Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0007517-51.2021.2.00.0000
Requerente: ASSOCIAÇÃO DOS POLICIAIS PENAIS DO BRASIL - AGEPPEN-BRASIL
Requerido: MARCIO SCHIEFLER FONTES e outros

 


EMENTA: RECURSO ADMINISTRATIVO. ATO DO PODER EXECUTIVO. MATÉRIA ESTRANHA À COMPETÊNCIA DO CNJ. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1 – O CNJ não possui competência para controlar ato do Poder Executivo. Art. 103-B da Constituição Federal.

2 – Impossibilidade de atuação do Conselho Nacional de Justiça. Matéria flagrantemente estranha às finalidades do CNJ. Art. 25, X, do RICNJ.

3 – Recurso conhecido e, no mérito, não provido.

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto do Relator. Declarou impedimento a Conselheira Salise Sanchotene. Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Plenário Virtual, 13 de maio de 2022. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luiz Fux, Maria Thereza de Assis Moura, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas (Relator), Giovanni Olsson, Sidney Madruga, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto e Mário Goulart Maia. Não votaram os Excelentíssimos Conselheiros Salise Sanchotene (impedimento), Luiz Fernando Bandeira de Mello e, em razão da vacância do cargo, o representante do Ministério Público Estadual.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0007517-51.2021.2.00.0000
Requerente: ASSOCIAÇÃO DOS POLICIAIS PENAIS DO BRASIL - AGEPPEN-BRASIL
Requerido: MARCIO SCHIEFLER FONTES e outros


 

Trata-se de Recurso Administrativo em Procedimento de Controle Administrativo (PCA), com pedido de liminar, proposto pela Associação dos Policiais Penais do Brasil (AGEPPEN-Brasil), em face da Decisão de Id 4517913, que julgou improcedentes os pedidos da requerente e determinou o arquivamento dos autos com fundamento no art. 25, X, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça (RICNJ).

O relatório da decisão recorrida foi assim sistematizado:

 

“Trata-se de Reclamação Disciplinar, posteriormente reautuada como Procedimento de Controle Administrativo, formulado pela ASSOCIAÇÃO DOS POLICIAIS PENAIS DO BRASIL (AGEPPEN-BRASIL) contra os atos de nomeações de juízes para compor o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP).

Alega a Reclamante que a designação de magistrados pelo Ministro da Justiça para compor o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária viola a CRFB/1988 e a Recomendação nº 65/2020 do CNJ, uma vez que referido conselho é órgão “subordinado diretamente ao Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) em que participa das diretrizes da gestão da Política Penitenciária desse Ministério e do Departamento Penitenciário Nacional (Depen)”.

Destaca que “No momento em que magistrados da ativa são nomeados membros do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), órgão do Poder Executivo Federal (MJSP) que participa efetivamente da elaboração das diretrizes políticas de gestão do Poder Executivo, o Poder Judiciário perde a independência consagrada pelo Princípio da Separação dos Poderes”.

Ressalta que “Membro do Judiciário não pode exercer função no Executivo, o Judiciário não pode se envolver na formulação e implementação de políticas públicas, pois com isso perde a imparcialidade para apreciá-las quando assim for necessário. No campo da segurança pública, que afeta as ações penais, isso é especialmente grave e constitucionalmente inaceitável, principalmente como vem ocorrendo, em que magistrados que exercem funções de Conselheiros estão participando efetivamente como membros de Grupo de Trabalho sobre pretensa política de privatização, cogestão e PPP’s em análise no CNPC”.

Requer, liminarmente, o afastamento de todos os magistrados que compõem o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP). No mérito, pede a apuração dos fatos e a aplicação da penalidade disciplinar cabível.

Em despacho de 06 de outubro do corrente ano, a Eminente Corregedora Nacional de Justiça se manifestou no sentido de que ...“no que tange à matéria veiculada neste expediente, qual seja, nomeação de magistrados para compor o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), não compete à Corregedoria Nacional de Justiça a análise da questão”. Com isso, determinou Sua Excelência a redistribuição do feito como Procedimento de Controle Administrativo, com a livre distribuição de Relator (Id 4501533).

É o relatório.” (Id. 4517913) 

 

A decisão de improcedência, que culminou no arquivamento liminar do processo, fundamentou-se na ausência de competência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para efetuar o controle de legalidade de atos administrativos exarados pelo Poder Executivo, por força do art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal.

Inconformada, a requerente interpôs Recurso Administrativo (Id 4530787) contra a decisão, por meio do qual defendeu que não houve a proposição de controle de ato do Poder Executivo e reafirmou a necessidade de atuação do CNJ no caso, a fim de que seja determinado aos magistrados requeridos o cumprimento da Recomendação nº 65/2020 do CNJ e dos demais dispositivos infraconstitucionais e constitucionais violados (art. 21 da LOMAN e arts. 2º e 95, parágrafo único, I, da Constituição Federal).

Ao final, requereu a nulidade da decisão de improcedência e pugnou pelo desarquivamento do processo, “para que tenha seu regular transcurso e surta seus legais e necessários efeitos, inclusive, se entender o Plenário, que seja devolvida-a à Corregedoria Nacional da Justiça deste Colendo Conselho para as medidas legais cabíveis”.

O feito foi redistribuído por sorteio, em razão do encerramento do mandato do então Conselheiro André Godinho, e remetido a este Gabinete.

Após a redistribuição, os requeridos foram intimados para apresentarem contrarrazões ao Recurso Administrativo no prazo de 5 (cinco) dias (Id 4597869). 

Em atendimento à intimação, a Associação dos Juízes Federais do Brasil (AJUFE) requereu a admissão no feito na qualidade de interessada e o ingresso como procuradora dos requeridos Walter Nunes da Silva Junior e Salise Monteiro Sanchontene, nos termos das procurações apresentadas, respectivamente, aos Ids 4604135 e 4604134.

Na mesma oportunidade, a AJUFE ofereceu contrarrazões ao Recurso Administrativo e defendeu que (i) a matéria extrapola as competências do CNJ, por ser voltada a controle de legalidade de ato de nomeação exarado pelo Poder Executivo; (ii) o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP) não constitui órgão de gestão do Poder Executivo, possuindo atividade consultiva e fiscalizadora, o que não afronta a Recomendação nº 65/2020 do CNJ; e (iii) não houve violação ao art. 21 da Código de Ética da Magistratura, em razão de a atuação dos requeridos no Conselho estar limitada a um encontro remoto por mês, sem impactar o desempenho da atuação jurisdicional dos magistrados. Requereu, portanto, a manutenção da decisão recorrida e pugnou pelo “desprovimento do recurso administrativo e o consequente arquivamento do feito definitivamente” (Id 4604131).

A requerida Elaine Bianchi apresentou resposta ao Recurso Administrativo por meio da Petição de Id 4612398, em que defendeu a compatibilidade das funções desempenhadas pelo CNPCP, com os deveres funcionais da magistratura e do Código de Ética da Magistratura, e ressaltou que, durante o período em que compôs o Conselho, não exerceu cargo de gestão. Por fim, informou que declinou da recondução ao cargo de representante titular no CNPCP em 15 de setembro de 2021, nos termos da documentação apresentada (Id 4612403 e Id 4612404).

Ao final, esclareceu que “diante do exposto e, considerando que período de mandato desta magistrada no CNPCP terminou em 13/09/21, requeiro a exclusão do nome desta peticionante do Procedimento de Controle Administrativo nº 0007517-51.2021.2.00.0000 ou, não sendo esse o entendimento de Vossa Excelência, requeiro a manutenção da decisão recorrida”. 

A Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) interpôs a Petição de Id 4690986, em que requereu seu ingresso no feito como terceira interessada e defendeu a manutenção da Decisão recorrida.

Apontou a ausência de competência deste Conselho para controlar atos expedidos pelo Ministro de Estado da Justiça – sendo, portanto, do Poder Executivo –, o que configuraria violação ao princípio da separação dos Poderes, cláusula pétrea prevista no art. 60, §4º, III, da Constituição Federal. 

Defendeu que os magistrados não estão alheios à formulação e à aplicação de políticas públicas, tendo em vista a atuação profissional criminal. 

Ademais, esclareceu que o CNPCP é composto por profissionais multidisciplinares, incluindo profissionais da área jurídica, professores e representantes da sociedade civil.

Destacou as experiências profissionais e acadêmicas na área penal dos Juízes Salise Monteiro Sanchotene e Walter Nunes da Silva. 

Registrou que “prevalece hodiernamente a teoria do diálogo institucional, numa releitura da tradicional separação de poderes, a qual veda o comportamento isolacionista de quaisquer dos Poderes, privilegiando a reciprocidade e a atuação conjunta de todos os atores envolvidos no processo decisório”.

Por fim, requereu:

 

“a) Admissão no processo, como interessada, mediante a juntada dos instrumentos de mandato e de seus atos constitutivos – estatutos sociais, atas e termos de posse; e

b) O desprovimento do recurso administrativo e o consequente arquivamento do feito definitivamente.”


 Intimados, os requeridos Ulysses de Oliveira Gonçalves, Davi Marcio Prado Silva, Luiz Carlos Rezende e Santos, Salise Monteiro Sanchotene, Walter Nunes da Silva Júnior, Gustavo Emelau Marchiori, Marcio Schiefler Fontes, Marcelo Mesquita Silva e Paulo Eduardo de Almeida Sorci não se manifestaram nos autos. 


É o relatório.

 

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO - 0007517-51.2021.2.00.0000
Requerente: ASSOCIAÇÃO DOS POLICIAIS PENAIS DO BRASIL - AGEPPEN-BRASIL
Requerido: MARCIO SCHIEFLER FONTES e outros

 


Voto

 

O Excelentíssimo Senhor Conselheiro MARCIO LUIZ FREITAS (Relator):

 

Recebo o presente Recurso Administrativo por ser tempestivo e próprio, nos termos do art. 115 do RICNJ.

Preliminarmente, defiro o ingresso da AMB no feito, na qualidade de terceira interessada.

Em relação ao pedido de exclusão do polo passivo formulado pela Desembargadora Elaine Bianchi, indefiro-o, pois, em que pese o final do mandato da Magistrada no CNPCP, o presente procedimento decorre de pedido de controle do ato administrativo que a nomeou, razão pela qual é incabível o pedido. 

A recorrente pede a reforma da Decisão de Id 4530321 por entender que estaria configurada hipótese de atuação deste CNJ, pois se trata de “exercício irregular de juízes ao compor o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP)”, com afronta à Recomendação CNJ nº 65/2020.

No mérito, todavia, em que pesem os argumentos da recorrente, verifica-se a inexistência de elementos ou fatos novos hábeis a reformar a decisão atacada, motivo pelo qual esta deve ser mantida pelos seus próprios fundamentos:

 

“Como pontuado, ao determinar a reautuação do presente feito como Procedimento de Controle Administrativo, a Eminente Corregedora Nacional de Justiça consignou que a matéria destes autos é estranha às competências daquele órgão, bem como fez referência à Reclamação Disciplinar nº 0007452- 56.2021.2.00.0000, que versou sobre os mesmos fatos e restou arquivada. Nesse contexto, o que remanesce como objeto do presente feito é o controle de legalidade do ato de nomeação, pelo Ministro da Justiça, dos Juízes Requeridos para comporem o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária – CNPCP. Ocorre que, como cediço, o CNJ não possui competência para controlar ato do Poder Executivo, tendo atuação adstrita ao âmbito interno do Poder Judiciário, a teor do art. 103-B, §4º, da Constituição Federal, in verbis: “Art. 103-B. (...) § 4º Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura: (...)” Penso que se impõe, nesse contexto, o reconhecimento da manifesta improcedência dos pedidos formulados, o que atrai a aplicação do artigo 25, X, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, que dispõe: “Art. 25. São atribuições do Relator: (...) X - determinar o arquivamento liminar do processo quando a matéria for flagrantemente estranha às finalidades do CNJ, bem como a pretensão for manifestamente improcedente, despida de elementos mínimos para sua compreensão ou quando ausente interesse geral;” Ante o exposto, com fulcro no artigo 25, X, do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça, JULGO IMPROCEDENTES os pedidos formulados no presente Procedimento de Controle Administrativo e DETERMINO o seu ARQUIVAMENTO LIMINAR, restando prejudicada a análise do pedido de liminar..”

 

Como apontado na Decisão recorrida (Id 4530321), segundo o art. 25, X, do RICNJ[1], é facultado ao Conselheiro relator determinar o arquivamento liminar do processo quando a matéria for flagrantemente estranha às finalidades do CNJ, como ocorre no caso em tela, que pugna pelo controle de ato do Poder Executivo.

Assim, não cabe a este Conselho o controle dos atos emanados dos outros Poderes, como neste caso, pois foi expedido pelo Poder Executivo para compor o CNPCP, sob pena de afronta ao princípio da separação dos Poderes, in verbis: 

 

“RECURSO ADMINISTRATIVO. PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. TJBA. INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS. NECESSIDADE DE IDENTIFICAÇÃO DOS NOMES DE AUTORIDADES POLICIAIS E DE MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO RESPONSÁVEIS PELA INVESTIGAÇÃO. OFÍCIO CIRCULAR Nº 17/2016. ENVIO DE DADOS A ÓRGÃO DA SECRETARIA DE SEGURANÇA PÚBLICA DO ESTADO. QUESTÕES RELACIONADAS À OPERACIONALIZAÇÃO. CUMPRIMENTO DE ATO DO PODER EXECUTIVO. INCOMPETÊNCIA DO CNJ. SEPARAÇÃO DE PODERES.

1. Inexistindo, nas razões recursais quaisquer elementos inéditos a infirmar o entendimento adotado na decisão recorrida, há que se mantê-la por seus próprios fundamentos.

2. A competência fixada para este Órgão de Controle é restrita ao âmbito administrativo do Poder Judiciário, não competindo a este Conselho, em atenção ao princípio republicano da separação de poderes, o controle ou revisão de quaisquer atos do Poder Legislativo ou do Poder Executivo.

3. Os Ofícios Circulares 17/2016 e 24/2016, expedidos pela Presidência do TJBA apenas indicam aos magistrados que atuam nas Varas Criminais que observem às normas pertinentes à interceptação telefônica editadas pelo Poder Executivo local. Tal recomendação, todavia, não colide com as demais normas constitucionais, legais e infralegais que regem a matéria, em especial, a Resolução CNJ nº 59/2008 no tocante à necessidade de identificação dos nomes de autoridades policiais e de membros do Ministério Público responsáveis pela investigação, cujas orientações devem ser seguidas por todos os órgãos jurisdicionais

4. Recurso Administrativo a que se nega provimento.”

(CNJ - PP nº 0005903-84.2016.2.00.0000 - Rel. ANDRÉ LUIZ GUIMARÃES GODINHO - 227ª Sessão Ordinária - julgado em 04.09.2018).

 

Diante do exposto, e não havendo irregularidade na decisão impugnada, conheço do recurso interposto e, no mérito, nego-lhe provimento.

 

É como voto.

 

À Secretária Processual para providências em relação ao ingresso da AMB no feito. 

 


Após as comunicações de praxe, arquive-se.

 

 

 

Conselheiro Marcio Luiz Freitas

Relator  

 



[1] Art. 25. São atribuições do Relator:

(...)

X - determinar o arquivamento liminar do processo quando a matéria for flagrantemente estranha às finalidades do CNJ, bem como a pretensão for manifestamente improcedente, despida de elementos mínimos para sua compreensão ou quando ausente interesse geral;