4.03.8000).

 

Durante o processamento do concurso de remoção, nos termos do disposto no artigo 29, inciso III, alíneas “b” e “c”, da Resolução CJF n. 1/2008, a Subsecretaria do Órgão Especial e Plenário certificou a existência do citado PAD contra o magistrado (doc. SEI 7765887), nos seguintes termos:

 

Certifico e dou fé que, em cumprimento ao despacho (doc. 7759960/2021 - cópia do doc. 7760215), consultei o sistema informatizado de acompanhamento processual - Siapro, pelos nomes e CPF's informados na lista de inscritos (doc. 7760236), e verifiquei não constar registro de procedimentos administrativos disciplinares em tramitação ou anotação de penalidades de advertência, censura ou remoção compulsória em face dos magistrados inscritos, à exceção do Juiz Federal Edevaldo de Medeiros, que teve aplicada contra si penalidade de advertência, pelo Órgão Especial deste Tribunal, no processo administrativo disciplinar em face de magistrado nº 0029224-53.2019.4.03.8000 (PADMag 1594), sob sigilo, em sessão administrativa realizada em 25/11/2020. Certifico finalmente que o acórdão do processo administrativo disciplinar em face de magistrado nº 0029224-53.2019.4.03.8000 (PADMag 1594), transitou em julgado em 12/04/2021. (destaquei).

 

São Paulo, 11 de junho de 2021.

 

O expediente relativo ao concurso de remoção foi submetido ao crivo do Conselho da Justiça Federal da 3.ª Região que, por unanimidade, aprovou o encaminhamento dos pedidos deduzidos pelos magistrados inscritos ao Órgão Especial desta Corte para deliberação e votação, nos termos do artigo 11, inciso II, alínea "l", do Regimento Interno do TRF3R.

 

Em 14/7/2021, na sessão de julgamento do Órgão Especial, o então relator, Desembargador Federal Presidente, Mairan Maia, consignou em seu voto que o magistrado EDEVALDO DE MEDEIROS não cumpriu o requisito previsto no art. 29, inciso III, “b”, da Resolução-CJF nº 01/2008, porquanto lhe foi aplicada penalidade de advertência há menos de doze meses, obstando sua participação no presente concurso de remoção.

 

Por unanimidade, o Colegiado decidiu aprovar a movimentação funcional dos magistrados habilitados, nos termos do voto apresentado pelo relator. 

Sendo estas as informações que me cabia prestar, apresento a Vossa Excelência protestos de elevada estima e distinta consideração.” 

 

 

Em paralelo, nos autos da já citada Reclamação Disciplinar CNJ nº 0005469-90.2019.2.00.0000, a Corregedoria Nacional de Justiça foi cientificada do desfecho administrativo-disciplinar que o Órgão Especial do TRF3 emprestou ao PAD nº 0029224-53.2019.4.03.8000. Nesse contexto, em decisão exarada em 07 de março de 2021, considerando a possibilidade de instauração da Revisão Disciplinar de ofício, a gravidade atribuída pelo Órgão Censor Nacional aos fatos detectados e a possível desproporcionalidade da sanção aplicada (advertência), a então Corregedora Nacional de Justiça, Exma. Sra. Ministra Maria Thereza Rocha de Assis Moura, determinou a intimação do magistrado para oferecimento de defesa prévia, em 15 (quinze) dias, relativamente à constituição dos supostos ilícitos funcionais e à proporcionalidade da penalidade, naquilo em que houve punição. Sem adiantar o efetivo juízo sobre a responsabilidade disciplinar do magistrado, à luz dos elementos e demais provas produzidas no PAD, Sua Excelência reputou “provável que a conclusão alcançada pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região, seja naquilo que diz respeito ao desfecho típico-administrativo dos episódios levados ao seu conhecimento, seja no que condiz à proporcionalidade da sanção aplicada, não parece ter sido a mais acertada[7].

Diante da deliberação acima enfocada, dirigida à instauração da revisão disciplinar ex officio, o Magistrado Edevaldo de Medeiros apresentou as exposições defensivas na Reclamação Disciplinar CNJ nº 0005469-90.2019.2.00.0000, em 29 de março de 2021, enfocando questões preliminares, prejudiciais e meritórias que, em linhas gerais, foram reproduzidas nas revisionais ora em análise[8].

A despeito das ponderações reiteradamente externadas pelo magistrado, pautadas na concretização de nulidades e irregularidades procedimentais na condução do PAD pela Corte Local, na inobservância da coisa julgada administrativa, no suposto impedimento e/ou suspeição de testemunha, na ocorrência da prescrição e no pleno exercício da garantia insculpida no art. 41, da LOMAN, a descaracterizar qualquer falta funcional, em sessão realizada em 08 de fevereiro de 2022, o Plenário deste Conselho acompanhou o voto apresentado pela Corregedora Nacional de Justiça, à época, Exma. Sra. Ministra Maria Thereza Rocha de Assis Moura e, à unanimidade, decidiu pela instauração da revisão disciplinar, na forma do v. aresto assim ementado[9]:

 

RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. CUMPRIMENTO AO DISPOSTO NO ART. 28 DA RESOLUÇÃO N. 135/CNJ. JUIZ FEDERAL. RETARDAMENTO DA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. DESRESPEITO ÀS DECISÕES PROFERIDAS PELO TRIBUNAL SUPERIOR. VIOLAÇÃO DOS DEVERES FUNCIONAIS INSCRITOS NO ART. 35, I E III, DA LOMAN, E NO ART. 1º DO CÓDIGO DE ÉTICA DA MAGISTRATURA NACIONAL. PAD JULGADO PARCIALMENTE PROCEDENTE NA ORIGEM. APLICAÇÃO DA PENALIDADE DE ADVERTÊNCIA. REVISÃO DO PROCESSO DISCIPLINAR. RECONHECIMENTO DA PRÁTICA DE OUTRAS INFRAÇÕES DISCIPLINARES. ADEQUAÇÃO DA PENALIDADE APLICADA.

 

1. O Tribunal Regional Federal da 3ª Região, em cumprimento ao disposto no art. 28 da Resolução n. 135/CNJ, comunicou à Corregedoria Nacional de Justiça a decisão de arquivamento do procedimento administrativo disciplinar instaurado em desfavor de Magistrado.

 

2. A jurisprudência deste Conselho Nacional de Justiça admite a instauração de revisão de processo disciplinar, quando da análise das informações prestadas pelo órgão correcional local, constata-se que a decisão proferida é contrária a texto expresso da lei, à evidência dos autos ou a ato normativo do CNJ ou quando verifica-se que a sanção aplicada é inadequada ao contexto fático-probatório ventilado nos autos.

 

3. A gravidade dos fatos apurados evidencia que a condenação em relação a apenas uma das imputações, bem como a aplicação da penalidade de mera advertência, em caráter reservado, não obstante os fundamentos da decisão proferida, vindicam a necessidade de revisão da penalidade, tornando necessária a abertura de procedimento revisional para análise da constituição de eventuais ilícitos funcionais a mais e da possível adequação da sanção disciplinar ao caso dos autos, nos termos do artigo 83, inciso I, do RICNJ.

 

4. Conclusão pela necessidade de instauração, de ofício, da Revisão de Processo Disciplinar, fundada no art. 83, inciso I, do RICNJ, para verificação da necessidade de rever o desfecho típico-administrativo dos episódios narrados nos autos, bem como da adequação e proporcionalidade da penalidade aplicada ao Juiz requerido, nos termos dos arts. 82 e 86 do RICNJ.

 

Em suma, o Órgão Especial do TRF3, no julgamento do procedimento administrativo disciplinar, reconheceu a ocorrência da falta funcional em relação a um único episódio (descumprimento de acórdão prolatado em sede de Recurso em Sentido Estrito – Processo TFF3 nº 0001449-25.2016.4.03.6139) e, por corolário, julgou parcialmente procedentes as imputações, tudo culminando na aplicação da advertência ao Juiz Federal Edevaldo de Medeiros. Diante disso, o magistrado propôs a Revisão Disciplinar distribuída sob nº 0008678-96.2021.2.00.0000, questionando a imposição da aludida sanção, ao passo que o Plenário desta Casa acatou a proposta da Corregedoria Nacional de Justiça (cientificada do desfecho do PAD pela Corte Origem), no tocante à instauração do procedimento revisional de ofício, distribuído sob nº 0000749-75.2022.2.0000.

Nos termos do voto condutor do acórdão emanado deste Conselho, em juízo preliminar e de aparência, a censurabilidade dos fatos apurados no PAD evidenciam que a condenação em relação a apenas uma das imputações, assim como a aplicação da advertência em caráter reservado, nada obstante os termos da própria fundamentação externada no julgado proferido pelo TRF3, não se revelaram adequados ao contexto fático-probatório dos autos (art. 83, I, do RICNJ), sinalizando a necessidade de revisão da própria penalidade. Dito de outro modo, o Colegiado concluiu pela necessidade de instauração da medida de revisão para análise de eventual caracterização de outros ilícitos funcionais e da possível readequação da pena ao caso concreto, ou seja, enalteceu a necessidade de rever o desfecho típico-administrativo dos episódios que afloram do PAD, assim como a proporcionalidade e adequação da sanção aplicada ao Juiz Federal Edevaldo de Medeiros (arts. 82 a 86, do RICNJ).

Delimitados e contextualizados os fatos e circunstâncias que reputo essenciais para melhor compreensão da controvérsia exposta, adentrarei ao exame da questão de ordem relacionada à tramitação sigilosa dos procedimentos revisionais ora submetidos ao Plenário, dos respectivos pressupostos de admissibilidade, dos temas preliminares e prejudiciais suscitados pela defesa do magistrado e, na sequência, à análise das discussões de fundo.

 

1.    Questão de ordem. Tramitação sigilosa


Conquanto a Revisão Disciplinar nº 8678-96, proposta pelo Juiz Federal Edevaldo de Medeiros, não tenha tramitado originariamente de forma sigilosa, verifica-se que a Secretaria Processual, ao tempo da autuação da Revisão Disciplinar nº 749-75, atribuiu sigilo à referida medida, porquanto instruída com peças trasladadas da reclamação disciplinar que tramitava em caráter sigiloso (RD nº 0005469-90.2019.2.00.0000)[10]. Nesses termos, considerando a conexão entre as citadas medidas revisionais, bem assim a deliberação desta Relatoria no tocante à tramitação conjunta dos feitos, visando a unificação de procedimentos, determinei a atribuição de sigilo também à Revisão Disciplinar nº 8678-96.[11]

 

Contudo, a Resolução CNJ nº 536, editada em 07/12/2023, introduziu ao Regimento Interno desta Casa o art. 25-A, e o respectivo parágrafo único, estabelecendo que o Relator, ao receber o processo, deverá analisar a necessidade de manutenção ou atribuição de segredo de justiça ou sigilo, determinando, conforme o caso, a alteração da situação processual e/ou dos documentos encartados.  

 

Nessa conjuntura, a despeito da fase processual em que se encontram os presentes procedimentos revisionais, de modo a dar efetivo cumprimento à diretriz emanada do já citado art. 25-A, do RICNJ, verifica-se, a par do atento exame dos dados reunidos nos autos, que não se revela necessária a manutenção da tramitação sigilosa nas medidas em análise.

 

Com efeito, nada obstante a reclamação disciplinar da qual se desdobrou a RevDis 749-75 tenha tramitado de modo sigiloso (RD nº 0005469-90.2019), as peças reproduzidas tanto na citada medida revisional, quanto na RevDis 8678-96, foram extraídas do PAD que tramitou no TRF3 em face do juiz suso nominado, sendo certo que o aludido procedimento administrativo disciplinar foi instruído em grande parte com documentos que refletem a situação processual de inúmeras demandas afetas à 1ª Vara Federal de Itapeva, pois as questões de fundo envolvem as supostas irregularidades atribuídas a esse último exatamente na condução dos aludidos processos.


Por outro lado, por meio de consulta feita à movimentação das referidas demandas, efetivada por amostragem junto ao Sistema da Justiça Federal da 3ª Região, em regra, não se detectou sigilo na tramitação de tais processos, sendo digno de menção que o próprio magistrado, ao tempo da propositura da medida revisional distribuída sob nº RevDis 8678-96, não vindicou a tramitação sigilosa do feito.

 

É certo que o art. 54, da LOMAN, preconiza que o processo e o julgamento das representações e reclamações serão sigilosos, para resguardar a dignidade do magistrado. Todavia, tal diretriz, editada nos idos de 1979, não merece ser aplicada irrestritamente, pois não se vislumbra no caso concreto a presença das hipóteses que justifiquem a continuidade da tramitação sigilosa, inclusive sob o prisma do sigilo constitucional (art. 5º, LX e XXXIII, da CF/1988, art. 189, do CPC, art. 792, § 1º, do Código de Processo Penal e arts. 112, § 2º e 116, do RICNJ).

 

Vale frisar, ainda, que a publicidade relativa aos atos praticados no âmbito das presentes medidas revisionais não terá o condão de comprometer o curso das investigações, na medida em que já encerrada há tempos, aliás, no âmbito do próprio PAD originário, a fase instrutória (art. 18, da Resolução CNJ nº 135/2011), ou seja, estes autos encontram-se maduros para o efetivo julgamento, tanto que o mérito será na sequência examinado por este Colegiado.

 

De ser lembrado, apenas a título de reforço, que a era de tramitação secreta de processos e de julgamentos com portas fechadas sem justificativas ficou no passado (arts. 5º, LX, 37 e 93, IX, da CF/1988, arts. 2º, parágrafo único, V, e 46, da Lei 9.784/99 e art. 3º, da Lei 12.257/2011, e 189 do CPC). O sigilo não foi eliminado, porém, somente passou a ser admitido em hipóteses excepcionalíssimas, porquanto o já citado art. 5º, LX, da Lei Maior, é claro ao estabelecer a regra da publicidade dos atos processuais (sem diferenciar entre a seara judicial e administrativa), afastada apenas quando a defesa da intimidade das partes e/ou o interesse público e/ou social o exigirem.

 

Nesse sentido, inclusive, no julgamento do Procedimento de Controle Administrativo nº 0006453-69.2022.2.00.0000 (Rel. Conselheira Jane Granzoto, 10ª Sessão Virtual de 2023ª, julg. 30/06/2023), o Plenário deste Conselho reafirmou a compreensão na linha de que, após a promulgação da Constituição Federal em 1988, a conduta dos agentes públicos passou a ser pautada pela transparência e satisfação dos interesses da coletividade. Logo, na atual ordem, não se admite qualquer retrocesso quanto à publicidade dos atos administrativos, por se tratar de princípio basilar do Estado Democrático de Direito, alçado ao patamar dos direitos fundamentais do cidadão. 

 

Destarte, a publicidade na tramitação dos procedimentos administrativos disciplinares constitui regra geral que somente pode ser mitigada em situações excepcionais e justificadas, às quais não se amoldam o caso vertente. Desse modo, não extraindo do atento exame dos autos qualquer risco ao interesse público e/ou social, nem tampouco à preservação do direito à intimidade do magistrado representado e/ou dos demais envolvidos nos fatos que constituem objeto de averiguação neste PAD, o levantamento do sigilo na tramitação do feito é medida impositiva.

 

Determino, portanto, com fulcro no art. 25-A, do RICNJ, o levantamento do sigilo relativamente à tramitação das Revisões Disciplinares nº´s 0008678-96.2021.2.00.0000 e 0000749-75.2022.2.00.0000.

 

2.  Conhecimento/Prazo decadencial

 

Relativamente aos requisitos de interposição da revisão disciplinar, reza o RICNJ:

 

Art. 82. Poderão ser revistos, de ofício ou mediante provocação de qualquer interessado, os processos disciplinares de juízes e membros de Tribunais julgados há menos de um ano do pedido de revisão.

 

Art. 83. A revisão dos processos disciplinares será admitida:

 

I – quando a decisão for contrária a texto expresso da lei, à evidência dos autos ou a ato normativo do CNJ;

II – quando a decisão se fundar em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos;

III – quando, após a decisão, surgirem fatos novos ou novas provas ou circunstâncias que determinarem ou autorizem modificação da decisão proferida pelo órgão de origem.

 

Art. 84 O pedido de revisão de processo disciplinar será apresentado em petição escrita, devidamente fundamentada e com toda a documentação pertinente


Ademais, mediante proposição de qualquer um dos Conselheiros, do Procurador-Geral da República ou do Presidente do Conselho Federal da OAB, este Plenário deste Conselho poderá decidir, de ofício, pela instauração da revisão, na hipótese de as informações prestadas pelo Tribunal de Origem revelarem que a decisão é contrária a texto expresso de lei, à evidência dos autos ou a ato normativo e/ou constatada a inadequação e/ou desproporcionalidade da sanção. Nesses termos, dispõe textualmente o art. 86 do RICNJ:

 

Art. 86. A instauração de ofício da revisão de processo disciplinar poderá ser determinada pela maioria absoluta do Plenário do CNJ, mediante proposição de qualquer um dos Conselheiros, do Procurador-Geral da República ou do Presidente do Conselho Federal da OAB.”

 

Não se olvide, ainda, que, na hipótese de procedência do pedido revisional, com esteio no art. 88, do RICNJ, o Plenário desta Casa poderá determinar a instauração de processo administrativo disciplinar, alterar a classificação da infração, absolver ou condenar o juiz ou membro de Tribunal, modificar a pena ou anular o processo.

Por outro lado, este Conselho Nacional de Justiça já pacificou o entendimento de que o conhecimento da medida de revisão condiciona-se unicamente, ao tempo da proposição, ao cumprimento do prazo decadencial constitucional – inferior a um ano do julgamento (art. 103-B, § 4º, V, da CF/88) - e à indicação, em tese, a uma das hipóteses insculpidas no dispositivo regimental suso referido. Em caráter ilustrativo, cite-se o seguinte precedente:

 

“REVISÃO DISCIPLINAR. TEMPESTIVIDADE. PRETENSÃO DE DESCONSTITUIÇÃO DA PENA DE APOSENTADORIA COMPULSÓRIA. ART. 83, INCISOS I, II E III DO REGIMENTO INTERNO DO CONSELHO NACIONAL DA JUSTIÇA. HIPÓTESES NÃO DEMONSTRADAS. PROPORCIONALIDADE E ADEQUAÇÃO DA PUNIÇÃO DISCIPLINAR. MANUTENÇÃO DA DECISÃO DO TRIBUNAL CENSOR. REVISÃO CONHECIDA E JULGADA IMPROCEDENTE.

I – O conhecimento de Revisão Disciplinar está condicionado, exclusivamente, ao cumprimento do prazo constitucional para sua proposição e à indicação, em tese, do atendimento de uma ou mais das hipóteses previstas no art. 83 do RICNJ.

II – As hipóteses constantes dos incisos do art. 83 constituem o mérito da ação revisional, razão pela qual, caso não comprovadas, após cognição exauriente, resultará em improcedência do pedido.

III – O Acórdão condenatório não merece ser revisto porque ancorado em provas documentais, testemunhais e em termo de confissão colhidos sob o contraditório e a ampla defesa, observado rigorosamente o rito da Resolução CNJ n. 135/2011.

IV – Inexistência de fato novo capaz de desafiar a intervenção do Conselho Nacional de Justiça.

V – Aplicação de pena disciplinar adequada e proporcional à gravidade dos fatos apurados e expressamente confessos.

VI – Revisão Disciplinar conhecida e, no mérito, julgada improcedente.”

(CNJ - REVDIS - Processo de Revisão Disciplinar - Conselheiro - 0010755-83.2018.2.00.0000 - Rel. FLÁVIA PESSOA - 304ª Sessão - j. 18/02/2020)

 

 

No tocante ao prazo decadencial para propositura e/ou abertura da revisão, há precedentes desta Casa e do STF, na linha de que o termo inicial de contagem corresponde à data da publicação do acórdão no órgão oficial e/ou à data que o CNJ foi cientificado de modo inequívoco do julgamento realizado pela Corte de Origem:

 

 

“REVISÃO DISCIPLINAR. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. APLICAÇÃO DE PENA DE APOSENTADORIA COMPULSÓRIA. UTILIZAÇÃO DE “LARANJAS” PARA A CONSTITUIÇÃO DE EMPRESA.MANUTENÇÃO DE RELAÇÃO DE AMIZADE ENTRE O MAGISTRADO E AUTORIDADES PÚBLICAS DA REGIÃO E ATUAÇÃO EM PROCESSOS EM QUE CONSTAVAM COMO PARTE. FUNCIONAMENTO EM PROCESSOS EM QUE SEUS CREDORES FIGURAVAM COMO PATRONO OU PARTE.EMISSÃO DE CHEQUE SEM FUNDOS. PREJUDICIAL DE DECADÊNCIA.OCORRÊNCIA. REVISÃO DISCIPLINAR PROPOSTA APÓS O TRANSCURSO DO PRAZO PREVISTO NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E NO REGIMENTO INTERNO DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA.PRELIMINAR DE PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO DISCIPLINAR.NÃO CONHECIMENTO.QUESTÃO JÁ DECIDIDA PELO PLENÁRIO NOS AUTOS DO PCA nº 0004971-96.2016.2.00.0000.MATÉRIA JUDICIALIZADA PERANTE O STF PELO REQUERENTE.PROVA PERICIAL PRODUZIDA APÓS O JULGAMENTO DO PAD. ELEMENTO QUE NÃO SE CARACTERIZA COMO PROVA NOVA. IMPROCEDÊNCIA DA REVISÃO.

 

1. Pedido de revisão disciplinar em face de decisão do Tribunal Pleno do Tribunal de Justiça do Espírito Santo que concluiu pela aplicação da pena de aposentadoria compulsória ao magistrado que se valeu de “laranjas” para constituição de empresas, manteve relacionamento íntimo com autoridades públicas da localidade em que funcionava como juiz, atuou em processos em que seus credores figuravam como patrono ou parte sem se declarar impedido ou suspeito, e emitiu cheque sem fundos.

 

2. Revisão Disciplinar. Prazo decadencial de menos de um ano após o julgamento dos processos disciplinares para propositura. Termo a quo. Data da publicação da decisão do julgamento do processo disciplinar. Precedentes do STF. Inobservância do requisito temporal. Indeferimento do pedido revisional.

 

3. Prescrição da pretensão punitiva administrativa. Não conhecimento. Questão conhecida e decidida nos autos do PCA nº 0004971-96.2016.2.00.0000 por este Conselho. Impossibilidade de utilização da revisão disciplinar como sucedâneo recursal das decisões proferidas por este Conselho. Matéria judicializada pelo Requerente perante o STF após o julgamento do PCA nº 0004971-96.2016.2.00.0000.

 

4. Revisão Disciplinar fundada na existência de prova nova e contrariedade às evidências dos autos. Laudo pericial produzido após o julgamento do PAD. Prova que não caracteriza como nova, uma vez que apenas revisa discussão já superada nos autos do PAD acerca da capacidade de discernimento do magistrado à época dos fatos. Inadequação ao conceito de prova nova previsto nas normas processuais civil e criminal. Precedentes do STJ.

 

5. Contrariedade à evidência dos autos. Não ocorrência.

 

6. Proporcionalidade da pena aplicada.

 

7. Improcedência do pedido de revisão disciplinar.” (Revisão Disciplinar CNJ nº 0007748-20.2017.2.00.0000, Relator Fernando Mattos, 287ª Sessão Ordinária, julg. 26/03/2019)

 

 

 

“REVISÃO DISCIPLINAR. PROCEDIMENTO ARQUIVADO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. REEXAME PELO CNJ. NÃO OBSERVÂNCIA DO PRAZO CONSTITUCIONAL DE MENOS DE UM ANO. INTEMPESTIVIDADE. NÃO CONHECIMENTO.

 

1. A reclamação disciplinar cuja revisão se pretende teve a decisão de arquivamento publicada no Diário Oficial do respectivo tribunal no dia 25/7/2018. A presente revisão disciplinar, por seu turno, somente foi autuada neste Conselho no dia 5/9/2019, quando já ultrapassado o prazo constitucional estabelecido para o conhecimento da pretensão formulada.

 

2. A comunicação encaminhada à Corregedoria Nacional de Justiça, por força do disposto no art. 9º, § 3º, da Resolução CNJ nº 135/2011, não tem o condão de alterar o início do cômputo do prazo para a apresentação do processo de revisão disciplinar neste Conselho. Intempestividade.

 

3. Revisão disciplinar não conhecida.” (Revisão Disciplinar CNJ nº 0006716-09.2019.2.00.0000, Relator André Godinho, 340ª Sessão Ordinária, julg. 19/10/2021)

 

 

“MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. ATO DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. REVISÃO DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR INSTAURADO CONTRA MAGISTRADO POR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. 1. O prazo estabelecido no art. 103-B, § 4º, inc. V, da Constituição da República para o Conselho Nacional de Justiça rever processo disciplinar instaurado contra magistrado começa a fluir da publicação da decisão do Tribunal de Justiça em órgão oficial. 2. O Conselho Nacional de Justiça não está compelido a aplicar ao magistrado a pena sugerida na representação. Precedentes. 3. Segurança denegada.” (MS nº 26.540, Segunda Turma, Rel. Min. Cármen Lúcia, DJe de 1º/8/14)

 

“Agravo regimental em mandado de segurança. 2. Direito

Constitucional. 3. Conselho Nacional de Justiça. 4. Preliminar de decadência do direito à impetração do mandado de segurança. Inocorrência. 5. Decurso de prazo decadencial para a exercer a revisão, de ofício ou por provocação, de processos disciplinares de juízes ou membros de tribunais. Art. 103-B, § 4º, V, da Constituição. Precedentes. 6. Termo inicial contado da ciência do acórdão do Tribunal a quo. 7. Argumentos insuficientes para infirmar a decisão agravada. 8. Agravo regimental a que se nega provimento.” (MS nº 36.144-AgR Segunda Turma, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJe de 19/5/20).

 

 

 

Na hipótese concreta, o julgamento do processo administrativo disciplinar no âmbito do Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região foi concluído em 25 de novembro de 2020, consoante detalhamento lançado na certidão de lavrada pela Secretaria daquele Colegiado[12]. Por sua vez, a disponibilização do acórdão no DEJT ocorreu em 17 de março de 2021 e, portanto, considerado publicado em 18 de março de 2021 (art. 4º, §§ 3º e 4º, da Lei nº 11.419/2006)[13], ao passo que o trânsito em julgado, a teor do relatado pelo TRF3, concretizou-se em 12 de abril de 2021[14]

Expostas tais premissas, considerando a publicação do acórdão condenatório proferido pelo TRF3 em 18 de março de 2021 e o pedido de revisão disciplinar protocolizado pelo Juiz Federal Edevaldo de Medeiros em 24 de novembro de 2021 (RevDis 8678/96), denota-se que foi atendido o lapso temporal constitucionalmente exigido para a admissão do feito, sem que tenha se operado a decadência do direito de pleitear a desconstituição da decisão proferida pelo Órgão Especial do TRF3.

Nesse mesmo contexto, não merece acatamento a argumentação exposta pela defesa do magistrado, na linha de que este Conselho Nacional de Justiça teria violado o prazo constitucionalmente previsto para a instauração da revisão disciplinar de ofício (RevDis 749-75), tomando-se por início da contagem o dia da sessão de julgamento do PAD pelo TRF3 (25/11/2020), nem tampouco fundado na tese de que o desfecho do feito disciplinar teria sido levado à cognição do Órgão Censor Nacional em 18 de janeiro de 2021.

É que, os elementos dos autos levam à asserção de que a Corregedoria Nacional de Justiça foi formalmente comunicada quanto ao trâmite do julgamento efetivado pelo TRF3 a partir de 12 de fevereiro de 2021. Na citada ocasião, foi recebido e encartado aos autos da RD 5469-90 (autuada para monitoramento das investigações relacionadas ao PAD) o expediente encaminhado ao Órgão Censor Nacional pela Relatora do processo administrativo disciplinar, Exma. Sra. Desembargadora Marisa Santos (Ofício nº 3/CORE), sendo digno de nota que o aludido ofício foi subscrito eletronicamente pela citada magistrada federal somente na data anterior (11 de fevereiro de 2021)[15].

Inócuas as tratativas defensivas embasadas no teor do Ofício nº 1/GABMS, datado de 18 de janeiro de 2021, pois o citado expediente, em verdade, foi juntado ao Pedido de Providências nº 0010014-09.2019.2.00.0000, de modo que o respectivo conteúdo foi posteriormente replicado no Ofício nº 3/CORE, acostado à supramencionada Reclamação Disciplinar nº 0005469-90.2019.2.00.0000, repita-se, somente em 12 de fevereiro de 2021. Ademais, conforme registrado em ambos os expedientes, estavam pendentes de juntada as declarações de voto dos Excelentíssimos Senhores Desembargadores Federais Nery Jr e Baptista Pereira, as quais seriam encaminhadas ao Órgão Censor Nacional, juntamente com o respectivo acórdão, assim que fossem encartadas aos autos do PAD[16]. Logo, não parece razoável concluir que este Conselho, já em 18/01/2021, tenha sido cientificado adequadamente – e de forma inequívoca - quanto ao inteiro teor do v. acórdão do TFF3.

Noutros dizeres, não prospera a linha da defesa de que a ciência inequívoca do CNJ quanto ao julgamento do PAD ocorreu por força do expediente anexado a expediente diverso (desacompanhado, aliás, da integralidade de documentos relevantes e indispensáveis à ampla e adequada compreensão dos fatos). Parece-me razoável concluir que a ciência do julgamento do processo administrativo disciplinar pelo TRF 3, para fins de abertura da revisão disciplinar, concretizou-se nos autos do procedimento que a ele deu ensejo (RD nº 0005469-90), e isso em 12/02/2021.

Em suma, deflui do acervo probatório ter sido a Corregedoria Nacional de Justiça comunicada formalmente em 12 de fevereiro de 2021 quanto ao resultado do julgamento do PAD e, na sequência, ordenado a intimação do juiz requerido para apresentação de defesa quanto à possível instauração do procedimento de revisão ex officio em 07 de março de 2021. Por sua vez, o acórdão condenatório do TRF3 foi disponibilizado no DEJT em 17 de março de 2021, ao passo que a autorização para instauração da medida revisional ocorreu na sessão de 08 de fevereiro de 2022.

Nessa senda, à luz da jurisprudência oriunda do STF, já acima enfocada, a dinâmica dos fatos envolvendo o caso concreto, consideradas as relevantes datas anteriormente delineadas, não permite concluir pela ocorrência da alegada decadência, pois não exaurido o prazo de até 1 (um) ano conferido ao Plenário deste CNJ para que possa rever, de ofício, os processos disciplinares de juízes e membros de tribunais.

Em verdade, a questão ora em análise já se mostra superada, a teor do decidido pelo STF na suprareferida Ação Mandamental nº 38.602-DF, impetrada pelo Juiz Federal Edevaldo de Medeiros contra o ato deste Conselho que autorizou a deflagração da revisão disciplinar de ofício (RevDis 749-75). Com efeito, a par dos elementos dos autos e da consulta ao sítio eletrônico do STF, denota-se que o mencionado writ foi indeferido sumariamente pelo DD. Relator, Exmo. Sr. Ministro Dias Toffoli, ao entendimento de que inexistiu a propalada violação ao prazo previsto constitucionalmente para a instauração da revisão disciplinar e, portanto, qualquer evidência de ilegalidade ou abuso de poder à atuação do Conselho Nacional de Justiça. De conseguinte, Sua Excelência assentou que, à míngua dos requisitos legais a fundamentar a impetração, resultava inviável o prosseguimento da medida, pelo que negou seguimento àquele mandado de segurança, reputando prejudicada a análise do pedido liminar (art. 21, § 1º, do RISTF).

Note-se, ainda, que a decisão monocrática em questão foi referendada pela 1ª Turma do STF, que negou provimento ao Agravo Regimental interposto pelo magistrado impetrante e, na sequência, aos Embargos Declaratórios opostos em face do v. acórdão que havia negado provimento ao apelo, operando-se o trânsito em julgado em 22/03/2023. Eis o teor da ementa extraída do julgamento dos Embargos Declaratórios em Agravo Regimental no MS nº 38.602-DF[17]:

 

Embargos de declaração em agravo regimental em mandado de segurança. Inexistência de omissão ou contradição a serem sanadas. Embargos declaratórios rejeitados.

 

1. Solução do presente mandamus suficientemente fundamentada e amparada nos documentos juntados aos autos e na jurisprudência do STF. In casu, não houve o decurso do prazo de 1 (um) ano entre a data na qual o CNJ tomou ciência inequívoca do julgamento realizado pelo TRF da 3ª Região e a data em que foi autorizada a instauração da revisão disciplinar pelo Plenário do Conselho.

2. Inexistência dos vícios previstos no art. 1.022 do Código de Processo Civil.

3. Embargos de declaração rejeitados.

 

Relativamente ao enquadramento, em tese, da situação dos autos às hipóteses descritas no art. 83, do RICNJ, verifica-se pela leitura da peça vestibular da RevDis 0008678-96 que o juiz requerente remeteu ao preenchimento dos requisitos inseridos nos incisos I, II e III, do aludido dispositivo normativo, apresentando narrativa devidamente fundamentada, pelo que tal exame atrela-se ao próprio mérito da citada medida revisional. De outra banda, a sobredita medida de revisão também foi instruída com a documentação pertinente, extraída do procedimento administrativo disciplinar que tramitou no TRF3, em obediência aos termos dos arts. 84 e 85, do RICNJ.

Por fim, consoante já amplamente salientado, a instauração da RevDis 0000749-75, de ofício, foi autorizada por expressa deliberação do Colegiado, em plena consonância com a diretriz perfilhada pelos arts. 86 e 88, do RICNJ, acatando-se a tese levantada pelo Órgão Censor Nacional, no sentido de que a evidência dos autos originários leva à conclusão de que desfecho do PAD no TRF3 amolda-se à hipótese do art. 83, I, deste RICNJ – a justificar possível redimensionamento da sanção.

Logo, cumpridos os requisitos constitucional e normativos e, diante do completo entrelaçamento entre os temas versados, assoma imperativo o conhecimento conjunto das medidas revisionais em seu âmago, o que ora se faz.

 

3. Questões preliminares levantadas pela defesa do Juiz Federal Edevado de Medeiros


3.1 Negativa de prestação jurisdicional


Bate-se a defesa na arguição de nulidade de instauração do próprio PAD, sustentando que o v. acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região (aresto nº 7517033/2021) em 25/11/2020, no julgamento do Processo Administrativo Disciplinar – PAD SEI nº 0029224-53.2019.4.03.8000, incorreu em negativa de prestação jurisdicional. Sustentou que a alegada inobservância da preclusão consumativa, com consequente violação à coisa julgada administrativa, em relação aos fatos já anteriormente analisados no expediente administrativo-disciplinar SEI nº 045326-24.2017.4.02.8000 (derivado da Correição Parcial nº 0042082-87.2017.4.03.8000)[18], deixou de ser efetivamente apreciada pelo Órgão Especial do TRF-3. Reputou “genérico” o argumento lançado no voto condutor da decisão colegiada, de lavra da Relatora, Exma. Sra. Desembargadora Federal Marisa Ferreira dos Santos, no sentido de que a coisa julgada constituiria matéria já apreciada e afastada por ocasião da ordem de abertura do PAD, considerando que tal questão prejudicial, na verdade, não teria sido examinada pelo Órgão Especial naquele momento (Sessão de 12/02/2020).

No tocante à alegada inobservância da coisa julgada administrativa, o já citado acórdão nº 7517033/2021, afastou textualmente as ponderações preliminares da defesa, nos seguintes termos (fls. 70/80, pdf /crescente, id 4549865)[19]:

 

“(...)

 

“E M E N T A

 

DIREITO ADMINISTRATIVO. INFRAÇÃO DISCIPLINAR. JUIZ FEDERAL. NULIDADES NO DECORRER DO TRANSCURSO DO PAD. INEXISTÊNCIA. PRELIMINARES NÃO ACOLHIDAS.

 

(...)

 

1. Nulidade da sessão de julgamento que determinou a instauração do PAD, por violação do direito de audiência, da coisa julgada administrativa e do impedimento de 02 (dois) desembargadores em razão dos fatos julgados, não configurada. Matérias devidamente apreciadas e afastadas pelo próprio Órgão Especial do Tribunal quando da abertura de procedimento administrativo contra o representado. Preliminar rejeitada.

 

(...)”

 

Como se verifica, embora de modo sucinto, o v. aresto explicitou as razões de convicção do Órgão Especial do TRF3, com o registro assertivo de que a nulidade aventada pelo magistrado, inclusive sob o ponto de vista da propalada ofensa à coisa julgada administrativa, não restou configurada. Nesse sentido, convém lembrar que a ratio legis do comando inserido no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal é permitir o conhecimento dos motivos que levaram o (a) julgador (a) à determinada conclusão, viabilizando, assim, que as partes e/ou os terceiros juridicamente interessados que se sintam prejudicados, possam aviar as medidas processuais cabíveis.

Em outras palavras, colhe-se do trecho acima reproduzido, repita-se, a manifestação taxativa do Órgão Especial do TRF3 sobre a suposta nulidade processual, sendo certo que eventual equívoco nas razões expostas no acórdão e/ou o fato de o Tribunal não haver se expressado como pretendia o magistrado no julgamento do processo administrativo disciplinar, por si só, não converge à propalada nulidade, devendo ser salientado que a questão processual de fundo (preclusão/coisa julgada administrativa) será submetida ao amplo e criterioso exame do Plenário deste Conselho (item 3.3, subsequente), ainda que pela via da revisão disciplinar (art. 103-B, § 4º, inc. V, da CRFB e art. 82, RICNJ), afastando, sob tal perspectiva, qualquer prejuízo aos interesses defensivos.

Mesmo que assim não fosse, independentemente da correção ou não da premissa lançada no acórdão em referência, no sentido que se tratava de matéria já apreciada e dirimida por ocasião do julgamento da representação ofertada pelo Ministério Público Federal (resultando na instauração do PAD) - considerando que, à luz da argumentação inicial, o Órgão Especial daquela Corte, na fase prévia à deflagração do processo administrativo disciplinar, não teria se pronunciado especificamente sobre alegada nulidade (acórdão nº 5526677/2020)[20] - certo é que o magistrado não cuidou de manejar oportunamente o remédio jurídico adequado ao saneamento da suposta omissão, seja por ocasião do julgamento da medida embrionária da qual derivou o PAD, seja ao tempo da apreciação do próprio feito disciplinar, o que faria incidir a preclusão e, portanto, sob tal perspectiva, também mereceria ser rechaçada a propalada nulidade.

Em reforço de argumentação, vale acrescentar que o magistrado chegou a apresentar o Procedimento de Controle Administrativo nº 0004577-50.2020.2.00.0000, por intermédio do qual questionava a legalidade da instauração do processo administrativo disciplinar pelo TRF3. Consoante se depreende da consulta ao PJe e da ementa ora reproduzida, a Relatora do sobredito PCA nº 4577-50, Eminente Conselheira Maria Teresa Uille Gomes, decretou a improcedência da pretensão (art. 25, X, do RICNJ), sendo certo que o Colegiado referendou tal conclusão, ao negar provimento ao Recurso Administrativo ali ofertado, reconhecendo a legitimidade do PAD deflagrado no Tribunal de Origem:

 

 

RECURSO ADMINISTRATIVO EM PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO. INSTAURAÇÃO DE PAD EM FACE DE MAGISTRADO. IRREGULARIDADES. INOCORRÊNCIA. RECURSO IMPROVIDO.

 

1. Procedimento em que se requer o controle de ato do Tribunal Regional Federal da 3ª Região que determinou a abertura de processo administrativo disciplinar em face de magistrado, por suposta violação de preceitos da LOMAN e Código de Ética da Magistratura Nacional.

 

2. Os argumentos suscitados pelo requerente não contêm a densidade jurídica necessária a infirmar a deliberação do TRF3, tampouco a atrair a intervenção do CNJ. A decisão do Tribunal está fundamentada e lastreada em fatos concretos e delimitados, de modo que PAD se mostra o instrumento adequado para o aprofundamento da apuração da suposta infringência aos deveres da magistratura.

 

3. É firme entendimento do Conselho Nacional de Justiça de que a interferência em processos disciplinares instaurados no âmbito dos Tribunais somente se justifica quando comprovada a presença de vícios insanáveis, hipótese não identificada nos autos.

 

4. Recurso a que se nega provimento.

 

 

Destarte, sob qualquer ângulo de análise, deve ser repelida a arguição de nulidade por negativa de prestação jurisdicional.

 

 

3.2  Violação ao direito de audiência. Nulidade da sessão de julgamento da medida disciplinar originária. Vedação ao comparecimento pessoal do magistrado requerente

 

Ainda na seara preambular, a defesa do Juiz Federal Edevaldo de Medeiros argui violação ao "direito de audiência", ao relato de que lhe foi vedado o comparecimento pessoal à sessão de julgamento da medida embrionária que culminou na instauração do processo administrativo disciplinar no Tribunal de Origem, concretizada em 12 de fevereiro de 2020 (PAD-SEI nº 0029224-53.2019.4.03.8000), o que teria inviabilizado que se fizesse presente àquele ato para o exercício do seu amplo direito de defesa.

À análise.

Inicialmente, vale repisar que a reclamação disciplinar que tramitou perante a Corregedoria do Tribunal Regional da Federal da 3ª Região - da qual se desdobrou o Processo Administrativo Disciplinar – PAD SEI nº 0029224-53.2019.4.03.8000 - foi apreciada na sessão realizada em 12/02/2020, Na ocasião, o Órgão Especial do TRF3 acolheu a proposta de abertura do PAD, na esteira do voto apresentado pelo então Corregedor Regional da Justiça Federal da 3ª Região, Exmo. Sr. Desembargador Federal Carlos Muta, acatando a ampla representação ofertada pelo Ministério Público Federal, no bojo da qual foram atribuídas ao Magistrado Edevaldo de Medeiros a prática das supostas e vastas irregularidades funcionais anteriormente explicitadas, indicativas de ofensa ao art. 35, incs. I e III, da LOMAN[21].

Extrai-se, ainda, dos elementos dos autos, que o Juiz Federal Edevaldo de Medeiros, cientificado do processamento daquela reclamação disciplinar, apresentou as suas informações de índole defensiva, além do que, em 04/12/2019, foi intimado da sessão de julgamento originariamente designada para 11/12/2019, tanto que em 09/12/2019 solicitou autorização de afastamento das funções jurisdicionais no lapso compreendido entre os dias 09/12/2019 e 11/12/2019. Pontuou, à época, que "a razão de se pedir os dois dias anteriores à data de julgamento, é a distância que separa Itapeva da Capital, 290 km, onde o julgamento se realizará e lugar em que este juiz tenciona contratar defesa técnica qualificada".

Na ocasião, Sua Excelência também justificou a pretensão alegando que teria ocorrido um equívoco de avaliação, pois "esperava pelo arquivamento da representação ou um prazo maior entre a comunicação e a data da sessão de julgamento no OE", requerendo, nesses termos, "autorização" para  que se "ausentasse" do "trabalho" entre "os dias 9 e 11 deste mês, ou o adiamento do julgamento para a próxima sessão do OE.", o que restou indeferido pela Exma. Sra. Juíza Auxiliar do Órgão Censor local[22].

Por outro lado, em 10/12/2019, o requerente reiterou o pedido de adiamento do julgamento, noticiando que apenas em referida data a "defesa técnica" havia ingressado nos autos, de modo que, diante do indeferimento do pedido de afastamento no período de 09/12/2019 a 11/09/2019, não teria sido possível "se reunir pessoalmente para discussão do caso e preparação de audiência", sendo certo que o então Corregedor Regional da Justiça Federal da 3ª Região, Exmo. Sr. Desembargador Federal Carlos Muta, em despacho de 10/12/2019, acabou por deferir o adiamento do julgamento do expediente disciplinar, por uma sessão, registrando que a apresentação do feito se daria em mesa, na próxima sessão do colegiado, independentemente de nova intimação.

Diante do contexto acima delineado, não se vislumbra nem sequer remotamente a propalada nulidade, pois o indeferimento do pedido de ausência aos trabalhos jurisdicionais e o fato de a defesa técnica haver ingressado nos autos da medida disciplinar às vésperas da data originária do respectivo julgamento, isoladamente não autorizam a conclusão de que o juiz requerente, em efetivo, estivesse impedido de comparecer à sessão. Ademais, o próprio magistrado, anteriormente, já havia ofertado a sua defesa prévia em 02/10/2019 - após a Corregedoria Regional do TRF3 lhe conceder o prazo dilatado de 30 (trinta) dias para apresentação da aludida peça processual[23], o que faz incidir o teor da Súmula Vinculante nº 05, do STF, no sentido de que a falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não reflete, por si só, a hipótese de violação à ampla defesa.

Repise-se, ainda que o pedido sucessivo de adiamento foi acatado pela Corregedoria do Tribunal de Origem[24], tanto que o processo administrativo disciplinar somente foi instaurado pelo Órgão Especial da Corte Federal Originária na sessão realizada em 12/02/2020[25], o que afasta derradeiramente a alarmada ofensa à ampla defesa, sucumbindo por completo a arguição de nulidade, dada a ausência de qualquer prejuízo à parte então requerida.

Por derradeiro, reporto-me, uma vez mais, aos fundamentos emanados da decisão colegiada exarada no PCA nº 0004577-50.2020.2.00.0000, que ratificou a decisão da Conselheira Relatora quanto à inexistência de vícios na deliberação do Órgão Especial do TRF3, ordenando a instauração do PAD.

Afasto.


3.3 Preclusão consumativa. Ofensa à coisa julgada administrativa e à segurança jurídica

 

Discorre a defesa que o Tribunal Regional Federal da 3ª Região desconsiderou a preclusão consumativa, violando a coisa julgada administrativa e, via de consequência, o princípio da segurança jurídica. Sob tal viés, sustenta a identidade de objeto do Processo Administrativo Disciplinar SEI nº 0029224- 53.2019.4.03.8000, ora sob revisão, e do expediente disciplinar SEI nº 045326-24.2017.4.03.8000 (derivado da Correição Parcial SEI nº 0042082-87.2017.4.03.8000), no bojo do qual restou afastada a hipótese de ilícito funcional no tocante ao mesmo contexto fático (suposto descumprimento do acórdão prolatado pelo TRF-3 no âmbito de recurso em sentido estrito), culminando na decisão de arquivamento pela Corregedoria Regional, com posterior referendo do Corregedor Nacional de Justiça no Pedido de Providências nº 0001145-91.2018.2.00.0000.

Examino.

Por primeiro, à luz dos elementos trazidos aos autos, cabe esclarecer que o expediente disciplinar SEI nº 045326-24.2017.4.03.8000, que tramitou perante a Corregedoria do TRF-3, foi autuado em cumprimento ao v. acórdão proferido na Correição Parcial SEI nº 0042082-87.2017.4.03.8000, emanado do Conselho da Justiça Federal da 3ª Região. Por intermédio da mencionada medida correicional, redigida em 06 de novembro de 2017, o Ministério Público Federal noticiou a prática de decisões abusivas e tumultuárias pelo requerente, indicativas de que o magistrado recalcitrava em cumprir o v. aresto proferido pelo TRF-3 no Recurso em Sentido Estrito nº 0001449-25.2016.4.03.6139 (Inquérito Policial nº 001359-17.2016.4.03.6139), relativamente à ordem de expedição e ao cumprimento de mandado de busca e apreensão de elementos de informação junto ao domicílio do investigado, Sr. Paulo Henrique Simões[26].

Assim, na 423ª sessão realizada em 16 de novembro de 2017, o Conselho da Justiça Federal da 3ª Região, por maioria, nos termos dos votos apresentados pelos Exmos. Srs. Desembargadores Federais Mairan Maia e Toru Yamamoto, conheceu parcialmente da Correição Parcial interposta pelo Parquet e, na parte conhecida, deu-lhe parcial provimento, determinando-se a expedição imediata de mandado de busca e apreensão junto ao domicílio do Sr. Paulo Henrique Simões, conforme requerido pelo MPF, com a ordem de que fosse prorrogada tal diligência quantas vezes se fizessem necessárias até o seu integral cumprimento, sob pena de desobediência (art. 330, do Código Penal). Registrou-se, ainda, no voto divergente lavrado pelo Exmo. Sr. Desembargador Federal Toru Yamamoto, que tal deliberação deveria ser cumprida “sem prejuízo de eventuais providências cabíveis no âmbito da Corregedoria Regional em face do magistrado”, pois esse último vinha “se mostrando recalcitrante” em “não cumprir” as ordens daquela Eg. Corte Regional, “comportando-se como membro deste Tribunal fosse, usurpando, voluntária ou involuntariamente, suas funções jurisdicionais[27].

Nesse contexto, foi instaurado e processado na Corregedoria local o expediente disciplinar - Processo SEI nº 0045326-24.2017.4.03.8000, com vistas à verificação da conduta do Juiz Federal Edevaldo de Medeiros na condução do feito de reg. nº 0001359-17.2016.4.03.6139, no que atine às ocorrências relacionadas à revogação, pelo titular da 1ª Vara de Itapeva, de decisão anteriormente prolatada no processo por magistrado substituto, à época em exercício na unidade judiciária, fazendo-o sem provocação das partes para tanto; e à aventada recalcitrância no  cumprimento de acórdão proferido por este Tribunal no Recurso em Sentido Estrito nº 0001449-25.2016.4.03.6139. Sobreveio, ao final, a r. decisão monocrática da então Corregedora Regional (Decisão nº 3469889/2018 - CORE), Exma. Sra. Desembargadora Federal Therezinha Astolphi Cazerta, de 28 de fevereiro de 2018, pelo arquivamento do supracitado expediente, porquanto não caracterizada, na sua compreensão, a hipótese de infração de cunho administrativo ou ilícito penal.

 

Prosseguindo, comunicou-se o inteiro teor da decisão acima referenciada a este Conselho Nacional de Justiça, na forma do § 3º, do artigo 9º da Resolução CNJ nº 135/2011, instaurando-se na esfera da Corregedoria Nacional de Justiça o Pedido de Providências nº 0001145-91.2018.2.00.0000. Desse modo, o Corregedor Nacional de Justiça, à época, Exmo. Sr. Ministro João Otávio de Noronha, em 03 de maio de 2018, acabou por referendar a decisão da corregedoria regional, arquivando o expediente, nos seguintes termos (fl. 2278, id 4550203, pág. 199/200, Revdis 8678-96).

Por outro vértice, nos moldes já reiteradamente explicitados, o Processo Administrativo Disciplinar - PAD SEI nº 0029224-53.2019.4.03.8000, aqui sob revisão, deflagrado por deliberação do Órgão Especial do TRF-3, a partir da representação disciplinar ofertada pelo Ministério Público Federal, examinava um amplo cenário de supostas irregularidades que envolveram a atuação do Juiz Edevaldo de Medeiros perante a 1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Itapeva/SP, atrelando-se, entre outros aspetos, à “anulação e reforma de ofício de decisões proferidas por magistrado substituto; rejeição sistemática de denúncias sem motivação jurídica exata e razoável, inclusive após o encerramento da instrução processual; anulação de prisões e provas decorrentes de abordagem realizada pela polícia, pelo simples fato de ter sido realizada por agente público de policiamento ostensivo, sem demonstração de patente ilegalidade; além de atraso no andamento dos processos[28].

Não é ocioso repisar, ainda, para fins de contextualização, que o v. aresto condenatório proferido no supracitado Processo Administrativo Disciplinar - PAD SEI nº 0029224-53.2019.4.03.8000, afastou as irregularidades atribuídas ao magistrado na representação em virtude de diversas condutas apontadas pelo Parquet, reconhecendo a prática de infração funcional tão somente em razão do descumprimento da decisão exarada pela 11ª Turma do TRF no julgamento do em Sentido Estrito nº 0001449-25.2016.4.03.6139 (Inquérito Policial nº 001359-17.2016.4.03.6139).

Diante do cenário acima delineado, observa-se que o conteúdo do Processo Administrativo Disciplinar SEI nº 0029224-53.2019.4.03.8000 revela-se muito mais abrangente que aquele versado no expediente disciplinar que tramitou perante a Corregedoria Regional - Processo SEI nº 0045326-24.2017.4.03.8000 (derivado da correição parcial outrora ofertada pelo MPF), o que de plano já fragiliza a alegada ofensa ao instituto da coisa julgada administrativa, diante da notória disparidade de objetos entre os procedimentos em apreço. Paralelamente, ainda que se vislumbre a similitude e/ou a coincidência entre o conteúdo tratado no expediente disciplinar SEI nº 0045326-24.2017.4.03.8000) e parte do objeto averiguado no Processo Administrativo Disciplinar SEI nº 0029224-53.2019.4.03.8000 (relacionado ao descumprimento do acórdão prolatado em recurso em sentido estrito), o primeiro foi arquivado por decisão monocrática da Corregedoria Regional e, portanto, não congrega os atributos indispensáveis à formação da coisa julgada administrativa, de modo a inviabilizar o exame colegiado da questão em sede de processo administrativo disciplinar.

A jurisprudência cristalizada neste Conselho Nacional de Justiça é exatamente na direção de que o arquivamento dos procedimentos prévios, por força de decisão monocrática do Órgão Censor local, não converge à concretização da coisa julgada administrativa. Eis os precedentes:

 

 

REVISÃO DISCIPLINAR. DECISÃO MONOCRÁTICA DE CORREGEDOR-GERAL DE JUSTIÇA. ARQUIVAMENTO DE REPRESENTAÇÃO FORMULADA CONTRA JUÍZA DE DIREITO. SUPOSTO DESCUMPRIMENTO DOS DEVERES INSCRITOS NA LOMAN E NO CÓDIGO DE ÉTICA DA MAGISTRATURA NACIONAL. INEXISTÊNCIA DE COISA JULGADA ADMINISTRATIVA. NÃO CONHECIMENTO DO PEDIDO DE REVISÃO DISCIPLINAR. RECEBIMENTO COMO PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO, TENDO COMO ATO IMPUGNADO A DECISÃO MONOCRÁTICA DE ARQUIVAMENTO PROFERIDA PELA CORREGEDORIA LOCAL. PRECEDENTES DO CNJ. DEVIDA DILIGENCIA DA CORREGEDORIA LOCAL NA INSTRUÇÃO. DECISÃO FUNDAMENTADA SOBRE O DESFECHO DA REPRESENTAÇÃO. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE NA APURAÇÃO E CONSEQUENTE DETERMINAÇÃO DE ARQUIVAMENTO. RECURSO ADMINISTRATIVO SEQUER AVIADO NA ORIGEM. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. (Revisão Disciplinar 0001338-14.2015.2.00.000, Cons. rel. Norberto Campelo, 34ª Sessão Extraordinária, j. em 14/02/2017)

 

 

REPRESENTAÇÃO. DECISÃO MONOCRÁTICA. ARQUIVAMENTO. COISA JULGADA ADMINISTRATIVA. INOCORRÊNCIA. REVISÃO DISCIPLINAR. NÃO CABIMENTO. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. DESCONSTITUIÇÃO DA DECISÃO. DELIBERAÇÃO PELO ÓRGÃO COLEGIADO COMPETENTE. NECESSIDADE.

1. A decisão monocrática pelo arquivamento de reclamação disciplinar ao fundamento de que há falta funcional a ser apurada não pode ser desconstituída por meio de Revisão Disciplinar, uma vez que não se tem presente a coisa julgada administrativa a ser desconstituída. Precedentes do CNJ. 

2. A existências de críticas e comentários desairosos à atuação do Ministério Público desnecessários ao julgamento de Ação Civil Pública pode configurar quebra do dever de urbanidade e excesso de linguagem por parte do magistrado que proferiu a decisão.

3. Recebimento do feito como Procedimento de Controle Administrativo, o qual se julga procedente para desconstituir decisão da Corregedoria Geral de Justiça local, determinando que o procedimento seja submetido à deliberação colegiada para instauração ou não de Processo Administrativo Disciplinar. (Revisão Disciplinar 0006919-15.2012.2.00.0000, Cons. rel. Jorge Hélio Chaves de Oliveira, j. em 14/5/2013).

 

 

RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. DECISÃO MONOCRÁTICA. ARQUIVAMENTO. PROVIDÊNCIAS INSTRUTÓRIAS. NÃO EXAURIMENTO. COISA JULGADA ADMINISTRATIVA. INOCORRÊNCIA. REVISÃO DISCIPLINAR. NÃO CABIMENTO. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. DESCONSTITUIÇÃO DA DECISÃO. AVOCAÇÃO DA RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR (ART. 79 E SEGS. DO RICNJ).

 

1. A decisão monocrática pelo arquivamento de reclamação disciplinar sem apreciação do mérito, ao fundamento de que não existiam os elementos de justa causa para, sequer, a apuração dos fatos por meio de sindicância, não pode ser desconstituída por meio de Revisão Disciplinar, porquanto, à exemplo do que se dá com a Revisão Criminal, não se tem presente a coisa julgada administrativa a ser desconstituída. Precedentes do CNJ.

 

2. No caso dos autos, identifica-se, em tese, a anatomia da falta funcional praticada no exercício da jurisdição, ou de um modus operandi comum às situações que recentemente vêm chegando a conhecimento deste Conselho, consubstancia  nos seguintes elementos: a) afronta ao princípio do juiz natural, seja pela manipulação da distribuição ou pela inobservância de regras de fixação de competência; b) concessão de medidas de urgência de caráter satisfativo envolvendo levantamento, repasse ou liberação de valores vultosos; c) tentativa de defesa do ato com base na independência funcional do magistrado e princípio do livre convencimento motivado.

 

3. Não exauridas as providências instrutórias de investigação de fatos que denotam grave falta funcional, cabe ao Conselho Nacional de Justiça exercer o controle administrativo da decisão que, de forma antecipada, arquivou o procedimento apuratório preliminar, máxime quando, pelo que consta dos autos, juízes de direito, flagrantemente incompetentes para apreciar pedido de alteração do valor do repasse do Fundo de Participação dos Municípios, proferem tutela antecipada, em prejuízo ao Tribunal de Contas da União, que detém a competência para definir os coeficientes de repasse de arrecadação ao Tesouro Nacional e ao Banco do Brasil, e aos demais Municípios do Estado do Amazonas que tiveram os seus coeficientes afetados, e, ademais disso, demoram em enviar os autos para a Justiça Federal, fatos que merecem ser melhor examinados.

 

4. Recebimento do feito como Procedimento de Controle Administrativo, ao qual se julga procedente para desconstituir decisão da Corregedoria-Geral de Justiça local, determinando remessa dos autos para a Corregedoria Nacional de Justiça, em avocação, uma vez que demonstrada, no Tribunal de origem, ausência de diligência para a ampla apuração dos fatos (art. 79 e segs. do RICNJ).

 

(CNJ - REVDIS - Processo de Revisão Disciplinar - Conselheiro - 0000483-45.2009.2.00.0000 - Rel. Walter Nunes da Silva Júnior - 111ª Sessão - j. 31/08/2010)

 

 

Dessa forma, considerando que a decisão de arquivamento exarada pela Corregedoria Regional do TRF-3 no expediente apuratório que tramitou anteriormente à deflagração do PAD (Processo SEI nº 0045326-24.2017.4.03.8000) não se mostra acobertada pelo manto da coisa julgada administrativa, inexistia qualquer entrave jurídico-processual ao exame da imputação envolvendo o descumprimento do acórdão regional  (Recurso em Sentido Estrito nº 0001449-25.2016.4.03.6139) pelo Órgão Especial do TRF-3, na condição de Órgão Colegiado competente para o julgamento do feito disciplinar e aplicação da correspondente sanção administrativa.

Dito de outro modo, não havia óbice ao reexame da matéria – como de fato ocorreu – na esfera da reclamação disciplinar, a qual acabou por ser acolhida, tudo culminando na instauração do processo administrativo disciplinar.

 

Igualmente rejeito.

 

3.4 Impedimento dos Desembargadores que participaram do julgamento de Correição Parcial interposta anteriormente à instauração do PAD

 

Em suas exposições preliminares, o Juiz Federal Edevaldo de Medeiros insiste na concretização de nulidade, apontando o impedimento de 02 (dois) magistrados, seja para participação na deliberação colegiada que culminou na instauração do processo administrativo disciplinar, seja para fins de julgamento do próprio mérito do PAD  - Excelentíssimos Senhores Desembargadores Federais Toru Yamamoto e Therezinha Astolphi Cazerta -, pois ambos teriam examinado alguns dos fatos que constituíram objeto do feito disciplinar (considerada a participação no julgamento da já citada Correição Parcial nº 0042082-87.2017.4.03.8000, da qual teria se desdobrado o Processo SEI nº 045326-24.2017.4.03.8000).

Obtemperou que a Exma. Sra. Desembargadora Federal Therezinha Astolphi Cazerta atuou como relatora da Correição Parcial, ao passo que o voto ali apresentado pelo Exmo. Sr. Desembargador Toru Yamamoto foi mencionado no julgamento do processo administrativo disciplinar, evidenciando que os fatos já anteriormente examinados naquela medida correicional foram submetidos à nova análise no processo administrativo disciplinar.

Nessa medida, reforçou que “por já terem conhecido da matéria anteriormente” os desembargadores ora nominados estariam impedidos de participar do julgamento do PAD, tudo convergindo à nulidade da própria sessão ocorrida em 12 de fevereiro de 2020, ocasião em que restou apreciada a representação do MPF, desaguando na deflagração do feito disciplinar.

Engana-se a defesa, uma vez mais,

De partida, atente o magistrado que a Correição Parcial não constitui medida preparatória do Processo Administrativo Disciplinar, sendo certo que tais instrumentos constituem medidas absolutamente distintas, com ritos próprios e objetivos igualmente díspares. A Correição Parcial, disciplinada no âmbito da Justiça Federal, pela Lei nº 5.010/1966 (art. 6º, inciso I) e pelos demais atos normativos expedidos pelo Órgão competente, destina-se à correção de eventual ato ou despacho que acarrete inversão tumultuária do processo e do qual não caiba recurso, ao passo que o Processo Administrativo Disciplinar, com respaldo no Texto Magno, na Lei Complementar nº 35/1979, na Lei nº 8.112/90, na Lei nº 9.784/99 e na Resolução CNJ nº 135/2011, tem por escopo a apuração da responsabilidade administrativa do magistrado em virtude da prática de eventual ilícito funcional, com consequente aplicação da correspondente sanção. Evidenciam-se, portanto, as particularidades díspares, alusivas ao processamento e à própria competência para apreciação das medidas, pois a Correição Parcial deve ser conhecida pelo Conselho da Justiça Federal da 3ª Região (art. 6º, inciso I, da Lei 5.010/1966 e art. 23, inciso I, do RITRF-3), ao passo que, nos termos regimentais (art. 11, inciso II, alínea “j”, do RITRF-3), o Processo Administrativo Disciplinar deve ser submetido à apreciação do Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região.

Como se vê, exsurgem nítidas a disparidade de objetos e as especificidades relacionadas ao processamento e à competência para apreciação das medidas ora referenciadas, sendo certo que a procedência da Correição Parcial não deságua, necessariamente, na deflagração de um expediente apuratório de cunho disciplinar, nem tampouco na instauração do próprio Processo Administrativo Disciplinar. Nesse quadrante, à míngua de outros elementos, a simples participação anterior dos 02 (dois) desembargadores federais, integrantes do Órgão Especial, no julgamento da Correição Parcial interposta contra decisões proferidas pelo Juiz Federal Edevaldo de Medeiros, no âmbito do Conselho da Justiça Federal da 3ª Região, de modo isolado, não induz ao impedimento desses magistrados para participação nas sessões de julgamento de instauração e de apreciação do mérito do Processo Administrativo Disciplinar, independentemente da similitude e/ou identidade dos fatos analisados em ambas as medidas.

E mais. Ainda que se compreendesse que a Correição Parcial constituiu medida de índole preliminar/preparatória ao Processo Administrativo Disciplinar, o impedimento suscitado não estaria configurado. Isso porque, o § 8º do art. 14 da Resolução CNJ nº 135/2011, dispõe textualmente que “não poderá ser relator o magistrado que dirigiu o procedimento preparatório, ainda que não seja mais o Corregedor”, ou seja, a vedação normativa diz respeito à atribuição da relatoria do feito disciplinar ao magistrado que conduziu o expediente preparatório, ainda que não esteja mais ocupando o cargo de corregedor. Assim, não incidiria no caso concreto tal hipótese normativa de impedimento, pois como já visto, atuou na relatoria da Correição Parcial a Exma. Sra. Desembargadora Federal Therezinha Astolphi Cazerta, ao passo que, no âmbito do processo administrativo disciplinar, ostentou a qualidade de Relatora a Exma. Sra. Desembargadora Federal Marisa Ferreira dos Santos, o que põe uma pá de cal na discussão.

 

Igualmente afasto.

 

3.5 Suspeição da testemunha do Juízo

 

A linha defensiva denunciou a ocorrência de nulidade no curso da instrução do Processo Administrativo Disciplinar SEI nº 0029224-53.2019.4.03.8000, ao relato de que o DD. Procurador Regional da República Ricardo Tadeu Sampaio foi inquirido na condição de testemunha do Juízo, nada obstante a contradita que lhe foi ofertada, à vista da atuação como colaborador ativo ("co-autor oculto") na elaboração da representação apresentada perante o Órgão Censor local - a partir da qual se desencadeou o feito disciplinar -, o que "acabaria por reverberar seus posicionamentos e acarretaria patente interesse no desfecho da representação".

Consoante alardeado pelo Juiz Federal Edevaldo de Medeiros, atribuiu-se ao mencionado Procurador Regional da República novo papel acusatório, ao figurar como testemunha compromissada - e não como simples informante consoante requereu a defesa -, salientando-se que a atuação da testemunha em comento foi tão relevante que, às vésperas do protocolo da representação, conforme admitiu em suas declarações, recebeu a minuta da peça para leitura, análise e revisão.

Ainda conforme reverberado na esfera defensiva, o Exmo. Sr. Procurador da República acima nominado ostentou a condição de signatário da já referida Correição Parcial nº 0042082-87.2017.4.03.8000, que originou o Processo SEI nº 045326-24.2017.4.03.8000, no bojo da qual os mesmos fatos teriam sido suscitados pelo procurador e analisados anteriormente pela Corregedoria Regional e pelo Corregedor Nacional de Justiça, a evidenciar que "a testemunha do juízo era, sabidamente, uma pessoa interessada na resolução da representação disciplinar, em sentido contrário ao magistrado".

Pois bem. À vista dos Termos de Audiência realizada em 10 de agosto de 2020 e das transcrições reproduzidas nos autos[29], depreende-se que a DD. Relatora do Processo Administrativo Disciplinar, Exma. Sra. Desembargadora Federal Marisa Ferreira Santos, no exercício da ampla direção e condução do procedimento, indeferiu a contradita formulada em relação à testemunha do juízo, DD. Procurador Regional da República Ricardo Tadeu Sampaio (fl. 992)[30], sob os seguintes fundamentos:

 

“(...)

 

RELATORA - Bem, eu imaginava que os senhores realmente arguissem isso, até porque já o fizeram nos autos, mas eu entendo que, a priori, não se configura a suspeição da testemunha, porque não me parece, ao menos nesse momento, que um membro do Ministério Público Federal, numa questão tão séria como esta, possa ter um interesse pessoal no desfecho da causa, e também não me parece - porque não é uma causa, é um processo administrativo - nem que seja inimigo da parte ou seu amigo íntimo.

 

O que eu tenho é um procurador da República, testemunha, que atua e atuou na subseção de Itapeva à época dos fatos, de modo que é seu dever legal trazer ao processo as informações que forem necessárias aos esclarecimentos dos fatos.

 

Além do mais, o depoimento que ele vai prestar será cotejado com todos os demais elementos da causa e pode acontecer, inclusive, que durante o seu depoimento essa suspeição apareça, e isso poderá ser considerado; a defesa bem sabe disto.

 

Por fim, nós vamos ter um julgamento colegiado, o Órgão Especial vai apreciar as provas e esse depoimento será, evidentemente, valorado como as demais provas; ele não será a única prova produzida, até porque é uma pessoa só falando pelo juízo, e os senhores têm seis testemunhas de defesa arroladas.

 

Então, a priori, doutor, eu indefiro a contradita, porque me parece que não há, nesse momento, a configuração da suspeição. Sempre deixando claro que ela poderá surgir durante o próprio depoimento, e aí o senhor, evidentemente, falará; e a própria relatora também está atenta a isso.

 

Então, contradita indeferida, eu prossigo e pergunto à nossa testemunha desde quando atua na subseção de Itapeva?

 

(...)”

 

A suspeição suscitada pela defesa do magistrado foi igualmente repelida pelo Órgão Especial do TRF-3 no julgamento do mérito do Processo Administrativo Disciplinar SEI nº 0029224-53.2019.4.03.8000, conforme se vê dos fundamentos extraídos do acórdão revisando, de seguinte teor (fl. 72, id 4549865):

 

“(...)

 

5. Testemunha do juízo. Reconhecimento da participação da testemunha do juízo como se mero informante fosse com base no suposto reconhecimento de participação ativa na elaboração da representação que originou o expediente administrativo. Conforme se verifica nos autos, 08 (oito) membros do Ministério Público Federal assinaram a representação que deu origem ao procedimento administrativo, o que denota que o depoimento do procurador da república e testemunha do Juízo não restou isolado nos autos. Testemunha ouvida sob compromisso, e, inclusive, durante a sua oitiva, mais de uma vez foi alertada de sua atuação no caso como testemunha, e não como parte. Preliminar rejeitada.

 

(...)”

 

 

Com efeito, sem adentrarmos, nesta seara preliminar, à discussão envolvendo a propalada suspeição do DD. Procurador Regional da República Ricardo Tadeu Sampaio, certo é que a sua oitiva na condição de testemunha do Juízo não acarretou qualquer prejuízo à defesa do juiz representado no julgamento do feito disciplinar. Consoante se verifica da fundamentação e da conclusão externadas no aresto do Órgão Especial do TRF-3, o magistrado foi absolvido da maior parte das imputações formuladas em seu desfavor, sendo digno de nota, em caráter exemplificativo, que as próprias razões de decidir do Colegiado, entre outros aspectos, registram que “a prova testemunhal colhida não trouxe evidências de que o atraso no andamento dos processos criminais fizesse parte da estratégia do magistrado para fazer valer seu posicionamento político-ideológico” (item “16”, da ementa)[31], bem assim que “não se conseguiu tirar da prova colhida, em nenhum dos casos concretos apontados na representação, que tenha havido parcialidade na aplicação desse entendimento no sentido de favorecimento do réu ou de represália à atividade policial ou do Ministério Público Federal. Não há notícias de que o Ministério Público Federal tenha se valido de exceções de suspeição contra o juiz processado em nenhum dos processos indicados.” (item “22”)[32],  levando à conclusão de que o conteúdo das declarações testemunhais, sob tais enfoques, não prestigiou a linha acusatória.

De outro norte, ainda conforme se denota da direção argumentativa externada pelo Órgão Especial, a conclusão final envolvendo a única falta funcional atribuída ao juiz requerente, qual seja, o descumprimento do acórdão prolatado pela 11ª Turma no âmbito do recurso em sentido estrito, não está respaldada nos depoimentos testemunhais, mas nos elementos de convicção extraídos da prova documental, os quais refletem tão somente o contexto dos próprios autos originários (inquérito policial e recurso em sentido estrito) nos quais teria se caracterizado a transgressão disciplinar – tornando-se irrelevante, nesse particular eventual reconhecimento da suspeição da testemunha do Juízo -.

É certo que, para além da medida de revisão proposta pelo próprio juiz representado (RevDis 8678-96), diante do procedimento revisional instaurado de ofício (RevDis 749-75) e, considerada a amplitude das imputações que recaem sobre o magistrado, assoma necessário o reexame do conjunto probatório ofertado em sua integralidade, para fins de possível reenquadramento dos fatos apurados no PAD e do respectivo desfecho sob a ótica persecutória-disciplinar, o que evidentemente pressupõe a reanálise dos depoimentos testemunhais em sua inteireza. Sem embargo, na eventual hipótese de reconhecimento da suspeição do DD. Procurador da República Ricardo Tadeu Sampaio nesta esfera revisional – o que será objeto de discussão ao tempo da apreciação das questões meritórias – tal particularidade não teria o condão de macular o procedimento administrativo disciplinar, mas tão somente o reenquadramento da atuação do aludida testemunha à condição de mero informante.

Em suma, o reconhecimento da suspeição – se o caso - desencadearia unicamente a requalificação do depoimento da testemunha em referência – emprestando-lhe a conotação de mera informante – a desafiar nova valoração do peso probatório eventualmente atribuído às suas declarações e possível alteração no resultado final do julgamento, sem com isso justificar o almejado decreto de nulidade de todo o processado.

Nesse contexto, rememore-se que, à luz do princípio pas de nullité sans grief, não há que se falar em nulidade quando não demonstrada, em efetivo, a concretização de prejuízos à defesa e, portanto, sob tal enfoque, também exsurge cristalina a inconsistência da arguição de nulidade em questão.

Realce-se que o entendimento pacificado pelo STF é exatamente no sentido de que a decretação de nulidade pressupõe a comprovação indiscutível do prejuízo, sendo certo que tal diretriz vem sendo aplicada não apenas na seara disciplinar, como também em relação aos feitos que tramitam na esfera criminal  - os quais guardam simetria com o processo administrativo disciplinar -, como ilustram os seguintes precedentes:

 

DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. POLICIAL MILITAR. CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PRESENÇA DE MEMBRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO CONSELHO SUPERIOR DE POLÍCIA. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. SÚMULA 279/STF. OBSERVÂNCIA DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. PRECEDENTES.

 

1. O Tribunal a quo não verificou qualquer prejuízo para a defesa, apesar da participação irregular de membro do Ministério Público no Conselho Superior de Polícia em processo administrativo disciplinar que resultou na cassação da aposentadoria do ora recorrente.

 

2. Aplicável a jurisprudência desta Corte acerca do princípio pas de nullité sans grief, com relação às nulidades alegadas em processo administrativo disciplinar. É necessária a demonstração de prejuízo concreto à parte que suscita o vício para que seja declarada eventual nulidade. Precedentes.

 

(...) 

 

5. Agravo interno a que se nega provimento.

 

(RE 1070319 ED-AGR. Rel. Min. ROBERTO BARROSO. Primeira Turma. Julgado em 27.9.2019. DJe de 20.10.2019).

 

 

 

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. NULIDADE DE ACÓRDÃO EM RAZÃO DA PARTICIPAÇÃO DE DESEMBARGADOR IMPEDIDO. EXCLUSÃO DO JULGADOR. RESULTADO INALTERADO. PREJUÍZO NÃO DEMONSTRADO.

 

1. É da jurisprudência desta CORTE o entendimento de que não se justifica a alegação de nulidade na hipótese em que magistrado impedido participa de julgamento que, mesmo com a sua exclusão, o resultado não seria alterado. Precedentes: HC 80.281, Rel. Min. OCTAVIO GALLOTTI, Primeira Turma, DJ de 29/09/2009; RHC 123.092, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA, Segunda Turma, DJe de 14/11/2014; HC 116.715, Rel. Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, DJe de 02/12/2013; HC 149395 AgR-ED-ED, Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES, Primeira Turma, DJe de 18/2/2019. 2. Recurso Ordinário a que se nega provimento. (STF. RHC 179356. Rel. Min. ALEXANDRE DE MORAES. 1ª T.. j. em 16 nov. 2020).

 

 

HABEAS CORPUS. PENAL E PROCESSO PENAL. HOMICÍDIO SIMPLES E FRAUDE PROCESSUAL. PRONÚNCIA. IRRESIGNAÇÃO. JULGAMENTO DE RECURSO PELO COLEGIADO NO STJ. PARTICIPAÇÃO DE MINISTRO IMPEDIDO. NULIDADE. NÃO OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE PREJUÍZO. VOTO QUE NÃO INTERFERIU NO RESULTADO. ORDEM DENEGADA.   

 

1. No processo penal, o postulado pas de nullité sans grief exige a efetiva demonstração de prejuízo para o reconhecimento de nulidade. 2. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que a participação de julgador impedido, quando do julgamento do recurso no órgão colegiado do tribunal, não acarreta automática nulidade da decisão proferida se, excluindo-se o voto do referido magistrado, o resultado da votação permanecesse incólume. 3. Ordem denegada. (STF. HC 125610. Rel. Min. EDSON FACHIN. 1ª T. j. em 29 mar. 2016).

 

 

RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. PROCESSUAL PENAL. OBRIGATORIEDADE DE DEFESA PRÉVIA. ART. 514 DO CPP. NULIDADE RELATIVA. NECESSIDADE DE DEMONSTRAR O EFETIVO PREJUÍZO. CONDENAÇÃO TRANSITADA EM JULGADO. RECURSO ORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. I – A partir do julgamento do HC 85.779/RJ, passou-se a entender, nesta Corte, que é indispensável a defesa prévia nas hipóteses do art. 514 do Código de Processo Penal, mesmo quando a denúncia é lastreada em inquérito policial (Informativo 457/STF). II – O entendimento deste Tribunal, de resto, é o de que, para o reconhecimento de eventual nulidade, ainda que absoluta, faz-se necessária a demonstração do prejuízo, o que não ocorreu na espécie. Nesse sentido, o Tribunal tem reafirmado que a demonstração de prejuízo, “a teor do art. 563 do CPP, é essencial à alegação de nulidade, seja ela relativa ou absoluta, eis que (…) o âmbito normativo do dogma fundamental da disciplina das nulidades pas de nullité sans grief compreende as nulidades absolutas” (HC 85.155/SP, Rel. Min. Ellen Gracie). III – Esta Corte decidiu, por diversas vezes, que a defesa preliminar de que trata o art. 514 do Código de Processo Penal tem como objetivo evitar a propositura de ações penais temerárias contra funcionários públicos e, por isso, a sua falta constitui apenas nulidade relativa. IV – No caso dos autos, trata-se de um processo findo, em que já houve o trânsito em julgado da sentença condenatória, não sendo possível perceber o que o réu poderia ter alegado na defesa prévia que já não o tivesse feito no curso da ação penal. V – Recurso ordinário a que se nega provimento. (RHC 120569, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 11/03/2014, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-059 DIVULG 25-03-2014 PUBLIC 26-03-2014).

 

 

E, nessa mesma direção, mencionem-se os seguintes precedentes desta Casa:

 

 

RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO ACRE. INTERVENÇÃO EM PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR EM CURSO NO TRIBUNAL. AUSÊNCIA DE NULIDADES. DESNECESSIDADE DE ATUAÇÃO DO CNJ. RECURSO CONHECIDO, PORÉM NÃO PROVIDO.

 

1. Recurso administrativo em Procedimento de Controle Administrativo contra o Tribunal de Justiça do Estado do Acre, em razão de supostos atos de cerceamento de defesa e de ofensa ao devido processo legal que teriam sido praticados no curso do Processo Administrativo Disciplinar instaurado em desfavor do magistrado requerente.

 

2. A jurisprudência deste Conselho é firme no sentido da não interferência na condução de procedimentos disciplinares em tramitação nos Tribunais, salvo em hipóteses excepcionais, quando verificada flagrante ilegalidade, o que não se observa no presente caso.

 

3. Não comprovado prejuízo concreto ao exercício de defesa, não há que se falar em nulidade - pas de nullité sans grief. Precedentes STF.

 

4. Inexistência de fato novo ou de elementos capazes de infirmar os fundamentos que lastreiam a decisão impugnada.

 

5. Recurso conhecido, porém não provido.

 

 (CNJ. RA no PCA 0002260-50.2018.2.00.0000. Rel. Cons. MÁRCIO SCHIEFLER FONTES. 49ª Sessão Extraordinária julg. 14.08.2018).

 

 

 

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE GOIÁS. CONCURSO PÚBLICO PARA JUIZ SUBSTITUTO. ALTERAÇÃO DA BANCA EXAMINADORA. IMPEDIMENTO. RESOLUÇÃO CNJ Nº 75/2009. MEMBRO QUE LECIONOU EM CURSO PREPARATÓRIO HÁ MENOS DE TRÊS ANOS. COLISÃO DE PRINCÍPIOS. LEGALIDADE ESTRITA VERSUS SEGURANÇA JURÍDICA, SATISFAÇÃO DO INTERESSE PÚBLICO E ECONOMIA PARA O ERÁRIO. AUSÊNCIA DE DIREITOS ABSOLUTOS. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. QUEBRA DA ISONOMIA. MÁ-FÉ. NÃO OCORRÊNCIA. RECONHECIMENTO DE NULIDADE. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DE PREJUÍZOS. ALTERAÇÃO DA COMPOSIÇÃO DA BANCA EXAMINADORA. CONVALIDAÇÃO DOS ATOS PRATICADOS. TEORIA DA ESTABILIZAÇÃO DOS EFEITOS DO ATO ADMINISTRATIVO. IMPOSSIBILIDADE DE EXTENSÃO DO ENTENDIMENTO A OUTROS CASOS.

1. As causas de impedimento e suspeição constantes da Resolução CNJ nº 75/2009 não são insindicáveis ou encerram presunção iuris et de iuris, uma vez que podem ser infirmadas pela circunstâncias que permeiam a situação concreta.

2. Embora seja incontroverso que a banca examinadora do 55º Concurso Público para Juiz Substituto do Estado de Goiás foi composta por membro que incorreu em hipótese de impedimento elencada pela Resolução CNJ nº 75/2009, as singularidades do caso afastam o reconhecimento de nulidade.

3. O examinador, dois anos e três meses antes de integrar a banca, lecionou em curso preparatório por menos de um mês e tal fato, por si só, não demanda a anulação dos atos por ele praticados, pois a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal abraça o princípio pas de nullité sans grief, de forma que, não sendo demonstrados prejuízos, deve-se manter o ato.

4. A ponderação de princípios reclama a observância do interesse público, segurança jurídica e economia para o erário, pois o concurso em comento está em curso há mais de um ano e seis meses e o requerente, embora ciente da alteração da banca examinadora desde fevereiro de 2013, somente após a realização da fase discursiva suscitou o impedimento do examinador.

5. A aplicação das normas insertas na Resolução CNJ nº 75/2009 não pode ocorrer de modo autômato e desvencilhada da realidade dos fatos. No presente procedimento, restou demonstrado que a participação do examinador não foi maculada por má-fé ou implicou em quebra da isonomia do certame.

6. É descabido paralisar o certame no qual foram gastos recursos públicos e determinar o refazimento de atos diante de uma presunção que não se confirmou na prática, sob pena de tornar a Resolução CNJ nº 75/2009 um fim em si mesmo.

6. Diante da notícia de que o examinador fora substituído, deve-se convalidar dos atos praticados, aplicando-se a teoria da estabilização dos efeitos do ato administrativo, cujo objetivo consiste na conservação do ato viciado para acautelamento de outros princípios constitucionais, in casu, a satisfação do interesse público e economia para o erário, principalmente.

7. As particularidades da situação ora examinada tornam insuscetível a extensão da solução a outros questionamentos relativos aos impedimentos definidos pela Resolução CNJ nº 75/2009, os quais deverão ser analisados de per si.

8. Pedido julgado improcedente.

 

(CNJ, PCA 0004362-21.2013.2.00.0000, Relatora Cons. GISELA GONDIN RAMOS, 179ª Sessão Ordinária, julg. em 12.11.2013)

 

Preliminar rejeitada.

 

3.6 Cerceamento de defesa. Dilação probatória. Ampliação do objeto do Processo Administrativo Disciplinar. Razões Implícitas do TRF3. Reabertura de instrução processual. Necessidade

 

Nas alegações finais ofertadas na RevDis 749-75[33],  o Magistrado Federal Edevaldo de Medeiros argumentou que a representação ofertada pelos Procuradores Regionais da República não teria abordado o tema relativo à má gestão da unidade judiciária de titularidade do ora defendente – 1ª Vara Federal de Itapeva (descontrole do acervo processual e improdutividade), mas especificamente: (i) suposto excesso de prazo recorrente nas tramitações de processos criminais e; (ii) existência de posicionamentos do magistrado representado supostamente contrários à jurisprudência pacificada da Corte Regional e que levariam à necessidade de interposição de inúmeros recursos por parte do Ministério Público Federal.

Nessa linha, sustentou que os fundamentos adotados no voto condutor do acórdão que ordenou a instauração do procedimento revisional ex officio, apresentados pela Corregedoria Nacional de Justiça, lastreados em dados ligados à gestão da Vara (que acumula processos de um Juizado Especial e uma Vara Federal - JEVA), bem assim extraídos dos resultados das Correições de 2018 e 2020, não teriam sido veiculados na reclamação disciplinar motivadora da deflagração do PAD nº 0029224-53.2019.4.03.8000, nem tampouco na respectiva portaria de instauração, ou seja, não corresponderiam ao efetivo objeto do feito disciplinar e, portanto, não poderiam constituir matéria de revisão disciplinar.

Sustentou, ainda, que “falar-se de gestão desse tipo de Vara é algo complexo, que amplia, e muito, o objeto da representação dos procuradores, vulnerando o princípio da ampla defesa e do contraditório”. Apontou, em síntese, as dificuldades vivenciadas e majoradas com a ampliação de competência da 1ª Vara Federal de Itapeva (considerada a unificação da Vara Federal com o Juizado Especial Federal e da fusão formal ocorrida em 2018), à míngua de auxilio de magistrado substituto por considerável lapso temporal, tudo agravado pelo volume processual expressivo e pela carência de recursos humanos.

Com tais razões, reportou que “apesar de relatados pelo magistrado representado em suas peças de defesa, corroborado por todos os testemunhos, foram claramente desconsiderados no processamento do presente, o que requer, sob pena de nulidade por cerceamento de defesa, a necessária reabertura da fase de instrução processual para que sejam averiguadas tais situações, com a análise dos processos, todos os seus andamentos processuais, bem como a oitiva dos servidores e dos magistrados envolvidos na gestão do próprio TRF da 3ª Região no período.”.

À análise.

Consoante admitiu o próprio juiz requerido, a representação apresentada pelo MPF em seu desfavor, da qual se desdobrou o PAD nº 0029224-53.2019 (objeto da presente revisão conjunta), enfocou amplamente a questão do retardamento na tramitação dos processos submetidos à condução do defendente. Nesses termos, a peça em referência denunciou a paralisação no processamento de recursos aviados pelo MPF por períodos de até 2 (dois) anos, a reiterada mora processual e o descumprimento das deliberações emanadas da Corregedoria Regional no tocante à superação dos atrasos[34]. Denota-se, inclusive, da atenta leitura da representação oferecida pelo Parquet, que as supostas irregularidades perpetuaram-se desde a investidura do juiz requerido na 1ª Vara Federal da 39ª Subseção Judiciária de Itapeva/SP e, ao menos, até a propositura da medida em 2019, conforme teria sido detectado, inclusive, pelo Órgão Censor Local em sede de correição parcial, bem assim nos trabalhos de correição ordinária.

Ainda conforme extensas exposições do Órgão Ministerial, ancoradas no andamento de 80 (oitenta processos) indicados em caráter exemplificativo, o excesso injustificado de prazo abarcaria não apenas um considerável quantitativo de feitos, como também situações  processuais diversificadas: i) juntada de petições e documentos; ii) submissão dos autos à conclusão; iii) prolação de despachos e remessa de recursos ao 2º Grau; o que desaguaria na reiterada ofensa, entre outros, aos deveres do magistrado de determinar que os atos processuais fossem realizados nos prazos legais, bem assim de zelar pelo cumprimento de prazos razoáveis.

Frise-se, ainda, que a portaria de instauração do PAD faz expressa alusão à possível ofensa ao art. 35, incs. I e III, da LOMAN), por eventual descumprimento dos deveres da magistratura de: "cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício" e de determinar as providências necessárias para que os atos processuais se realizem nos prazos legais (artigo 35, I e III, da Lei Complementar 35/1979); com violação, outrossim, dos deveres de imparcialidade, cortesia, transparência, prudência, diligência e dedicação para celeridade e eficiência na prestação jurisdicional (Código de Ética da Magistratura, especialmente artigo 1.º).”[35].

Nesse patamar, resulta forçosa a conclusão de que a solução da ampla controvérsia de fundo, por uma questão de coerência, não poderia se restringir à análise da suposta motivação jurídico-ideológica atribuída pelo Parquet às reiteradas condutas do representado – as quais teriam contribuído à mora processual injustificada – ou seja, sob a ótica correicional/persecutória-disciplinar, desafiaria igualmente o exame de aspectos mais abrangentes, ligados inclusive à própria gestão da unidade jurisdicional, exatamente como procedeu o TRF3 no julgamento do PAD.

Desse modo,  inexistia óbice à análise e à valoração emprestada pela Corregedoria Nacional de Justiça aos dados correicionais objetivos registrados na fundamentação do v. acórdão sob revisão, os quais, cotejados com as conclusões ali externadas pelo TRF3, sinalizaram a possível caracterização da hipótese do art. 83, I, do RICNJ, justificando a instauração da medida revisional ex officio.

Partindo de tais premissas, a par dos efetivos termos da peça acusatória e dos limites delineados na portaria de instauração do PAD, os argumentos de defesa no intuito de rechaçar o suposto excesso injustificado de prazo (enaltecendo as medidas adotadas para aprimoramento da gestão da unidade judiciária) – os quais, conforme sustentou o próprio magistrado nas suas razões finais, já se encontravam nos autos e teriam sido desconsiderados no “processamento” da medida revisional - associados aos demais elementos de convicção reunidos tanto na RevDis 8678-96, quanto na RevDis 749-75, revelam-se suficientes para dirimir os debates nesta estrita seara revisional.

Não se olvida que o art. 87, do RICNJ, dispõe que a instrução do processo de revisão disciplinar observará os princípios do contraditório e da ampla defesa, franqueando-se à parte interessada encartar aos autos os documentos que entender pertinentes, na forma do artigo 85, §1º do RICNJ. Todavia, também é certo que o pedido revisional não constitui recurso contra as decisões proferidas pelos Tribunais, ou seja, seu escopo precípuo não é promover novo julgamento do processo administrativo disciplinar, sendo digno de menção que o art. 82 e seguintes, do RICNJ, não preveem no curso da revisão disciplinar qualquer fase específica dedicada à dilação probatória.

 Logo, incumbia ao magistrado interessado a instrução imediata das medidas revisionais com as peças necessárias à comprovação dos fatos alegados (artigo 85, §1º do RICNJ), remanescendo descabida, sob qualquer ângulo de análise, a almejada reabertura da fase de instrução – há muito encerrada no âmbito daquele PAD -, para fins de “análise integral dos processos, todos os seus andamentos processuais, bem como a oitiva dos servidores e dos magistrados envolvidos na gestão do próprio TRF da 3ª Região no período”.

Afasto.

 

4. Prescrição

 

A corrente defensiva insistiu no pronunciamento da prescrição, seja pela pena em abstrato, seja em concreto, pretendendo sejam afastadas as regras inseridas na Resolução CNJ nº 135/2011, notadamente o quinquídio a que alude o art. 24, do ato normativo. Invocou o princípio da hierarquia das normas, assentando que a resolução em apreço constitui "ato infralegal", extrapolando seu poder normativo ao versar sobre o instituto em apreço, tudo a justificar a aplicação exclusiva da Lei nº 8.112/90.

Realçou o magistrado representado que o TRF3 já tinha ciência das supostas acusações em seu desfavor desde a apresentação da Correição Parcial SEI nº 0042082-87.2017.4.03.8000, em 06/11/2017, tanto que  instaurado o procedimento de apuração disciplinar SEI nº 0045326-24.2017.4.03.8000 em 27/11/2017, ao passo que o Processo Administrativo Disciplinar foi instaurado em 03/04/2020, quando já teria se consumado o prazo de prescrição da pretensão punitiva administrativa - 180 (cento e oitenta) dias – nos exatos termos da Lei nº 8.112/90.

Mesmo que assim não fosse, defendeu que já teria transcorrido tal prazo em relação à pena em concreto (advertência), pois a instauração do PAD teria ocorrido em 03 de abril de 2020, por meio da Portaria PAD/PRES nº 3, de modo que o prazo de 140 (cento e quarenta) para conclusão do procedimento, iniciado em 06 de abril de 2020, teria finalizado em 20 de agosto de 2021. Logo, no seu entender, a partir do 141º dia teria iniciado a contagem do prazo prescricional de 180 (cento e oitenta) dias para aplicação da advertência, exaurido em 19 de fevereiro de 2021, sem que a penalidade tenha sido efetivamente aplicada até a data de apresentação da RevDis nº 8678-96.

Passo ao exame

De logo, oportuno salientar que a estreita via eleita pela parte não constitui o remédio jurídico próprio para discussão atinente à validade e à eficácia da Resolução CNJ nº 135/2011, editada por este Conselho no intuito de uniformizar a tramitação do processo administrativo disciplinar instaurado em desfavor de magistrado.

Por outro lado, apenas em caráter elucidativo, saliente-se que, conquanto diversos temas versados na Resolução CNJ nº 135/2011 tenham constituído objeto de questionamento por intermédio da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 4638 - DF, a referida medida foi parcialmente conhecida pelo STF e, na parte conhecida, os pedidos ali veiculados foram julgados improcedentes, nos termos do v. acórdão redigido pelo Exmo. Sr. Ministro Luís Roberto Barroso, cujo trânsito em julgado operou-se em 23/08/2023.[36] Inócuos, portanto, os questionamentos levantados pelo magistrado representado quanto à aplicabilidade da regra inserida no já citado art. 24, do ato normativo em referência, tornando-se desnecessárias maiores incursões nesse ponto.

Prevalece, portanto o comando inserido no art. 26, da Resolução CNJ nº 135/2011, na esteira de que sejam aplicados “aos procedimentos disciplinares contra magistrados subsidiariamente, e desde que não conflitem com o Estatuto da Magistratura, as normas e os princípios relativos ao processo administrativo disciplinar das Leis n.8.112/90 e n. 9.784/99", levando à conclusão de que a aplicação da legislação ora referida opera-se apenas na hipótese de eventual lacuna na mencionada resolução.

Tecidas tais premissas, saliente-se que o instituto da prescrição, uma vez consumado, tem por consequência jurídica a extinção da punibilidade e, por corolário, a impossibilidade de aplicação da correspondente penalidade, decorrendo de eventual inércia da Administração que, ciente do suposto ilícito, não empreende as diligências necessárias à deflagração da persecução disciplinar, conquanto já reunisse elementos para concretizá-lo.

Realce-se, ainda, que o regime de prescrição administrativa referente à pretensão punitiva, em uma primeira ótica, transcorre no tempo compreendido entre a ciência da suposta falta por parte da autoridade competente e a instauração do processo administrativo disciplinar – a denominada “prescrição em abstrato” -. Assim, em razão de expresso comando legal (art. 24, da Resolução CNJ nº 135/2011, c.c art. 142, § 1º, da Lei nº 8.112/90, aplicável subsidiariamente aos procedimentos disciplinares contra magistrados, na forma do já citado art. 26, do citado ato normativo), o cômputo do aludido prazo não tem início na data do suposto ilícito, mas a partir do momento em que se tornou conhecido pela autoridade competente (grifei).

Nessa perspectiva, rezam o artigo 24, e parágrafos, da Resolução CNJ nº 135/2011:

 

Art. 24. O prazo de prescrição de falta funcional praticada pelo magistrado é de,cinco anos, contado a partir da data em que o tribunal tomou conhecimento do fato, salvo quando configurar tipo penal, hipótese em que o prazo prescricional será o do Código Penal.

 

§ 1º A interrupção da prescrição ocorre com a decisão do Plenário ou do Órgão Especial que determina a instauração do processo administrativo disciplinar.

 

§ 2º O prazo prescricional pela pena aplicada começa a correr nos termos do § 9º do art. 14 desta Resolução, a partir do 141º dia após a instauração do processo administrativo disciplinar. (Alterada conforme retificação publicada no DJ-e n. 144, de 04 de agosto de 2011)

 

§ 3º A prorrogação do prazo de conclusão do processo administrativo disciplinar, prevista no § 9º do artigo 14 desta Resolução, não impede o início da contagem do prazo prescricional de que trata o parágrafo anterior. (Alterada conforme retificação publicada no DJ-e n. 216, de 23 de novembro de 2011)

 

De outra parte, por se tratar de competência concorrente (artigo 103-B, parágrafo 4º, inciso III, da Constituição Federal, e artigos 12 e 13 da Resolução CNJ nº 135/2011), o prazo prescricional é único e possui como termo inicial a data em que a primeira das autoridades que dispõem de competência para a instauração do processo disciplinar for cientificada do suposto ato faltoso. Trata-se de diretriz que melhor se amolda à natureza e à finalidade do instituto da prescrição, sem prejuízo da preservação da própria segurança jurídica.

Nessa direção, ou seja, chancelando a contagem do prazo prescricional a partir da data em que a primeira das autoridades competentes para a instauração do processo administrativo disciplinar tomou ciência dos supostos fatos ilícitos, citem-se os seguintes precedentes: STF - MS 37.074, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, DJe de 02/06/2021; STF - MS 33.018, Rel. Min. Rosa Weber, DJe de 28/03/2017; CNJ - PAD 0006920-87.2018.2.00.0000, Relator Cons. Mario Guerreiro, 60ª Sessão Extraordinária, julg: 28.09.2021.

Logo, à luz da norma regulamentar em epígrafe e do art. 142, inciso I, § 1º, da Lei nº 8.112/90, aplicável subsidiariamente, não configurando ilícito penal, o cálculo da prescrição em abstrato envolvendo a falta funcional praticada pelo magistrado deve observar o prazo de 05 (cinco) anos contados da data em que os fatos caracterizadores da infração disciplinar tornaram-se conhecidos pela primeira das autoridades competentes para atuar na respectiva apuração.

Ainda na forma do que estabelece o art. 24, da Resolução CNJ nº 135/2011, em seus §§ 1º e 2º, o prazo prescricional será interrompido com a instauração do processo administrativo disciplinar, recomeçando a contagem, pela pena em concreto ou pela pena aplicada, apenas após o exaurimento dos 140 (cento e quarenta) dias para conclusão do processo. Ressalte-se, ainda, que a prescrição calculada pela pena em concreto não retroage à fase inquisitória, ou seja, anterior ao PAD, consoante se extrai da inteligência do mencionado § 2º, do art. 24, da Resolução CNJ nº 135/2011.

Nessa mesma linha, já se posicionou este Conselho Nacional de Justiça, conforme precedente ora reproduzido:

 

REVISÃO DISCIPLINAR. DECISÃO QUE APLICOU AO MAGISTRADO A PENA DE ADVERTÊNCIA. REJEIÇÃO DAS PRELIMINARES DE PRESCRIÇÃO EM ABSTRATO E INTERCORRENTE. INOCORRÊNCIA DE IRREGULARIDADES FORMAIS NA CONDUÇÃO DAS SESSÕES DE JULGAMENTO PELO TRIBUNAL PLENO. CONTRARIEDADE À EVIDÊNCIA DOS AUTOS NÃO DEMONSTRADA. TENTATIVA DE REDISCUSSÃO E AMPLA REAPRECIAÇÃO DA PROVA. IMPOSSIBILIDADE. FIXAÇÃO DA PENA MAIS BRANDA EM RAZÃO DA AUSÊNCIA DE MAIORIA ABSOLUTA. DECISÃO QUE CONTRARIA DIRETAMENTE A CONSTITUIÇÃO FEDERAL E A RESOLUÇÃO CNJ N. 135, COM A INTERPRETAÇÃO CONFORME LEVADA A EFEITO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL NO JULGAMENTO DA ADI 4638. NULIDADE DO ATO QUE FIXOU A PENA. AUSÊNCIA DE RESULTADO ÚTIL NO REFAZIMENTO DA VOTAÇÃO. PENALIDADES APLICÁVEIS PRESCRITAS. EXTINÇÃO DA PUNIBILIDADE PELA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. PROCEDÊNCIA PARCIAL.

I. O regime de prescrição administrativa referente à pretensão punitiva contra magistrados está baseado no Estatuto do Servidor Público Civil da União.

II. A prescrição em abstrato (até a instauração do Processo Administrativo Disciplinar - PAD), via de regra, conta-se pelo prazo de 5 (cinco) anos, contados da data em que os fatos se tornaram conhecidos. Inteligência do art. 24 da Resolução CNJ n. 135 e do art. 142, inciso I, da Lei n. 8.112/1990 (aplicado subsidiariamente).

III. A partir da instauração do PAD, a prescrição conta-se pela pena em concreto ou pela pena aplicada, a teor do que prescreve o art. 24, §2º, da Resolução CNJ n. 135.

IV. Não tendo transcorrido 5 (cinco) anos entre a data em que a Administração tomou conhecimento dos fatos e a instauração do PAD em face do Magistrado requerente, bem assim não havendo qualquer indício de desídia por parte do Tribunal de origem na condução da instrução processual, não há falar em prescrição em abstrato ou intercorrente. Preliminar rejeitada.

(...)

XV. O prazo prescricional fluiu ininterruptamente desde o 141º dia posterior à instauração do Processo Administrativo Disciplinar, tendo transcorrido o prazo de 180 (cento e oitenta) dias para prescrição da ação disciplinar quanto à advertência e o prazo de 2 anos (ou 730 dias) quanto à censura.

XVI. Extinta a punibilidade em face do reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva.

XVII. Revisão Disciplinar que se julga parcialmente procedente.

(REVISÃO DISCIPLINAR - 0003740-97.2017.2.00.0000, Relator LUCIANO FROTA, Julg: 292ª Sessão Ordinária - 04-06-2019)

 

Assim, à luz do art. 24, e parágrafos, da Resolução CNJ nº 135/2011, o prazo para instauração dos processos disciplinares em desfavor dos magistrados é, em regra, de 05 (cinco) anos, contados da data de conhecimento dos fatos pela autoridade competente para apuração dos fatos, transcorrendo em tal lapso a prescrição em abstrato. Por sua vez, o primeiro marco interruptivo da prescrição ocorre com a instauração do PAD, reiniciando-se a contagem a partir do 141º dia após a deflagração do procedimento, porém pela pena em concreto, sendo certo que a Lei Orgânica da Magistratura não estabelece regras de prescrição da pretensão punitiva por faltas disciplinares praticadas por magistrados, ao passo que a Resolução CNJ nº 135/2011 não disciplina os prazos prescricionais pelo ângulo da pena aplicada.

Nessa senda, sob o ponto de vista exclusivamente administrativo, balizando-se de modo subsidiário nas regras insculpidas na Lei nº 8.112/90, a partir do precedente fixado no voto apresentado pela então Corregedora Nacional de Justiça, Excelentíssima Senhora Ministra Nancy Andrighi, no julgamento do PAD nº 0005696-90.2013.2.00.0000 (229ª Sessão Ordinária de 12/04/2016), este Conselho adotou posicionamento no sentido de que o prazo prescricional alusivo à pena concreta poderá corresponder a 180 dias (advertência), 02 anos (censura e remoção compulsória) ou 05 anos (disponibilidade, aposentadoria compulsória e demissão).

Dito isso, em relação à prescrição em abstrato, o material probatório dos autos, aliado ao teor do relato do próprio magistrado representado, sinaliza que a primeira das autoridades competentes para instauração do procedimento disciplinar - Corregedoria do TRF-3 - foi cientificada do único ato faltoso reconhecido pelo Órgão Especial no julgamento do PAD (descumprimento do acórdão da 11ª Turma do TRF-3 em sede de recurso em sentido estrito) em 06 de novembro de 2017, no contexto no pedido de Correição Parcial formulado pelo Ministério Público Federal (Processo SEI nº 0042082-87.2017.4.03.8000)[37].

Em relação aos demais fatos levados ao conhecimento da Corregedoria Regional do TRF-3 por meio de representação disciplinar apresentada igualmente pelo Ministério Público Federal (englobando a situação acima elencada) - os quais também constituíram objeto de apuração do PAD ora em revisão - o conjunto probatório demonstra que o Órgão Censor recebeu a peça processual e demais documentos instrutórios enviados fisicamente pelo Parquet, por meio do Ofício nº 1438/2019, em 03 de julho de 2019 [38].  

Considerando que o processo administrativo disciplinar foi instaurado pelo TRF3 em 12 de fevereiro de 2020, ainda não havia escoado o interregno de 05 (cinco) anos da prescrição em abstrato,  compreendido entre o conhecimento dos fatos pela autoridade administrativa que reúne poderes decisórios para apuração infracionais imputadas aos magistrados e o primeiro marco interruptivo (art. 24, §§ 1º e 2º, da Resolução CNJ nº 135/2011) - data da deflagração do PAD -.

Nessa conjuntura, as tratativas defensivas, embasadas no aspecto abstrato do instituto ora em análise, não merecem acatamento, pois a prescrição não fulminou a pretensão punitiva no período que antecedeu o processo administrativo disciplinar, considerados os expressos termos do citado art. 24, caput, da Resolução CNJ nº 135/2011.

Resta, pois, o exame da prejudicial sob o ângulo da pena concreta passível de aplicação ao magistrado (art. 24, § 2º, da Resolução CNJ nº 135/2011), o que ora se faz.

Com efeito, após a interrupção da prescrição, ou seja, a partir do 141º dia de instauração do processo administrativo disciplinar - e até a sua efetiva conclusão - inicia-se a contagem do lapso prescricional levando-se em conta a pena em concreto. No caso em exame, considerando a diretriz emanada do precedente acima mencionado (PAD nº 0005696-90.2013.2.00.0000) e, portanto, a aplicação subsidiária do art. 142, inciso III, da Lei nº 8.112/90, o prazo de prescrição pela pena aplicada (advertência) corresponderia a 180 (cento e oitenta) dias.

Logo, interrompida a prescrição em 12 de fevereiro de 2020 (instauração do PAD), a contagem foi retomada no 141º dia, ou seja, em 01 de julho de 2020, de modo que a prescrição da pretensão punitiva pela pena concreta se consumaria em 28 de dezembro de 2020, o que não se efetivou, pois o julgamento do processo administrativo disciplinar deu-se em 25 de novembro de 2020, ocasião em que foi aplicada ao defendente a sanção de advertência.

O argumento extraído das ponderações externadas pelo magistrado, no sentido de que a advertência não teria sido aplicada ao menos até a data da apresentação da RevDis 8678-96 em 24 de novembro de 2021, o que evidenciaria o escoamento do prazo prescricional em relação à pena concreta, não encontra eco nos elementos dos autos. Isso porque, ao que se depreende da certidão de julgamento do PAD e das informações da Corte Originária, a advertência decorrente do julgamento realizado em 25 de novembro de 2020, por escrito e reservadamente (art. 43, da LOMAN), foi concretamente aplicada e devidamente formalizada, com registro nos assentos funcionais do requerido[39].

Com efeito, tanto houve a aplicação da sanção, dali irradiando-se seus efeitos jurídicos, que o próprio magistrado, na inicial, afirmou que teria sido punido em duplicidade, levando-se em conta que não logrou participar do concurso de remoção exatamente em virtude da penalidade decorrente do Processo Administrativo Disciplinar SEI nº 0029224-53.2019.4.03.8000. E aqui, ressalte-se que o não cumprimento do requisito pelo previsto no art. 29, inc. III, alínea “b”, da Resolução-CJF nº 01/2008, em razão da aplicação da advertência há menos de 12 (doze) meses, obstando a participação do Juiz Federal Edevaldo de Medeiros do concurso de remoção foi reconhecida pelo Órgão Especial em 14/07/2021, anteriormente, portanto, à propositura da revisão voluntária em novembro/2021 (INFORMAÇÃO Nº 8563207/2022 - GABPRES)[40], o que igualmente faz cair por terra as tratativas defensivas em sentido contrário.

Destarte, não havendo transcorrido 05 (cinco) anos das datas em que noticiados os fatos à Corregedoria Regional do TRF-3  (06/11/2017 e 03/07/2019) e a instauração do processo administrativo disciplinar (12/02/2020), não há que se falar em incidência da prescrição punitiva sob o prisma abstrato.

De outra parte, o prazo prescricional de 180 (cento e oitenta) dias pela pena concreta aplicada ao juiz requerido e revisionante (advertência) teve início em 01/07/2020 (141º dia após a deflagração do PAD) e, portanto, transcorreria em 28/12/2020, o que não se concretizou, diante do julgamento definitivo, com consequente aplicação da sanção administrativa, ocorrido em 25/11/2020. Inteligência dos artigos 24, § 2º da Resolução CNJ nº 135/2011, e 142, inciso III, da Lei nº 8.112/90.

Prejudicial rejeitada.

 

5. Mérito


De pronto, previamente à reanálise dos fatos, argumentos, provas e demais elementos trasladados do PAD em seu âmago, cumpre examinar o incidente envolvendo a propalada suspeição da testemunha do Juízo, DD. Procurador Regional da República, Ricardo Tadeu Sampaio. A contradita ofertada pela defesa do magistrado foi afastada pelo Órgão Especial do TFF3 pelos seguintes fundamentos[41]:

 

Ementa

5. Testemunha do juízo. Reconhecimento da participação da testemunha do juízo como se mero informante fosse com base no suposto reconhecimento de participação ativa na elaboração da representação que originou o expediente administrativo. Conforme se verifica nos autos, 08 (oito) membros do Ministério Público Federal assinaram a representação que deu origem ao procedimento administrativo, o que denota que o depoimento do procurador da república e testemunha do Juízo não restou isolado nos autos. Testemunha ouvida sob compromisso, e, inclusive, durante a sua oitiva, mais de uma vez foi alertada de sua atuação no caso como testemunha, e não como parte. Preliminar rejeitada.

(...)      

VOTO

Analiso as preliminares suscitadas pelo representado em suas razões finais:

(...)

5. Da testemunha do juízo

Pugna o representado, em sede preliminar, pelo reconhecimento da participação da testemunha do juízo como se mero informante fosse, tendo em vista o suposto reconhecimento de participação ativa daquele na elaboração da representação que originou o expediente administrativo.

A preliminar não merece ser acolhida.

Conforme se verifica nos autos, 08 (oito) membros do Ministério Público Federal assinam a representação que deu origem a este procedimento administrativo, o que denota que o depoimento do procurador da república e testemunha do Juízo Ricardo Tadeu não é voz isolada nos autos.

Por outro lado, o art. 18 da Resolução 135/2011 do Conselho Nacional de Justiça dá poderes ao relator para, de ofício, no caso de inércia das partes no tocante à indicação de provas, iniciar a instrução do processo com a

produção das provas que entender necessárias, o que, conforme se verifica da audiência de instrução, de fato ocorreu.

Há que ser ressaltado que a testemunha foi ouvida sob compromisso, e, inclusive, durante a sua oitiva, mais de uma vez foi alertada de sua atuação no caso como testemunha, e não como parte.

Preliminar rejeitada.

(...)”

 

De fato, a teor das declarações do DD. Procurador Regional da República, Ricardo Tadeu Sampaio, restou evidente a participação ativa da sobredita testemunha na elaboração da representação oferecida pelo Parquet em face do requerido (a partir da qual derivou o PAD julgado pelo TRF3). Ainda que não tenha subscrito a peça em referência, em conjunto com os demais Procuradores Regionais da República, a testemunha do Juízo afirmou que forneceu alguns subsídios e demais dados que compõem as exposições acusatórias, ou seja, embora informalmente, no mínimo colaborou para a confecção da representação, independentemente de haver exercido qualquer ingerência quanto à efetiva apresentação – ou não – da medida perante os Órgãos Correicionais. Tanto assim que, às vésperas do protocolo, recebeu uma cópia do texto por correspondência eletrônica, havendo lido a peça para aferição de eventual equívoco nos dados ali tabulados (“verificar se tinha alguma situação pontual de algum caso que pudesse ter sido incluído por equívoco...”; É o que relatei aqui para S. Exa, a relatora, fui...forneci as informações, as informações que me foram pedidas”...)[42].

Além das particularidades em questão, não se olvide que a testemunha em tela já havia reportado à DD. Relatora do PAD que o magistrado imputado ofertou várias representações em seu desfavor junto à Corregedoria do Ministério Público e ao Conselho Nacional do Ministério Público[43]:

“[...]

RELATORA ... o senhor, então, continua atuando na subseção de Itapeva.

DEPOENTE Sim.

RELATORA Tem encontrado dificuldades maiores na sua atuação depois do início dessa questão da representação do Ministério Público à Corregedoria e da instauração do processo administrativo disciplinar?

DEPOENTE Sim, Excelência, sim.

Alguns pontos são, enfim, subjetivos, por exemplo um aumento ainda... um incremento na rejeição de denúncias, denúncias que estavam recebidas sendo reformadas, mas mais que isso, depois dessa atuação principalmente da Procuradoria Regional, o senhor juiz começou a representar em mim, injustamente, tanto na Corregedoria do Ministério Público como no Conselho Nacional do Ministério Público, representou várias representações contra mim, todas até agora arquivadas de plano, sem sequer um pedido de informações mesmo pelo CNMP, o que demonstra que não se trata de corporativismo - muito pelo contrário -, que realmente são representações descabidas.

Soube muito recentemente, também não tenho nem certeza se isso aconteceu, no final do que eu vou dizer, mas uma das representações que ele fez contra mim, dizendo que eu faltava com respeito a ele nas manifestações, o que também é descabido, sempre o tratei com o máximo respeito, inclusive com mais respeito do que eu sou tratado, e daí o corregedor nacional do Ministério Público não só arquivou de plano como - esse ponto que eu não tenho bem certeza - me parece que ele representou contra o juiz ou pediu alguma providência desta Corregedoria do Tribunal em relação a isso, tamanha era a incorreção da representação do magistrado.

Então, sim, noto um recrudescimento inclusive, sim, de uma situação que já era muito ruim e séria.

[...]”

 

Dessa forma, para além da colaboração do DD. Procurador Regional da República Ricardo Tadeu Sampaio na indicação de dados lançados na peça acusatória e do prévio acesso ao inteiro teor da representação – antes mesmo do respectivo protocolo – para fins de averiguação de eventual inconsistência nos informes ali referenciados, exsurgiu nítida a animosidade entre a testemunha e o juiz representado (“uma situação que já era muito ruim e séria”), cujo recrudescimento, a par do relato acima enfocado, operou-se a partir do oferecimento da medida pelo Parquet.

Nesse contexto, pouco importa o compromisso assumido perante a DD. Relatora, assim como o fato de o depoimento do aludido membro do MPF não restar isolado nos autos, pois não se vislumbra no caso concreto a completa isenção de ânimo necessária à valoração das suas declarações na condição de testemunha do Juízo (art. 214, do CPP e arts. 447, § 3º, I e II, e §§ 4º a 5º, e 457, §§ 1º e 2º, do CPC do CPC). Por corolário, atribuo à testemunha contraditada a conotação de mera informante e, como tal, se o caso, cotejados os demais elementos de prova, será valorado o respectivo depoimento.

No mais, conforme já anteriormente exposto, os DD. Procuradores Regionais da República, signatários da representação proposta em face do Juiz Federal Edevaldo de Medeiros (Adriana Scordamaglia, Álvaro Luiz de Mattos Stipp, Janice Agostinho Barreto Ascari, José Ricardo Meirelles, Márcio Domene Cabrini, Sergei Medeiros Araújo, Stella Fátima Scampini e Uendel Domingues Ugatti), noticiaram que o magistrado retarda a prestação jurisdicional, profere decisões atípicas, teratológicas, tumultuárias e disfuncionais - dissociadas da realidade jurídico-processual dos autos - e, portanto, desprovidas de fundamentação jurídica técnica e idônea, em desprestígio à atuação institucional dos órgãos de persecução penal. Argumentaram que a atuação padronizada do imputado, envolvendo o indeferimento deliberado das diligências requeridas pelo MPF; a revisão de ofício decisões prolatadas por magistrados substitutos (sem alteração motivadora no panorama fático-juridico); a rejeição sistemática de denúncias sem motivação jurídica exata e razoável, por suposta inépcia, após o encerramento da fase instrutória, com posterior reforma pelo Tribunal; a anulação de provas e o relaxamento de prisões, decorrentes de abordagem realizada pela polícia, pelo simples fato de ter sido realizada por agente público de policiamento ostensivo, sem demonstração de patente ilegalidade; entre outras inúmeras e sucessivas estratagemas, acabava por eximir os réus da efetiva sujeição às medidas cautelares e/ou de sofrerem a condenação criminal.

Sob a ótica dos DD. Procuradores da República, as reiteradas condutas do representado exigiram a interposições de sucessivos e inúmeros recursos em um mesmo processo, particularidade que não se repete em outras subseções judiciárias, assomando intuitivo o escopo do magistrado no sentido de fazer prevalecer a sua peculiar visão no tocante à atuação da força policial e à aplicação da lei penal a investigados em condições econômicas desfavorecidas. Enfatizaram que tais práticas não haviam cessado até o momento de apresentação da reclamação disciplinar, mesmo após reiteradas reformas pela via recursal e da própria atuação da Corregedoria Regional. Acrescentaram que os processos tramitam com excesso de prazo na unidade em que o magistrado é titular, especialmente no que se refere à: i) juntada de petições e documentos; ii) submissão dos feitos à conclusão; iii) prolação de despachos e decisões; e iv) remessa de recursos ao Tribunal; sendo que tais falhas, longe de aceitáveis, podem inviabilizar a persecução penal. Indicaram, a título elucidativo, situações envolvendo a remessa de recursos ao Tribunal com atraso superior a 1 (um) ano, assinalando que, em alguns casos, o envio ao 2º Grau somente se concretizou em razão da intervenção do Órgão Censor Regional. Nessa ordem, denunciaram abuso quanto à prerrogativa da independência funcional e ao exercício do livre convencimento motivado, ao relato de que as decisões exaradas pelo representado, subliminarmente, ostentariam conotação político-partidária, a evidenciar um padrão de comportamento reiterado e generalizado indicativo de impropriedade, inexatidão, parcialidade, ausência de qualidade, serenidade, urbanidade e eficiência na prestação jurisdicional, ou seja, práticas violadoras de deveres constitucionais, legais e éticos da magistratura, as quais refletiriam um completo descumprimento do dever de “accountability judicial” comportamental.

Em linhas gerais, imputaram-se ao requerido irregularidades de tais ordens: i) retardamento no andamento dos processos e procedimentos; ii) descumprimento deliberado de decisões do Tribunal; iii) prolação de decisões teratológicas e tumultuárias do andamento processual; iv) predisposição de cercear a atividade funcional de órgãos do sistema de justiça e segurança pública.

Como já visto, o Órgão Especial do TRF3, em sessão realizada em 25/11/2020, por maioria, acolheu parcialmente as imputações, aplicando ao magistrado a sanção de advertência pelo descumprimento de decisão proferida por aquela Corte Regional em sede de Recurso em Sentido Estrito, nos termos do voto apresentado pela Relatora do PAD, Exma. Sra. Desembargadora Federal Marisa Ferreira dos Santos (Acórdão nº 7517033/2021) [44].

Em suma, a par dos fundamentos expendidos em referido acórdão, no tocante ao alegado excesso de prazo e ao suposto “engavetamento” de recursos, o TRF3 não reconheceu a prática de infração funcional, assentando que o atraso no andamento dos processos de interesse do Ministério Público Federal não é consequência de procedimento deliberado e intencional do magistrado, fundado em suas convicções político-ideológicas, mas sim da deficiência de gestão e na dificuldade de lotação e permanência de servidores na unidade judiciária.

Relativamente à alegada predisposição contrária aos órgãos de persecução penal, a Corte local firmou convicção que não há infração disciplinar, tendo em vista que o magistrado aplicaria os entendimentos pessoais “contramajoritários” em todos os casos que lhe são submetidos, particularidade que, independentemente do acerto jurídico, colocava-se em linha com o respectivo dever de independência e imparcialidade. Registrou-se, ainda, que a condição de “garantista” ou “punivista”, por si só, não configura transgressão de ordem funcional.

Quanto à discussão que gravita em torno da anulação e reforma, de ofício, de decisões exaradas pelos magistrados substitutos, o TRF3 compreendeu igualmente que não se caracterizou qualquer infração disciplinar, pois o representado, amparado pelo arcabouço constitucional e processual, modificou as decisões por vislumbrar, com base em seu livre convencimento motivado, alteração do cenário fático e/ou a existência de ilegalidade nas decisões proferidas por outros magistrados que atuaram na 1ª Vara Federal de Itapeva, o que afastaria a hipótese de patente ilegalidade e/ou extrapolação da independência funcional.

No que concerne, aos processos que denunciavam fraude nos cadastros do Programa “Minha Casa, Minha Vida”, o TRF3 reiterou a conclusão na linha de que, conquanto “contramajoritário”, o posicionamento externado pelo juiz requerido não revelaria desvio funcional, tanto que o MPF interpôs as medidas cabíveis contra as decisões do representado – providas pelo Tribunal – a indicar o pleno funcionamento do sistema judiciário como um todo.

Tão somente em relação ao descumprimento de decisão proferida pela Corte Local, o TRF3 assentou a prática de infração disciplinar (art. 35, I, da LOMAN), ao entendimento de que o requerido teria inviabilizado deliberadamente a execução de medida cautelar de busca e apreensão determinada pelo Tribunal no Recurso em Sentido Estrito nº 0001449-25.2016.4.03.6139, violando a hierarquia e a disciplina judiciária, o que lhe valeu a aplicação da pena de advertência - objeto específico da revisão disciplinar proposta pelo magistrado (RevDis 8678-96) -.

Pois bem. Diante do conteúdo mais abrangente, examino em primeira ordem as questões vinculadas ao procedimento revisional instaurado de ofício (RevDis 749-75), registrando, desde logo, que o atento cotejo entre os fundamentos externados no acórdão proferido no julgamento do PAD e os demais elementos de convicção aqui reunidos, sinalizam que as conclusões externadas pelo Órgão Especial do TRF3, tanto em relação ao desfecho típico-administrativo dos episódios submetidos à cognição daquela Corte Local, quanto em relação à proporcionalidade da sanção aplicada, revelam-se contrárias à lei e à evidência dos autos, desafiando a correspondente revisão (art. 83, I, do RICNJ).

Com efeito, no levantamento do MPF, detalhado na peça de representação dirigida tanto à Corregedoria Local, quanto à Corregedoria Nacional de Justiça (da qual se desdobrou o PAD originário), foram apontados nada menos que 80 (oitenta) processos criminais, ilustrativos da excessiva mora processual, o que teria viabilizado – em diversos casos – a consumação da prescrição da pretensão punitiva[45], sem que tais dados objetivos, relativos à movimentação processual, tenham sido impugnados especificamente pela defesa.

Por outro lado, o Parquet também sustentou que, no período de 06/05/2017 e 17/06/2019, teriam sido oferecidas 65 (sessenta e cinco) denúncias e interpostos 73 (setenta e três) recursos em sentido estrito, o que destoaria da realidade das demais subseções judiciárias, demonstrando a conduta atípica do representado, apta a inviabilizar o bom andamento dos processos criminais na base de primeiro grau de jurisdição. Ainda conforme relatado pela Procuradoria Regional da República, o representado teria “engavetado” os recursos aviados pelo MPF contra suas decisões, alguns dos quais não receberam impulso por 1 (um) ou até 2 (dois) anos, antes de serem remetidos ao TRF3.

 

Eis os teor dos dados comparativos apresentados pelo Órgão Ministerial ao ensejo da apresentação da reclamação disciplinar[46]:

 

 

Em relação aos percentuais supramencionados, compartilho do entendimento perfilhado pelo Órgão Especial do TRF3, à luz do voto apresentado pela DD. Relatora do PAD, no sentido de que tais dados isoladamente não teriam o condão de demonstrar a atuação atípica e dolosa do magistrado representado, pois a Procuradoria Regional da República não esclareceu a metodologia de comparação adotada, sem que tenham sido ao menos apontadas as razões de indicação das Subseções de Bragança Paulista, São João da Boa Vista, Ourinhos, Sorocaba e Presidente Prudente (cidades localizadas em regiões díspares) para fins de cotejo estatístico, sem que se perca de vista o fato de que não foram obtidos dados quanto ao percentual de recursos ofertados pelo MPF em Itapeva e efetivamente providos.

Reporto-me, assim, às acertadas observações do julgado originário, na direção de que os percentuais supra enfocados também podem ser indicativos das particularidades e nuances envolvendo a própria atuação dos Procuradores da República designados para atuar naquelas Subseções (“ou porque estão 100% satisfeitos com as decisões proferidas, ou porque não conseguem vencer o número de recursos de interposição necessária ou porque talvez não enxerguem na atividade jurisdicional a ‘atuação atípica do magistrado’ apontada” em relação à Itapeva).

Contudo, a teor do exame dos demais dados objetivos e expressivos oferecidos na representação apresentada pela Procuradoria Regional da República, aliado à consulta ao sistema processual da Justiça Federal da 3ª Região[47], salta aos olhos o retardamento excessivo na tramitação processual (prolação de despachos e decisões, processamento de recursos, movimento dos autos à conclusão), sendo digno de nota que os 80 (oitenta) processos indicados pelo MPF a título exemplificativo foram reproduzidos pela própria Relatora do PAD no voto condutor do aresto exarado pelo TFF3[48]. Em caráter elucidativo, transcrevem-se por amostragem os seguintes casos de morosidade na entrega da prestação jurisdicional:

 

1) Autos 0006005-07.2009.4.03.6110: “Recurso em Sentido Estrito interposto em 23/11/2015, remetido ao E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região apenas após a interposição de correição parcial, em 02/02/2017, mais de um ano depois da interposição”;

 

2) Autos 0000268-52.2017.4.03.6139: “Agravo em Execução

interposto em 21/08/2015 (contra decisão dos autos n° 0002555-61.2012.4.03.6139), que foi remetido ao E. Tribunal Regional Federal da 3a Região apenas em 07/03/2017, quase dois anos após. O recurso foi juntado em 21/10/2015 e em 11/12/2015 a decisão recorrida foi mantida, bem como foi determinada a formação do instrumento e o encaminhamento à instância superior. No entanto, apenas em 07/03/2017 (após a correição parcial), houve a distribuição e remessa do recurso ao E. Tribunal Regional Federal da 3a Região”;

 

(...)

 

5) Autos 0004927-65.2015.403.6110: “Recurso em Sentido Estrito interposto em 25/04/2016, remetido ao E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região apenas em 06/04/2017 (após a correição parcial)”;

 

(...)

 

10) Autos 0001413-64.2012.4.03.6125: “Recurso em Sentido

Estrito interposto em 02/02/2016 e remetido ao E. Tribunal Regional Federal da 3a Região apenas em 09/12/2016. As contrarrazões foram juntadas em 04/04/2016, porém apenas 06/12/2016 os autos foram conclusos. A decisão proferida pelo magistrado foi reformada pelo TRF3”;

 

11) Autos 0000127-67.2016.4.03.6139: “Recurso em Sentido

Estrito interposto em 25/04/2016. Em 26/04/2016 o recurso foi juntado e os autos foram conclusos, porém apenas em 29/07/2016 houve decisão de recebimento do recurso e apenas em 01/02/2017 o recurso foi remetido ao E. Tribunal Regional Federal da 3a Região. A decisão proferida pelo magistrado foi reformada pelo TRF3”;

 

(...)

 

15) Autos 0009511-78.2015.403.6110: “Denúncia oferecida em 23/09/2016 e juntada nos autos em 28/10/2016. Apenas em 06/03/2017 os autos foram conclusos, data em que a denúncia foi rejeitada. A decisão proferida pelo magistrado foi reformada pelo TRF3”;

 

16) Autos 0000687-09.2016.4.03.6139: “Denúncia oferecida em 17/06/2016 e juntada aos autos em 22/08/2016. Apenas em 03/03/2017 os autos foram conclusos, data em que a denúncia foi rejeitada”;

 

(...)

 

20) Autos 0001283-79.2009.403.6125: “Apelação interposta em 16/10/2015. O recurso foi juntado nos autos em 21/10/2015 e apenas em 07/03/2016 os autos foram conclusos. Em 26/09/2016 foi determinada a intimação da recorrida para apresentar contrarrazões, porém, apenas em

15/03/2017, quase seis meses depois, foi expedido o mandado de intimação e apenas em 10/04/2017 os autos foram remetidos à instância superior, um ano e seis meses após a interposição do recurso. A decisão proferida pelo magistrado foi parcialmente reformada pelo TRF3”;

 

21) Autos 0003112-48.2012.403.6139: “Apelação interposta em 16/12/2015 e juntada aos autos em 10/02/2016. Os autos foram conclusos em 22/02/2016, sendo que o próximo andamento é de 12/04/2016, quando foi retificada a autuação. Depois, o próximo andamento processual é de apenas 16/09/2016, cinco meses depois. Os autos foram remetidos à instância superior apenas em 14/02/2017, mais de um ano após a interposição do recurso. A decisão proferida pelo magistrado foi reformada pelo TRF3”;

 

22) Autos 0002595-77.2011.403.6139: “Apelação interposta em 19/11/2015, juntada aos autos em 23/11/2015. Em 02/12/2015 foi disponibilizado no diário eletrônico despacho recebendo o recurso e determinando a intimação do recorrido para apresentar contrarrazões. Todavia, o próximo andamento é de apenas 04/03/2017, mais de um ano depois, quando os autos foram conclusos. Os autos foram remetidos à instância superior apenas em 13/03/2017. A decisão proferida pelo magistrado foi reformada pelo TRF3”;

 

23) Autos 0010418.92.2011.403.6110: “Apelação interposta em 17/03/2016, juntada aos autos em 22/03/2016. Apenas em 14/07/2016, quase quatro meses depois, os autos foram conclusos. O recurso somente foi recebido no E. Tribunal Regional Federal da 3a Região em agosto de 2018. A apelação interposta pelo MPF não foi provida”;

 

24) Autos 0004031.66.2008.403.6110: “Apelação interposta em 15/04/2016, juntada aos autos em 26/04/2016 e remetida ao E. Tribunal Regional da 3a Região apenas em 28/03/2017, quase um ano após a interposição do recurso”;

 

(...)

 

30) Autos 0000042-18.2015.403.6139: “Após o recebimento da denúncia, que ocorreu pelo E. Tribunal Regional Federal da 3a Região em Recurso em Sentido Estrito, foi proposta a suspensão condicional do processo, em 03/06/2016, juntada aos autos em 13/07/2016. Porém, apenas em 19/02/2017, mais de oito meses depois, os autos foram conclusos e apenas em 27/03/2017 houve decisão do representado, mais de nove meses depois”;

 

31) Autos 0000478-74.2015.403.6139: “A denúncia foi recebida pelo E. Tribunal Regional Federal da 3a Região em Recurso em Sentido Estrito. Os autos retornaram ao juízo de primeiro grau em 13/05/2016, porém, apenas foram remetidos ao Ministério Público Federal em 27/03/2017, quase um ano após”;

 

32) Autos 0001908-32.2013.403.6139: “Recurso em Sentido Estrito interposto em 18/09/2015. Em 10/11/2015 foi disponibilizado no diário eletrônico despacho determinando a intimação dos recorridos. Porém, apenas em 04/03/2017 os autos foram conclusos, mais de um ano e cinco meses depois. O recurso foi remetido ao E. Tribunal Regional Federal da 3a Região apenas em 14/03/2017. A decisão proferida pelo magistrado foi reformada pelo TRF3;

 

33) Autos 0000754-08.2015.403.6139: “Recurso em Sentido Estrito interposto em 16/10/2015. Em 27/10/2015 os autos foram recebidos com despacho, porém o próximo andamento processual é de mais de um ano e quatro meses depois, de 08/03/2017, quando houve a juntada de petição. O recurso somente foi remetido ao E. Tribunal Regional Federal da 3ª Região em novembro de 2017, mais de dois anos após a interposição. A decisão proferida pelo magistrado foi parcialmente reformada pelo TRF3;

 

(...)

 

39) Autos 0006196-47.2012.403.6110: “Denúncia oferecida em 05/02/2016, rejeitada por suposta inépcia mais de um ano depois, em 03/03/2017”;

 

40) Autos 0001097-09.2012.403.6139: Denúncia oferecida em 01/12/2015, recebida parcialmente em 14/07/2016. Essa decisão foi registrada apenas em 02/03/2017 e não foi dada ciência ao Ministério Público Federal. Também em 02/03/2017 os autos foram conclusos e o representado reformou essa decisão de ofício, em 06/03/2017, declinando o feito para a esfera estadual, mais de um ano depois do oferecimento da denúncia;

 

(...)

 

42) Autos 0001282-42.2015.403.6139: Denúncia oferecida em 01/12/2015, recebida parcialmente em 18/10/2016, decisão da qual não foi dada ciência ao Ministério Público Federal. O representado reformou essa decisão de ofício, em 02/03/2017, declinando o feito para a esfera estadual, mais de um ano depois do oferecimento da denúncia;

 

(...)

 

44) Autos 0005934-92.2015.403.6110: “Pedido de arquivamento e declínio de competência protocolado em 13/11/2015 e juntado aos autos em 11/12/2015. Os autos foram conclusos quase quatro meses depois, em 02/03/2016. O recebimento com decisão do representado ocorreu em 29/07/2016 e a decisão foi registrada apenas em 19/08/2016. O próximo andamento processual ocorreu sete meses depois, em 16/03/2017, sendo que a baixa dos autos para a Justiça Estadual ocorreu apenas em 05/04/2017, mais de um ano e quatro meses depois do pedido”;

 

45) Autos 0001185-42.2015.403.6139: “Denúncia oferecida em 05/11/2015, juntada aos autos em 09/11/2015. Os autos foram conclusos apenas em 23/03/2016. A denúncia foi recebida em 29/03/2016 e os autos foram recebidos na secretaria em 30/03/2016. Após, o próximo andamento processual, de remessa dos autos ao Ministério Público Federal, ocorreu apenas em 27/03/2017, praticamente um ano depois do recebimento da denúncia e mais de um ano e quatro meses após o oferecimento da denúncia;

 

46) Autos 0006493-88.2011.4.03.6110: “O Ministério Público

Federal requereu diligências (fase do artigo 402, do Código de Processo Penal) em 28/08/2015, juntado aos autos mais de um mês depois, em 01/10/2015 e que foram deferidas. Em 31/03/2016 foi juntado aos autos pedido da defesa de instauração de incidente de insanidade mental, que só foi analisado em 27/07/2016, quatro meses depois. A defesa interpôs apelação contra essa decisão, juntada aos autos em 19/08/2016, porém os autos foram conclusos apenas em 08/03/2017, mais de seis meses depois. Apenas em 27/03/2017 os autos foram remetidos ao Ministério Público Federal para apresentação de alegações finais escritas, mais de um ano e seis meses depois de requerer as diligências”;

 

47) Autos 0000771-44.2015.403.6139: “Denúncia oferecida em 17/07/2015 e recebida em 12/08/2015. Após apresentação da resposta à acusação, juntada aos autos em 09/11/2015, os autos foram conclusos apenas em 19/02/2017, mais de um ano e três meses depois, e a denúncia foi rejeitada, em 21/03/2017, mais de um ano e seis meses depois do oferecimento da denúncia. A decisão proferida pelo magistrado foi reformada pelo TRF3”;

 

48) Autos 0000521-11.2015.4.03.6139: “Transação penal proposta em 15/05/2015. A última carta precatória não cumprida foi protocolada em 16/06/2016 e juntada aos autos apenas em 25/10/2016, mais de quatro meses depois. Após, os autos foram conclusos apenas em 19/02/2017, quase quatro meses depois e o despacho determinando vista dos autos ao Ministério Público Federal foi proferido apenas em 13/03/2017, o que poderá ocasionar a prescrição”;

 

50) Autos 0003102-04.2012.4.03.6139: “Ação Civil de Improbidade Administrativa em que as alegações finais dos réus foram juntadas em 18/06/2015. Os autos foram conclusos em 30/07/2015 e apenas em 10/06/2016, quase um ano depois, foi prolatada decisão convertendo o julgamento em diligência, para determinar a manifestação do Ministério Público Federal sobre documentos juntados pelas partes. Em 28/06/2016 os autos foram conclusos, mas apenas em 14/03/2017, sete meses depois, foi prolatada sentença”;

 

(...)

 

54) Autos 0005946-09.2015.403.6110: “Requerimento de reconhecimento da competência do Juízo Federal e encaminhamento dos autos à Delegacia de Polícia Federal para continuidade das investigações protocolado em 17/11/2015 e juntado aos autos em 30/11/2015. Apenas em 23/11/2016 os autos foram conclusos e em 29/11/2016 sobreveio decisão, um ano depois;

 

(...)

 

58) Autos 0011484-83.2006.403.6110: “Pedido de desarquivamento de inquérito policial por descumprimento de parcelamento tributário protocolado em 16/02/2016 e juntado aos autos em 19/02/2016. Apenas em 19/02/2017 os autos foram conclusos, um ano depois do pedido”;

 

(...)

 

60) Autos 0001232-16.2015.403.6139: “Denúncia oferecida em 04/12/2015 e juntada aos autos em 11/12/2015. Apenas em 19/02/2017 os autos foram conclusos e em 03/03/2017 a denúncia foi rejeitada, um ano e três meses depois de oferecida”;

 

(...)

 

70) Autos 0003275-57.2014.403.6139: “Execução Penal. O MPF requereu a reconversão da pena em 01/03/2016, pedido apreciado (postergando a apreciação para após nova tentativa de intimação) em 23/09/2016, com expedição da respectiva carta precatória tão somente em 07/03/2017. Consumou-se a prescrição”;

 

77) Autos 0002062-50.2013.403.6139: “Rejeição de denúncia

reformada pelo TRF3, com baixa para prosseguimento em 01/02/2017. Despacho em 17/03/2017, mas com a expedição das respectivas cartas precatórias apenas em 24/01/2018”;

 

(...)”

 

 

O cenário desolador vivenciado pela unidade judiciária de titularidade do Juiz Federal Edevaldo de Medeiros foi expressamente registrado nas razões de decidir do Órgão Especial do TRF3, por ocasião do julgamento do PAD, à luz dos dados oriundos da Correição Geral Ordinária ali realizada entre 11 e 12 de abril de 2016. Por sua vez, os aludidos apontamentos, conforme constou do v. acórdão revisando, foram registrados na decisão exarada pela Corregedoria Local (em sede de Correição Parcial), com lastro no Relatório do Procedimento Administrativo autuado no SEI sob nº 0009882-61.2016.4.03.8000 (aprovado pelo Conselho da Justiça Federal da 3ª Região em 5 de maio de 2016 - Certidão de Julgamento DCOR 1898454).

Com efeito, ao que se extrai dos mencionados assentamentos, entre outras particularidades, foram detectados atrasos nas atividades cartorárias, inclusive “na promoção de abertura de conclusão, atingindo até mesmo os feitos de vista obrigatória, existindo retardo também na prolação de despachos, decisões e sentenças”. Diante de tais constatações, para fins de padronização e aprimoramento do serviço, sobreveio a recomendação de que a unidade judiciária adotasse diversas medidas, entre as quais[49]:

 

- Aprimoramento da alimentação do sistema de acompanhamento processual informatizado, incluindo-se o cadastramento da fase de recebimento da denúncia;

- Gerenciamento do acervo de modo que os processos não fiquem sem movimentação por mais de 120 (cento e vinte) dias;

- Utilização da rotina MV-GM para expedições de mandados e ofícios (Resolução Conjunta na 2, de 2 de fevereiro de 2014, da Presidência do Tribunal e Corregedoria-Regional);

- Identificação nos autos da existência de bens apreendidos, nos termos da disposição contida no artigo 270 do Provimento CORE 64/2005;

- Inserção de termo de conclusão concomitantemente à promoção da abertura no sistema;

- Aperfeiçoamento no processamento dos feitos, com o intuito de se evitar a incidência das ocorrências detectadas nos autos submetidos a verificação, sobretudo a utilização e preenchimento tanto da etiqueta prevista no § 33 do artigo 161, do Provimento CORE 64/2005, quanto da folha de sumário, e a regular identificação das mídias;

- Alteração de classe processual nos feitos criminais após o recebimento da denúncia e, nos cíveis, naqueles em fase de cumprimento de sentença, em prol da gestão e controle estatístico do acervo, bem como para o fim de permitir atender o contido na Meta 5 de 2015 do Conselho Nacional de Justiça;

- Observância, na promoção de abertura de conclusão, do disposto no artigo 173, § 49, do Provimento CORE 64/2005, e Comunicado CORE 81/2008;

- Intensificação da atividade decisória e de prolação de despachos de expediente, objetivando a redução do estoque de feitos com conclusão aberta para despacho/decisão, inclusive como forma de melhor impulsionar as execuções fiscais;

- priorização do julgamento dos feitos incluídos nas Metas 2, 4 e 6 de 2015 do Conselho Nacional de Justiça e 7/2015 do Conselho da Justiça Federal;

- Julgamento incontinenti dos feitos conclusos para sentença em 2014 (todos) e 2015 (ações penais, feitos previdenciários e processos de vista obrigatória), cumprindo à unidade judiciária em questão encaminhar à Corregedoria, no prazo de 4 (quatro) meses a contar do recebimento deste relatório, planilha atualizada materializada em relatório próprio (rotina RM/RC), para o adequado acompanhamento."

 

A despeito da abrangência e do detalhamento das medidas sugeridas ao magistrado requerido visando a solução dos problemas apontados, bem assim do reconhecido esforço na redução do acervo, persistiu o quadro de deficiência ligado à morosidade processual. Tanto assim que, conforme igualmente consignado pela relatoria do PAD, foi realizada outra Correição Ordinária na 1ª Vara Federal de Itapeva no lapso compreendido entre 2 e 4 de maio de 2018, ocasião em que o Corregedor Regional apontou o grande acervo de processos daquela Unidade, instalada em 2010 (Provimento CJF3 nº 319/2010), valendo destacar que o Juiz Federal havia assumido a respectiva titularidade em 7 de julho de 2014.

Nesse sentido, o acórdão proferido pelo TRF3 tabulou dados indicativos de que, pela análise dos processos criminais naquela Correição Ordinária de maio/2018, as Metas deste CNJ não haviam sido cumpridas. Dada a relevância do relatório correicional examinado pelo Tribunal de Origem para o deslinde da questão nesta esfera revisional, assoma imperativo a reprodução dos informes bem lançados pela DD. Desembargadora Relatora do PAD[50]:

 

"META 7/2017 do CNJ (qualitativa): NÃO cumprida

 

A Meta 7/2017 objetiva baixar e julgar, no ano, quantidade maior de processos criminais do que os casos novos criminais no respectivo período, sendo cumprida

quando o acumulado dos processos sentenciados dividido pelo acumulado dos processos (distribuídos - (excluídos + incluídos)), até o mês vigente ou pesquisado, for maior que um. A estatística da unidade exibiu o seguinte desempenho (base: 12/2017):

 

 

Em se tratando de meta em processos criminais, sujeitos a prescrições e outras graves consequências processuais, é de rigor que a aferição do resultado, vinculado a dado de celeridade objetiva, seja rigorosa e, no caso, 72% do acervo sujeito à meta deixou de ser tratado adequadamente com o julgamento no prazo do nivelamento idealizado, acarretando, pois, o aumento do acervo criminal em tramitação.


 

 

Oportuno acrescentar que a Relatora do PAD, no corpo do voto condutor do v. aresto sob revisão, registrou outros dados relevantes emanados da Correição Ordinária de maio/2018, apontando – entre outras referências - o expressivo volume de feitos conclusos para  despacho/decisão (784) e sentença (390), além da existência de processo aguardando desfecho na conclusão desde abril/2017 (Processo 0009005-54.2011.4.03.6139), com a observação de que o processo mais antigo em fase de conclusão havia sido distribuído em 13/01/2011 (Processo 0000328-35.2011.4.03.6139). Os registros consignados nas razões de decidir estacam qualquer dúvida quanto à morosidade na entrega da prestação jurisdicional, revelando-se imperiosa a correspondente transcrição[51]:

 

“(...)

 

Pela rotina Controle de Metas, do Sistema de Acompanhamento Processual da Justiça Federal, seria necessário julgar mais do que o indicado na linha de produtividade para ser atingido o nivelamento pretendido com a prioridade fixada pelo Conselho Nacional de Justiça. Trata-se, como visto, de mínimo a ser atingido e, assim, seria necessário julgar mais processos do acervo referente a crimes contra a administração da justiça e contra a administração em geral para ser atingido o nivelamento pretendido com a prioridade fixada pelo Conselho Nacional de Justiça (70% do universo de sete feitos), o que recomenda a priorização no respectivo processamento e julgamento". (destaquei).

 

...

 

Verifica-se, no caso, que as diversas metas quantitativas e qualitativas, que se encontram pendentes de integral cumprimento, somente podem ser atingidas se houver, no próprio processamento, a celeridade necessária, o que não se verificou, em vários níveis, no âmbito da unidade.

 

De fato, sem adentrar no exame de outras variáveis, os dados revelam que o acervo ainda pendente a ser julgado. Para tal fim, é elevado e preocupante. Somando quase duzentos processos (178 da Meta 2/2017. Cinco da Meta 4/2017. E quatro da Meta 8/2017). Recomendando maior atenção e estímulo para a elaboração e implemento imediato, pela unidade, de plano de trabalho, focando no êxito e estrita observância das prioridades estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça".

...

 

Verifica-se expressivo número de feitos sem qualquer movimentação há pelo menos quatro meses e, alguns, há mais de um ano. Mesmo que conste eventual prazo em curso, tais situações, quando superiores a cento e vinte dias, merecem monitoramento e justificativa específica.

 

Vale destacar, no sentido oposto, que houve movimentação, nos últimos sessenta dias, de extraordinário volume do acervo da unidade, o que, de certa forma, demonstra o efeito positivo da correição.

 

...

 

Os quadros acima demonstram situação grave da unidade na gestão processual, no tocante seja ao processamento, seja ao julgamento do acervo físico.

 

De fato, existe elevado volume de feitos conclusos para sentença (390), e a conclusão mais antiga remonta a 11/04/2017 (processo 0009005-54.2011.4.03.6139), enquanto que o processo mais antigo em fase de conclusão foi distribuído em 13/01/2011 (processo 0000328-35.2011.4.03.6139).

 

Também importante registrar que, dentre tais feitos, observou-se, por amostragem, que o tempo médio entre o ato processual anterior e a respectiva remessa à conclusão para sentença é de quinze dias, e de 1.452 dias entre a distribuição e tal conclusão para sentença, o que se revela excessivo e recomenda revisão na estratégia de gestão da unidade.

...

 

Outro dado que merece atenção, na estatística da unidade, é o elevado volume de processos conclusos para despacho/decisão (784), verificando-se situação de atrasos de vários meses, em prejuízo, portanto, à tramitação regular e célere do acervo.

 

Não houve apuração, no caso, de processos com pendência de cumprimento de diligência pela Secretaria, na medida em que, em razão da correição, houve movimentação intensa do acervo retratada nas últimas fases de processamento lançadas no sistema (remessa para publicação, publicação, juntadas, ato ordinatório, etc.).

 

Necessário pontuar, contudo, que, diante de tais situações críticas, a unidade foi alertada para a adoção de providências urgentes de regularização, iniciando-se, de imediato, a análise de feitos pendentes na fase de conclusão para despacho/decisão, de que resultou a movimentação, no curso da correição, de setenta processos, elaborando-se estratégia de ação com metas semanais de produtividade, o mesmo ocorrendo no âmbito dos processos em fase de conclusão para sentença, conforme plano de trabalho apresentado para estudo analítico da Corregedoria-Regional, sem prejuízo da implementação iniciada.

 

(...)”.

 

Para além do não atingimento das metas qualitativas e quantitativas do CNJ, em segmentos e níveis diferenciados, ressoa do v. aresto sob revisão que o elevado atraso abarcava quase a totalidade dos processos físicos inspecionados por amostragem, conforme se depreende dos quadros ilustrativos a seguir reproduzidos[52]:

 

 

Deflui, portanto, dos elucidativos registros lançados nas razões de decidir do TRF3, que a listagem levantada pelo Órgão Censor Local, ao tempo dos trabalhos correicionais de 2018, levou à identificação de atrasos pontuais de até catorze meses, superiores à previsão legal para a prolação de sentença, pelo que a unidade foi alertada sobre a importância de adotar mecanismos de controle permanente de prazo, especialmente em feitos sensíveis pelo respectivo objeto, partes ou tempo de tramitação. Eis aqui outros dados obtidos nos trabalhos correicionais, replicados pelo TRF3 no julgamento do PAD[53]:

 

 

 

A amostragem extraída do relatório de correição mencionado pela Corte Originária também identificou um elevado número de processos com atrasos frente à previsão legal para exame de petição após a conclusão dos autos, verificando-se, em alguns casos, pendência por prazo superior a um ano[54]:

 

 

 

Os números acima enfocados evidenciam que a unidade não atentava às metas de produtividade, nem tampouco às recomendações correicionais, olvidando-se quanto à importância da pronta abertura da conclusão ao magistrado após a manifestação das partes e/ou do MPF e concretização de outros atos processuais, como forma de assegurar a celeridade e a eficiência no próprio cumprimento dos prazos em tempo razoável.

Como se observa, a par do relatório elaborado pela Corregedoria Regional do TRF3, com base no material coletado na inspeção de 2018, devidamente esmiuçado, repita-se, nos fundamentos externados no voto condutor do acórdão do PAD, ora sob revisão, denota-se que os significativos atrasos no andamento processual atrelaram-se à má gestão da unidade jurisdicional, o que impôs a elaboração de plano de trabalho para acompanhamento pelo Órgão Censor local. Deflui, ainda, das constatações da Corregedoria do TRF3, que a demora no trâmite processual ocorria de modo generalizado, não se restringindo às ações penais.

À parte das deficiências anteriormente expostas, cumpre destacar que a resenha elaborada em razão dos trabalhos correicionais de maio/2018 indica que foram detectadas outras irregularidades formais, relacionados à ausência de identificação na capa dos autos, de tarjas, de planilhas de controle de prescrição, de preenchimento de termos/certidões e termo de conclusão.

Diante de todos esses levantamentos, nas conclusões assentadas no relatório correicional, bem sintetizando o panorama crítico vivenciado pela unidade judiciária ao tempo dos fatos, sobreveio o alerta do Órgão Censor local, de seguinte teor[55]:


 

O exame da amostragem revelou a existência de fases ou situações críticas na gestão do processamento e julgamento dos feitos. Os atrasos, falhas ou erros procedimentais, embora não generalizados, foram bastante frequentes, inclusive em processos de tramitação prioritária, relacionando-se a pontos como falta de adequação e regularização de lançamento, no sistema MUNPS, de fases processuais e utilização da planilha de prescrição. A maioria das situações foi sanada no curso dos trabalhos, e o monitoramento dos procedimentos, para controle de regularidade e resultados, tem como objetivo garantir a eficiência e a excelência na gestão processual.

 

De modo geral, remanescem ainda casos para controle específico, sem prejuízo do acompanhamento preventivo do acervo, controlado por amostragem, nas situações ou fases mais relevantes apuradas durante a correição.

...

 

Ainda durante a correição, houve orientação ao magistrado e ao diretor da Secretaria para elaboração imediata de plano de trabalho para regularização do acervo e acompanhamento da Corregedoria-Regional no tocante aos pontos críticos constatados pela equipe, dentre os quais: atrasos significativos no processamento, cumprimento das determinações judiciais e julgamento de processos sensíveis; baixa produtividade e constante fluxo positivo como causa de aumento expressivo do acervo eletrônico; falta de uso de métodos e ferramentas essenciais na tarefa de adequada gestão processual (a exemplo da planilha de prescrição penal, lançamento no sistema da data de recebimento da denúncia); e omissão no controle mais efetivo da cobrança de carga, como o prazo excedido, de autos remetidos para o Ministério Público Federal e Fazenda Nacional, do cumprimento de cartas precatórias e de outros prazos processuais.

 

Neste contexto, foi constatada a praxe de significativa demora na prestação jurisdicional, após à conclusão dos autos ao Juízo, excedendo-se nos prazos de prolação de sentenças e decisões, gerando risco de efetiva prescrição da persecução penal, considerada a pena mínima, razão pela qual foi determinada a elaboração de metas e plano de ação, bem como o imediato julgamento das ações penais 0001515-73.2014.403.6139 (prescrição pela pena mínima em junho/2018), 00002092-22.2012.403.6139 (prescrição pela pena mínima em junho/2018) e 0002249-24.2014.403.6139 (prescrição pela pena mínima em julho/2018).

 

Saliente-se que a unidade apresentou o plano de trabalho, atualmente em acompanhamento na Corregedoria-Regional.

 

Para orientar a unidade na condução dos esforços de regularização, saneamento e aprimoramento das rotinas de trabalho, relacionadas às situações e fases críticas que foram identificadas, especialmente as que constituem reiteração do apurado em correição anterior, necessário o acompanhamento permanente da gestão local, mediante elaboração de relatórios informativos e de desempenho, conforme cronograma fixado pela Corregedoria-Regional, e visitas técnicas complementares à correição para verificar o desenvolvimento dos trabalhos e a situação atualizada da unidade judiciária”.

 

 

Imperioso ressaltar que, em fevereiro de 2020, ou seja, quando já transcorridos quase 2 (dois) anos da última correição ordinária que havia identificado a persistência nos problemas da 1ª Vara Federal de Itapeva-SP, não foi detectada melhora substancial no cenário outrora identificado pela Corregedoria Local (descontrole do acervo, improdutividade e mora na marcha processual). Naquela conjuntura, a Corregedoria Regional da 3ª Região publicou o Relatório de Gestão Estatística e de Cumprimento de Metas da Justiça Federal da 3ª Região, com comparativos dos anos de 2017 a até 31/12/2019, depreendendo-se que, em 31/12/2019, a situação da unidade permaneceu quase idêntica àquela aferida em 2018, a despeito da restruturação da vara e do aumento do quadro de servidores – o que teria ocorrido aproximadamente entre o final/2017 e março/2018 (conforme interrogatório do próprio magistrado)[56] -. À luz da correspondente “Tabela Resumo”, houve discretíssima redução de acervo (2% do acervo total em tramitação – 12.183), com aumento de apenas 1,1% (um vírgula um por cento) no total de sentenças proferidas (2.666) e redução tão somente de 1,7% (um vírgula sete por cento) na taxa de congestionamento (70,7%), a evidenciar que a gestão do acervo da Vara de Itapeva e o andamento dos processuais carecia de aperfeiçoamento[57].

Ademais, não é ocioso lembrar que o saneamento das deficiências – se e quando concretizado - tem efetiva relevância e repercussão na dosimetria de possível sanção, sob pena de verdadeiro esvaziamento do próprio poder disciplinar da Administração. Logo, ainda que regularizada a situação pretérita, com a plena retomada da celeridade na entrega da prestação jurisdicional – o que não se pode dizer tenha ocorrido no caso concreto -, tal nuance não teria o condão de desnaturar eventual infração outrora concretizada, ou seja, não afastaria o dever imposto à Administração de apurar as condutas e punir eventuais infrações. É o que se conclui da atenta leitura do art. 128, da Lei nº 8.112/90, aplicável subsidiariamente aos processos administrativos disciplinares contra magistrados (art. 26, da Resolução CNJ 135/2011, art. 26), que prevê:

 

Art. 128.  Na aplicação das penalidades serão consideradas a natureza e a gravidade da infração cometida, os danos que dela provierem para o serviço público, as circunstâncias agravantes ou atenuantes e os antecedentes funcionais

 

É certo que, consoante ponderou a DD. Relatora do PAD, bem assim enalteceu a defesa, outros fatores e condições adversas podem ter contribuído para o comprometimento da gestão e o congestionamento processual (ampliação da competência e abrangência do Juizado Especial Federal, alta rotatividade dos servidores, déficit no quantitativo de serventuários, instituição do processo eletrônico, acervo físico remanescente, utilização concomitante de plataformas distintas, ausência de juiz auxiliar e/ou substituto por determinado período). Entretanto, tais justificativas isoladamente não se prestam a respaldar o amplo e generalizado panorama de desorganização e deficiência diagnosticado, pois as dificuldades em questão correspondem à realidade que não se diferencia daquela vivenciada pela grande maioria das Varas Federais da 3ª Região e das demais estabelecidas no vasto interior do pais – menos ainda das Varas Estaduais -, sendo certo que o magistrado foi alertado desde 2016 sobre a situação da 1ª Vara de Itapeva, sem que tenha demonstrado a adoção de medidas concretas, à época, no intuito de sanear a unidade de sua titularidade desde 2014 e debelar os reiterados atrasos. Como bem observado com argúcia pela D. Corregedoria Nacional de Justiça, ao ensejo da instauração do presente procedimento revisional, incumbia ao representado haver solicitado o auxílio e a intervenção da Corregedoria Local, com o escopo de encontrar a solução mais adequada àquele cenário, em busca da solução mais adequada, elaborando e executando plano de ação consistente e eficaz, sem que providências concretas nessa direção tenham sido implementadas, a despeito do monitoramento do próprio Órgão Censor Regional em determinado lapso temporal.

Expostas tais premissas, extraídas, repita-se, dos dados probatórios emanados do próprio julgamento do PAD, ouso dissentir das ponderações externadas no v. aresto oriundo do Órgão Especial do TRF3, no sentido de que a ausência de elementos de convicção indicativos de que o atraso processual em si tenha resultado de estratégia e/ou procedimento intencional e deliberado do magistrado requerido (para fazer valer as suas convicções ideológicas) descaracterizaria a hipótese de ofensa aos deveres insculpidos na Lei Orgânica da Magistratura e no Código de Ética da Magistratura. É que, independentemente de dolo ou eventual motivação político-ideológica, o magistrado ostenta a condição de responsável pela gestão dos processos em trâmite na unidade jurisdicional sob a sua titularidade, competindo-lhe, portanto, o direcionamento de todos os trabalhos ali desenvolvidos, tratando-se de providências que evidentemente abarcam a orientação, a fiscalização e o amplo comando na atuação dos servidores que lhe auxiliam.

Na hipótese, os números e demais aspectos objetivos acima apontados, expressamente analisados pelo próprio Tribunal de Origem ao tempo do julgamento do PAD, são incontroversos, fragilizando por completo as premissas defensivas, já que estacam qualquer dúvida quanto à prática de transgressão disciplinar, diante da ausência de organização da unidade judiciária e, portanto, do patente excesso de prazo ali aferido, valendo destacar a persistência no mau desempenho da unidade, nada obstante os planos de trabalho desenvolvidos e o monitoramento pelo Órgão Censor Local (conforme constatado pelos sucessivos levantamentos correcionais realizados de 2016 a 2020). Sob tal perspectiva, não se olvide que, para além da morosidade na entrega da prestação jurisdicional, na hipótese dos processos criminais, a omissão do magistrado no cumprimento dos deveres do cargo, em derradeira análise, ensejou prejuízo à sociedade como um todo, diante da concretização da prescrição da pretensão punitiva do Estado em parte dos casos submetidos à condução do representado.

Nesse contexto, a conclusão final adotada pelo TRF3, no sentido de que, conquanto evidenciadas a má gestão e a mora processual, inexistiria transgressão disciplinar, ante a ausência de comprovação do elemento subjetivo motivador (convicção político-ideológica), revelou-se contrária à evidência dos autos e, portanto, ao ordenamento jurídico (art. 83, I, do RICNJ). Como se viu, restou patenteada a conduta negligente do juiz requerido, caracterizando a infringência aos deveres que impõem o cumprimento das disposições legais e atos de ofício com independência, serenidade e exatidão, bem como a determinação das providências necessárias para que os atos processuais se realizem nos prazos legais (art. 35, I e III, da LOMAN), devendo ser lembrado que tal omissão também converge ao descumprimento do dever de diligência e dedicação insculpido no art. 20, do Código de Ética da Magistratura.

No que toca à reforma ex officio de decisões proferidas por outros magistrados (investidos no mesmo grau de jurisdição), independentemente da alteração das circunstâncias de fato e de direito, em dissonância com as decisões oriundas do próprio Tribunal de Origem que alertaram o magistrado quanto à irregularidade do procedimento, cumpre aqui tecer algumas considerações.

Por ocasião do interrogatório, o juiz requerido admitiu a aplicação de teses minoritárias, bem assim declarou que não procedia deliberadamente ao reexame de ofício das decisões proferidas por outros magistrados. Referiu que, a despeito da vasta extensão, Itapeva não contava com defensoria pública, pelo que, deparando-se no curso do processo com a hipótese de réu preso, analisa ex officio a licitude da prisão, de modo a dar efetivo cumprimento ao art. 316, do CPP[58]. Não haveria, portanto, solicitação aleatória de envio dos feitos à revisão pelo simples fato de terem sido prolatadas decisões de prisão[59]:

“[...]

RELATORA Quando os processos criminais são despachados no plantão - e essa é uma alegação que o Ministério Público inclusive relaciona vários processos -, quando eles são então despachados no plantão por um outro juiz, percebe-se que o senhor às vezes altera essas decisões sem que tenha havido requerimento das partes, faz isso de ofício, tem aí uma relação de processos.

O senhor costuma rever todas as decisões dos juízes proferidas no plantão, pelos juízes de plantão?

DEPOENTE Então, doutora, aí tem uma questão de linguagem também, né? Que eu faço revisão, que eu me comporto como órgão revisor, mas não é isso que acontece. O que acontece é o seguinte: Itapeva é uma cidade grande, ela não tem Defensoria Pública. Então, se de repente no curso do processo eu me deparo... no curso do processo, eu não peço para trazer o processo: Olha, venha aqui e traga todos os processos para mim, de plantão, que eu vou revisar as decisões. Isso eu não faço. O que eu faço é o seguinte, o processo... depois lá eu nem sei, às vezes eu pergunto para eles: Quantos réus presos nós temos na vara? Porque outro dia uma colega foi processada e condenada porque uma pessoa ficou presa treze anos sem que a vara se desse conta, uma vara no Nordeste, a juíza foi processada e condenada por isso, e já tinha passado vários juízes pela vara. Então eu pergunto genericamente: Quantos réus presos nós temos? Como é que estão os processos?

E isso eu pergunto. Agora, me traga aqui os processos que o juiz deixou preso, eu nunca faço.

Agora, se eu encontrar o processo, se ele vier para cumprimento, para despacho, para alguma coisa, eu olho se a pessoa está presa e, se eu olhar que a pessoa está presa, eu analiso de ofício se ela deve ou não ficar presa, porque o art. 316 do Código de Processo Penal diz expressamente que o juiz pode fazer isso.

Agora, mesmo antes do Código dizer isso, eu nunca - confesso a V. Exª – achei que alguém pudesse achar que eu estava querendo ofender meus colegas com esse procedimento, porque isso é muito comum, até na votação de abertura do PAD um dos desembargadores levantou essa questão, e ocorre isso até nos Tribunais. Agora, não ocorre porque eu tenho desejo de fazer nada, de impor a minha vontade sobre o meu colega. Todas essas minhas decisões, eu vi que umas das coisas que foram exemplificadas foi a seguinte: “Ah, as decisões do juiz são sempre reformadas”.

Eu não discuto que eu tenho tese minoritária. Certamente eu sigo teses... jurisprudências minoritárias.

Mas nesse caso específico, por exemplo, não se usou o argumento de que as decisões do juiz foram reformadas, porque o Tribunal manteve todas as minhas decisões de soltura, todas essas decisões. Nenhum desembargador mandou me processar por isso.

Então, veja V. Exª o seguinte: essa pessoa que foi presa, normalmente era por cigarro, por crimes sem violência e tal, tanto é que o Tribunal confirmou a decisão. Se eu deixasse a pessoa presa... quando chegar na sentença, eu vou ter que soltar essa pessoa, porque eu solto todos eles de acordo com a mesma tese, porque a pena que eu vou aplicar para ela, se ela for condenada, vai ser uma pena de regime aberto, substituída. A senhora está entendendo? Então eu vou deixar a pessoa presa para se esperar até a sentença, para a sentença soltar a pessoa?

Essa é a questão.

Itapeva, como eu ia dizendo, não tem Defensoria Pública, só tem defensores constitu... os defensores são dativos.

[...]”

 

A despeito do relato acima reproduzido, enquanto titular da unidade, o representado “chama o feito à ordem”, anulando de ofício decisões prolatadas por outros magistrados em situações que não se relacionam unicamente à aferição da necessidade e/ou eventual ilicitude da medida de prisão. Nesse sentido, os dados probatórios sinalizam que o juiz requerido revogou ordens de busca e apreensão, bem assim reviu decisões de quebra de sigilo telefônico, reexaminou decisões homologatórias de prisões em flagrante e decretou antecipadamente a nulidade provas, sem que a sobreposição das deliberações originárias tenham sido ditadas, em todos os casos, pela cláusula rebus sic stantibus, que autoriza a modificação das condições quando os pressupostos não se configurem mais presentes.

Dito de outra forma, em algumas situações, independentemente de fundamentação jurídica suficientemente idônea e da efetiva alteração do panorama fático-processual, o representado acabou por exercer verdadeiro juízo de retratação, nada obstante, repita-se, a ausência das hipóteses legais e excepcionais aptas a respaldar tal conduta, de modo a sobrepor as suas decisões a outras já prolatadas validamente por outros magistrados, o que não se admite pelo ordenamento jurídico pátrio. Tanto assim que o próprio magistrado afirmou em seu interrogatório que, em alguns casos (envolvendo “cigarro” e “crimes sem violência”), deliberava pela soltura imediata, considerando que, na sentença, teria “que soltar essa pessoa”, pois “solta” todos em razão da “mesma tese” (aplicando o regime semi-aberto) e, portanto, não haveria justificativa para a manutenção da prisão até a decisão de mérito - “Então eu vou deixar a pessoa presa para se esperar até a sentença, para a sentença soltar a pessoa” (sic) -.

De ser salientado que as regras e diretrizes extraídas do já citado art. 316, do CPP, bem assim do art. 654, § 2º, do CPP[60], merecem ser interpretadas sistematicamente com o comando inserido no art. 650, § 1º, do mesmo Diploma Legal[61]. Nessa ordem, inexistindo hierarquia entre os juízes de primeiro grau, a modificação de decisões validamente proferidas por outros magistrados, no exercício da sua regular competência, sem que tenha ocorrido a concreta modificação de circunstâncias de fato e de direito, não se coaduna com o dever ético imposto ao juiz, no sentido de abster-se de interferir na atuação jurisdicional de outros colegas, sob pena de ofensa ao dever de cautela e prudência, bem assim de respeito às regras basilares que norteiam as delimitações de competência, atribuição e atuação jurisdicional.

Para fins ilustrativos, ressoa exuberante a irregularidade que aflora da atuação do representado na condução do Processo nº 0001359-17.2016.403.6139 (Inquérito Policial), ao qual se vincula o Recurso em Sentido Estrito nº 0001449-25.2016.4.03.6139.

Com efeito, no citado Inquérito Policial nº 0001359-17.2016.403.6139, envolvendo a explosão de caixas eletrônicos (Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil) e graves condutas praticadas no âmbito de organização criminosa, mediante a utilização de explosivos e armamentos de grosso calibre, com apreensão de diversos cartuchos deflagrados, inclusive de fuzil, houve identificação do suspeito (com extensa ficha criminal), o que justificou a decretação da prisão preventiva. Sem embargo, o magistrado representado, de ofício, sem oportunizar o contraditório, cassou a decisão do juiz substituto que havia deferido a busca e apreensão, a prisão preventiva e a quebra de sigilo de dados telefônicos (providências que já se encontravam em fase executória). Na ocasião, o representado reputou inexistente a prova testemunhal, externando o controvertido posicionamento pautado na inconstitucionalidade do Provimento nº 32/2000 do TJSP. À vista da conclusão adotada pelo imputado, a testemunha responsável pelo reconhecimento do suspeito não estaria legitimamente protegida pelo sigilo e, portanto, não se justificaria o testemunho anônimo – sem ao menos perquirir-se quanto à identificação da depoente, cujos dados não eram secretos e/ou desconhecidos (mas apenas estavam protegidos por questões de segurança). Eis o teor da decisão de revisão de ofício em comento[62]:

"(...)

 

O provimento 32/2000 do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo legisla em matéria processual, usurpando competência da União, conforme art. 22, I, da Constituição Federal.

Ademais, este juízo federal, não se submete a regras criadas pelo TJ/SP, ainda que lícitas fossem.

A testemunha que teve seu depoimento colhido à fl. 50/51, não se enquadra nas hipóteses da Lei 9.807/1999 (que, entre outras providências, estabelece normas para a organização e a manutenção de programas especiais de proteção a vítimas e a testemunhas ameaçadas).

De tal sorte, como o depoimento de fls. 50/51 é de testemunha não identificada e considerando que não há previsão legal de testemunhos anônimos ou desconhecidos do juízo, a prova que lastreia a decisão de f. 119/121 é inexistente.

Importa frisar que não é cabível no processo penal prova cuja origem seja desconhecida do Julgador, porque ele deve fazer o controle de legalidade de todo o processo.

Assim, INDEFIRO o pedido de f. 137 e, por conseguinte, REVOGO as demais medidas cautelares determinadas à fls. 119/121

Expeça-se CONTRAMANDADO DE PRISÃO em favor de PAULO HENRIQUE SIMÕES".

 

 

Note-se que, diante do Recurso em Sentido Estrito interposto pelo MPF, a C. 11ª Turma do TRF3 enalteceu que não caberia ao próprio Juízo da 1ª Vara Federal de Itapeva revogar de ofício a decisão anterior, devidamente fundamentada, sem que houvesse manifestação das partes e alteração do cenário fático-processual subjacente e, na sequência, restabeleceu, na íntegra, a decisão reformada pelo juiz imputado, que havia decretado a prisão preventiva e deferido a busca domiciliar e o levantamento do sigilo telefônico (RESE nº 0001449-25.2016.4.03.6139)[63]:


“(...)

Já tendo o Juízo da 1ª Vara Federal de Itapeva decidido sobre a decretação das medidas constritivas, não caberia ao próprio Juízo, de ofício, revogar essa decisão sem que houvesse qualquer manifestação das partes e alteração do panorama fático-processual. O que se observa, na verdade, é a discordância do magistrado que assumiu a condução do feito, em relação ao decisum proferido por outro Juiz Federal.

Dispõe o artigo 654, §2º do CPP, que os juízes e Tribunais possuem competência para expedir de ofício ordem de habeas corpus, quando no curso do processo verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal.

No entanto, para que o juiz conceda a ordem de ofício é necessário que seja competente para tanto, de modo que o aludido dispositivo deve ser interpretado sistematicamente com o artigo 650, §1º do mesmo diploma legal.

Esse entendimento subsiste, ainda que a primeira decisão seja da lavra de outro magistrado, como no caso em tela, em que as medidas cautelares foram autorizadas de forma devidamente fundamentada pelo Juiz Federal Substituto e, em seguida, foram revogadas por outro magistrado federal. Com efeito, o Juiz é agente do Estado, e como tal, não age em nome próprio.

A decisão que revogou as medidas anteriormente decretadas configura verdadeira concessão, de ofício, da ordem de habeas corpus contra ato próprio, em nítida violação ao artigo 650, §1º do CPP.

 

Recurso provido para restabelecer a decisão que deferiu a prisão preventiva e as medidas cautelares de busca e apreensão e quebra de sigilo telefônico.”

 

Verificou-se, ainda, no caso acima narrado, a recalcitrância do magistrado requerido frente à ordem do TRF3, no sentido de que fosse restabelecida a medida de busca e apreensão (particularidade que constituirá, inclusive, objeto de análise específica por este Colegiado, diante da revisão disciplinar proposta pelo representado). Tanto que se tornou necessária a interposição de Correição Parcial (Processo nº 0042082-87.2017.4.03.8000) – conhecida e parcialmente provida -, com a expressa observação do Egrégio Conselho da Justiça Federal da 3ª Região na esteira de que o juiz representado atuou como “se Tribunal fosse”, ao “cassar” de ofício a decisão do magistrado substituto, a ensejar verdadeiro tumulto processual, obrigando a interposição de outras medidas jurídicas pelo MPF[64]:

 “(...)

 

Sob outro ângulo, pode-se afirmar que o Juiz corrigido está atuando como se Tribunal fosse, primeiro, quando, de ofício, “cassou” a decisão do Juiz Federal Substituto, o que obrigou o MPF a interpor recurso em sentido estrito perante este Tribunal, que lhe deu integral provimento; segundo, quando deixou de cumprir, imediatamente, a ordem emanada desta Corte, cumprindo-a tão somente após decorridos mais de dois meses; terceiro, quando, em face do pedido de dilação de prazo por mais 60 (sessenta) dias, requisitou os autos do IPL; quarto, quando indeferiu tal pedido após decorridos quase dois meses do pedido, ao argumento de que “que não foram realizadas diligências para apontar que o investigado ainda reside no mesmo endereço”; e, por fim, quando, após a prisão do investigado e a confirmação de sua residência no endereço objeto da busca e apreensão, indeferiu, de forma definitiva, novo pedido de prazo para expedição do mandado de busca e apreensão, ao argumento de que “decurso de tempo entre o deferimento da medida até o presente momento, indicativo de que nenhuma prova que ajudasse a esclarecer a autoria do delito deva estar presente no local em que a Polícia pretende diligenciar”.

 

[...]

 

Ante o exposto, conheço, em parte, da presente correição parcial e, na parte conhecida, dou-lhe parcial provimento, sem prejuízo de eventuais providências cabíveis no âmbito da Corregedoria Regional em face do magistrado, que, efetivamente, vem se mostrando recalcitrante em não cumprir ordem emanada desta E. Corte Regional, comportando-se como membro deste Tribunal fosse, usurpando, voluntária ou involuntariamente, suas funções jurisdicionais.

 

Por conseguinte, intime-se, eletronicamente, o Juiz corrigido, determinando-lhe que expeça incontinenti o mandado de busca e apreensão de elementos de informação no domicílio de Paulo Henrique Simões, conforme requerido pelo MPF, prorrogando-o quantas vezes se fizerem necessárias até integral cumprimento, sob pena de desobediência (Código Penal, art. 330).

 

[...]

 

(Voto condutor do acórdão, parcialmente divergente da Relatoria, apresentado pelo Exmo. Sr. Desembargador Federal Toru Yamamoto)

 

“[...]

 

É inconteste a linha, muitas vezes tênue, que caracteriza um ato como error in procedendo ou error in judicando, porquanto os impactos de um erro judicial são sempre de alta repercussão, seja para as partes, seja para o processo, seja para a sociedade, como um todo.

 

No presente caso, ocorre que o erro verificado não recai sobre as razões jurídicas que ensejam o mérito das decisões judiciais do magistrado corrigido, mas sim, nos termos do artigo 9º do Provimento CORE 64/2005, sobre atos praticados pelo referido magistrado de ofício ou mediante abuso de poder.

 

Neste sentido, nos termos do voto divergente, vem a descrição dos atos praticados pelo juiz corrigido:

 

[...]

 

Sobrelevar tais atos do juiz corrigido e, considerá-los error in judicando, é o mesmo que aplicar o utilitarismo ao processo penal, recaindo em desrespeito à Constituição Federal, às instituições e à sociedade, de modo a desconsiderar a ordem dos atos, a hierarquia das decisões e autorizar a inversão tumultuária do processo.

 

Ante o exposto, dou parcial provimento à correição parcial, nos termos do voto divergente.

 

[...]

 

(voto convergente àquele acima reproduzido apresentado pelo Desembargador Federal Mairan Gonçalves Maia Júnior)”

 

Mencione-se, ainda, a título exemplificativo, a situação do Processo nº 0001290-82.2016.4.03.6139. Tratava-se de auto de prisão em flagrante, oriundo de abordagem rotineira a ônibus oriundo de Foz do Iguaçu, desaguando na apreensão de diversos medicamentos proibidos, no bojo do qual o juiz representado também “chamou o feito à ordem”. Naquela ocasião, a despeito do expressivo volume de material ilegal apreendido e das evidências que emanavam do caso concreto, o representado não se restringiu à revogação da prisão preventiva outrora decretada pelo juiz plantonista – o que, em tese, na presença dos requisitos legais, assomaria juridicamente aceitável –. Também em referido caso, de ofício, o requerido decretou a nulidade do procedimento, da prisão e das provas levantadas pela autoridade policial, sob o questionável posicionamento de que a Polícia não poderia realizar abordagens preventivas (desprovidas, na sua concepção, de fundada suspeita). Não estariam preenchidos, sob a ótica do imputado, os requisitos do art. 240, do CPP, para realização de busca pessoal, uma vez que os policiais não teriam qualquer motivo juridicamente válido para interromper a viagem de ônibus e para fazer a busca pessoal no réu.

Diante da interposição da medida recursal pelo MPF, o TRF3 pontuou textualmente que as provas obtidas a partir da busca pessoal e a decretação da prisão preventiva não se revestiam de qualquer ilegalidade, porquanto lícitas as modalidades probatórias obtidas por intermédio da fiscalização policial de rotina, no contexto do patrulhamento ostensivo, já que se trata de diligência igualmente regular.

A par do interrogatório do magistrado, chama igualmente atenção a decisão exarada no Processo nº 0001249-18.2016.4.03.6139. Foi ali lavrado auto de prisão em flagrante pelos crimes de moeda falsa e corrupção de menores. Populares acionaram a Guarda Municipal tendo em vista que um indivíduo maior de idade e outros menores estavam introduzindo na circulação diversas notas falsas. Em 14/09/2016, o representado declarou a ilegalidade da prisão e de todas as provas coletadas, relaxando-a, sob o argumento de que a busca pessoal não poderia ser efetivada pela Guarda Municipal. Segundo a linha de argumentação externada pelo imputado, teria sido a partir da busca pessoal de guarda municipal que se obteve a materialidade delitiva, além dos indícios de autoria, levando à hipótese de prova ilícita, que macularia a prisão, impondo o relaxamento do flagrante.

Como se verifica, na prática, o representado desconsiderou por completo o fato de que a prisão em flagrante efetuada por guarda municipal, em prol da segurança social, constitui ato legal, ainda que tal medida não esteja inserida no rol de suas atribuições constitucionais (art. 144, parágrafo 8º, da CF/99), a teor do disposto no art. 301, do CPP,  suficientemente claro no sentido de qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito. Nesse mesmo contexto, olvidou-se o representado de institutos e princípios básicos do direito processual penal, levando-se em conta que o acusado no Processo nº 0001249-18.2016.4.03.6139 encontrava-se em estado de flagrância quando abordado pela guarda municipal (art. 302, inc. IV, do CPP), particularidade que deveria ser sopesada em conjunto com a regra do art. 244, do CPP, que admite a busca pessoal, independente de mandado, na hipótese de prisão ou quando houver fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito.

Vale acrescentar que, novamente, oferecida a correspondente medida recursal pelo MPF, sobreveio o v. acórdão do TRF3, reformando a decisão do imputado que havia relaxado a prisão do requerido (RESE nº 0000263-30.2017.4.03.6139), fixando medidas alternativas, nos seguintes termos:

 

PROCESSO PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. MOEDA FALSA. PRISÃO EM FLAGRANTE. BUSCA PESSOAL. GUARDA MUNICIPAL. LEGALIDADE. PRISÃO. MEDIDAS CAUTELARES. IMPOSIÇÃO

 

1. Não há ilegalidade na prisão em flagrante. O recorrido encontrava-se em estado de flagrância quando foi abordado pela guarda municipal. O art. 302, inc. IV, do Código de Processo Penal, considera em flagrante delito quem "é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele o autor da infração". Por outro lado, o art. 244 do Código de Processo Penal admite a busca pessoal, independente de mandado, "no caso de prisão ou quando houve fundada suspeita de que a pessoa esteja na posse de arma proibida ou de objetos ou papéis que constituam corpo de delito". Nesse sentido, os precedentes jurisprudenciais (STJ, HC n. 129.932, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, j. 15.12.09; HC n. 286.546, (TRF da 3ª Região, ACr n. 2008.61.05.009993-0, Rel. Des. Fed. Paulo Fontes, j. 11.05.15).

2. O laudo pericial do Instituto de Criminalística concluiu serem falsas as cédulas apreendidas.

3. A aplicação de medidas cautelares alternativas à prisão é suficiente para a garantia da ordem pública e aplicação da lei penal, considerando-se que o recorrido não tem antecedentes criminais de qualquer natureza e o delito a ele atribuído foi cometido sem violência.

4. Medidas cautelares alternativas à prisão fixadas nos termos requeridos pelo Ministério Público Federal, a saber: a) comparecimento mensal em Juízo para informar sua atividade e endereço (CPP, art. 319, I); b) proibição de ausentar-se de Itapeva (SP), local de sua residência, sem prévia autorização judicial (CPP, art. 319, II); c) pagamento de 2 (dois) salários mínimos, a título de fiança (CPP, art. 319, VIII).

5. Recurso em sentido estrito provido.

 

Em outro caso (Processo nº 0000001-80.2017.4.03.6139), sobreveio a lavratura do auto de prisão em flagrante a partir de a partir de abordagem de rotina da Polícia Militar Rodoviária, pelos crimes de descaminho e importação de arma de fogo de uso restrito, substâncias psicotrópicas e medicamentos (uma arma GLOCK 9mm de numeração suprimida com dois carregadores, cinquenta munições calibre 32, dois tabletes de maconha, anabolizantes e estimulantes sexuais). O casal preso ostentava largo registro de antecedentes criminais, mas o representado declarou a ilegalidade das provas e da prisão, relaxando-a também sob o fundamento de que teria sido realizada em abordagem de rotina da Polícia Rodoviária, destituída da motivação para interromper a viagem do veículo e menos ainda para a realização da busca que resultou na apreensão acima referida. Consignou o magistrado que “a fiscalização de rotina é um bordão sem significado jurídico que contraria o art. 240 do Código de Processo Penal; não substitui a fundada suspeita para busca pessoal em automóvel ou pertences das pessoas; e também não constitui fundada suspeita o suposto nervosismo da vítima ao ser abordada pela Polícia”.

Indagado no interrogatório quanto à situação em apreço, o requerido sinalizou que a policia rodoviária somente poderia ter fundada suspeita, a justificar a coleta de provas e a prisão cautelar, com relação às infrações de trânsito – e não com relação a outros delitos –.[65] Ora, a prevalecer o posicionamento em questão, seriam ilícitas todas as apreensões de substâncias entorpecentes, contrabando, etc, ocorridas nas rodovias do território nacional, assim como as respectivas prisões em flagrante, ou seja, as provas obtidas naquele mesmo contexto não se prestariam a amparar qualquer juízo condenatório, o que refoge à razoabilidade e fere a lógica jurídica.

Oportuno salientar que, diante da inusitada deliberação acima mencionada, o MPF interpôs Recurso em Sentido Estrito, autuado sob nº 0000025-11.2017.4.02.6139, parcialmente provido, com o reconhecimento da licitude da prisão. Conforme consignado pelo TRF3, o cenário envolvendo a abordagem e a fiscalização de rotina justificava plenamente a suspeita levantada pelos agentes da Polícia Rodoviária, tanto que concretizada a apreensão de expressivo quantitativo de produtos clandestinos. Eis o teor da respectiva ementa:

 

    RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. RELAXAMENTO DE PRISÃO INDEVIDO. PRISÃO PREVENTIVA SUBSTITUÍDA POR MEDIDAS CAUTELARES. RECURSO MINISTERIAL PARCIALMENTE PROVIDO.

    1 - Não se vislumbra mínima ilegalidade na prisão em flagrante decretada em face dos recorridos.

    2 - Os réus foram abordados em mera fiscalização de rotina por policiais rodoviários, em rota e horário comumentemente utilizados no transporte clandestino de mercadorias, tendo os recorridos demonstrado nervosismo na abordagem. O cenário é simples e claro para justificar a suspeita levantada pelos policiais, que nada mais faziam senão o cumprimento do dever insculpido no artigo 144 da Constituição Federal. Tanto é verdade que as suspeitas se concretizaram eis que grande quantidade de mercadorias clandestinas de fato estava sendo transportadas pelos recorridos.

    3 - O cenário desenhado é de que os recorridos estavam transportando mercadorias contrabandeadas, notadamente, medicamentos, entorpecentes, armas de fogo e munições, provenientes do Paraguai, para fins de comércio no Brasil. Condutas que, embora num juízo extremo de cognição sumária, se amoldam aos arts. 273, 1º e 1º B, I, do CP, 16, parágrafo único, IV, 18, c.c. 19, da Lei 10.826/03, e art. 33 e art. 35, c.c. art. 40, inc. I da Lei 11.343/06.

    4 - Assim, não há que se falar em relaxamento de prisão, eis que os fatos são, em princípio, típicos, tendo sido os recorridos surpreendidos, aparentemente, cometendo a infração penal.

    5 - De outro lado, não é o caso de se converter a prisão em flagrante em preventiva.

    6 - Embora ambos os recorridos confessadamente dediquem-se à compra e venda de mercadorias provenientes do Paraguai, já tendo sido alvos de retenção de mercadorias estrangeiras, a aplicação das medidas cautelares diversas da prisão, por ora, é o suficiente.

    7 - Sem perder de vista a natureza das mercadorias apreendidas (drogas, medicamentos e arma de fogo), observa-se que a quantidade de maconha não é aviltante e não há laudo acerca dos medicamentos apreendidos. Ambos são pessoas simples, de baixa escolaridade, sem emprego formal, que sobrevivem por meio do comércio ambulante, bicos e ajuda de familiares. Não se trata de crime cometido com violência, e, aparentemente, os recorridos não são pessoas perigosas.

    8 - Dentro desse panorama, entende-se que a segregação cautelar ou a fixação de qualquer valor de fiança seria excessivo e extremamente penoso para ambos, sendo, suficiente e adequada, para o momento, considerando a gravidade das condutas e para coibir eventual reiteração criminosa, a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão previstas no artigo 319, incisos I e IV do CPP, a saber: a) comparecimento mensal em juízo, para informarem e justificarem suas atividades, bem como os endereços onde possam ser encontrados; b) proibição de ausentarem-se da Comarca, por mais de 07 dias, sem autorização judicial.

    9 - Recurso ministerial parcialmente provido.

 

Reporto-me, ainda, aos autos do Processo nº 0000876-84.2016.4.03.6139, envolvendo a prisão em flagrante realizada pela Polícia Militar e a suposta prática do crime de descaminho (expressivo quantitativo de eletrônicos). Aqui, a denúncia foi rejeitada pelo representado, que declarou a ilegalidade da prisão e de todas as provas, também motivado pela compreensão de ilegalidade da atividade de policiamento preventivo, com vistoria pessoal por comportamento suspeito de condutores ou passageiros abordados, da qual resulte a apreensão de armamentos,  munições e substancias entorpecentes proibidas. O Recurso em Sentido Estrito foi provido pelo TRF3, para o fim de recebimento da denúncia, como segue:

 

    RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. DESCAMINHO. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA. LEGALIDADE DA BUSCA VEICULAR. FUNDADA SUSPEITA. NÃO INCIDÊNCIA DO PIS/COFINS. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. RECURSO PROVIDO.

    1. A busca pessoal realizada foi baseada na existência de fundada suspeita, conforme exige o art. 244 do Código de Processo Penal, tanto que os acusados foram presos em flagrante transportando 247 (duzentos e quarenta e sete) equipamentos eletrônicos/acessórios, de marcas diversas, de origem estrangeira, desacompanhadas de qualquer documento comprobatório que atestasse o regular ingresso no território nacional. Portanto, não há que se falar em ilicitude da prova. Precedentes.

    2. O crime de descaminho pune apenas a sonegação do imposto devido pela entrada clandestina da mercadoria de procedência estrangeira, não sendo admitida qualquer interpretação extensiva em prejuízo do réu. Desse modo, tendo em vista que PIS e Cofins não constituem impostos, mas espécies de contribuição, devem ser excluídos do cálculo efetuado pela Receita Federal.

    3. Em que pese o pequeno valor dos impostos suprimidos, não é possível a aplicação ao caso do princípio da insignificância. Isso porque também é consagrado no STF que a reiteração de comportamentos antinormativos por parte do agente impede a aplicação do princípio em questão, já que não se pode considerar irrelevantes repetidas lesões a bens jurídicos tutelados pelo Direito Penal.

    4. Recurso provido.

 

Eis o teor do interrogatório do representado, relacionado ao tema das abordagens policiais[66]:

 

“[...]

RELATORA Também há... se aponta aqui que o senhor reiteradamente decide no sentido de anular prisões e as provas decorrentes dessas abordagens policiais ditas de rotina.

O senhor pode esclarecer isso para mim?

DEPOENTE - Eu vou ter que explicar o meu posicionamento jurídico a esse respeito, se V. Exª não se incomodar, porque essa é uma questão muito sutil de Direito e é uma questão inclusive que acaba... que vai... a questão é a seguinte: o art. 240, § 2º, do Código de Processo Penal, ele diz o seguinte, que a polícia pode fazer busca quando – busca pessoal - quando tiver fundada suspeita. É o requisito da busca, está certo?

O que eu digo aí? A palavra ‘abordagem policial’ - e eu digo na minha decisão -, ela não tem significação jurídica. Ela precisa ser redefinida para ter uma significação jurídica. E isso é o que ensina Ferrajoli. Então eu vou lá e redefino isso... a lei redefine, e ela diz: olha, isso aqui - está dizendo aí - é abordagem policial? Juridicamente, quer dizer, é uma diligência com busca pessoal.

A Constituição brasileira garante às pessoas o direito à intimidade.

Então eu não tenho preconceito nenhum com a atividade policial. Eu só analiso se a polícia observou ou não essa... a fundamentação, se ela tem... se ela disse se ela tinha ou não tinha fundada suspeita para fazer isso. Normalmente não tem. Qual é a análise que normalmente se faz? “Ah, mas o resultado da busca foi profícuo” .

Isso é muito parecido com o que acontecia antigamente nos crimes permanentes, até que o Supremo definiu que, no crime permanente, não podia entrar na casa – mesmo sendo permanente - se não tivesse uma expressão visual de fora do prédio e tal, onde o crime estava ocorrendo.

Então lá na... na... na busca domiciliar, pode ser por mandado, pode ser por... em prisão em flagrante ou por consentimento do morador.

Aqui também tem o requisito na busca pessoal; é só isso que eu estou dizendo.

Quando o policial faz a busca e observa esse requisito... e mais, eu digo o seguinte: ele tem que dizer... porque nem o juiz pode ter convicção íntima, não é? Eu tenho que dizer, tanto é que eu digo por que que eu fiz.

Então, quando ele prende, ele tem que dizer: “Olha, essa pessoa, eu tinha uma fundada suspeita com relação a ela por causa disso”. E aí, eu vou analisar se a suspeita era fundada ou se não era fundada; que é a segunda questão: se motivaria ou não ele fazer aquela busca e obter a prova. Se ele não respeitou essa condicionante legal, eu tenho uma prova coletada de maneira ilícita, e isso pode acarretar o relaxamento da prisão ou a rejeição da denúncia.

Mas eu não tenho nenhum preconceito, e jamais tive, com a Polícia nem com o Mistério Público.

RELATORA

[...]

Nesse processo 000001-80.2017.403.6139, a decisão ali proferida deu origem a uma representação no Ministério Público Federal e teve repercussão na imprensa, que até já foi dito hoje, aqui pela manhã, com o depoimento do procurador.

Ali foi uma prisão em flagrante a partir de uma abordagem de rotina da Polícia Militar Rodoviária, por descaminho, e foram encontradas... além das mercadorias, foi encontrada arma de fogo de uso restrito, substâncias psicotrópicas e medicamentos, dois tabletes de maconha, anabolizantes e estimulantes sexuais. Foram presos o Waldomiro e a Elizete que, pelo que consta dos autos, têm um largo registro de antecedentes, e foi então apreendida uma Glock 9 milímetros com a numeração suprimida, dois carregadores e 50 munições de calibre 32.

Na sua decisão, o senhor diz claramente que “ fiscalização de rotina é um bordão sem significado jurídico que contraria o art. 240 do Código de Processo Penal; não substitui a fundada suspeita para busca pessoal em automóvel ou pertences das pessoas; e também não constitui fundada suspeita o suposto nervosismo da vítima ao ser abordada pela Polícia”. Então seria ilícita a prisão, seria ilícita a busca, tudo seria ilícito, e as provas também.

Mas no seu entender, a Polícia Rodoviária está ali e para um carro e está fazendo aquelas fiscalizações, todos aqui já fomos parados algum dia pela Polícia Rodoviária, o senhor não acredita que esteja correta?

Em que situações o senhor acha que a Polícia Rodoviária pode parar um carro?

DEPOENTE Olha, existe uma divergência aí, Excelência, com a questão da busca quando ela é em automóvel, porque a busca... via de regra, essa fundada suspeita não acontece só quando para um carro... acontece...

RELATORA Não, não. Eu estou dizendo deste caso específico que houve a... que consta da representação e que teve a repercussão na imprensa.

Nessa situação específica de abordagem da Polícia Rodoviária, como o senhor pensa sobre isso? No seu entender, como a Polícia Militar Rodoviária tem que proceder, então?

DEPOENTE Bom, eu ia tentar explicar para V. Exª a questão da busca, que é mais ampla do que isso. Mas se preciso responder da maneira como V. Exª indaga, é como eu disse, é preciso ter uma fundada suspeita para fazer busca pessoal, e essa fundada suspeita é uma condição que precede a busca. Se ele faz e depois encontra, o encontrar não justifica a busca. Ele precisa...

RELATORA Eu compreendi. Não, eu compreendi.

O que eu quero entender é...

DEPOENTE Ah, eu tenho um exemplo para dar para V. Exª. Um exemplo de um caso...

RELATORA ... se a Polícia Militar não pode parar ninguém na estrada.

É isso que eu estou perguntando.

DEPOENTE Não. Pode.

Por exemplo, se ela parar lá porque a pessoa cometeu alguma infração de trânsito, entendeu? Por exemplo, ela parou... a pessoa cometeu infração de trânsito... tem um caso específico que eu vou narrar para V. Exª, que é bem claro, faz alguns meses eu mantive a prisão. A Polícia ia andando na rodovia e viu um caminhão, e parece que estava meio desajeitado... as questões de pneu, não sei, eles pegaram e puxaram a placa do caminhão pelo rádio e aí encontraram... a placa do caminhão não era aquela. O veículo não correspondia com a placa. Então eles pararam o caminhão e fizeram a busca, e eu mantive a prisão.

RELATORA Aí o senhor manteve a prisão?

DEPOENTE Mantive, porque tinha uma fundada suspeita.

RELATORA Bem, em outro processo, também um processo em que houve prisão em flagrante por policiais da Guarda Municipal por crimes de moeda falsa e corrupção de menores, é o 0001249-18/2016. Nesse caso foi decretada a nulidade da prisão e de todas as provas por ter sido feita pela Guarda Municipal, e o senhor entende que a Constituição não lhes atribui atividade típica de policiamento.

No seu entender - compreendo perfeitamente o que o senhor disse que a Guarda Municipal não tem a atribuição constitucional de buscar provas, nada -, mas quem pode prender em flagrante? A Guarda Municipal não pode?

DEPOENTE Não, todos podem prender em flagrante. Qualquer pessoa do povo pode prender em flagrante.

O que eu digo que a Guarda não pode é fazer busca.

Tem inclusive decisão do TJ de São Paulo também no mesmo sentido.

RELATORA No caso, a prisão em flagrante foi pelo crime de moeda falsa, não é? Que foi feita uma busca. Foi isso que eu entendi do processo.

Foi pego na hora com o uso de moeda falsa, portando moeda falsa.

Mas, então, o senhor entende que a busca, ele poderia prender em flagrante, mas não poderia fazer a busca? É isso?

DEPOENTE Eu acho que eu não estou me fazendo claro, doutora.

Eu não vou me lembrar de caso concreto aqui, porque são cento e cinquenta e tantos processos.

RELATORA São muitos relacionados.

DEPOENTE Então eu não posso dizer para a senhora, embora eu tenha uma memória razoável, desse caso específico.

Mas o critério que eu uso invariavelmente, em todo e qualquer caso, é idêntico. Em todo e qualquer caso que se submeta a mesma regra. E a busca só é autorizada se tiver fundada suspeita. Então, se ele fizer a busca primeiro e depois descobrir a nota - que deve ter sido isso que aconteceu nesse caso -, aí já está comprometida a prova, porque ele não tinha autorização para fazer a busca. É uma questão precedente.

RELATORA - Não, eu compreendi perfeitamente. Estamos aqui esmiuçando o que foi trazido pelo Ministério Público.

Há também o caso de Jones Gonçalo Filho, que é uma questão... o juiz substituto proferiu uma decisão e ela foi revogada por decisão do senhor, para decretar a ilegalidade da prisão e das provas em casos em que a Polícia parou o ônibus e fez a busca pessoal na mochila do Gonçalo, ao fundamento de que – abro aspas - "os policiais não tinham motivo para interromper a viagem do ônibus e muito menos para aborrecer e fazer busca pessoal em Jones”.

A questão aqui parece que é a mesma que o senhor está relatando.

[...]”

 

Além da anulação deliberada de provas e prisões decorrentes das abordagens policiais, os elementos dos autos evidenciam a prolação de outras decisões tumultuárias.

A título exemplificativo, cite-se o Processo nº 0004668-70.2015.4.03.6110, em que foi deferido parcialmente o pedido do MPF no tocante à busca e apreensão de material pornográfico infantil. Naquela conjuntura, o juiz imputado consignou à autoridade policial que não procedesse à prisão, ainda que o suspeito fosse surpreendido armazenando o material ilícito (art. 241-B, do ECA), ao entendimento de que os crimes com pena máxima de até 4 (quatro) anos não permitiriam a prisão em flagrante,  em clara dissonância com a regra inserida no já citado art. 301, do CPP. Olvidou-se o magistrado que, conquanto se tratasse da hipótese de pena máxima abstrata de 4 anos, os pressupostos para realização da prisão em flagrante e/ou da prisão de índole processual não estão atrelados ao período máximo da sanção restritiva de liberdade e, portanto, o correspondente relaxamento está condicionado à presença de outros requisitos legais. Não se mostra concebível, portanto, que a polícia não efetive a medida restritiva, deparando-se com a prática de um delito, revelando-se no mínimo preocupante a afirmação do magistrado à DD. Relatora do PAD, ao confirmar que orienta a autoridade policial a não concretizar o flagrante em hipóteses como aquela acima mencionada, envolvendo “crimes de perigo abstrato”, nos seguintes termos: “eu acho que devo ter recomendado para não fazer a prisão porque depois iria ter que soltar. Quer dizer, não ia ter utilidade nenhuma”. [67]

Em outros casos de ações penais relacionadas ao armazenamento e à disponibilização de material pedopornográfico (Processos n´s 0000334-03-2015-4.02.6139 e 001272966.2011.4.02.6139), o MPF apontou que as denúncias haviam sido rejeitadas sob o curioso fundamento de que o fato narrado pelo Parquet seria atípico (“compartilhar” e “disponibilizar” o material), pois o tipo penal, no entender do imputado, compreenderia os verbos “fornecer, divulgar, publicar”. A teor do relatado pelo MPF, o Tribunal reformou a rejeição das denúncias, mas sem qualquer fato novo, sobreveio a decisão de absolvição nos mesmos termos da anterior, já rechaçada pela Corte Local, impondo a interposição de novos recursos, a evidenciar, para além do tumulto, a recalcitrância do magistrado quanto ao cumprimento das decisões do TRF3. Observa-se que, ao ensejo do interrogatório, o representado valeu-se de evasivas, não ofertando qualquer argumento apto a respaldar seu proceder, restringindo-se a afirmar que não se recordava do caso, mas que poderia ter cometido “erro”, na condição de ser humano[68]:

 

“[...]

 

RELATORA Nós temos também uma outra questão aqui... também foi trazida pelo Ministério Público Federal, que é uma questão também de armazenamento e disponibilização de material pedopornográfico.

Também é um processo de 2015, em que a denúncia foi rejeitada ao argumento de que compartilhar e disponibilizar o material seria atípico, porque o tipo penal fala em fornecer, divulgar e publicar.

Foram decisões anuladas pelo Tribunal, porém o senhor, segundo o Ministério Público, absolveu, proferiu sentença absolutória com o mesmo fundamento já rejeitado pelo Tribunal.

O senhor tem algo a dizer sobre isso?

DEPOENTE Olha, Excelência, um caso concreto desse eu precisaria examinar o processo, todas as razões dele com as provas, com as alegações, porque me parece que tem uma questão aí também do núcleo do tipo penal, não dá para dizer se está certo ou se está errado a minha decisão. Eu provavelmente entendi assim.

Agora, não excluo a possibilidade de ter errado. Como eu disse, eu sou humano, posso errar nesse processo, por um erro, eu posso ter errado.

[...]”

 

É digna de menção, ainda em caráter exemplificativo, a situação do Processo 000023613.2018.4.03.6139, em que indeferida a produção de prova (persecução de crime de moeda falsa), porquanto igualmente reveladora de que o requerido lançava mão de critérios pessoais em detrimento da lógica e da técnica que devem orientar e motivar as decisões judiciais. Na situação em tela, a autoridade policial procedeu à busca domiciliar justificada pelo intento de localizar e apreender o objeto material do alegado crime de violência doméstica, que corresponderia à faca utilizada para agredir a suposta vítima, contexto no qual os Policiais Militares depararam-se com instrumento e produto de crime de moeda falsa. A despeito das evidências reunidas naquela diligência, o juiz requerido não reconheceu a validade da apreensão da mídia de armazenamento que constituiria o instrumento do delito de moeda falsa, indeferindo a quebra do sigilo de dados ali contido, ao entendimento de que a busca tinha por escopo a prisão do suposto agressor e a localização do objeto ligado ao crime de violência doméstica (faca). Em resumo, o magistrado ignorou deliberadamente a descoberta fortuita de provas, admissível para fatos delituosos que não são objetos de investigação originária. Indagado pela DD. Relatora do PAD quanto ao tema, o magistrado restringiu-se à declinar[69]:

 

“[...]

 

RELATORA Há um caso interessante também, que já foi referido hoje, mas cujo número aqui eu não tenho, mas talvez o senhor se lembre, porque ele foi várias vezes comentado aqui nesse processo, que é o caso de uma ocorrência de violência doméstica, a mulher ligou para o número 190, e aí a Polícia veio, ela abriu a porta para que eles entrassem, e eles depararam com notas falsas sobre uma impressora, a pessoa havia acabado de... havia imprimido as notas e estavam na tela do computador porque ele iria imprimir mais. E aí o senhor rejeitou essa diligência, decretou a nulidade dessa diligência, porque eles tinham ido lá por outro motivo e acabaram encontrando esse material e prendendo por moeda falsa.

O senhor pode explicar esse entendimento?

DEPOENTE Bom, eu posso explicar o entendimento, sim. Agora, o caso concreto sem examinar profundamente o processo é difícil.

O entendimento é que o manda... na prisão, eu posso dar prisão em flagrante, ele vai lá para prender e não para fazer uma busca na casa da pessoa.

Então eu devo ter entendido que, além da prisão, ele fez também uma busca, e que não foi um mero caso eh, um acaso. Deve ter sido isso o que eu entendi ali.

Mas como eu disse a V. Exª, sempre sujeito a recurso e o Tribunal mudar a decisão.

Eu não sou o dono...

 

RELATORA É, essa decisão parece que foi mudada, sim.

 

[...]”

 

Mais uma vez, restou necessária a interposição da correspondente medida recursal, provida pela C. 11ª Turma do TRF3, com o registro de que, a despeito do caráter fortuito do flagrante delito e da apreensão do objeto do crime de moeda falsa, tais procedimentos não apenas se mostraram lícitos como eram de observância obrigatória para os agentes da segurança pública. Eis o teor da respectiva ementa:

 

APELAÇÃO CRIMINAL. PROCESSO PENAL. REPRESENTAÇÃO PARA A QUEBRA DE SIGILO DE DADOS EM DISPOSITIVO ELETRÔNICO DE ARMAZENAMENTO INDEFERIDA PELO JUÍZO A QUO. DISCO RÍGIDO APREENDIDO NO CONTEXTO DE PRISÃO EM FLAGRANTE EFETUADA NO DOMICÍLIO DO INVESTIGADO. VALIDADE DA APREENSÃO DA MÍDIA DE ARMAZENAMENTO QUE CONSTITUIRIA INSTRUMENTO DE CRIME DE MOEDA FALSA, SEGUNDO APONTADO EM UNÍSSONO PELOS ELEMENTOS DE INFORMAÇÃO. LEVANTAMENTO DO SIGILO DE DADOS QUE SE IMPÕE COMO MEDIDA EFICIENTE E NECESSÁRIA PARA AS INVESTIGAÇÕES. APELAÇÃO PROVIDA.

01. Trata-se de Apelação Criminal interposta pelo Ministério Público Federal em face de decisão que denegou pedido de quebra de sigilo dos dados contidos no disco rígido apreendido em poder do investigado no contexto de flagrante delito pela suposta prática do delito de moeda falsa (art. 289, caput, do CP), sob o fundamento de não estar demonstrada a legalidade do ato da apreensão do referido equipamento de informática.

02. Depoimentos e interrogatório colhidos no inquérito que apontam para a contrafação e guarda de moeda falsa. Laudo pericial que relaciona o número de série das cédulas apreendidas e das cédulas reproduzidas em papel sulfite com outros procedimentos policiais no território nacional.

03. Busca domiciliar justificada pelo intento de localizar e apreender o objeto material do alegado crime de violência doméstica, que seria uma faca utilizada para agredir a suposta vítima, contexto no qual os Policiais Militares depararam-se com instrumento e produto de crime de moeda falsa. Conquanto a casa seja asilo inviolável do indivíduo, é lícita a penetração sem consentimento do morador em situação flagrancial (artigo 5º, inc. XI, da Constituição Federal), hipótese na qual se amolda o presente caso.

04. Não obstante o caráter fortuito do flagrante delito e da apreensão do objeto do crime de moeda falsa, tais procedimentos não apenas se mostram lícitos como são de observância obrigatória para os agentes da segurança pública.

05. Assentada a legalidade da apreensão policial do disco rígido questionado, torna-se insubsistente o fundamento para a denegação do exame pericial relativo aos dados armazenados no referido dispositivo. Embora interfira na vida privada do investigado, importa precisar que franquear o acesso aos dados do mencionado dispositivo de armazenamento constitui relevante meio probatório para descortinar eventual conexão com outros delitos de moeda falsa investigados, além de ser ele próprio possível instrumento de crime, conforme apontado pelos elementos de informação.

06. Revelando-se medida eficiente e necessária para as investigações, deve ser deferido o acesso, reservadamente às partes e serventuários que atuarem no feito, notadamente os peritos criminais, ao conteúdo do indigitado disco rígido mediante quebra de sigilo.

07. Apelação do Parquet federal provida.

 

Em outra situação narrada pelo Órgão Ministerial, a investigação estava centrada no uso indevido e não autorizado do nome de pessoas beneficiárias do Bolsa Família, a caracterizar possível prática de crimes fiscais e financeiros, sendo certo que a averiguação foi iniciada a pedido das próprias vítimas (Processo nº 0000358-26.2018.4.03.6139). O MPF solicitou a decretação de quebra do sigilo bancário, no intuito de identificar outros dados relacionadas à utilização indevida do CPF das vítimas, o que restou indeferido pelo representado sob o fundamento de que não havia sido apontada nenhuma circunstância apta a torná-las suspeitas do cometimento de eventual ilícito. Como se vê, a justificativa do magistrado para indeferir a diligência revelou-se incoerente e dissociada da causa de pedir e do pedido, pois noticiado desde a exordial que as representantes não eram investigadas, mas sim vítimas. A situação em referência também obrigou a interposição de recurso pelo Parquet, provido com a determinação de quebra de sigilo das denunciantes, nos seguintes termos:

 

    PENAL. PROCESSO PENAL. QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO. EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO AO COAF. POSSIBILIDADE. INDICIOS SUFICIENTES DE MATERIALIDADE. RECURSO PROVIDO.

    1. O pedido de quebra de sigilo bancário foi requerido no bojo do Procedimento Investigatório Criminal, instaurado pela Procuradoria da República de Itapeva/SP para apurar a prática de crimes de estelionato majorado mediante meio digital, bem como falsificação de sinal público.

    2. Consta dos Boletins de Ocorrência nº 118 e 119/2018, da Delegacia de Polícia de Bom Sucesso de Itacaré/SP, compareceram Elisete Leal Andrade e Maria de Fátima Engre, narrando que tiveram seus benefícios de Bolsa-Família bloqueados pela CEF em razão de constarem declarações de imposto de renda dos exercícios de 2014/2015, referentes a esta, e de 2014/2016, referentes àquela, que afirmam desconhecerem.

    3. Em reforço às regras contidas na Lei Maior, o artigo 1º, § 4º da Lei Complementar 105/2001 prevê que a quebra de sigilo poderá ser decretada, quando necessária para apuração de ocorrência de qualquer ilícito, em qualquer fase do inquérito ou do processo judicial.

    4. É necessária a quebra do sigilo bancário e o fornecimento dos extratos das movimentações, bem como a expedição de ofício ao COAF, tal como requerido pelo Ministério Público Federal, uma vez que indispensável para identificar os autores do crime em questão e averiguar a possível existência de esquema criminoso e de outras vítimas.

    5. Desse modo, a quebra de sigilo bancário das vítimas, bem como a expedição de ofício ao COAF tem por escopo aprofundar as investigações para descobrir onde seus nomes possam ter sido utilizados indevidamente para a prática de crimes.

    6. Verificada a demonstração de indícios de existência de delito, demonstração da necessidade/imprescindibilidade das medidas para obtenção de prova da autoria do delito, indicação da pertinência temática entre as informações obtidas e a natureza do delito, a delimitação dos sujeitos titulares dos dados a serem investigados e do lapso temporal abrangido pela ordem de ruptura dos registros sigilosos mantidos por instituição financeira.

    7. Recurso provido para determinar a quebra de sigilo bancário das vítimas, no período compreendido entre 2013 até 2016, bem como a expedição de ofício ao COAF, a fim de que seja informada eventual constatação de "operações financeiras suspeitas de ilicitude" em nome das executadas.

 

No Processo nº 0000334-03.2015.4.03.6139, o imputado rejeitou a denúncia quando já encerrada a fase instrutória, respaldando-se na tese de inépcia. O TRF3 afastou a premissa do magistrado no tocante a ilicitude dos instrumentos probatórios, ressaltando a incongruência do magistrado, ao proceder à reanálise das hipóteses do art. 395, do CPP, após a instrução processual quando já possível o pronunciamento meritório, nos seguintes termos:

 

PENAL. PROCESSUAL PENAL. DENÚNCIA. REVOGAÇÃO DO RECEBIMENTO. INADMISSIBILIDADE. INSTRUÇÃO CRIMINAL FINALIZADA. JUÍZO DE MÉRITO. NULIDADE. PRELIMINAR ACOLHIDA. PREJUDICADO O EXAME DO MÉRITO.

1. A justa causa para o exercício da ação penal constitui condição da ação, sendo necessário seu preenchimento para que se possa partir ao exame da própria controvérsia trazida em ação judicial.

2. No caso da ação penal, a acusação deve preencher os requisitos do art. 41 do CPP, devendo a denúncia descrever fatos típicos puníveis, suas circunstâncias e os indícios de autoria, atribuindo responsabilidade ao denunciado, de sua leitura não emergindo qualquer dificuldade ao exercício do direito de defesa.

3. Verifica-se dos autos que o Ministério Público Federal, em ambas as denúncias, atendeu ao disposto no art. 41 do Código de Processo Penal, tanto que é possível compreender as condutas delitivas do réu, onde e quando foram praticadas.

4. A inépcia da denúncia só pode ser acolhida quando demonstrada inequívoca deficiência a impedir a compreensão da acusação, em flagrante prejuízo à defesa do acusado, ou na ocorrência de qualquer das falhas apontadas no art. 395 do CPP. Na hipótese dos autos, inexiste o alegado defeito da peça acusatória.

5. Admitida a persecução penal e ausentes as hipóteses de absolvição sumária, a presente ação penal prosseguiu até a sentença final, quando então a pretensão punitiva deveria ter sido analisada à luz da prova produzida na instrução criminal.

6. Não pode o juiz, após a instrução, voltar à fase de admissibilidade da ação penal e rejeitar a denúncia por inépcia ou falta de justa causa.

7. Diferentemente do processo civil, em que as condições da ação podem ser na maioria das vezes apreciadas "in status assertionis", independentemente da instrução probatória, no processo penal condições como a legitimidade passiva e a "falta de justa causa" estão ligadas ao resultado da atividade probatória e não podem em geral ser apreciadas de maneira abstrata.

8. Não havendo na maioria dos casos uma perfeita separação entre a admissibilidade e o mérito da ação, no processo penal, não faz sentido reanalisarem-se as hipóteses do art. 395 do CPP após a instrução processual, quando então já é possível o pronunciamento meritório.

9. Mesmo no caso de inépcia da denúncia, se ela foi considerada anteriormente apta e propiciou adequada defesa por parte do acusado, não há que se permitir uma reanálise desse aspecto após a instrução. Somente algumas situações admitiriam a reconsideração a qualquer tempo, como no caso de pressupostos processuais ou mesmo de ilegitimidade ativa.

10. Remessa dos autos ao juízo de origem para que seja proferida sentença de mérito.

11. Acolhida a preliminar. Prejudicado o exame do mérito do apelo ministerial.

 

Situação análoga àquela acima exposta pode ser detectada na consulta ao acórdão proferido pelo TRF no Processo nº 0000547-77.2013.4.03.6139. No caso em tela, o representado ignorou a hipótese de preclusão pro judicato, rejeitando a denúncia já outrora recebida, após haver determinado o prosseguimento do feito e o interrogatório do acusado, levando à apresentação de recurso pelo MPF, provido parcialmente nos seguintes termos:


PENAL. PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. ART. 273 §1-B DO CÓDIGO PENAL. IRREGULARIDADE DO INQUÉRITO NÃO CONTAMINA A AÇÃO PENAL. BUSCA PESSOAL DECORRENTE DA PRISÃO. LEGALIDADE. DENÚNCIA. REVOGAÇÃO DO RECEBIMENTO. INADMISSIBILIDADE.

1. Eventuais vícios da prisão em flagrante e, por via reflexa, do inquérito policial não se refletem na ação penal para contaminá-la.

2. Os medicamentos estavam em poder do acusado quando de sua prisão, e, nesse contexto, a busca pessoal encontra respaldo no art. 244 do Código de Processo Penal.

3. O juiz recebeu a denúncia, ratificou seu recebimento ao determinar o prosseguimento do feito, realizou o interrogatório do acusado e, só então, reconsiderou a decisão de recebimento da denúncia. In casu, não pode o Juiz, em reconsideração de despacho anteriormente prolatado, rejeitar a denúncia já recebida, uma vez que já exaurido o juízo de admissibilidade da denúncia, operada contra ele a preclusão pro judicato.

2. Recurso em sentido estrito parcialmente provido.

 

 

 A análise, por amostragem, dos processos indicados na representação, também revela a rejeição sistemática de denúncias pelo requerido, por suposta inépcia, em razão da desclassificação do crime de contrabando para descaminho, bem assim da aplicação do princípio da insignificância. As reiteradas decisões do magistrado colidem frontalmente com a orientação das Cortes Superiores, na linha de que introdução de cigarros de origem estrangeira desacompanhados da documentação comprobatória da regular importação configura crime de contrabando (mercadoria de proibição relativa), e não descaminho, a inviabilizar a incidência do princípio da insignificância, independentemente do valor dos tributos elididos, na medida em que o bem jurídico tutelado envolve, sobremaneira, o interesse estatal no controle da entrada e saída de produtos, assim como a saúde e segurança públicas (Processos nº´s 0001228-42.2016.4.03.6139, 0001302-96.2016.4.03.6139 e  0000763-67.2015.4.03.6139).

Para fins de melhor compreensão, transcreve-se aqui o teor do julgado emanado da Corte de Origem no já citado Processo nº 0001228-42.2016.4.03.6139, após a interposição de recurso pela Procuradoria Regional da República, com consequente provimento pelo prosseguimento da ação penal:

 

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. REJEIÇÃO DE DENÚNCIA. CRIME DE CONTRABANDO. CIGARROS DE PROCEDÊNCIA ESTRANGEIRA. COMERCIALIZAÇÃO PROIBIDA NO PAÍS. INAPLICABILIDADE DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA.

1. Os cigarros de origem estrangeira internados irregularmente no território nacional são mercadorias cuja importação é proibida, assim, como sua comercialização. Os cigarros apreendidos foram relacionados no Auto de Infração e Termo de Apreensão e Guarda Fiscal de Mercadorias e com o valor de R$ 497,67 e estimativa de tributos ilididos em R$ 708,97.

2- É inaplicável o reconhecimento do princípio da insignificância ao caso concreto, vez que se trata de crime de contrabando de cigarros.

3- Comprovada a procedência estrangeira dos cigarros aprendidos sua comercialização em território nacional é proibida, além da evidencia de ausência da regularização na Agencia Nacional de Vigilância Sanitária, conforme o estabelecido na Lei 9.782/99 e da Resolução RDC 90/2007 da ANVISA.

4- O valor das mercadorias apreendidas (cigarros) é irrelevante, pois não há que se questionar sobre o valor dos tributos ilididos, por configurar-se crime de contrabando o presente caso, não há tributos a ilidir, mas sim de proibição de importação e comercialização de mercadorias. A importação de cigarros estrangeiros causa grave lesão à saúde pública, higiene e segurança.

5- A r. sentença de primeiro grau deve ser reformada, em razão da inaplicabilidade do princípio da insignificância ao caso concreto, além da comprovação da materialidade e fortes indícios de autoria delitiva do réu LUCIANO AMELIO DOS SANTOS.

7- Recurso ministerial a que se dá provimento, desconstituindo-se a r. sentença de primeiro grau, remetendo-se os autos à Vara de origem para prosseguimento regular da ação criminal em relação ao acusado.

 

 

A representação ofertada pelo MPF também aponta casos ligados à investigação de fraudes nos projetos do Governo Federal na cidade de Itapeva (Minha Casa – Minha Vida), levando ao ajuizamento de inúmeras ações penais e ações cíveis. Com referência às ações criminais, o representado rejeitou sistematicamente as denúncias, por suposta inépcia (contradição), ao entendimento de que não haveria prova de que os supostos fraudadores fossem titulares de outros imóveis, visto que tais bens não possuíam registro imobiliário (Processos nºs 0000030-33.2017.4.03.6139, 0000169-82.2017.4.03.6139, 0000162-90.2017.4.03.6139, 0000203-57.2017.4.03.6139, 0000168-97.2017.4.03.6139, 0000189-73.2017.4.03.6139, 0000193-13.2017.4.03.6139, entre outros). Consoante reiterada asserção exposta pelo representado nas situações em tela, a narrativa da denúncia seria irreal e contraditória quanto à condição jurídica do (a) acusado (a) frente ao imóvel, com a observação de que a acusação parecia “ignorar” o fato de que a transferência da propriedade por ato intervivos, nos termos do art. 1245, do C. Civil, concretiza-se somente com o registro do título de aquisição junto ao cartório imobiliário.

Assim manifestou-se o juiz requerido no Processo nºs 0000030-33.2017.4.03.6139:


“(...)

Compulsando a exordial acusatória verifica-se a existência de contradição, o que impossibilita a persecução penal.

Isso porque, ao descrever a suposta vantagem econômica obtida pela acusada, o Ministério Público Federal, primeiramente, sustenta que a denunciada obteve "indevida vantagem econômica, ao ser habilitada ao programa e por meio dele adquirir, em 24.12.2015, imóvel residencial quase que totalmente subsidiado" (fl. 72).

No tópico sobre a autoria e materialidade, argumenta o MPF que a acusada "adquiriu a propriedade de uma unidade habitacional do Residencial Morada do Bosque, Bairro de Cima - Itapeva/SP, que deve ser entregue aos beneficiários em breve" (fl. 77).

Como se vê tais afirmações são contraditórias entre si. E a contradição aqui decorre do fato de a acusação parecer ignorar como se dá a aquisição da propriedade imóvel no Brasil, e, com isso, estabelecer tamanha confusão.

Sabe-se que, a teor do art. 1.245 do Código Civil, a transferência da propriedade de bem imóvel por ato inter vivos dá-se somente com o registro do título de aquisição junto ao cartório imobiliário.

Desse modo, a presente denúncia, em razão da contradição, prejudica a ampla defesa e o contraditório, padecendo, pois, de vício insanável que acarreta sua inépcia.

...”

 

A solução adotada pelo imputado em referidos processos, uma vez mais, impôs a interposição de sucessivos recursos pelo Parquet, providos para fins de processamento da ação penal, visto que eventual impropriedade técnica relacionada aos conceitos de posse e propriedade, no contexto envolvendo o modo de aquisição de bens imóveis, por si só não justificaria o indeferimento sumário da denúncia, não se cogitando da antecipação da discussão de fundo na fase meramente postulatória (juízo de delibação). Nessa direção, cite-se o teor da ementa extraída do acórdão exarado pela Corte Originária no já citado Processo nº 0000030-33.2017.4.03.6139:

 

    PENAL. PROCESSUAL PENAL. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. REJEIÇÃO DA DENÚNCIA. INÉPCIA DA DENÚNCIA. ARTIGO 171, § 3º, DO CÓDIGO PENAL. ESTELIONATO MAJORADO. RECURSO PROVIDO.

    1. Para receber a denúncia, cumpre ao juiz verificar a existência de prova da materialidade e de indícios suficientes da autoria e a inocorrência de qualquer das hipóteses do art. 395 do CPP (manifesta inépcia da denúncia, falta de pressuposto processual ou de condição para o exercício da ação penal, ou falta de justa causa para o exercício da ação penal).

    2. O art. 41 do Código de Processo Penal exige a exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do acusado, a classificação do crime e, se necessário, o rol de testemunhas.

    3. No caso, a denúncia apresenta a descrição fática do suposto delito e a contradição apontada na decisão não compromete a narrativa dos fatos nem dificulta a defesa, pois o fato de o parquet afirmar que a denunciada teria obtido vantagem indevida ao ser habilitada ao programa e, por meio dele, adquirir um imóvel e, mais à frente, expor que ela adquiriu a propriedade, que seria entregue em breve, apesar da impropriedade técnica no tocante ao modo de aquisição de bens imóveis, não é fator determinante ao afastamento da peça.

    4. A descrição realizada pelo MPF permite a compreensão dos fatos, fazendo referência à suposta declaração falsa e à obtenção de vantagem ilícita, sendo relevante ressaltar que nesta fase, não se pode antecipar a discussão aprofundada da prova, inclusive quanto à responsabilidade pelo preenchimento de cadastros ou sua atualização, pois neste momento processual basta a existência de prova da materialidade e de indícios suficientes de autoria.

    5. Recurso em sentido estrito provido.

 

Questionado pela Relatora do PAD no tocante à rejeição sistemática das denúncias nos casos do Programa Minha Casa Minha Vida, de modo inusitado e irônico, o magistrado representado justificou-se remetendo à legislação processual civil, ao relato de que “achava” que era “caso de indeferimento da inicial” – “do alto da sua ignorância” - por força do art. 321, do CPC (grifei), causando estranheza que um magistrado experiente desconhecesse o conjunto de regras específicas da legislação processual penal, ditadas pelos arts. 41 e 395, do CPP. Nesse ponto, vale a transcrição:

 

“[...]

RELATORA É, também apontam que há diversos processos em que o senhor rejeita a denúncia por inépcia em caso de contrabando, desclassifica para descaminho e aplica o princípio da insignificância, eu nem vou tratar dessa questão.

Mas eu gostaria que o senhor explicasse aqui um pouco mais sobre esses problemas que ocorreram na Vara, esse... essa divergência de... essa indignação que causou ao Ministério Público nas questões desses processos do programa Minha Casa Minha Vida.

O senhor poderia explicar o que houve ali? Do seu ponto de vista, o que foi que houve.

DEPOENTE Claro que sim.

RELATORA Porque o senhor fala... inclusive numa decisão, o senhor explica a diferença entre posse e propriedade, fala que propriedade é um conceito técnico, ele tem isso.

DEPOENTE É, é isso mesmo.

RELATORA Mas gostaria que o senhor me esclarecesse isso.

DEPOENTE É, o procurador da República entrou com várias ações, ações civis públicas e também criminais. Não eram só civis públicas... contra as mulheres...

RELATORA Não, tem as criminais também, que o senhor declinou da competência, não foi isso?

DEPOENTE É, depois, a senhora quer tratar só das ações civis públicas, é isso, agora?

RELATORA Não, o senhor pode falar da questão toda do Minha Casa Minha Vida.

É só para lhe mostrar que eu... que eu estudei o processo e sei que há uma questão na ação civil pública, e aos processos criminais também, onde o senhor acabou declinando da competência.

DEPOENTE Isso eu me lembro mais. Esse eu lembro melhor, Excelência, porque eu ainda estou julgando, eu julguei aqui sentenças desses processos antes de eu sair de férias.

Então está mais fresco na minha mente e eu posso dizer a V. Exª, sim, mas evidentemente que também não posso fazer uma análise em detalhes de cada caso.

Mas o que aconteceu aí foi o seguinte: o procurador entrou com as ações e ele dizia assim, “olha, fulana de tal” - porque o Minha casa Minha Vida é um programa feito para as mulheres – “Fulana de tal, ela não poderia ter se inscrito no programa porque ela é proprietária de um imóvel, embora” - tá escrito lá – “não conste registro da matrícula do imóvel no cartório de registro de imóveis” .

Eu, para mim, essa definição... isso é uma definição de posse e não de propriedade. Ele estava alegando propriedade, mas não tinha matrícula do registro de imóveis. Então eu achei que era caso de indeferimento da inicial por causa do 321, do Código de Processo Civil, que diz que se o juiz encontrar dificuldade para o julgamento... havia uma antítese entre a inicial... a inicial, ela tinha uma antítese, né? Ele elegia um fato e dava uma atribuição jurídica entre a causa... a causa de pedir próxima e remota, que se contradiziam.

Então tinha uma contradição intrínseca.

No meu entendimento, aqui no alto da minha ignorância, eu achei que aquilo fosse caso de indeferimento da inicial. Indeferi várias. O Tribunal disse “não, isso aqui você tem que processar e entrar no mérito” . Eu processei todas elas. Teve umas que o Tribunal, ele mesmo já julgou. O Tribunal pegou e falou “não, isso aqui não era caso de indeferimento” , mas ele já julgou improcedente, inclusive com parecer favorável de alguns procuradores da República.

Isso eu me lembro, era uma questão técnica ali...

[...]”[70]

 

Não passou despercebido, ainda, que além das decisões de rejeição sistemática das denúncias nos casos relacionados ao Projeto Minha Casa Minha Vida, reformadas pelo TRF3, o magistrado representado, em momento posterior, houve bem adentrar ao exame de questão processual diversa e, então, declinar da competência para as Varas Especializadas em Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e Crimes de Lavagem e Ocultação de Bens, Direitos e Valores, conforme admitiu em seu interrogatório[71], o que levou à interposição de novas medidas recursais naqueles feitos – postergando, uma vez mais, na prática, a entrega da prestação jurisdicional -.

Além das inúmeras situações anteriormente expostas, cumpre analisar – até porque se trata do objeto da revisão disciplinar ofertada pelo magistrado requerido (RevDis 8678-96) –a injustificada relutância frente à ordem oriunda da 11ª Turma do TRF3, no Recurso em Sentido Estrito nº 0001449-25.2016.4.03.6139 (atrelado ao Inquérito Policial nº 0001359-17.2016.4.03.6139).

Com efeito, não é ocioso reiterar que, nas suas razões de defesa, o magistrado insistiu na descaracterização do desvio funcional e/ou da hipótese de conduta inadequada, relatando que não teve qualquer intenção de descumprir o comando inserido no acórdão da 11ª Turma do TRF-3, mas sim expedido o mandado de busca e apreensão, nos exatos termos da decisão colegiada, não havendo concluído que, do citado aresto, houvesse “autorização perene de expedição de novos mandados”. Nesses termos, renovou a argumentação de que o indeferimento posterior do pedido formulado pela autoridade policial, no sentido de que fosse renovado diligência, resultou de decisão devidamente fundamentada, tratando-se de ato jurisdicional que não refletiu qualquer transgressão de ordem disciplinar. Argumentou que somente no julgamento da Correição Parcial SEI nº 0042082 87.2017.4.03.8000 a Corte Federal determinou que o mandado deveria ser prorrogado “quantas vezes se fizessem necessárias até o seu integral cumprimento”, de modo que a citada diretriz passou a ser observada a partir da prolação da citada decisão. Assim, sob a sua ótica, diante da manifesta inexistência de qualquer ilícito funcional, visto que “agiu em estrito cumprimento das ordens emanadas” do TRF-3, requereu a revisão do acórdão condenatório, reputando inaplicável a sanção de advertência que lhe foi imposta.

De plano, ressalto que, a luz do já citado art. 83, I a III, do RICNJ, a Revisão Disciplinar, em sua essência, guarda simetria com a natureza da Ação Rescisória (arts. 966 a 975, do CPC), da Revisão Criminal (arts. 621 a 631 do Código de Processo Penal), e da Revisão dos Processos Administrativos no âmbito da Administração Pública Federal (art. 65 da Lei 9.784/99) e, portanto, as suas taxativas hipóteses, acima elencadas, constituem numerus clausus, evidenciando que a revisional não constitui via recursal em sede de processo administrativo disciplinar.

Na hipótese, o deliberado descumprimento do comando extraído v. aresto do TRF3 tornou-se patente, conforme detida e criteriosa análise efetivada pelo Órgão Especial no julgamento sob revisão. Reporto-me, novamente, aos fundamentos consignados no v. aresto condenatório do Tribunal de Origem, nesse particular:

 

“[...]

 

32. O caso analisado é inquérito policial com pedido de busca e apreensão e de prisão preventiva, referente à explosão de caixas eletrônicos do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal. Segundo narra o MPF no bojo da representação, após a identificação do suspeito, que possui extensa ficha criminal, foi requerida a busca e apreensão em sua residência, bem como a sua prisão preventiva e a quebra de sigilo de dados telefônicos. O pedido foi integralmente acolhido pelo magistrado substituto. Porém, após retornar à Jurisdição, o representado, de ofício, cassou a decisão anterior e denegou todas as medidas, ao fundamento de que a testemunha que identificou o suspeito estava protegida pelo sigilo, nos termos do Provimento do TJ/SP. Inconformado, interpôs o órgão ministerial Recurso em Sentido Estrito em 28.11.2016, autuado sob n° 0001449-25.2016.4.03.6139. Em julgamento, a 11ª Turma deste Tribunal, por unanimidade, deu provimento ao recurso, anulando a decisão recorrida e restabelecendo, na íntegra, a decisão que decretou a prisão preventiva, deferiu a busca domiciliar e a quebra de sigilo de dados telefônicos.

 

33. Apesar de ter inicialmente expedido o mandado de busca, o juiz negou-se a prorrogar seu prazo, primeiro argumentando que não havia informações atualizadas de que o investigado residia no imóvel e, após confirmada essa situação por diligências da Polícia Federal, definitivamente, ao argumento de que o “decurso de tempo entre o deferimento da medida até o presente momento, indicativo de que nenhuma prova que ajudasse a esclarecer a autoria do delito deva estar presente no local em que a Polícia pretende diligenciar". Interposta a citada correição parcial, pelo MPF, o Conselho da Justiça Federal da Terceira Região, em sessão realizada em 16/11/2017, por maioria, conheceu em parte do pedido de correição parcial e, na parte conhecida, deu-lhe parcial provimento.

 

34. Embora insista o magistrado processado em invocar as razões do voto da então Corregedora Regional, convém lembrar que Sua Excelência restou vencida quanto ao conhecimento da Correição Parcial, por entender que a matéria trazida pelo MPF não comportava apreciação naquela via. Ao contrário do alegado pelo magistrado, o voto não lhe foi favorável, pois deixou claro que deveriam ser apurados “em expediente a ser formado separadamente” os atos do magistrado “que ilegalmente obstaculizem as investigações realizadas nos autos do inquérito policial n.º 0001359-17.2016.403.6139’, além do próprio teor do julgado da 11ª Turma ao solucionar o recurso em sentido estrito no bojo do feito subjacente, ao reconhecer que ‘já tendo o Juízo da 1ª Vara Federal de Itapeva decidido sobre a decretação das medidas constritivas, não caberia ao próprio Juízo, de ofício, revogar essa decisão sem que houvesse qualquer manifestação das partes e alteração do panorama fático-processual” .O descumprimento da decisão do Tribunal foi suficientemente demonstrado nos substanciosos votos divergentes colhidos nos autos daquela correição parcial.

 

35. O magistrado, sem disfarce ou constrangimento, praticou atos que impediram a execução da medida cautelar de busca e apreensão determinada pelo Tribunal. E não o fez porque estivesse examinando a eventual modificação das condições determinantes da cautelar, mas sim, no evidente propósito de fazer valer o que antes fizera e fora reformado pelo Tribunal: impedir a diligência. Não cabia ao magistrado, naquela oportunidade, decidir sobre a diligência de busca e apreensão. Sua decisão já fora modificada pelo Tribunal, e só lhe cabia o cumprimento do quanto decidido pela 11ª Turma do Tribunal.

 

36. Configurada a violação ao art. 35, I, da Lei Complementar n. 35, de 14 de março de 1979, e ao art. 1º do Código de Ética da Magistratura Nacional, por descumprimento da decisão proferida pela 11ª Turma no julgamento do Recurso em Sentido Estrito n. 0001449-25.2016.4.03.6139.

 

37. As penas disciplinares estão previstas no art. 42, I a VI e parágrafo único, da Lei Complementar 35/1979. É a advertência a pena disciplinar adequada ao caso. Embora a instauração do PAD tenha sido fincada em diversos fundamentos, só se configurou a infração disciplinar em um dos casos apontados, de modo que a advertência se afigura suficiente em relação ao grau de reprovabilidade da conduta do magistrado.

 

38. Aplicada a pena de advertência por infração ao art. 35, I, da Lei Complementar n. 35, de 14 de março de 1979, e ao art. 1º do Código de Ética da Magistratura Nacional, por descumprimento da decisão da 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região proferida no Recurso em Sentido Estrito n. 0001449-25.2016.4.03.6139, procedendo-se na forma do disposto no art. 43 da LOMAN.

 

[...]”

 

Como se verifica, os dados probatórios trazidos pelo próprio magistrado apontam que, nos autos do Inquérito Policial nº 0001359-17.2016.4.03.6139, a investigação ali deflagrada envolvia graves delitos, relacionados a roubo de cofres e explosões em caixas eletrônicos do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal, praticados por indivíduos fortemente armados (fuzis), os quais concluíram a subtração do dinheiro que se encontrava nesse local, empreendo fuga em dois veículos em direção ao Paraná. Desse modo que, a teor das narrativas do Parquet em sua representação, após a identificação do suspeito, detentor de vastos antecedentes criminais, foram solicitadas medidas de cunho cautelar – busca e apreensão na residência do investigado, prisão preventiva e quebra de sigilo de dados telefônicos -.

Conforme já destacado anteriormente, por ocasião da análise da conduta do processado envolvendo a revisão, de ofício, das decisões prolatadas por outros magistrados, os requerimentos cautelares foram acatados pelo juiz em substituição, mas após o retorno do magistrado titular, ora representado, à jurisdição, a deliberação do substituto foi reconsiderada, ex officio, sob o fundamento de que a testemunha que identificou o suspeito estaria ilegitimamente protegida pelo sigilo.  

Irresignado, o Ministério Público Federal interpôs o Recurso em Sentido Estrito nº 0001449-25.2016.4.03.6139, sendo certo que a 11ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região restabeleceu a decisão do juiz substituto que havia decretado a prisão preventiva, bem como deferiu a busca domiciliar e a quebra de sigilo de dados telefônicos no Inquérito Policial nº 0001359-17.2016.403.6139.

Baixados os autos do Recurso em Sentido Estrito, o magistrado representado, de fato, expediu novo mandado de busca e apreensão, mas não acatou o pedido da D. Autoridade Policial relativo à prorrogação do prazo, sob o pretexto de que inexistiriam informações atualizadas de que o investigado mantinha sua residência no imóvel. Verifica-se, ainda, que a dúvida em questão foi saneada pela Polícia Federal após a prisão do suspeito e, nada obstante, o juiz imputado rechaçou a possibilidade de prorrogação do prazo para conclusão da diligência remetendo ao “decurso de tempo entre o deferimento da medida até o presente momento, indicativo de que nenhuma prova que ajudasse a esclarecer a autoria do delito deva estar presente no local em que a Polícia pretende diligenciar.”

Não se olvide, ainda, que, a despeito das notórias dificuldades inerentes ao cumprimento da diligência no prazo originariamente estabelecido, inclusive em razão da notória escassez de recursos humanos e da própria distância geográfica entre a Delegacia da Polícia Federal (responsável pelo cumprimento das medidas deferidas pela Subseção de Itapeva) e a residência do suspeito (cerca de 300 quilômetros), o juiz representado houve por bem solicitar o envio dos autos do inquérito policial (de Sorocaba à Itapeva), para, em 23/08/2017, deliberar pela “possibilidade da medida”, desde que confirmada a residência do investigado no local. Entretanto, mesmo cumprida a diligência confirmatória, consoante acima salientado, ou seja, com a informação positiva de que o suspeito residia no mesmo local, o requerido, em 27/10/2017,  negou a dilação de prazo definitivamente.

O contexto fático-probatórios dos autos originários sinaliza que o imputado, na prática, impôs resistência à concretização da decisão colegiada proferida no âmbito do recurso em sentido estrito, e isso sem provocação de qualquer natureza -. Em verdade, ao magistrado representado incumbia uma única tarefa, qual seja, dar efetivo cumprimento à deliberação da 11ª Turma do TRF-3, no intuito de assegurar a execução cabal da ordem cautelar de busca e apreensão, não lhe competindo, naquela fase processual  - a teor do decidido pelo Colegiado restabelecendo a decisão do magistrado substituto – exercer qualquer juízo valorando a conveniência ou não da diligência de busca e apreensão -. Todas essas nuances deságuam na conclusão, consoante bem observado com argúcia pela DD. Relatora do Processo Administrativo Disciplinar, de que o processado “não o fez porque estivesse examinando a eventual modificação das condições determinantes da cautelar, mas sim, no evidente propósito de fazer valer o que antes fizera e fora reformado pelo Tribunal”.

Reitere-se, ainda, que foi necessária a apresentação de Correição Parcial pelo MPF, para o fim de que fosse acatado o comando emanado da 11ª Turma do TRF3, sobrevindo a conclusão taxativa da Corte Local na seara correional, também já acima reproduzida, no sentido de que o requerido atuava “como se Tribunal fosse, primeiro, quando, de ofício, ‘cassou’ a decisão do Juiz Federal substituto, o que obrigou o MPF a interpor recurso em sentido estrito perante este Tribunal, que lhe deu integral provimento; segundo quando deixou de cumprir, imediatamente, a ordem emanada desta Corte, cumprindo-a tão somente após decorridos mais de dois meses; terceiro, quando, em face do pedido de dilação de prazo por mais 60 (sessenta) dias, requisitou os autos do IPL; quarto, quando indeferiu tal pedido após decorridos quase dois meses do pedido, ao argumento de que ‘não foram realizadas diligências para apontar que o investigado ainda reside no mesmo endereço’; e por fim, quando, após a prisão do investigado e a confirmação de sua residência no endereço objeto da busca e apreensão, indeferiu de forma definitiva, novo pedido de prazo para expedição do mandado de busca e apreensão, ao argumento de ‘decurso de tempo entre o deferimento da medida até o presente momento, indicativo de que nenhuma prova que ajudasse a esclarecer a autoria do delito deva estar presente no local em que a Polícia pretende diligenciar’ [...]”.

Oportuno salientar, a título de observação, que o representado enalteceu em defesa as inúmeras dificuldades da unidade judiciária para justificar a mora processual da 1ª Vara Federal de Itapeva (dimensão territorial, escassez de recursos humanos, etc), mas que paradoxalmente não foram consideradas para escusar eventuais atrasos no cumprimento da diligência da Polícia Federal. Nesse sentido, como justificativa apresentada no interrogatório, o processado afirmou cumprir as ordens do Tribunal, tanto que o mandado de busca e apreensão teria sido expedido no mesmo dia, mas considerou que a diligência deveria ser realizada impreterivelmente em 30 (trinta) dias (já que a Corte Local não havia especificado o cumprimento a qualquer tempo). Desse modo, como a Polícia Federal não logrou cumprir a diligência em 30 (trinta) dias, deixou de emitir novo mandado[72]:

 

“[...]

 

DEPOENTE Não. Eu vou explicar para a senhora, agora. É, eu vou explicar para a senhora.

É que o voto dela é tão bom explicando isso que é melhor que a minha fala.

Mas eu posso explicar.

O que aconteceu foi o seguinte: o Tribunal mandou expedir a ordem, foi expedido o mandado - por isso que eu digo que eu não posso cumprir e descumprir ao mesmo tempo

- no mesmo dia. O processo chegou num dia; no outro dia o Tomás fez a decisão; e no terceiro dia estava com a Polícia. Foi essa a ordem.

O que aconteceu?

A Polícia descumpriu o mandado, e não eu, porque eu expedi o mandado. Então eu não posso cumprir e descumprir a decisão ao mesmo tempo.

O mandado era de trinta dias e a Polícia, depois de meses - agora não me lembro quanto -, veio pedir prorrogação.

As cautelares, todo mundo... no processo penal, elas têm prazo. Então diz lá S. Exª, a desembargadora Therezinha Cazerta, no voto... falou assim: “Não era uma atividade meramente protocolar do magistrado, de dar outro mandado para a Polícia ou prorrogar aquele conforme se entenda” .

Então eu entendi que eu tinha que analisar a situação atual, se demandaria ou se não demandaria, naquele momento, a expedição do mandado, e achei - conforme até o procurador da República falou hoje - que, pelo passar do tempo e pela demora da Polícia, nada mais iria se encontrar na casa da pessoa, porque imagine uma pessoa que explode banco vai ficar guardando prova em casa?

Foi esse o meu entendimento.

Aí - tem uma questão aí -, mas se o Tribunal dissesse assim: “Olha, o mandado não tem prazo” , eu teria cumprido ele, eu teria expedido outro. O problema é que ele tinha prazo.


[...]”

 

Sem embargo, as ponderações externadas pelo representado não se sustentam sob o ponto de vista correicional-disciplinar, a teor de todas as peculiaridades acima enfocadas, bem assim do padrão de conduta reiteradamente externado nas situações anteriormente narradas. As inúmeras nuances fático-probatórias que afloram dos autos vão exatamente ao encontro da conclusão do TRF3 no julgamento do PAD, na linha de que o requerido, em efetivo, impôs resistência injustificada ao cumprimento da decisão exarada pela Corte Regional em sede recurso em sentido estrito, com o nítido intento de fazer valer a revogação por ele próprio anteriormente decretada, sem provocação de qualquer natureza e/ou alteração do estado de fato e/ou de direito.

Não se pode concluir, nesse aspecto, pelo desacerto do acórdão condenatório, pois o Órgão Especial do TRF3 examinou e valorou de modo percuciente todo o arcabouço fático-probatório daquele feito disciplinar e, de conseguinte, à luz das disposições legais e normativas, concluiu pela configuração da falta disciplinar, ante a imposição de resistência injustificada ao concreto cumprimento do aresto proferido pela 11ª Turma em sede de Recurso em Sentido Estrito, caracterizando ofensa ao art. 35, inciso I, da Lei Complementar nº 35/1979, e ao art. 1º do Código de Ética da Magistratura Nacional.

É certo que o livre convencimento do Magistrado e a sua independência na interpretação e na aplicação das normas jurídicas aos casos concretos são pilares do Estado Democrático de Direito. Contudo, não é menos certo que cabe ao juiz o fiel respeito à disciplina judiciária, bem como a observância do quanto deliberado pelas Instâncias Superiores, de modo a resguardar o Poder Judiciário. Mas assim não procedeu o magistrado representado, já que todo o cenário acima explicitado, reitere-se, corrobora a asserção exposta pelo TRF3, embasada na premissa de que o descumprimento consciente da decisão exarada no âmbito do recurso em sentido estrito, subliminarmente, teve por escopo fazer prevalecer a revogação da medida cautelar anteriormente decretada pelo imputado (de ofício),  o que se revelou bastante para caracterização do ilícito funcional, justificando a aplicação da correspondente sanção administrativa.

Logo, a situação exposta não se amolda ao inciso I, do art. 83, do RICNJ, pois não restou caracterizada a indubitável afronta a texto legal ou a ato normativo deste Conselho, nem tampouco foi demonstrada pelo imputado a concreta dissonância entre a conclusão do julgado e os elementos hospedados naqueles autos originários.

De igual modo, o juiz processado não logrou demonstrar que o édito condenatório está respaldado em depoimentos, documentos e exames comprovadamente falsos, nem apresentou novos fatos, provas novas ou quaisquer outras circunstâncias suficientemente determinantes e aptas a autorizar a revisão do julgado, nos exatos moldes exigidos pelos incisos II e III, do art. 83, do RICNJ.

Resultaram plenamente caracterizadas, portanto, a autoria e a materialidade da transgressão disciplinar, também em relação ao tópico envolvendo a desatenção deliberada ao acórdão proferido pela 11ª Turma do TRF3 no âmbito de recurso em sentido estrito. Logo, o pedido revisional formulado pelo juiz processado não se amolda às hipóteses insculpidas no art. 83, incs. I a III, do RICNJ, impondo-se a sua rejeição.

Em resumo, a par dos vastos dados ofertados pelo MPF em sua representação, do material probatório hospedado nos autos e das informações extraídas do interrogatório do próprio juiz imputado, observa-se que, em reiteradas situações, o magistrado declarou a ilegalidade da prisão e de provas, procedendo a revisão de ofício de decisões proferidas por outros magistrados investidos no mesmo grau de jurisdição, bem assim inviabilizou a execução de inúmeras diligências requeridas pela acusação, pelo simples fato de que a apreensão dos produtos tidos por ilícitos teriam decorrido da abordagem rotineira da polícia. Em sucessivas oportunidades, sem ponderar as condições e peculiaridades da situação concreta, o requerido partiu de premissas a priori, reveladoras de subjetivismo desmensurado e conceitos preconcebidos, reputando que as abordagens e vistorias policiais, em regra, seriam arbitrárias, abusivas e violadoras ao direito à intimidade do cidadão.

Por outro vértice, para além da revisão ex officio de decisões proferidas por outros colegas que atuaram na unidade judiciária, mediante relaxamento de prisões, decreto de nulidade de provas e indeferimento de diligências, o requerido procedeu à rejeição sistemática de denúncias, inclusive quando já encerrada a fase instrutória, louvando-se de motivações intuitivamente antijurídicas, proferiu sentenças de absolvição fundamentadas em questões já decididas e procedeu ao descumprimento deliberado de decisão oriunda do Tribunal, retardando ato de ofício e acarretando nítido tumulto processual.

 No sentir desta Relatoria, o padrão de conduta externado pelo magistrado transborda os limites do livre convencimento motivado e da independência funcional, porquanto na prática desqualifica e inviabiliza o próprio exercício do legítimo poder de polícia, consideradas as exigências formais exacerbadas para fins de convalidação da revista, da apreensão e da própria prisão cautelar. Com efeito, ao que se depreende do acervo probatório, a avaliação relacionada ao preenchimento – ou não - do requisito inerente à “fundada suspeita” está vinculada primordialmente ao total arbítrio do magistrado, sem considerar o fato de que a constatação da presença do condicionante legal pressupõe a avaliação subjetiva do agente policial no desempenho da sua atividade rotineira em si mesma, pautada inclusive em critérios de conveniência e oportunidade. Assim, diante da presunção de veracidade que emana dos atos praticados pela Administração Pública, não parece razoável que a licitude da diligência merecesse desconstituição sumária pelo simples fato de não constar do respectivo auto de apreensão a referência formal e literal no sentido de que houve “fundada suspeita” com relação ao suposto agente delitivo “por causa disso” (sic), conforme pontuou o magistrado no interrogatório.

Dito de outra maneira, o contexto probatório dos autos demonstra a leniência extrema e radical do imputado, a despeito das evidências da licitude da provas obtidas, da materialidade delitiva, bem assim dos robustos indícios de autoria em diversos casos relacionados a crimes graves, ora examinados pelo Colegiado por amostragem, em dissonância com o equilíbrio, a serenidade e a ponderação indissociáveis do exercício da judicatura, a exigir uma enérgica, firme e rigorosa atuação do Estado-Juiz na seara da persecução-penal, em prol da preservação do interesse público, da manutenção da segurança da coletividade e da paz social, sob pena de verdadeiro incentivo à impunidade.

Com o nítido afã de fazer prevalecer seus posicionamentos reconhecidamente contramajoritários, o imputado acabava por obrigar a acusação a interpor sucessivos recursos, isto é, tumultuava a marcha processual, comprometendo a celeridade e a própria eficiência na prestação jurisdicional - particularidade, aliás, que se revelou notória por ocasião do exame dos detalhes relacionados à morosidade na tramitação dos feitos -. E aqui, não é demais ressaltar que o próprio TRF3 admitiu expressamente que “o entendimento contramajoritário do magistrado tem dado causa à demasiada demora no andamento dos processos criminais da 1ª Vara Federal de Itapeva, como reclama o Ministério Público, o que impacta, obviamente, no tempo da razoável duração do processo” (item “24”, da ementa), mas paradoxalmente não reconheceu a prática de qualquer falta funcional, nesse ponto.

Em última análise, denota-se que a prática utilizada pelo representado, ao fim e ao cabo, comprometeu a articulação da própria atividade policial de repressão no âmbito da Subseção Judiciária de Itapeva, dificultou a persecução processual penal e acarretou verdadeiro conflito institucional com os demais entes do sistema da justiça, com o que não pode ser conivente este Conselho.

É cediço que a independência funcional do magistrado, quando exercida sem subterfúgios ou desvio no desempenho da função jurisdicional, encontra plena guarida no art. 41, da Lei Orgânica da Magistratura e, portanto, refoge à competência deste Conselho o controle de mérito da atividade jurisdicional. Assim, em regra, não se concebe a aplicação de sanção disciplinar ao magistrado pelo simples conteúdo das decisões que proferir, sob pena de esvaziamento do próprio comando vertido pelo supracitado dispositivo da LOMAN. 

Todavia, a garantia atrelada à independência funcional não ostenta caráter absoluto, levando-se em conta que o próprio texto legal em referência excepciona os casos de impropriedade ou excesso de linguagem.  Logo, embora em caráter excepcional, este Conselho vem admitido a relativização dos princípios da independência e da imunidade funcionais, a propiciar a responsabilização administrativo-disciplinar do magistrado quando, no exercício da atividade jurisdicional, resultar patenteada a ofensa aos deveres constitucionais e legais que norteiam a magistratura, exatamente como se concretizou, in casu, diante da reiteração de procedimentos evidenciadores do desvirtuamento da atividade judicante. Eis os precedentes:

 

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. MAGISTRADO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO MARANHÃO. PRELIMINAR DE PREVENÇÃO. ARGUIÇÃO DE NECESSIDADE DE REUNIÃO DE PROCESSOS POR RISCO DE DECISÕES CONFLITANTES. PRECLUSÃO. CISÃO REALIZADA POR ACOLHIMENTO DE TESE DEFENSIVA DO PRÓPRIO MAGISTRADO REQUERIDO. ALEGAÇÃO DE ILEGALIDADE DE DECISÃO PLENÁRIA DE AVOCAÇÃO DAS SINDICÂNCIAS. IMPOSSIBILIDADE DE REDISCUSSÃO DA MATÉRIA NA SEARA ADMINISTRATIVA. PRESCRIÇÃO IN ABSTRATO. COMPETÊNCIA CONCORRENTE PARA INSTAURAÇÃO DE PAD. TERMO INICIAL. DATA EM QUE A PRIMEIRA DAS AUTORIDADES COMPETENTES TOMOU CIÊNCIA DO FATO. NULIDADE DO ACÓRDÃO DE INSTAURAÇÃO DO PAD EM RELAÇÃO AOS FATOS NÃO PRESCRITOS. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE RELAÇÃO DE INTERDEPENDÊNCIA ENTRE OS FATOS E DE PREJUÍZO PARA A DEFESA. CONTROLE DE CUMPRIMENTO DOS DEVERES FUNCIONAIS NA ATIVIDADE JUDICANTE. ÓBICE DO ARTIGO 41 DA LOMAN. INAPLICABILIDADE. POSSIBILIDADE DE SANCIONAMENTO ADMINISTRATIVO EM CASO DE INFRAÇÃO DOS VALORES PRIMORDIAIS DA ORDEM JURÍDICA E DOS DEVERES DE CONDUTA FUNCIONAL. COMPROVAÇÃO DE TENTATIVA DE DIRECIONAMENTO DA DISTRIBUIÇÃO DE PROCESSOS E DE EXPEDIÇÃO DE AUTORIZAÇÃO PARA LEVANTAMENTO DE VALORES DEPOSITADOS EM CONTA JUDICIAL VINCULADA A PROCESSO DE VARA SOBRE A QUAL NÃO POSSUÍA JURISDIÇÃO. PARCIAL PROCEDÊNCIA DAS IMPUTAÇÕES.  VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DO JUIZ NATURAL E DO DEVIDO PROCESSO LEGAL. ABALO À IMAGEM DO PODER JUDICIÁRIO E À SEGURANÇA JURÍDICA. INFRAÇÃO AOS ARTIGOS 35, I E VIII, DA LEI COMPLEMENTAR 35/1979 E 1º, 2º, 4º, 5º, 8º, 10 E 25 DA RESOLUÇÃO CNJ 60/2008. EXISTÊNCIA DE CONDENAÇÕES A SANÇÕES DE CENSURA E DISPONIBILIDADE PELA PRÁTICA DE OUTRAS INFRAÇÕES FUNCIONAIS. INCOMPATIBILIDADE PERMANENTE PARA O EXERCÍCIO DA JURISDIÇÃO. APLICAÇÃO DE SANÇÃO DISCIPLINAR DE APOSENTADORIA COMPULSÓRIA COM VENCIMENTOS PROPORCIONAIS AO TEMPO DE SERVIÇO. (CNJ, Processo Adm. Disciplinar nº 0006920-87.2018.2.00.0000, Rel. Mário Guerreiro, Julg. 60ª Sessão Extraordinária – 28/09/2021).

 

PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. RESOLUÇÃO CNJ N. 135/2011. TJBA. JUIZ DE DIREITO. LIMINARES CONTRA O DESCONTO DO EMPRÉSTIMO CONSIGNADO EM FOLHA SALARIAL DOS SERVIDORES. ARQUIVAMENTO PELA CORREGEDORIA-GERAL DE JUSTIÇA. POSSÍVEL CONTRARIEDADE AO DIREITO E À PROVA DOS AUTOS (ART. 83, I, RICNJ). DETERMINADA A INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR.

1. Independência funcional. O magistrado deve decidir com independência, sem aceitar indevidas influências externas (art. 5º do Código de Ética da Magistratura Nacional). Coincidência de redação entre decisões de magistrados vinculados a tribunais diversos. Por si só, o uso de textos redigidos por outros agentes não é ilícito. Os textos judiciários não são protegidos por direitos autorais. Peculiaridades que indicam possível influência externa, que levou à adoção do texto que não foi inteiramente redigido por seu gabinete – pessoalmente pelo magistrado por sua assessoria – nem provêm de pesquisa.

2. O magistrado, na condução de suas atividades, deve observar o dever de prudência, adotando comportamentos e decisões que sejam o resultado de juízo justificado racionalmente, à luz do Direito aplicável (art. 24 do Código de Ética da Magistratura Nacional) e, ao proferir decisões, atuar de forma cautelosa, atento às consequências que pode provocar (art. 25 do Código de Ética da Magistratura Nacional). Ausência de checagem de circunstâncias do caso. Abertura de espaço para sucessivas fraudes, ao determinar a liberação das margens consignáveis.

3. Determinada a instauração de processo administrativo disciplinar. (CNJ – Pedido de Providências nº 0002668-36.2021.2.00.0000, Rel. Maria Thereza de Assis Moura, Julg. 340ª Sessão Ordinária – 19/10/2021)

 

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. PAD. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. TJRJ. DESEMBARGADOR. PLANTÃO. CONCESSÃO DE LIMINAR EM HABEAS CORPUS A RÉU PRESO PREVENTIVAMENTE. RESOLUÇÃO CNJ N. 71/2009. REQUISITOS. URGÊNCIA. NÃO COMPROVAÇÃO. EXTENSÃO DE DECISÃO A 6 PROCESSOS CRIMINAIS DISTINTOS. DECISÃO TERATOLÓGICA. COMPETÊNCIA. PREVENÇÃO. JUIZ NATURAL. VIOLAÇÃO. PARENTESCO. FILHO. ADVOGADO DO PACIENTE. ALEGAÇÃO DE DESCONHECIMENTO. FALTA DE CAUTELA. INFRAÇÃO À LOMAN E AO CÓDIGO DE ÉTICA DA MAGISTRATURA. APLICAÇÃO DA PENA DE APOSENTADORIA COMPULSÓRIA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR JULGADO PROCEDENTE.

I - Processo Administrativo Disciplinar instaurado em desfavor de Desembargador para apurar: (i) concessão de liminar em habeas corpus, durante o plantão judiciário, em favor de paciente anteriormente patrocinado por advogado filho do requerido; e (ii) violação da Resolução CNJ n. 71/2009, que dispõe sobre o regime de plantão judiciário.

II - A Resolução CNJ n. 71/2009 disciplina as matérias passíveis de apreciação em plantão judiciário. Necessidade de o fato superveniente ao expediente regular caracterizar-se como urgente, sob pena de violação ao princípio do juiz natural.

III - Prolação de decisão teratológica. Liminar em habeas corpus para, por meio de uma única decisão, conceder prisão domiciliar a réu preso preventivamente em 6 processos distintos, com trâmite em juízos diversos.

IV - Fatos agravados ante a constatação de que o filho do requerido havia funcionado nos mesmos autos como advogado do paciente, e que havia anteriormente pleiteado a mesma medida judicial.

V - Elevada gravidade passível de repreensão, por afronta aos artigos 35, I, e VIII, da LOMAN e 1º, 4º, 5º, 8º, 15, 17, 19, 24, 25 e 37, do Código de Ética da Magistratura.

VI - Procedência das imputações. Aplicação da pena de aposentadoria compulsória. (CNJ, Processo Adm. Disciplinar nº 0006926-94.2018.2.00.0000, Rel. Salise Monteiro Sanchotene, Julg. 3ª Sessão Ordinária/2023 – 14/03/2023).

 

REVISÃO DISCIPLINAR. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARÁ. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR INSTAURADO EM DESFAVOR DE MAGISTRADA. DECISÃO TERATOLÓGICA QUE AFRONTOU REGRA PROCESSUAL, IGNOROU O INSTITUTO DA COISA JULGADA, OFENDEU DIRETRIZ DO CNJ E DESCUMPRIU ORDEM DA SUPREMA CORTE. FALTA DISCIPLINAR COMPROVADA. GRAVIDADE DO ATO. HISTÓRICO FUNCIONAL CONSIDERADO. PENA DE APOSENTADORIA COMPULSÓRIA. INEXISTÊNCIA DE CONTRARIEDADE À EVIDÊNCIA DOS AUTOS. CONCLUSÃO QUE SE COADUNA COM O ACERVO PROBATÓRIO. IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO REVISIONAL.

1. Revisão disciplinar proposta contra acórdão do TJPA que aplicou à magistrada a pena de aposentadoria compulsória, em razão de suposto descumprimento voluntário e consciente da Resolução CNJ 80/2009 e de decisões proferidas pela Suprema Corte.

(...)

3. A independência funcional dos magistrados (art. 41 da LOMAN) deve ser defendida e protegida de forma resoluta, porém figura como garantia que não tem caráter absoluto, nem desobriga esses agentes públicos do compromisso de observarem os deveres constitucionais e legais que norteiam a magistratura.

4. Evidencia o arcabouço probatório que a decisão foi propositada e que, a um só tempo, afrontou preceito constitucional (necessidade de concurso público - art. 236, § 3º, da CF/1988), contrariou ordem expressa da Suprema Corte, ignorou diretriz do CNJ e violou o instituto da coisa julgada.

5. Não se pode classificar como mero error in judicando ou error in procedendo decisão teratológica que desborda das balizas que deviam dirigir a atuação da magistrada e se direciona ao favorecimento de interinos.

6. Pretensão de utilizar a revisão disciplinar como sucedâneo recursal. Impossibilidade. Precedentes.

7.      Revisão disciplinar conhecida e, no mérito, julgada IMPROCEDENTE. (CNJ – Revisão Disciplinar nº 0007103-53.2021.2.00.0000, Rel. Mauro Pereira Martins, Julg. 5ª Sessão Virtual/2023 – 20/04/2023)

 

 

Nessa mesma direção, colhem-se os seguintes precedentes do E. STF:

 

“1. Agravo regimental em mandado de segurança. 2. Conselho Nacional de Justiça. Competência para processar e julgar processo administrativo disciplinar com vistas a apurar descumprimento de deveres funcionais por parte dos magistrados. Art. 103-B, § 4º, da Constituição. 3. Independência funcional do magistrado. Incursão. Inocorrência. Atos sucessivos que demonstram a reiteração de procedimentos incorretos evidenciadores do desvirtuamento da atividade judicante. Violação aos deveres impostos aos magistrados pelo art. 139 do NCPC e pelo art. 35 da LOMAN. 4. Proporcionalidade da sanção aplicada. Necessidade de ampla dilação probatória. Inadequação do meio processual. Impossibilidade. 5. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STF - MS 32.221 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, Segunda Turma, DJe de 09/10/2017)

 

 

“AGRAVO REGIMENTAL. MANDADO DE SEGURANÇA. MAGISTRATURA ESTADUAL. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. CNJ. INFRAÇÕES DISCIPLINARES. VIOLAÇÃO IMPARCIALIDADE. APOSENTADORIA COMPULSÓRIA. 1. Dentre as atribuições do Conselho Nacional de Justiça previstas no art. 103-B, § 4º, da Carta da República, está o dever de zelar pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura (LC 35/1979 - LOMAN) e pela observância do disposto no artigo 37 da mesma Carta Política. Nesse contexto, são, portanto, legítimas as determinações de remoção, afastamento ou mesmo aposentadoria de membros da magistratura, quando verificadas infrações previstas na LOMAN que comportem tais penalidades. 2. Na espécie, após regular trâmite de processo administrativo disciplinar, com a participação do Ministério Público Federal, realização de diligências, apresentação de defesa escrita, oitiva de testemunhas e interrogatório do requerido, o Conselho Nacional de Justiça acolheu dez das doze infrações disciplinares imputadas ao agravante, todas relacionadas com a violação ao pincípio da imparcialidade que deve pautar a atuação judicial. 3. Não houve, por parte do CNJ, revisão de atos com conteúdo jurisdicional, mas sim fiscalização da atuação do magistrado em sua função judicante, de modo a garantir que a condução dos processos judiciais ocorra de forma imparcial e compatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo. 4. Também não se verificou qualquer ofensa às garantias constitucionais, como devido processo legal e ampla defesa; os fatos narrados constituem infrações típicas segundo as disposições da LOMAN e não se verifica desproporcionalidade entre as condutas narradas e a penalidade aplicada. 5. Não cabe a esta Corte rever o mérito das decisões do CNJ, mas apenas verificar a legalidade dos atos e procedimentos realizados pelo Conselho no exercício legítimo de sua função constitucional. 6. Agravo regimental a que se nega provimento.” (STF - MS 33.595 AgR, Rel. Min. Edson Fachin, Segunda Turma, DJe de 31/07/2018)

 

 

Nesse amplo panorama, não se discute propriamente o conteúdo jurisdicional em si das decisões prolatadas pelo requerido, mas a condução de sucessivos casos que lhe foram submetidos na esfera criminal, sem que o magistrado tenha sopesado e considerado com cautela e prudência todo o cenário peculiar emanado daqueles autos originários. Com o seu proceder, olvidando-se de cumprir com serenidade e exatidão as disposições legais e os atos de ofício, o processado prolatou diversas decisões tumultuárias, destituídas de bases lógicas e coerentes, indicativas de que não decorreram da análise isenta e cuidadosa de cada caso concreto. Mas diversamente, em reiteradas situações, à luz dos posicionamentos contramajoritários incontroversamente aplicados, o representado fez valer a sua peculiar visão, fundada na presunção abstrata de ocorrência de abuso, arbitrariedade, ilegalidade e nulidade nos atos praticados pelos órgãos de investigação policial e persecução processual, inviabilizando a própria celeridade na entrega da prestação jurisdicional, o que por certo não se coaduna com a prudência, a independência, a isenção e a imparcialidade norteadoras da atuação jurisdicional.  

Logo, não se tratou de mero error in judicando ou error in procedendo. Examinadas e avaliadas em seu conjunto, deflui que as deliberações externadas pelo representado, nos moldes em que exaradas – atípicas e tumultuárias - isto é, em rota de colisão com os deveres de prudência, cautela e imparcialidade, desbordaram das balizas que deveriam dirigir a atuação do magistrado nos inúmeros casos apontados pelo MPF. Frise-se, ainda, que o padrão de conduta adotado pelo requerido não cessou, nem mesmo após as reiteradas reformas oriundas da via recursal e a própria intervenção do Órgão Censor Local pela via da correição parcial, o que também é dado a ser sopesado.

Nesse patamar, as transgressões praticadas pelo representado não se restringem aos fatos relacionados à resistência ao cumprimento de acórdão prolatado em recurso em sentido estrito. A par do amplo e atento reexame do acervo probatório, resulta inarredável a conclusão de que processado incorreu na prática de múltiplas faltas funcionais, em decorrência da ampla e reiterada ofensa ao comando vertido nos incisos I e III, do art. 35 da Lei Orgânica da Magistratura, em total desalinho com os compromissos institucionais insculpidos nos arts. 1º, 4º, 5º, 8º, 9º, 10, 14, 20, 22, 24, 25, e 29, do Código de Ética da Magistratura, in verbis:

Art. 1º O exercício da magistratura exige conduta compatível com os preceitos deste Código e do Estatuto da Magistratura, norteando-se pelos princípios da independência, da imparcialidade, do conhecimento e capacitação, da cortesia, da transparência, do segredo profissional, da prudência, da diligência, da integridade profissional e pessoal, da dignidade, da honra e do decoro.

[...]

Art. 4º Exige-se do magistrado que seja eticamente independente e que não interfira, de qualquer modo, na atuação jurisdicional de outro colega, exceto em respeito às normas legais.

Art. 5º Impõe-se ao magistrado pautar-se no desempenho de suas atividades sem receber indevidas influências externas e estranhas à justa convicção que deve formar para a solução dos casos que lhe sejam submetidos.

[...]

Art. 8º O magistrado imparcial é aquele que busca nas provas a verdade dos fatos, com objetividade e fundamento, mantendo ao longo de todo o processo uma distância equivalente das partes, e evita todo o tipo de comportamento que possa refletir favoritismo, predisposição ou preconceito.

Art. 9º Ao magistrado, no desempenho de sua atividade, cumpre dispensar às partes igualdade de tratamento, vedada qualquer espécie de injustificada discriminação.

Art. 10. A atuação do magistrado deve ser transparente, documentando-se seus atos, sempre que possível, mesmo quando não legalmente previsto, de modo a favorecer sua publicidade, exceto nos casos de sigilo contemplado em lei.

[...]

Art. 14. Cumpre ao magistrado ostentar conduta positiva e de colaboração para com os órgãos de controle e de aferição de seu desempenho profissional.

[...]

Art. 20. Cumpre ao magistrado velar para que os atos processuais se celebrem com a máxima pontualidade e para que os processos a seu cargo sejam solucionados em um prazo razoável, reprimindo toda e qualquer iniciativa dilatória ou atentatória à boa-fé processual.

[...]

Art. 22. O magistrado tem o dever de cortesia para com os colegas, os membros do Ministério Público, os advogados, os servidores, as partes, as testemunhas e todos quantos se relacionem com a administração da Justiça.

[...]

Art. 24. O magistrado prudente é o que busca adotar comportamentos e decisões que sejam o resultado de juízo justificado racionalmente, após haver meditado e valorado os argumentos e contra-argumentos disponíveis, à luz do Direito aplicável.

Art. 25. Especialmente ao proferir decisões, incumbe ao magistrado atuar de forma cautelosa, atento às conseqüências que pode provocar.

[...]

Art. 29. A exigência de conhecimento e de capacitação permanente dos magistrados tem como fundamento o direito dos jurisdicionados e da sociedade em geral à obtenção de um serviço de qualidade na administração de Justiça.

 

Ante todo o acima narrado, depreende-se que desfecho administrativo-disciplinar emanado do Órgão Especial do TRF3 no julgamento do PAD mostrou-se contrário à evidência dos autos e ao ordenamento jurídico (art. 83, I, do RICNJ), porquanto demonstrada a reiterada prática de transgressões disciplinares graves – à parte da falta funcional já reconhecida pelo v. aresto sob revisão -.

Destarte, reputo comprovada a culpabilidade do representado pela prática de sucessivas faltas disciplinares, as quais não se restringem, portanto, ao contexto da violação funcional reconhecida pelo v. aresto sob revisão (desobediência ao comando exarado pelo Órgão ad quem no âmbito de recurso em sentido estrito), diante da ampla e reiterada ofensa ao art. 35, incisos I e III, da LOMAN e a diversos dispositivos do Código de Ética da Magistratura, consubstanciadas na morosidade processual injustificada, na revisão de decisões proferidas por outros magistrados investidos no mesmo grau de jurisdição, independentemente de provocação das partes e/ou da alteração do estado de fato e de direito, bem assim na prolação sucessiva de outras decisões igualmente tumultuárias, destituídas de motivação jurídica idônea, em detrimento da cautela, da prudência e da parcialidade indissociáveis do exercício da magistratura, as quais acabaram por retardar a efetiva entrega da prestação jurisdicional.

Por corolário, proponho ao Colegiado o redimensionamento da sanção aplicada ao requerido pela Corte de Origem, diante da notória inadequação e insuficiência da advertência, forte no comando exarado pelo art. 88, do RICNJ.

 

6. Dosimetria da pena. Redimensionamento

 

De partida, cabe ressaltar que, nos termos do artigo 42, caput, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional – LOMAN, bem assim do artigo 3º, da Resolução CNJ nº 135/2011, podem ser aplicadas aos magistrados as seguintes sanções na seara disciplinar: advertência, censura, remoção compulsória, disponibilidade, aposentadoria compulsória e demissão (juízes não vitalícios). 

 

Consoante se depreende do comando extraído da LOMAN e da Resolução CNJ nº 135/2011, a negligência é passível de ser apenada com advertência, ao passo que a censura deve ser aplicada nos casos de reiterada negligência no cumprimento dos deveres do cargo ou de procedimentos incorretos, caso a infração não justifique punição mais grave (CNJ - REVDIS - Processo de Revisão Disciplinar - Conselheiro - 0005852-68.2019.2.00.0000 - Rel. MARCOS VINÍCIUS JARDIM RODRIGUES - 68ª Sessão Virtual - julgado em 01/07/2020).  

 

Já a pena de disponibilidade será aplicada residualmente, quando não aplicáveis as penas de advertência, censura e remoção compulsória e quando a conduta não justificar a aplicação da pena mais severa - aposentadoria e/ou demissão (essa última na hipótese de magistrado não vitalício) -.

 

A remoção compulsória deve ser contextualizada às hipóteses em que a falta funcional guarde estreito liame com o local de exercício da jurisdição do (a) representado (a) – de sorte que o deslocamento do (a) magistrado (a) para outra unidade tem por escopo coibir a reiteração do ilícito, bem assim afastar o descrédito do Poder Judiciário naquela jurisdição –.  Nesta gradação, portanto, este Conselho entende que essa modalidade de sanção seria aplicável nas situações em que se tornar insustentável a permanência do(a) magistrado(a) na comarca ou quando houver o comprometimento de sua imagem perante a comunidade jurídica e local (CNJ - REVDIS - Processo de Revisão Disciplinar - Conselheiro - 0001805-51.2019.2.00.0000 - Rel. FLÁVIA PESSOA - 57ª Sessão Extraordinária - julgado em 08/09/2020

 

De outro vértice, a aposentadoria compulsória destina-se às infrações revestidas de maior grau de reprovabilidade, que demonstrem a efetiva incompatibilidade para o exercício da jurisdição de forma permanente. 

 

Nesse sentido, colhem-se com propriedade as ponderações externadas por ALEXANDRE HENRY ALVES (In: Regime Jurídico da Magistratura, 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2014. E-book, pág. 1217), ao discorrer sobre o regime disciplinar da magistratura e a dosimetria da pena, nos seguintes termos:

 

“(...) Assim, caberá ao colegiado, após a produção de todas as provas e a defesa do magistrado, analisar que tipo de infração ele cometeu: se foi mero descumprimento dos seus deveres, sem dolo; se houve reiteração; se a conduta consiste em um ilícito penal etc. Além disso, o colegiado deverá averiguar se o ato praticado pelo juiz não o tornou incompatível com o exercício do cargo. Se positivo e a incompatibilidade for permanente, a pena será de aposentadoria compulsória. Se essa incompatibilidade for apenas temporária, e de acordo com o ato cometido, a punição será de disponibilidade compulsória. Se a incompatibilidade é apenas em relação ao juízo em que o magistrado atua, caberá remoção compulsória. Se, por fim, embora tenha cometido uma infração de média gravidade ou uma infração leve, mas reiterada, sua postura não se mostrar absolutamente incompatível com a continuidade do exercício do cargo, em qualquer circunstância, a pena será a censura. (...)"

 

 

Historiado o parâmetro normativo, também rememoro, na linha de precedente firmado por este CNJ, que “a escolha da pena disciplinar incidente é iluminada pelo princípio da proporcionalidade, ou seja, por um juízo de ponderação ancorado no caso concreto, considerada a carga retributiva da sanção, a finalidade preventiva de novos desvios e, sobretudo, o grau de reprovabilidade da ação/omissão combatida. II Deve-se levar em conta a gravidade da conduta ensejadora da imputação, a carga coativa da pena, o grau de culpabilidade e a eficácia da medida punitiva” (CNJ – RD nº 200810000018800 - Rel. Cons. Mairan Gonçalves Maia Júnior – 85º Sessão - j. 26.05.2009 - DJU 17.06.2009 – destaques nossos).

Na hipótese concreta, o considerável grau de reprovabilidade das condutas perpetradas pelo magistrado representado na condução dos processos criminais em trâmite na unidade judiciária de sua titularidade restou amplamente patenteada, a teor dos vastos elementos anteriormente expostos. Logo, tenho por insuficiente e inadequada a pena de advertência em caráter reservado que lhe foi imposta pelo TRF3, esfacelando-se por completo o pleito revisional formulado pelo magistrado também no tocante à dosimetria da pena.  

Com efeito, o exame dos dados objetivos levantados pela Corregedoria Local, expostos didaticamente no voto apresentado pela própria Relatora do PAD (condutor do acórdão sob revisão), relacionados à situação do acervo processual da 1ª Vara Federal da Subseção Judiciária de Itapeva -SP ao tempo dos fatos sob apuração no feito disciplinar, aliado à análise por amostragem efetivada por este Colegiada relativamente ao contexto jurídico-processual dos processos apontados na representação do MPF, descortinou a prática de transgressões sucessivas aos deveres legais e éticos que ecoam do já citado art. 35, incisos I e III, da LOMAN, bem assim do Código de Ética da Magistratura em seus diversos enunciados, em contrariedade às orientações emanadas do próprio TRF3 na apreciação de inúmeras medidas interpostas pela acusação, a reforçar ainda mais a gravidade do comportamento do representado.

No tocante à morosidade na tramitação dos feitos, reitere-se que o magistrado representado, enquanto titular da unidade, deveria conhecer com bastante propriedade os problemas ali enfrentados, inclusive quanto ao alegado déficit no quadro de pessoal, incumbindo-lhe, portanto, a implementação de medidas mais eficientes para o fim de minorar as dificuldades, mas assim não procedeu, conforme demonstrado pelos números objetivamente registrados pelo TRF3 no julgamento do PAD. O que se viu foi a redução ínfima nos atrasos injustificados aferidos pelo Órgão Censor Regional, aquilatando em alguns casos a possibilidade de responsabilização penal de supostos autores de crimes graves, por viabilizar a consumação da prescrição da pretensão punitiva estatal, com potencial comprometimento da ordem pública, do devido processo legal e da razoável duração do processo.

Ademais, como já visto, para além da recalcitrância na adoção das diretrizes e até mesmo no cumprimento de deliberações taxativas emanadas do Órgão ad quem, retardando a prática de atos de ofício, em dezenas de casos o magistrado requerido não demonstrou a efetiva exatidão, serenidade, imparcialidade e independência técnico-jurídica, inviabilizando as investigações e a própria atividade persecutória-processual. Sob o pretexto de que as suas decisões decorreram tão somente do pleno exercício do livre convencimento motivado e da independência funcional (art. 41, da LOMAN), valendo-se da condição de titular da unidade judiciária, procedeu à revisão de ofício de decisões prolatadas por outros colegas (em substituição ou oriundas do plantão), para relaxar prisões e anular provas obtidas na seara policial, promoveu a rejeição sistemática denúncias (inclusive quando já encerrada a fase instrutória) e indeferiu diligências requeridas pela acusação, passando ao largo da disciplina judiciária e da almejada celeridade processual, respaldando-se, inclusive, em premissas há muito superadas pelos entendimentos das Cortes Superiores, motivado intuitivamente por sua peculiar visão peculiar, genérica, minoritária e preconcebida frente à atuação estatal na seara persecutória-criminal.

Tratou-se, portanto, de condutas reiteradas e perpetradas deliberadamente, muitas delas, insisto, no intuito de que prevalecesse o posicionamento peculiar do imputado, em detrimento da própria entrega da prestação jurisdicional, as quais não traduzem mera negligência, faltas pontuais ou simples procedimento incorreto, não se justificando que o proceder adotado seja apenado com a censura.

Quanto à remoção compulsória, não entendo igualmente pela pertinência de aplicação da aludida sanção, porque não demonstrado cabalmente pelos elementos dos autos que a permanência do representado à frente da 1ª Vara Federal de Itapeva -SP tenha se tornado efetivamente insustentável. De outra parte, a despeito da repercussão jornalística negativa envolvendo inúmeros casos polêmicos sob a condução do representado, levando à uma primeira conclusão de que a imagem do magistrado restou comprometida perante a comunidade jurídica e local, a sanção poderá representar um bônus para a juiz que eventualmente poderá ser removido para Subseção Judiciária menos conturbada e deixar para o seu sucessor uma gama de dificuldades ocasionadas em parte por sua má gestão.

Esta sanção, portanto, não se mostra adequada aos fatos.

Seguindo nesse raciocínio, chega-se ao enunciado no artigo 6º, da Resolução CNJ nº 135/2011 que assim prescreve:

 

Art. 6º O magistrado será posto em disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço, ou, se não for vitalício, demitido por interesse público, quando a gravidade das faltas não justificar a aplicação de pena de censura ou remoção compulsória.

 

Sob essa ótica, não sendo apropriado apenar o magistrado com a censura ou com a remoção compulsória diante da gravidade das infrações, nem se vislumbrando a hipótese de incompatibilidade permanente para o exercício da judicatura, mostra-se razoável e proporcional sancioná-lo com a pena de disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço.

Em síntese, expostas todas as premissas suso assinaladas, isto é, sopesados o elevado grau de reprovabilidade das condutas, revestidas de gravidade suficiente a indicar a incompatibilidade temporária para o exercício das funções jurisdicionais, os resultados e prejuízos daí advindos, a carga coativa da pena, o caráter pedagógico e a eficácia da medida punitiva, bem assim os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, por medida de interesse público, assoma adequada e pertinente, nesta seara revisional (art. 88, do RICNJ), a readequação da sanção outrora aplicada pelo Órgão Especial do TRF3, no intuito de que incida em relação ao juiz processado a pena de disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço, consoante previsão inserida no art. 93, inc. VIII, da Carta Magna, nos arts. 42, inc. IV, e 57, § 1º, da LOMAN, e no art.  6º, da Resolução CNJ nº 135/2011.

Sem embargo, a questão exposta não se esgota por aí. É que, uma vez estabelecido que a pena aplicável ao representado é a disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço, resta definir, também em conformidade com os citados postulados da razoabilidade e proporcionalidade, o correspondente prazo de duração.

Com efeito, ao dispor sobre a pena de disponibilidade, tanto o inciso VIII, do art. 93, do Texto Magno, quanto o inciso IV, do art. 42, e o caput, do art. 57 da LOMAN, de antemão, não especificam prazo mínimo ou máximo quanto à extensão temporal da penalidade. Na forma do já citado art. 57, da LOMAN, é certo que, voluntariamente, o magistrado que foi apenado com esta sanção somente poderá pleitear seu aproveitamento decorridos, no mínimo, 2 (dois) anos de afastamento, nos termos do parágrafo primeiro do citado dispositivo, o que nem de longe se assemelha a qualquer limitação temporal para efeito de aplicação da pena em referência, abrindo caminho, à luz da interpretação teleológica e sistemática, à possibilidade de delimitação de um prazo inferior.

Em minha compreensão, a redação dos já mencionados arts. 93, VIII, da Lei Maior, 42, IV e 57, da LOMAN, desloca a questão à margem de discricionariedade do Órgão Julgador, conferindo a esse último a liberdade necessária para fixar o termo final do período de afastamento compulsório, de modo a viabilizar a integral observância dos princípios constitucionais que norteiam do Direito Administrativo Sancionador, dentre os quais estão a proporcionalidade, a razoabilidade e a individualização da pena.

Nessa ordem, é necessário para efetivo cumprimento dos princípios que estão nos baldrames da Constituição Federal e do Estado Democrático de Direito, que o prazo mínimo de duração das penas de disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço, aplicadas pelo Conselho Nacional de Justiça, possa ser adequado segundo as particularidades das condutas apuradas nos processos administrativos disciplinares julgados por esta Corte Administrativa.

Cumpre ressaltar, ainda, que se encontra em trâmite perante o E. STF a ADPF 677, de Relatoria do Exmo. Sr. Ministro Cristiano Zanin, por intermédio da qual a Associação dos Magistrados Brasileiros, entidade que representa todos os magistrados e, portanto, o próprio representado, veiculou, entre outros pedidos, a possibilidade de os Órgãos Censores fixarem a pena de disponibilidade em qualquer quantidade de dias, meses ou anos, desde que limitada a 2 (dois) anos, o que referenda a penalidade ora aplicada.

 

Ressalte-se que este Conselho, em julgamento ocorrido recentemente, já deliberou pela aplicação da disponibilidade, fixando desde logo o respectivo prazo para o cumprimento da sanção, valendo a transcrição:

 

 

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. DESEMBARGADOR DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 15ª REGIÃO. VIOLAÇÃO AO CONTRADITÓRIO E À AMPLA DEFESA NÃO CARACTERIZADA. REPOSTAGEM E MANIFESTAÇÃO EM REDE SOCIAL. CONTEÚDO REVESTIDO DE ÍNDOLE POLÍTICO-PARTIDÁRIA. OFENSA AOS DEVERES INSCULPIDOS NO ART. 95, PARÁGRAFO ÚNICO, III, DA CARTA MAGNA/1988, NO ART. 35, VIII, DA LEI COMPLEMENTAR Nº 35/79 (LOMAN), NOS ARTS. 1º, 2º, 7º, 13, 15, 16 E 37 DO CÓDIGO DE ÉTICA DA MAGISTRATURA, NO ART. 3º, I, DO PROVIMENTO Nº 135 DA CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA, BEM COMO NOS ARTS. 3º, II, “A” E “F”, E 4º, II, DA RESOLUÇÃO CNJ Nº 305/2019 DEMONSTRADA. PROCEDÊNCIA DA IMPUTAÇÃO. GRAVIDADE DA CONDUTA. INCOMPATIBILIDADE TEMPORÁRIA PARA O EXERCÍCIO DA JURISDIÇÃO. PENA DE DISPONIBILIDADE FIXADA POR 60 (SESSENTA) DIAS.

(...) 

5. Os atos praticados pelo magistrado processado, distanciando-se da prudência e da cautela que deveriam nortear as suas manifestações em rede social, ainda que de índole privada, consubstanciaram falta funcional, a receber reprovação por parte deste Conselho, pois violadores dos deveres insculpidos no art. 95, parágrafo único, III, da Carta Magna/1988, no art. 35, VIII, da Lei Complementar nº 35/79 (LOMAN), nos arts. 1º, 2º, 7º, 13, 15, 16 e 37 do Código de Ética da Magistratura, no art. 3º, I, do Provimento nº 135 da Corregedoria Nacional de Justiça, bem como nos arts. 3º, II, “a” e “f”, e 4º, II, da Resolução CNJ nº 305/2019.

6. Sopesados o elevado grau de reprovabilidade da conduta, o potencial lesivo dali decorrente e o efeito pedagógico/dissuasório da sanção, à luz da razoabilidade e da proporcionalidade, revela-se pertinente a aplicação da disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço, pelo prazo de 60 (sessenta) dias (art. 93, VIII, da Carta Magna, arts. 42, inc. IV, e 57, parágrafo 1º, da LOMAN, c.c art. 6º, da Resolução CNJ nº 135/2011).

7. Imputação que se julga procedente para aplicar ao magistrado processado a pena de disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço por 60 (sessenta) dias. (CNJ - PAD – Processo Adm. Disciplinar - 0002268-51.2023.2.00.0000 – Rel. Jane Granzoto - 19ª Sessão Ordinária de 2023 – julgado em 12/12/2023).

 

 Uma vez definido que a pena adequada para reprimir as condutas apuradas nos autos é a disponibilidade com proventos proporcionais ao tempo de serviço, reputo imprescindível que este Colegiado, com fulcro no inciso VIII do art. 93 da Constituição Federal e no caput do art. 57 da LOMAN, e diante das singularidades do caso vertente, fixe o correspondente prazo por 180 (cento e oitenta) dias.

 

Nesse contexto, ante a inadequação da pena de advertência aplicada reservadamente pelo Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região ao Exmo. Sr. Juiz Federal EDEVALDO DE MEDEIROS no julgamento do Processo Administrativo Disciplinar nº 0029224-53.2019.4.03.8000, impõe-se a revisão do acórdão condenatório, com consequente redimensionamento da sanção, na forma do art. 88, do RICNJ, em virtude da ampla e reiterada infração ao comando vertido no art. 35, incisos I e III, da LOMAN, bem assim de diversos enunciados do Código de Ética da Magistratura.

 

Destarte, conheço e, no mérito, julgo improcedente o pedido de revisão proposto pelo magistrado representado (RevDis 8678-96); e julgo procedente a medida revisional deflagrada de ofício por deliberação deste Plenário (RevDis 749-75), por toda a fundamentação acima ofertada, para modificar a sanção de advertência e aplicar ao magistrado requerido a pena de disponibilidade com proventos proporcionais ao tempo de serviço, pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias, forte no comando extraído do art. 93, inc. VIII, da Constituição Cidadã, dos arts. 42, inc. IV, e 57, caput e parágrafo 1º, da LOMAN, e do art. 6º, da Resolução CNJ nº 135/2011.

 

7. Dispositivo

 

Ante todo o acima exposto,

i) REJEITO as preliminares e questões prejudiciais suscitadas pela defesa do Exmo. Sr. Juiz Federal Edevaldo de Medeiros, à exceção da arguição de suspeição da testemunha do Juízo (DD. Procurador Regional da República Ricardo Tadeu Sampaio), acolhendo-se a contradita unicamente para requalificá-la à conotação de mero informante;

ii) CONHEÇO e, no mérito, julgo improcedente o pedido de revisão proposto pelo magistrado representado (RevDis nº 0008678-96.2021.2.00.0000) e julgo procedente a pretensão revisional instaurada de ofício por deliberação deste Plenário (RevDis nº 0000749-75.2022.2.00.0000), em virtude da ampla e reiterada infração ao comando vertido no art. 35, incisos I e III da LOMAN, bem assim ao enunciado de que trata o art. 1º, do Código de Ética da Magistratura, entre outros dispositivos ali delineados, tornando-se imperiosa a revisão do acórdão condenatório, consoante autorizado pelo art. 88, do Regimento Interno deste Conselho (RICNJ);

iii) Por corolário, diante da inadequação da advertência cominada reservadamente pelo Órgão Especial do Tribunal Regional Federal da 3ª Região ao Exmo. Sr. Juiz Federal EDEVALDO DE MEDEIROS, no julgamento do Processo Administrativo Disciplinar nº 0029224-53.2019.4.03.8000,  impõe-se o redimensionamento da sanção, aplicando-se em desfavor do imputado, nesta seara revisional, a pena de disponibilidade com proventos proporcionais ao tempo de serviço, pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias, à vista do comando exarado do art. 93, inc. VIII, da Constituição Cidadã, dos arts. 42, inc. IV, e 57, caput e parágrafo 1º, da LOMAN, e do art. 6º, da Resolução CNJ nº 135/2011.

Tendo em vista a aprovação da questão de ordem submetida previamente ao Plenário, determino o levantamento do sigilo na tramitação das Revisões Disciplinares nº´s 0008678-96.2021.2.00.0000 e 0000749-75.2022.2.00.0000.

Providencie a Secretaria Processual as anotações e demais providências de praxe junto ao sistema informatizado.

Dê-se ciência ao magistrado representado, à respectiva defesa, à terceira interessada e ao MPF quanto ao inteiro teor da presente.

Oficie-se ao Tribunal Regional Federal da 3ª Região para ciência quanto ao inteiro teor da presente e adoção das providências cabíveis no tocante à concretização da sanção disciplinar.

Expeça-se, ainda, ofício à Advocacia-Geral da União para as medidas que entender pertinentes (art. 22, parágrafo único, da Resolução CNJ nº 135/2011).

Tudo cumprido, em não havendo qualquer outro incidente ou pendência, arquivem-se os autos.

 

Intimem-se.                    

 

É o voto que submeto ao Plenário.

 

Brasília, data registrada no sistema.

 

Conselheira JANE GRANZOTO

                    Relatora

 

 



[1] id 4838083 - pág. 70, item “iii”, alegações finais na RevDis 749-75.

[2] ID 4610936, pág. 1, RevDis 749/75.

[3] ID 4610929 – pág. 1/2 e ID 4610927 – pág. 1/2 e ID 4610925 - pág. 1/64, da RevDis 749-75.

[4] ID 4610920 – pág.1/3 e ID 4610888 – pág. 67/68 da RevDis 749-75.

[5] IDS 4549822, 4549862 e 4549865, da RevDis nº 0008678-96/ IDS 4610910, 4610911 e 46610912

[6] Id 4659886 – RevDis 8678-96

[7] Id 4610907 – RevDis 749-75

[8] Id 4610869 e Id 4610870 – RevDis 749-75

[9] Id 4610806 e id 4615945 – RevDis 749-75

[10] Id 4610948 - pág. 1 –  RevDis 749-75

[11] Id 4966220 - Pág. 1/2 – RevDis 749-75

[12] Id 4550166 - Pág. 1/2 – RevDis 8678-96

[13] Id 4550199 - Pág. 92 – RevDis 8678-96

[14] Id 4659886 - Pág. 4 - RevDis 8678-96

[15] Id 4610910 – pág 1/2 – RevDis 749-75

[16] Id 4610898 - Pág. 15-17 e Id 4967653 - Pág. 9 – RevDis 749-75

[17] Id 4762423 e Id 5082944– RevDis 749-75

[18] id 4550201 – RevDis 8678-96

[19] Id 4549865 - Pág. 2 – RevDis 8678-96

[20] Id 4550181 – pág. 43/45 (Revdis 8678-96) e id 4610925 – pág. 3/64– (RevDis 749-75)

[21] Id 4550180 – pág. 46/91 – RevDis 8678-96

[22] Id 4550180 pág. 95/96 e id 4550181, pág. 1/6  - RevDis 8678-96

[23] id 4550179 - pág. 13 e id 4550179 - pág. 19/52, RevDis 8678-96

[24] id 4550181, pág. 9/10, Revdis 8678/96

[25] id 4550181, pág. 41/42, RevDis 8678-96

[26] id 4550201 - Pág. 3/20, RevDis 8678-96

[27] Id 4550201 - pág. 1 e id 4550203 - pág. 111/134, Revdis 8678-96

[28] id 4550179 - Pág. 2/9 e id 4550180, pág. 46/91, Revdis 8678-96


[29] id 4550185 - pág. 13 e id 4550185 pág. 26/64, Revdis 8678-96

[30] Id 4550185 - pág. 28

[31] Id 4549865 - pág. 5, RevDis 8678-96

[32] Id 4549865 - pág. 6, RevDis 8678-96

[33] Id 4838083, pág. 5

[34] 4550167 - Pág. 5/91, RevDis 8678-96

[35] PORTARIA PAD/PRES Nº 3, de 03 de abril de 2020, id 4610888 - pág. 67/68, RevDis 749-75

[36] https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4125637

[37] Id 4550184 - pág. 2, RevDis 8678-96

[38] id 4550167 - pág. 1 e id 4550167 - pág. 95, RevDis 8678-96

[39] Id 4550166 - Pág. 1/2 e id 4659886 – pág 1/5, RevDis 8678-96

[40] id 4659886 – pág 1/5, RevDis 8678-96

[41] Id 4549865 - pág. 3 (Revdis 8678-96) e id 4610911 - pág. 29/32 (RevDis749-75)

[42] Id 4610890, pág. 121 (Revdis 749-75)

[43] Id 4610890 - Pág. 102/103 (Revdis 749-75)

[44] Ementa e acórdão -  id 4549865, pág. 1/11 (RevDis 8678-96) e id 4610911 – pág. 1/143 (RevDis 749-75)

Certidão de julgamento  - id 4550166, pág. 1/2 (RevDis 8678-96) e id 4610912, pág. 1/2 (Revdis 749-75)

[45] Id 4610940 – pág.1/88 – RevDis 749-75

[46] Id 4610940 - Pág. 4 – RevDis 749-75

[47] https://www.jfsp.jus.br/foruns-federais

[48] Id 4610911 - pág. 39/49 – Revdis 749-75

[49] Id 4610911 - Pág. 51/53 – RevDis 749-75

[50] Id 4610911 - Pág. 54/67 – RevDis 749-75.

[51] Id 4610911 - Pág. 56/57 (Revdis 749-75)

[52] Id 4610911 - Pág. 58/59 (Revdis 749-75)

[53] Id 4610911 - Pág. 59/64 (Revdis 749-75)

[54] Id 4610911 - Pág. 64/67 (Revdis 749-75)

[55] Id 4610911 - Pág. 68/69

[56] Id 4610890 – pág. 191 (RevDis 749-75)

[57] Id 4610911 - Pág. 93 (Revdis 749-75)

[58] Art. 316. O juiz poderá, de ofício ou a pedido das partes, revogar a prisão preventiva se, no correr da investigação ou do processo, verificar a falta de motivo para que ela subsista, bem como novamente decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem. (Redação dada pela Lei nº 13.964, de 2019)  

Parágrafo único. Decretada a prisão preventiva, deverá o órgão emissor da decisão revisar a necessidade de sua manutenção a cada 90 (noventa) dias, mediante decisão fundamentada, de ofício, sob pena de tornar a prisão ilegal.

[59] Id 4610890 - Pág. 164/165 (Revdis 749-75)

[60] Art. 654.  O habeas corpus poderá ser impetrado por qualquer pessoa, em seu favor ou de outrem, bem como pelo Ministério Público.

(...)

§ 2º  Os juízes e os tribunais têm competência para expedir de ofício ordem de habeas corpus, quando no curso de processo verificarem que alguém sofre ou está na iminência de sofrer coação ilegal.

[61] Art. 650.  Competirá conhecer, originariamente, do pedido de habeas corpus:

(...)

§ 1º  A competência do juiz cessará sempre que a violência ou coação provier de autoridade judiciária de igual ou superior jurisdição.

[62] Id 4550202 - Pág. 89 (RevDis 8678-96)

[63] Id 4550202 – Relatório e voto – pág. 175/184/Ementa - pág. 185/187 (RevDis 8678-96)

[64] Id 4550203 - pág. 124/132 (RevDis 8678-96)

[65] Id 4610890 - Pág. 167/168 (Revdis 749-75)

[66] Id 4610890 - Pág. 166/169 (RevDis 749-75)

[67] Id 4610890 - Pág. 175/176 (RevDis 749-75)

[68] Id 4610890 - Pág. 176 (RevDis 749-75)

[69] Id 4610890 - pág. 177 (RevDis 749-75)

[70] Id 4610890 - Pág. 177/178 (RevDis 749-75)

[71] Id 4610890 - Pág. 179 (RevDis 749-75)

[72] Id 4610890 - Pág. 184 (RevDis 749-75)