Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0010198-28.2020.2.00.0000
Requerente: ATIVA ADMINISTRAÇÃO COMPRA VENDA E INCORPORAÇÃO DE IMOVEIS LTDA - ME
Requerido: RAIMUNDO SERGIO SALES CAFEZEIRO

 

 

RECURSO ADMINISTRATIVO. RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. PRETENSÃO DE REVISÃO DE ATO JURISDICIONAL. ART. 103-B, § 4º, DA CF. NÃO CABIMENTO. AUSÊNCIA DE INDÍCIOS DE DESCUMPRIMENTO DOS DEVERES FUNCIONAIS DO MAGISTRADO OU DE DESOBEDIÊNCIA ÀS EXIGÊNCIAS ÉTICAS DA MAGISTRATURA. SUSPENSÃO DE PRAZOS PROCESSUAIS POR QUESTÃO SANITÁRIA. MEDIDA QUE SE RESTRINGE EXCLUSIVAMENTE ÀS PARTES E NÃO AO MAGISTRADO. ININTERRUPÇÃO DA ATIVIDADE JURISDICIONAL. MANUTENÇÃO DA DECISÃO DE ARQUIVAMENTO. 

1. Os fatos narrados neste expediente referem-se ao exame de matéria eminentemente jurisdicional, relacionada à inclusão de recurso de apelação em pauta de julgamento e à prolação de decisões pelo reclamado que seriam incongruentes.

2. O Conselho Nacional de Justiça possui competência adstrita ao âmbito administrativo do Poder Judiciário, não podendo intervir em decisão judicial com o intuito de reformá-la ou invalidá-la. A revisão de ato judicial não se enquadra no âmbito das atribuições do CNJ, nos termos do art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal. 

3. A suspensão dos prazos processuais por questões sanitárias (pandemia causada pelo SARS-CoV-2) não impede que o magistrado profira decisões e despachos no período, vigorando exclusivamente para as partes, que poderão impugnar as decisões oportunamente e sem o risco da perda de prazos. 

4. Ante a ausência de indícios de que o magistrado requerido tenha descumprido seus deveres funcionais ou incorrido em desobediência às exigências éticas da magistratura, deve ser mantida a decisão de arquivamento da reclamação disciplinar. 

5. Recurso administrativo não provido. 

 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora. Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Plenário Virtual, 16 de abril de 2021. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luiz Fux, Maria Thereza de Assis Moura, Emmanoel Pereira, Luiz Fernando Tomasi Keppen, Rubens Canuto, Tânia Regina Silva Reckziegel, Mário Guerreiro, Candice L. Galvão Jobim, Flávia Pessoa, Ivana Farina Navarrete Pena, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, André Godinho, Maria Tereza Uille Gomes e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Não votou, em razão da vacância do cargo, o representante do Ministério Público da União.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0010198-28.2020.2.00.0000
Requerente: ATIVA ADMINISTRAÇÃO COMPRA VENDA E INCORPORAÇÃO DE IMOVEIS LTDA - ME
Requerido: RAIMUNDO SERGIO SALES CAFEZEIRO


RELATÓRIO


                    Cuida-se de recurso administrativo interposto contra a decisão de arquivamento de representação formulada por ATIVA ADMINISTRAÇÃO COMPRA E VENDA E INCORPORAÇÕES DE IMÓVEIS LTDA. contra o Desembargador RAIMUNDO SÉRGIO SALES CAFEZEIRO, integrante da 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia.

Em decisão monocrática (Id 4203683), a Corregedoria Nacional de Justiça determinou o arquivamento sumário do expediente, nos termos do art. 8º, I, do RICNJ, ao fundamento de que trata do exame de matéria eminentemente jurisdicional, não cabendo a intervenção do CNJ.

A ementa do decisum foi redigida nos seguintes termos:

“RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. SUSPENSÃO DE PRAZOS PROCESSUAIS POR QUESTÃO SANITÁRIA. MEDIDA QUE SE RESTRINGE EXCLUSIVAMENTE ÀS PARTES E NÃO AO MAGISTRADO. ININTERRUPÇÃO DA ATIVIDADE JURISDICIONAL. IMPUGNAÇÃO DE ATOS PRATICADOS VIÁVEL NO PLANTÃO JUDICIÁRIO OU ATÉ MESMO PELA VIA DO MANDADO DE SEGURANÇA. PRETENSÃO DE REVISÃO DE ATO JURISDICIONAL. ART. 103-B, §4º, DA CF. NÃO CABIMENTO. INSURGÊNCIA CONTRA EVENTUAL PREJUDICIALIDADE DO JULGAMENTO DE APELAÇÃO ANTES DO EXAME DE AGRAVO INTERNO. MATÉRIA QUE DESBORDA DA ATUAÇÃO DA CORREGEDORIA NACIONAL. ARQUIVAMENTO SUMÁRIO DETERMINADO.” 

Alega a recorrente (Id 4227188) que “a conclusão pelo arquivamento da Representação em referência merece ser revista pelo próprio CNJ, eis que a impossibilidade quanto à interposição do Agravo Interno – ocasionado diante dos termos do Ato Normativo Conjunto nº 20, de 20 de setembro de 2020, que determinou a suspensão dos prazos – e a deliberada inclusão do recurso de apelação na pauta de julgamento, se coaduna, data máxima vênia, com a atuação do referido órgão central da justiça, eis que abalou frontalmente o exercício do direito de ampla defesa do Representante, devido a uma conduta deliberada do Desembargador Relator responsável pelo julgamento do recurso de apelação interposto.” 

Sustenta, ainda, que “algumas decisões judiciais exaradas pelo magistrado Representado são incongruentes não apenas com seu dever de imparcialidade, mas também, e por via reflexa, as mesmas decisões não respeitam o princípio da igualdade processual.”  A esse respeito, aduz que "o Em. Desembargador autorizou a realização de registro na matrícula anteriormente bloqueada, objeto desta demanda em referência, apesar deste mesmo Magistrado ter afastado a tabeliã competente e apelada nos autos, tendo em vista a não realização do bloqueio da referida matrícula, determinada por ele mesmo."

Requer a reforma da decisão de arquivamento, a fim de que se dê prosseguimento ao presente expediente.

Intimado, o Desembargador reclamado apresentou contrarrazões (Id 4238907). 

É o relatório. 

 

 

 


 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0010198-28.2020.2.00.0000
Requerente: ATIVA ADMINISTRAÇÃO COMPRA VENDA E INCORPORAÇÃO DE IMOVEIS LTDA - ME
Requerido: RAIMUNDO SERGIO SALES CAFEZEIRO

 


VOTO

  

Consoante relatado, o presente expediente foi formulado para apuração de supostas irregularidades e possível atuação temerária do requerido nos autos do processo 0500966-97.2015.8.05.0022. 

A Corregedoria Nacional de Justiça determinou o arquivamento sumário da reclamação disciplinar com amparo nos seguintes fundamentos (Id. 4203683):

“Nos termos do art. 103-B, §4º, da Constituição Federal, a via correcional se restringe "ao controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura".  

No presente caso, da análise dos fatos narrados neste expediente, nota-se que a irresignação se refere a exame de matéria eminentemente jurisdicional, relacionada a suposto equívoco do magistrado na condução do processo. Nessas hipóteses o interessado deve buscar os meios de impugnação previstos na legislação processual, não cabendo a intervenção da Corregedoria Nacional de Justiça.  

A suspensão dos prazos processuais por questões sanitárias não impede que o magistrado profira decisões e despachos no período. Bem ao contrário: a atividade jurisdicional é ininterrupta e não há proibição — mas há, sim, o dever — de que o julgador prossiga prestando jurisdição, seja em processos físicos, seja em eletrônicos. A suspensão dos prazo vigora exclusivamente para as partes, que poderão impugnar as decisões oportunamente e sem o risco da perda de prazos.  

Então, o fato de o desembargador ter proferido decisões ou despachos no período de suspensão de prazos é insignificante. A suspensão — como dito — apenas determina que não esteja correndo prazos para as partes. Não para o magistrado.  

Mais a mais, qualquer ato que cause prejuízo ou e que eventualmente não seja de imediato recorrível é suscetível de ser questionado em regime de plantão ou mesmo através de Mandado de Segurança.  

Para além disso, o que se tem é a irresignação com a concomitância de prazos processuais e a insatisfação com a entrada em pauta de um Recurso de Apelação, que eventualmente propiciará prejuízo a Agravo Interno antes interposto, questão essa que desborda da atuação da Corregedoria Nacional de Justiça.  

Meras ilações de má-fé ou de parcialidade não se prestam a desencadear a atividade correcional do CNJ. Com efeito, o Conselho Nacional de Justiça possui competência adstrita ao âmbito administrativo do Poder Judiciário, não podendo intervir em decisão judicial com o intuito de reformá-la ou invalidá-la. Dessa forma, a pretendida revisão de ato judicial não se enquadra no âmbito das atribuições do CNJ, nos termos do art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal. 

[...]” 

 

Da análise das razões recursais, constata-se que pretende o recorrente a revisão de matérias estritamente jurisdicionais, relacionadas à inclusão de recurso de apelação em pauta de julgamento e à prolação de decisões pelo reclamado que seriam incongruentes, o que desborda da atuação da Corregedoria Nacional de Justiça. Além disso, meras ilações de má-fé ou de parcialidade não se prestam a desencadear a atividade correcional do CNJ. 

Em tais casos, por força da prerrogativa da independência funcional (LOMAN, art. 41), deve a parte valer-se dos meios processuais adequados, não cabendo a intervenção do Conselho Nacional de Justiça.

Com efeito, a pretendida revisão de ato judicial não se enquadra no âmbito das atribuições deste Conselho (art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal), cuja competência está restrita ao âmbito administrativo do Poder Judiciário. 

 A esse respeito, confiram-se os seguintes julgados do CNJ:

 

“RECURSO ADMINISTRATIVO EM RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. ALEGAÇÃO DE SUSPEIÇÃO. INDEFERIMENTO DE PROVAS E JUSTIÇA GRATUITA. QUESTÕES MERAMENTE JURISDICIONAIS. RECURSO DESPROVIDO.  

1. Alegação de suspeição em razão de suposta parcialidade deve ser realizada no bojo dos autos judiciais, mediante ato processual específico para a espécie.  

2. Magistrada que indeferiu provas e a concessão de justiça gratuita nos autos de ação trabalhista. Irresignação que se volta ao exame de matéria eminentemente jurisdicional, hipótese em que a parte prejudicada deve valer-se dos meios recursais próprios, não se cogitando atuação do CNJ.  

3. Recurso administrativo desprovido.”  (CNJ – RA – Recurso Administrativo em RD – Reclamação Disciplinar – 0004381-85.2017.2.00.0000 - Rel. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA – 268ª Sessão Ordinária - j. 20/3/2018) 

  

"RECURSO ADMINISTRATIVO. RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. EXAME DE MATÉRIA JURISDICIONAL. CONTROLE DE ATO JUDICIAL. DESCABIMENTO. INCOMPETÊNCIA DO CNJ. ART. 103-B, § 4º, DA CF. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO.  

1. A competência constitucional do Conselho Nacional de Justiça é restrita ao âmbito administrativo do Poder Judiciário, não lhe cabendo exercer o controle de ato de conteúdo judicial para corrigir eventual vício de ilegalidade ou nulidade.  

2. Exame de matéria eminentemente jurisdicional não enseja a intervenção do Conselho Nacional de Justiça por força do disposto no art. 103-B, § 4º, da CF.  

3. Recurso administrativo conhecido e desprovido." (CNJ – RA – Recurso Administrativo em PP – Pedido de Providências –Corregedoria – 0002342-86.2015.2.00.0000 – Rel. JOÃO OTÁVIO DE NORONHA – 22ª Sessão Virtual – j. 5/6/2017) 

 

No mais, cumpre novamente ressaltar que não constitui infração disciplinar o fato de o desembargador ter proferido decisões ou despachos no período de suspensão de prazos por questões sanitárias (pandemia causada pelo SARS-CoV-2). A atividade jurisdicional é ininterrupta e não há proibição — mas há, sim, o dever — de que o julgador prossiga prestando jurisdição, seja em processos físicos, seja em eletrônicos. Nesse sentido, a suspensão dos prazos vigora exclusivamente para as partes, que poderão impugnar as decisões oportunamente e sem o risco da perda de prazos.

Dessarte, não havendo demonstração de que o magistrado tenha descumprido seus deveres funcionais, praticado infração disciplinar ou incorrido em desobediência às exigências éticas da magistratura, deve a decisão de arquivamento ser confirmada.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso administrativo.

É como voto.