Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR EM FACE DE MAGISTRADO - 0002799-84.2016.2.00.0000
Requerente: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ
Requerido: MARCELO TESTA BALDOCHI


 

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR EM FACE DE MAGISTRADO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO MARANHÃO.PRELIMINARES DE MÉRITO AFASTADAS. ABUSO DE PODER. APROPRIAÇÃO   INDEVIDA DE GADO APÓS PRISÃO DO DEVEDOR. PRISÃO E RENEGOCIAÇÃO DE DÍVIDA EM CIRCUNSTÂNCIAS SINGULARES. VIOLAÇÃO AOS DEVERES DO CARGO PELO MAGISTRADO. AJUIZAMENTO DE INTERPELAÇÃO JUDICIAL ÀS VÉSPERAS DO JULGAMENTO DE PROCEDIMENTO PRÉVIO DE NATUREZA DISCIPLINAR EM TRAMITAÇÃO NO TRIBUNAL DE ORIGEM. ALTERAÇÃO PARCIAL DOS FATOS INICIALMENTE NARRADOS PELOS INTERPELADOS AO ÓRGÃO MINISTERIAL. SUSPEITA DE COAÇÃO.  PARCIAL PROCEDÊNCIA DAS ACUSAÇÕES.  APLICAÇÃO DA PENA DE DISPONIBILIDADE.

I – Processo Administrativo Disciplinar instaurado, com afastamento cautelar,  para apurar infrações disciplinares supostamente praticadas  pelo magistrado Marcelo Testa Baldochi, juiz de direito do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em violação à Lei Orgânica da Magistrado e ao Código de Ética da Magistratura. 

II – O PAD tem origem na Reclamação Disciplinar n.° 0006131-93.2015.2.00.0000, autuada a partir da decisão deste Conselho que avocou, da Corregedoria-Geral de Justiça do Estado do Maranhão, os procedimentos administrativos instaurados em face do magistrado. 

III – A atuação do Conselho Nacional de Justiça no caso concreto deriva da competência concorrente afirmada na ADI n.° 4638/STF. 

IV  Além de extemporânea, não procede a impugnação quanto a vícios ocorridos durante a tramitação do PP n.° 0000116-11.2015.2.00.0000e da RD n.° 0006131-93.2015.2.00.0000, esta última ensejadora da instauração de PAD contra o magistrado. 

V – Observância do art. 14 da Resolução CNJ n.° 135/2011 e do § 2° do art. 120 do RICNJ para submissão da RD n.° 0006131-93.2015.2.00.0000 ao Plenário. 

VI – Possibilidade de citação por hora certa nos processos administrativos disciplinares caso a situação concreta se amolde às condições descritas no art. 362 do CPP c/c art. 252 CPC. 

VII – Preliminares de mérito afastadas. 

VIII  Apropriação de gado após prisão de pessoa que, em tese, não honrou negócio de compra e venda de bovino com o juiz processado revela atuação incompatível com a dignidade, a honra e o decoro das funções pelo magistrado, cuja conduta, encontra-se desapegada de qualquer dever de prudência exigido do cargo. 

IX  Não deve ser presumido o vício de vontade na declaração prestada em juízo pelos interpelados, sobretudo quando os depoentes interpelados afastam a coação atribuída ao juiz processado, investigada nos autos.  

X  Parcial procedência do Processo Administrativo Disciplinar para determinar a aplicação da pena de disponibilidade com proventos proporcionais em observância aos artigos 42, IV e 45, II, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional e artigo 6º, da Resolução CNJ n. 135/2011.

 ACÓRDÃO

O Conselho, por maioria, julgou parcialmente procedente o pedido para aplicar a pena de disponibilidade ao magistrado, com proventos proporcionais, nos termos do voto do Relator. Votou o Presidente. Vencidos os Conselheiros Rubens Canuto, Mário Guerreiro, Candice L. Galvão Jobim, Flávia Pessoa e Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, que aplicavam a pena de censura. Ausente, em razão da vacância do cargo, o representante do Ministério Público da União. Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Plenário, 6 de abril de 2021. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Luiz Fux, Maria Thereza de Assis Moura, Emmanoel Pereira, Luiz Fernando Tomasi Keppen, Rubens Canuto, Tânia Regina Silva Reckziegel, Mário Guerreiro, Candice L. Galvão Jobim, Flávia Pessoa, Ivana Farina Navarrete Pena, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, André Godinho, Maria Tereza Uille Gomes e Luiz Fernando Bandeira de Mello.

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR EM FACE DE MAGISTRADO - 0002799-84.2016.2.00.0000

Requerente:

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ
Requerido: MARCELO TESTA BALDOCHI

 

 

 

RELATÓRIO 

 

Trata-se de Processo Administrativo Disciplinar (PAD) instaurado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), contra o magistrado Marcelo Testa Baldochi, para apurar violação, em tese, dos deveres impostos aos magistrados pelos arts. 35, inciso I, da Lei Complementar n.° 35/1979 e arts. 1°, 2°, 4°, 5°, 8°, 12, 24 e 30 do Código de Ética da Magistratura.   


A portaria que inaugura o PAD, Portaria n.° 6, de 14 de junho de 2016, delimitou os fatos atribuídos ao magistrado:

 FATO I 

 DO ABUSO DE PODER PELA UTILIZAÇÃO DO CARGO DE JUIZ PARA APROPRIAR-SE DE COISA ALHEIA MÓVEL DE QUE TINHA POSSE

 Há indícios de que o Reclamado teria agido com abuso de poder, utilizando-se do cargo de juiz para apropriar-se de coisa alheia móvel (gado transportado por uma determinada pessoa), após a decretação de sua prisão, com o abatimento em breve lapso de tempo, para ocultar os fatos.


 FATO II

 DO ABUSO DE PODER PELA UTILIZAÇÃO DE INTERPELAÇÃO JUDICIAL COM O INTUITO DE INFLUENCIAR E ALTERAR O DEPOIMENTO DE TESTEMUNHAS

 Há indícios de que o Reclamado teria se utilizado de diversos procedimentos de interpelação judicial e, antes mesmo da propositura da medida, teria contatado testemunhas, com o objetivo de influenciar e alterar depoimentos referentes aos fatos narrados no item I, possivelmente, coagindo os depoentes para tanto.

                   

                   Adotadas as providências para a instrução, o Ministério Público e o magistrado processado manifestaram-se sobre a produção de provas, em estrita observância à Resolução CNJ n.° 135/2011.

       As provas testemunhais e documentais realizadas a pedido das partes integram os presentes autos.  


A pedido do Ministério Público foram produzidas as seguintes provas testemunhais:

a) oitiva de Marques Antônio Morais, conhecido por “Mineiro”, que teria adquirido gado do magistrado Marcelo Baldochi, processado nestes autos (IDs 3573242, 3573243, 3573244, 3573245, 3573246, termo de audiência ID 3573241); 

b) Joaquim Ribeiro de Souza Júnior, Promotor de Justiça a quem foram reportados fatos relatados no item I da portaria de instauração do PAD (IDs 3580313 e 3580314 e 3580315, reinquirição ID 3664592);

c) Jairo Pereira de Moura, pecuarista, signatário da declaração prestada perante membro do Ministério Público (IDs 3580416, 3580417 e 3580418);

d) Raulino Lima Gobira, pecuarista, signatário da declaração prestada perante membro do Ministério Público (ID 3580419);

e) Elisete Alves Gobira, filha de Raulino Lima Gobira (IDs 3580421, 3580422 e 3580426);

f) Patrícia Coutinho Cavalcante de Albuquerque, advogada que esteve presente na audiência realizada na cidade de João Lisboa/MA, onde tramitou a interpelação judicial de autos de autos n.° 1207-42.2015.8.10.0038, a que se refere o item II da portaria de instauração do PAD(ID 3580427);

g) Gislene Gomes de Sousa, companheira de “Mineiro” à época dos fatos (ID 3580429);

h) Antônio Fernando Bayma Araújo, Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão que atuou como Corregedor nos procedimentos disciplinares contra o juiz Marcelo Baldochi devido a impedimento da desembargadora Nelma Sarney (IDs 3582572, 3582573, 3582574, 3582578, 3582575, 3582576   - Ata de audiência  ID 3581242);

O magistrado Glender Malheiros Guimarães foi arrolado enquanto testemunha pelo Ministério Público e pela defesa (ID 3580420, reinquirição ID 3664591 e 3664596). Trata-se de juiz de direito que presidiu a interpelação judicial de autos n.° 1207-42.2015.8.10.0038, ajuizada na Comarca de João Lisboa/MA.

Demais provas, oitiva das testemunhas indicadas pela defesa e interrogatório do magistrado processado acostado aos autos, conforme especificado abaixo:

a) Walmir Pinheiro Lopes, motorista (ID 3664595);

b) Raimundo Nonato Rodrigues de Sousa, motorista (ID 3664597);

c) Adaías Macedo Rocha, advogado a quem o juiz Marcelo Baldochi contatou para reaver valores supostamente devidos por “Mineiro” (IDs 3864618, 3864619, 3864621 e 3864622);

e) interrogatório do magistrado (IDs 3864631, 3864647, 3864648, 3864649, 3864650 e 3864653). 

Vale anotar que, a pedido da própria defesa do magistrado, foi dispensada a oitiva das seguintes testemunhas: Raimundo Pinheiro Gaspar (ID 2148932), Segismundo Carneiro Rodovalho, Manoel Aroucha Sousa e André Viana Cardoso (ID 3664588).

A oitiva da testemunha José Luís Modengo foi indeferida haja vista que todas as diligências para ouvi-lo foram tomadas sem êxito (ID 3733285).

Provas documentais acostadas aos autos a pedido da defesa:

a)  certidão da Receita Federal/ Ministério da Fazenda informa que: i) a emissão de notas fiscais, sejam elas avulsas ou não, é de competência das Secretarias Estaduais da Fazenda; ii)  não foi identificada emissão de Nota Fiscal Eletrônica em nome do contribuinte Marcelo Testa Baldochi, Ano-Calendário 2013 (ID 2286570 –  p. 2); 

b) ofício n.° 927/2018-GABIN/SEFAZ, no qual o Secretário da Fazenda do Estado do Maranhão, Marcellus Ribeiro Alves, informou não constar do sistema notas fiscais de compra ou venda de gado, no período compreendido entre maio e julho de 2013, em nome do Marcelo Testa Baldochi, CPF n.° 109.067.228-45 (ID 2641630 – p. 1); 

c) controle de movimentação do rebanho no ano de 2013, da Fazenda Pôr do Sol, situada em Bom Jardim/MA, de propriedade do magistrado Marcelo Baldochi, com tabela de entrada e saída de gado (ID  3492419); 

d) documentos relacionados à prisão de Marques Antônio de Morais, conhecido por “Mineiro” (ID 3492411);

e) ofício n.° 189/2018-GAB/SAGRIMA, da Secretaria de Estado da Agricultura, Pecuária e Pesca do Maranhão (SAGRIMA), por meio do qual informa a ficha da movimentação de rebanho na fazenda Fazenda Pôr do Sol, de propriedade do magistrado. Certidão de fiscal estadual agropecuário informa que não houve emissão de Guia de Trânsito Animal (GTA) pelo produtor Marcelo Testa Baldochi (ID 2716646, p. 1 e 2).

 

       Houve sucessivas prorrogações da instrução do presente feito a pedido do então Conselheiro Henrique Ávila, todas aprovadas por este Plenário.

     Concluídas as diligências de cunho probatório, o Ministério Público, em sede de alegações finais, afastou as preliminares de mérito apresentadas pelo magistrado. Manifestou-se, por fim, pela procedência do processo administrativo disciplinar com aplicação de sanção de disponibilidade com vencimentos proporcionais, levando em conta os fatos descritos no Item II da portaria inaugural.   

      Afirmou que a cronologia e as circunstâncias da proposição da interpelação judicial permitem concluir que, mesmo sem reconhecerem, as testemunhas agiram com sentimento de medo e acabaram por alterar seus depoimentos em relação às denúncias feitas contra o magistrado Baldochi no ano de 2014.

     Quanto ao abuso de poder do cargo para apropriar-se de coisa móvel pertencente a terceiro após sua prisão, concluiu o Parquet que a superficialidade das provas não admite a segura procedência das acusações.

      O magistrado processado, no entanto, impugnou incidentalmente a condução da investigação de caráter disciplinar pelo CNJ. Apontou:

a)     a nulidade da instauração do PAD em razão da intimação extemporânea da defesa acerca da sessão de julgamento, realizada  no período de 19.4.2016 a 26.4.2016, na 11ª Sessão Virtual. 

 

b)    o vício na condução procedimento administrativo, haja vista que a citação para apresentação de defesa preliminar ocorreu na modalidade por hora certa; 

 

c)    a impossibilidade do CNJ avocar da sindicância administrativa que se encontrava em curso no Tribunal de origem (Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão), com finalidade de investigá-lo. 

 

     Além de invocar vícios na tramitação do feito, asseverou, no mérito, a inexistência de provas aptas a embasar condenação na esfera disciplinar.

 

  É o relatório. 


Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR EM FACE DE MAGISTRADO - 0002799-84.2016.2.00.0000
Requerente: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA - CNJ
Requerido: MARCELO TESTA BALDOCHI

 

 

 

VOTO 

  

Trata-se de procedimento administrativo disciplinar instaurado pelo Conselho Nacional de Justiça, em 26.4.2016, na 11ª sessão Plenário Virtual, contra o magistrado MARCELO TESTA BALDOCHI, juiz de direito do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão, em acórdão assim ementado (IDs  1967588 e 1967590): 

 

RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. PRELIMINAR. SUPOSTA VIOLAÇÃO AO CONTRADITÓRIO E AO DEVIDO PROCESSO LEGAL. INOCORRÊNCIA. FORTES INDÍCIOS DA EXISTÊNCIA DE ABUSO DE PODER, APROPRIAÇÃO INDÉBITA E COAÇÃO DE TESTEMUNHAS. ABERTURA DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. AFASTAMENTO CAUTELAR DO MAGISTRADO. NECESSIDADE. 

1. Da ausência de violação ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa. O enquadramento legal apontado em sede de Reclamação Disciplinar é preliminar, pois somente a partir da apuração detalhada dos fatos propostos em processo disciplinar estará delineado o arcabouço fático-probatório necessário para o enquadramento definitivo, o qual constará do Relatório Final de eventual Processo Administrativo Disciplinar. 

2. Existência de elementos indiciários suficientes que apontam a possível prática de infrações disciplinares por Juiz que teria agido com abuso de poder, utilizando-se de seu cargo para apropriar-se de coisa alheia móvel da qual tinha a posse.

3. Interposição de ação de interpelação judicial em face das testemunhas de procedimento administrativo em trâmite na Corregedoria Local com o possível intuito de alterar as provas produzidas, podendo, para tanto, ter coagido os depoentes.

4. Necessidade de instauração de Procedimento Administrativo Disciplinar com afastamento cautelar do Juiz Requerido.

(CNJ - RD – Reclamação Disciplinar - 0006131-93.2015.2.00.0000  - Rel. NANCY ANDRIGHI - 11ª Sessão Extraordinária - julgado em 26/04/2016). 

A portaria que inaugura o PAD, Portaria n.° 6, de 14 de junho de 2016(IDs 1967569 e 1967574), aprovada na 12ª Sessão do Plenário Virtual (ID 1967578), delimitou os fatos que são objeto de apuração.

O PAD em discussão tem origem na RD n.° 0006131-93.2015.2.00.0000, autuada a partir da decisão deste Conselho que, em 19.5.2015,  avocou da Corregedoria-Geral de Justiça do Estado do Maranhão os procedimentos administrativos instaurados em face do juiz Marcelo Testa Baldochi (35.848/2013, 43.909/2014, 56.838/2014, 57.463/2014 e 58.855/2014). Os expedientes avocados apuravam possíveis infrações disciplinares praticadas pelo magistrado no exercício de seu cargo e sua conduta na vida pública e particular.

Em atenção aos arts. 16 e 17 da Resolução CNJ n.° 135/2011, foram adotadas providências para instrução com manifestação do Ministério Público e magistrado processado (ID 2008388 e ID 2040068).

Por fim, o Ministério Público apresentou alegações finais em 14.5.2020 (ID 3975180), nos termos do art. 19 da Resolução CNJ n.° 135/2011, manifestando-se pela procedência do processo administrativo disciplinar com aplicação de sanção de disponibilidade com vencimentos proporcionais.

Sustenta que os elementos de prova formados nos autos são suficientes para comprovar que, em relação aos fatos descritos no Item II da Portaria n.° 6, de 14 de junho de 2016, o magistrado infringiu o art. 35, inciso VIII, da LOMAN e aos arts. 15 e 16 do Código de Ética da Magistratura.  

Na manifestação final, além de preliminares de mérito a sugerir vícios na tramitação da RD n.° 0006131-93.2015.2.00.0000 e do presente feito, o magistrado processado alega a inexistência de provas aptas a embasar condenação na esfera disciplinar (ID 4041874).

Feita essa breve contextualização, passo a examinar individualmente os fatos objeto de apuração, bem como as alegações apresentadas pelo processado.

 

  I- PRELIMINARES

a) NULIDADE DA INSTAURAÇÃO DO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR PELO CNJ.


 O Magistrado processado sustenta vício na deliberação do Plenário do CNJ que determinou a instauração do presente processo administrativo disciplinar (ID 2040068).

Alega que a intimação acerca da sessão de julgamento da RD n.° 0006131-93.2015.2.00.0000 efetivou-se no sistema em data subsequente à realização da sessão plenária, fato que teria obstaculizado a sustentação oral e apresentação de questão de ordem por seu advogado.

Pois bem, o Plenário do Conselho Nacional de Justiça deliberou a instauração do processo administrativo disciplinar contra o juiz de direito Marcelo Testa Baldochi, com afastamento cautelar os autos da RD n.° 0006131-93.2015.2.00.0000, apreciado na 11ª Sessão Virtual, realizada no período de 19.4.2016 a 26.4.2016 (ID 1967588).

A pauta com a veiculação dos processos a serem apreciados na sessão virtual em referência, o que incluiu a RD n.° 0006131-93.2015.2.00.0000, foi publicada no DJe n.° 59/2016, de 13.4.2016[1] com intimação da defesa nos respectivos autos, em 15.4.2016, ID 1967591. Ou seja, foram atendidas as exigências do §1° do art. 14 da Resolução CNJ n.° 135/2011 e do § 2° do art. 120 do Regimento Interno do CNJ[2].

Vale anotar que o Regimento Interno do CNJ vigente à época considerava a exclusão de procedimentos da sessão virtual no caso de pedido de sustentação oral. O pedido deveria ser pleiteado pela parte no prazo de até duas horas antes do horário previsto para o início da sessão, o que não foi solicitado oportunamente pela defesa - art. 118-A, §5°, inciso V e §6°do RICNJ[3].

Feitas tais considerações, rechaço a preliminar, por não constatar vício no ato que comunicou o magistrado e/ou a defesa acerca do julgamento da RD n.° 0006131-93.2015.2.00.0000, impugnado quando já transcorridos 6 (seis) meses da sessão deliberativa.

 

b) NULIDADE DA CITAÇÃO POR HORA CERTA PARA APRESENTAR DEFESA PRELIMINAR, NOS TERMOS DO ART. 17  DA RESOLUÇÃO CNJ N.°135/2011.

 

 O magistrado suscita nulidade na condução do presente feito, pois a citação para apresentação de defesa preliminar ocorreu na modalidade por hora certa (ID 2040068).

A despeito dos argumentos apresentados, afasto a preliminar pelos seguintes fundamentos.

Vale lembrar que, para realizar a citação descrita no art. 17 da Resolução CNJ n.° 135/2011, os oficiais de justiça inicialmente designados para o ato deslocaram-se, sem êxito, em 6 (seis) oportunidades ao endereço situado na Avenida Itaupu, 51 – Parque Santa Lúcia, conforme revela certidão presente no ID 2025087, p. 5, mas o magistrado não foi localizado. A certidão trouxe, ainda, que o contato telefônico do magistrado encontrava-se fora de área em diversas ocasiões.

De posse das informações apresentadas pelo Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão à época, que indicavam o retorno da carta de ordem proveniente deste Conselho sem o atendimento de sua finalidade (ID 2025085, p. 1), novas providências foram adotadas pelo Conselheiro que atuou em substituição regimental nestes autos, Ministro Lélio Bentes, para promover citação do magistrado processado.

A diligência, de acordo com o então Conselheiro, poderia se efetivar por hora certa, desde que atendidos os termos de condições do art. 362 do CPP c/c art. 252 do CPC ( IDs 2026654e 2028192).

Expedida nova carta de ordem a partir dos endereços apresentados pelo magistrado ao juiz diretor do Fórum da Comarca de Imperatriz/MA (ID 2025087, p. 2), a Desembargadora Maria das Graças de Castro Duarte Mendes, no exercício da presidência do TJMA, informou, por fim, a efetivação do ato por meio do OFC-GP 870/2016 (ID 2038639, p. 1).

Considerando a aplicação subsidiária das Leis n.s 8.112/90, 9.784/99, bem como do Código de Processo Penal nos procedimentos disciplinares em face de magistrados, afasto a nulidade ora aventada.

Destaco que o Supremo Tribunal Federal afirma ser constitucional a citação por hora certa descrita no código de processo penal, conforme expõe o seguinte julgado:


Ementa: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. PROCESSO PENAL. CITAÇÃO POR HORA CERTA. ARTIGO 362 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. CONSTITUCIONALIDADE. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO EXTRAORDINÁRIO.

1. É constitucional a citação por hora certa, prevista no art. 362, do Código de Processo Penal.

2. A conformação dada pelo legislador à citação por hora certa está de acordo com a Constituição Federal e com o Pacto de São José da Costa Rica.

3. A ocultação do réu para ser citado infringe cláusulas constitucionais do devido processo legal e viola as garantias constitucionais do acesso à justiça e da razoável duração do processo.

4. O acusado que se utiliza de meios escusos para não ser pessoalmente citado atua em exercício abusivo de seu direito de defesa. Recurso extraordinário a que se nega provimento.

(RE 635145, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Relator(a) p/ Acórdão: LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 01/08/2016, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-207  DIVULG 12-09-2017  PUBLIC 13-09-2017).

 

 Se no âmbito dos processos penais, que materializam a ultima ratio da ingerência estatal na esfera de liberdade do indivíduo, a citação ou intimação por hora certa é permitida, não há razão para que a sua adoção no âmbito dos processos administrativos disciplinares, per si, importe em alguma nulidade, sobretudo quando o caso concreto revelar a necessidade de sua utilização.

Destaco que, ciente da acusação, o magistrado processado atuou em todas as fases de instrução e conclusão do feito por meio dos advogados habilitados nos autos[4], de modo que se afasta qualquer prejuízo[5].

 

c) INCOMPETÊNCIA PARA AVOCAR SINDICÂNCIA ADMINISTRATIVA EM CURSO NO TRIBUNAL DE ORIGEM E AMPLIAR O SEU OBJETO.


Como anteriormente relatado, o processo administrativo disciplinar sob análise teve origem na RD n.° 0006131-93.2015.2.00.0000, autuada a partir da decisão deste Conselho que, em 19.5.2015, avocou da Corregedoria-Geral de Justiça do Estado do Maranhão os procedimentos administrativos instaurados em face do juiz Marcelo Testa Baldochi (35.848/2013, 43.909/2014, 56.838/2014, 57.463/2014 e 58.855/2014).

No curso da tramitação destes autos (ID 2270903), bem como em sede de alegações finais (ID 4041874), o magistrado sustentou a incompetência do CNJ para avocar sindicância administrativa que se encontrava em trâmite na corregedoria local.

Argumenta que a assunção de competência pelo CNJ, nos termos do inciso III do art. 4° do art. 103-B da Constituição Federal[6], é restrita aos procedimentos administrativos disciplinares em curso, assim compreendidos em seu sentido estrito – ou seja, a avocação não abarcaria as fases antecedentes, como a sindicância ou procedimentos preliminares, por exemplo.

Desse modo, defende a nulidade da deliberação proferida pelo Plenário do CNJ que determinou a avocação dos feitos que se encontravam em andamento na Corregedoria do Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão.

Também sustenta que o CNJ ampliou o objeto do procedimento disciplinar TJ/MA n.° 58.855/2014 avocado, tendo em conta que o único fato em apuração pela Corregedoria local seria a declaração prestada por Raulino Gobira e Jairo Pereira de Moura, em 15.12.2014, perante Promotor de Justiça local (ID 4041874).

Como a interpelação judicial n.° 0001207-42.2015.8.01.0038 não abrangia o procedimento disciplinar desencadeado pela Corte local, aponta ser irregular a atuação do CNJ na apuração desse fato.

Friso que a avocação do procedimento disciplinar TJ/MA n.° 58.855/2014 pelo CNJ – assim como de outros procedimentos que se encontravam em curso na Corregedoria local contra o mesmo magistrado – decorreu de deliberação deste colegiado, na 26ª Sessão Extraordinária, realizada em 19.5.2015, nos autos do PP  n.° 0000116-11.2015.2.00.0000 (ID 1967671, 1967672 e 1967673):

 

PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS. AVOCAÇÃO DE PROCEDIMENTOS DISCIPLINARES EM CURSO NO TJ/MA. DIFICULDADES NA APURAÇÃO. INTERFERÊNCIA DO JUIZ RECLAMADO.

I - A evidente interferência do Juiz reclamado no julgamento dos processos disciplinares contra si instaurados.

II – A proximidade do julgamento de 03 sindicâncias pelo Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão.

III – Faz-se pertinente que o Conselho Nacional de Justiça utilize a prerrogativa conferida pelo artigo 103-B, § 4º, inciso III, da Constituição Federal, que prevê a possibilidade de avocação dos processos

disciplinares em curso.

IV – Avocação dos procedimentos disciplinares nºs 35.848/2013, 43.909/2014, 56.838/2014, 57.463/2014 e 58.855/2014 em trâmite no Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão.

(CNJ - PP n.° 0000116-11.2015.2.00.0000 - Rel. NANCY ANDRIGHI - 26ª Sessão Extraordinária - Julgado em 19/05/2015.

 

Além de a impugnação quanto a avocação revelar-se extemporânea, é certo que a aplicação desse instituto não está restrita às hipóteses em que instaurado propriamente o processo administrativo disciplinar na origem.

Com efeito, a avocação de quaisquer procedimentos, sejam eles prévios ou não, decorre da competência concorrente do CNJ para a aplicação do regime disciplinar da magistratura, afirmada pelo Supremo Tribunal Federal ao referendar a medida cautelar na ADI n.° 4638. Confira-se:

PROCESSO OBJETIVO – LIMINAR – ATUAÇÃO DO RELATOR – REFERENDO PARCIAL. Atuando o relator em período no qual o Colegiado não esteja reunido, cumpre submeter a cautelar na abertura dos trabalhos. Referendo parcial implementado pela ilustrada maioria nos termos da ata de julgamento.

Decisão

O Tribunal, por unanimidade, rejeitou a preliminar suscitada pelo Procurador-Geral da República. Por maioria, o Tribunal referendou o indeferimento da liminar em relação ao artigo 2º da Resolução nº 135, do Conselho Nacional de Justiça, contra os votos dos Senhores Ministros Cezar Peluso (Presidente) e Luiz Fux, que davam, cada qual nos termos de seus respectivos votos, interpretação conforme. Em relação a seu artigo 3º, inciso V, o Tribunal, por unanimidade, referendou o indeferimento da liminar. E, em relação ao artigo 3º, § 1º, contra os votos da Senhora Ministra Cármen Lúcia e do Senhor Ministro Joaquim Barbosa, o Tribunal referendou o deferimento da liminar. Em seguida, foi o julgamento suspenso. Falaram, pela requerente, o Dr. Alberto Pavie Ribeiro; pelo amicus curiae, o Dr. Ophir Cavalcante Júnior; pela Advocacia-Geral da União, o Ministro Luís Inácio Lucena Adams, Advogado-Geral da União, e, pelo Ministério Público Federal, o Dr. Roberto Monteiro Gurgel Santos, Procurador-Geral da República. Plenário, 01.02.2012. Decisão: Prosseguindo no julgamento, o Tribunal referendou o indeferimento da liminar em relação ao artigo 4º da Resolução nº 135, do Conselho Nacional de Justiça, contra os votos dos Senhores Ministros Cezar Peluso (Presidente) e Luiz Fux; por unanimidade, o Tribunal referendou a decisão liminar quanto ao artigo 20, caput; em relação ao artigo 8º e ao artigo 9º, caput e §§ 2º e 3º, o Tribunal referendou a decisão liminar para dar interpretação conforme no sentido de, onde conste presidente ou corregedor, ler-se órgão competente do Tribunal; quanto ao artigo 10, o Tribunal deu interpretação conforme para, excluindo a expressão "por parte do autor da representação", entender-se que o sentido da norma é da possibilidade de recurso por parte do interessado, seja ele o magistrado contra o qual se instaura o procedimento, seja ele o autor da representação arquivada, contra os votos dos Senhores Ministros Marco Aurélio (Relator), Luiz Fux, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello, que mantinham a liminar nos termos do voto do Relator, e, em parte, contra o voto da Senhora Ministra Rosa Weber, que a indeferia; quanto ao artigo 12, caput, e seu parágrafo único, o Tribunal negou referendo à liminar concedida, contra os votos dos Senhores Ministros Marco Aurélio (Relator), Luiz Fux, Celso de Mello e Presidente, e contra o voto do Senhor Ministro Ricardo Lewandowski, que deferia a liminar para conferir interpretação conforme ao dispositivo, de modo a assentar que a competência correicional do CNJ é de natureza material ou administrativa comum, nos termos do artigo 23, I, da Constituição Federal, tal como aquela desempenhada pelas corregedorias dos tribunais, cujo exercício depende de decisão motivada apta a afastar a competência disciplinar destes, nas situações anômalas caracterizadas no voto do Ministro Celso de Mello no MS 28.799/DF. Em seguida, foi o julgamento suspenso. Plenário, 02.02.2012. Decisão: Em continuidade ao julgamento, o Tribunal, por maioria, quanto aos § 3º, § 7º, § 8º e § 9º do artigo 14, cabeça; aos incisos IV e V do artigo 17, cabeça, e ao § 3º do artigo 20, da Resolução nº 135/2011 do Conselho Nacional de Justiça, negou referendo à liminar, contra os votos dos Senhores Ministros Marco Aurélio (Relator), Ricardo Lewandowski, Celso de Mello e Cezar Peluso (Presidente), que a referendavam, e o voto do Senhor Ministro Luiz Fux, que a referendava parcialmente. Quanto ao § 1º do artigo 15, por maioria, o Tribunal, referendou a cautelar concedida, contra o voto da Senhora Ministra Rosa Weber. Quanto ao parágrafo único do artigo 21, o Tribunal, por maioria, deu interpretação conforme a Constituição Federal para entender que deve haver votação específica de cada uma das penas disciplinares aplicáveis a magistrados até que se alcance a maioria absoluta dos votos, conforme o artigo 93, inciso VIII, da Constituição, contra os votos dos Senhores Ministros Relator, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello. Em seguida, o Tribunal deliberou autorizar os Ministros a decidirem monocraticamente matéria em consonância com o entendimento firmado nesta ação direta de inconstitucionalidade, contra o voto do Senhor Ministro Marco Aurélio. Plenário, 08.02.2012.

ADI 4638 MC-Ref, Relator(a): MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 08/02/2012, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-213  DIVULG 29-10-2014  PUBLIC 30-10-2014 RTJ VOL-00231-01 PP-00033)

 

Referido entendimento é reproduzido nos seguintes julgados do Supremo Tribunal Federal: 

 

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CNJ. COMPETÊNCIA AUTÔNOMA. REGULARIDADE NA DESIGNAÇÃO DE MAGISTRADO AUXILIAR PARA INSTRUÇÃO DE SINDICÂNCIA. ORDEM DENEGADA.

1. O Conselho Nacional de Justiça tem competência constitucional autônoma, e não subsidiária da competência dos demais tribunais. 

2. É regular a designação de juiz auxiliar, seja ele originário do Judiciário estadual ou federal, para a condução de sindicância, por delegação do Corregedor-Nacional de Justiça, ainda que o investigado seja magistrado federal.

3. Segurança denegada.

(MS 28513, Relator(a): TEORI ZAVASCKI, Segunda Turma, julgado em 15/09/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-193  DIVULG 25-09-2015  PUBLIC 28-09-2015)

 

AGRAVO REGIMENTAL EM MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. DETERMINAÇÃO DE APOSENTADORIA COMPULSÓRIA. COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA E CONCORRENTE DO CNJ. ANÁLISE SOMENTE DOS FATOS NÃO ATINGIDOS PELA PRESCRIÇÃO PARA DETERMINAÇÃO DA PENA. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME DE ACERVO PROBATÓRIO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR EM SEDE DE MANDADO DE SEGURANÇA. AGRAVO REGIMENTAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. O CNJ não está condicionado à atuação do órgão correicional local (artigo 103-B, §4º, II, III e V), para somente após proceder, consoante a exegese adotada pelo Supremo Tribunal Federal. 

2. A jurisprudência desta Corte firmou entendimento no sentido de que o Conselho Nacional de Justiça detém competência originária e concorrente com os Tribunais de todo o país para instaurar processos administrativo-disciplinares em face de magistrados. (Precedentes: MS 29.187/DF, Min. Rel. Dias Toffoli, Plenário, DJe 18/2/2014, MS 28.513/DF, Min. Rel. Teori Zavascki, 2ª Turma, DJe 25/9/2015)

3. In casu, conforme restou evidenciado no voto do Conselheiro Relator, apenas os fatos tidos como infrações disciplinares e não atingidos pela prescrição foram considerados para respaldar a punição imposta ao recorrente, ficando demonstrado materialmente que tais condutas violaram o art. 36, I e art. 35, VII, da LOMAN.

4. A análise da adequação da sanção envolve rediscussão de fatos e provas produzidas no âmbito do processo administrativo disciplinar, o que não se compatibiliza com a via do mandado de segurança. 5. Agravo regimental a que se nega provimento.

(MS 28353 AgR, Relator(a): LUIZ FUX, Primeira Turma, julgado em 24/11/2015, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-248  DIVULG 09-12-2015  PUBLIC 10-12-2015)

 

Agravo regimental em mandado de segurança. Conselho Nacional de Justiça. Competência. Atuação dos tribunais. Caráter originário e autônomo. Precedentes. Agravo regimental ao qual se nega provimento. 1. A competência do Conselho Nacional de Justiça deriva da Carta Magna e é originária e autônoma, não tendo caráter subsidiário no que se refere a matéria disciplinar. 2. Agravo regimental ao qual se nega provimento. 

(MS 29187 AgR, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 18/12/2013, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-033  DIVULG 17-02-2014  PUBLIC 18-02-2014) 

 

A obstrução da sindicância administrativa em trâmite do tribunal de origem pelo magistrado, seja por meio de ajuizamento de interpelação às vésperas do seu julgamento, seja pelos incidentes manejados, justificou a avocação do feito pela Corregedoria Nacional de Justiça.

De acordo com o voto vencedor proferido pela Corregedora Nacional à época dos fatos (ID 1967671):

Imperioso destacar que a interpelação judicial foi ajuizada na Comarca de João Lisboa/MA, no plantão judicial do dia 17/05/2015 às 20h:40, sendo despachada na manhã do dia seguinte por GLENDER MALHEIROS GUIMARÃES, Juiz Titular da 1ª Vara, respondendo pela 2ª Vara, no qual, considerando a urgência do pleito e diante na análise de novo afastamento cautelar do Juiz requerido, por ocasião do julgamento da Sindicância nº 58.855, designou para o mesmo dia, às 14h:00, a realização de audiência de justificação (Id 1705559).

Causa estranheza o fato de que, somente 05 (cinco) meses após a instauração da referida Sindicância e diante da iminência de seu julgamento, o Juiz requerido tenha deduzido interpelação judicial – ajuizada no plantão judicial (domingo às 20h:40), sendo designada e realizada audiência no dia seguinte, o que denota uma possível interferência do Juiz MARCELO TESTA BALDOCHI na conclusão dos procedimentos disciplinares em curso na CGJ-TJ/MA.

(...)

 Vê-se que o Juiz MARCELO TESTA BALDOCHI, com o propósito de pressionar e amedrontar as testemunhas, deduziu interpelação judicial, sendo esse o motivo determinante para que as testemunhas alterassem seus depoimentos, de modo a interferir no julgamento da Sindicância nº 58.855, contra si instaurada.

Além disso, há fortes indícios que as testemunhas munidas pelo sentimento de medo, supostamente coagidas, foram obrigadas a alterarem seus depoimentos, mudando por completo as denuncias feitas contra o Juiz MARCELO TESTA BALDOCHI, conforme termo de declarações prestados ao Promotor de Justiça de Imperatriz\MA, Joaquim Ribeiro de Souza Junior, no dia 15/12/2014 (Id 1619389).

(...)

Ademais, acrescente-se ainda que o Juiz requerido vem obstruindo o julgamento dos procedimentos instaurados na CGJ-TJ/MA, utilizando-se de expedientes protelatórios, em especial a argüição de suspeição do Des. Fernando Bayma, Corregedor em exercício, fazendo com que o julgamento dos procedimentos contra si instaurados fossem adiados.

(Grifo nosso).

Avocada a sindicância n.° 58.855/2014 do TJMA, o fato relativo à suposta coação de testemunha em razão do ajuizamento de interpelação judicial n.º 1207-42.2015.8.01.0038 foi capitulado na RD n.° 0006131-93.2015.2.00.0000 para apuração, oportunidade em que foi assegurado o contraditório ao magistrado, de acordo com o art. 14 da Resolução CNJ n.° 135/2011 – vide ID 1967628, p. 7 a 9; ID 1967598, p. 3.

Quanto ao ponto, transcrevo excerto do voto condutor da RD n.° 0006131-93.2015.2.00.0000 (ID 1967588):

 

1. Preliminarmente. Da ausência de violação ao contraditório e ao devido processo legal. 

Aduz o reclamante a violação dos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, alegando a inexistência de indicação do suporte probatório das condutas a ele imputadas, bem como da conexão dessas com os tipos disciplinares indicados.

No entanto, conforme se verifica da intimação do reclamado para apresentação de Defesa Prévia (Despacho de Id 1860311 e Aditamento à Id 1855505), suas condutas foram individualizadas, enumerando-se uma a uma, e discriminadas as provas trazidas separadamente em cada um dos procedimentos avocados da Corregedoria-Geral da Justiça do Maranhão.

Além disso, o enquadramento legal apontado em sede de Reclamação Disciplinar é preliminar, pois somente a partir da apuração detalhada dos fatos no curso do processo disciplinar é que se delineará o arcabouço fático-probatório necessário para o enquadramento definitivo, o qual constará do Relatório Final de eventual Processo Administrativo Disciplinar.

Ressalte-se que a exigência legal para a fase instrutória do processo é delimitada à imputação dos fatos e à identificação do teor da acusação, não se verificando, portanto, quaisquer vícios no presente procedimento.

 

Com efeito, assim como descabe recurso da decisão Plenária - seja da de avocação como a da reclamação que deu origem ao presente PAD -, nos termos do art. 4°,§ 1° do RICNJ[7], a atuação do CNJ no caso decorre do exercício da competência conferida ao Conselho para apurar falta disciplinar praticada, em tese, pelo magistrado.

Não prospera, portanto, a tese invocada pela defesa a sugerir vício na tramitação do PP  n.° 0000116-11.2015.2.00.0000 e da RD n.° 0006131-93.2015.2.00.0000.2.00.0000, que não se verifica nos autos.

Vale anotar que o magistrado impugnou mesmo tema perante o Supremo Tribunal Federal, por meio do Mandado de Segurança nº 34.245/DF, cuja ordem foi denegada, em 26.10.2017, pelo Ministro Roberto Barroso, conforme explicitado a seguir:

 

 3. O impetrante alega: (i) ilegalidade da avocação da sindicância, por ausência de previsão legal, argumentando que, nos termos do art. 103-B, § 4º, III, da Constituição e do art. 4º, IV, do RI/CNJ, o Conselho poderia avocar processos disciplinares em curso, mas não sindicâncias; (ii) ter sido avocado “fato inexistente” ou “sequer constante de qualquer sindicância”, já que a Corregedora Nacional teria arrolado “como sindicância avocada a ‘interpelação judicial n. 1207-42.2015.8.01.0038’ — que não é ou jamais foi objeto de qualquer providencia administrativa no TJMA” (doc. 1, p. 16); (iii) carência de fundamentação, porque, não obstante a Corregedora Nacional tenha relatado, em sua decisão, o tópico da defesa relativo à inclusão, supostamente indevida, da questão relativa à interpelação judicial no objeto da sindicância, a questão não teria sido abordada na fundamentação; e (iv) ilegalidade de seu afastamento das funções de magistrado, uma vez que a decisão “não se confina nas atividades profissionais”, mas em “fato externo, alheio à atividade jurisdicional e, ademais, fato pretérito” (doc. 1, p. 32). Pede a concessão da segurança para que seja invalidado o ato impugnado.

 

(...)

 

6. Conforme já assentei anteriormente, diversos dos vícios alegados pelo impetrante teriam ocorrido na avocação da sindicância. As informações do CNJ confirmam que a avocação ocorreu em 19.05.2015 (doc. 53, p. 3; doc. 55, p. 9). Para impugnar essa decisão, o impetrante interpôs recurso administrativo sem efeito suspensivo em 08.06.2005 (art. 115, § 4º, do RI/CNJ), quando considero que teve ciência da decisão. O recurso administrativo não foi conhecido, em decisão da qual o impetrante foi intimado em 19.08.2015 (doc. 62, p. 42-46). O presente writ somente foi impetrado em 15.06.2016, mais de 120 (cento e vinte) dias após a ciência da decisão impugnada (art. 23 da Lei nº 12.016/2009). Assim, operou-se a decadência para fins de impetração de mandado de segurança quanto às questões afetas à avocação.

 

11. De toda sorte, em casos como o dos autos, tenho reiterado o entendimento de que a intervenção do STF sobre atos praticados pelo CNJ deve ocorrer em caráter excepcionalíssimo. O CNJ foi criado com a finalidade constitucional expressa de controlar a atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e o cumprimento dos deveres funcionais dos juízes (art. 103-B, § 4º, da Constituição). Assim, suas decisões devem ser revistas com a deferência que os órgãos constitucionais de natureza técnica merecem, evitando-se ingerência desnecessária ou indevida. Nessa linha, o controle por parte dessa Corte somente se justifica em hipóteses de anomalia grave, dentre as quais: (i) inobservância do devido processo legal; (ii) exorbitância, pelo Conselho, de suas competências; e (iii) injuridicidade ou manifesta falta de razoabilidade do ato. No caso, não estão configuradas essas hipóteses.

 

12. Não há razão para se impor restrição à avocação de sindicâncias pelo CNJ, mormente quando o Conselho disporia da competência necessária para instaurar originariamente processo administrativo disciplinar contra o impetrante. Registro que a competência do CNJ é concorrente à das corregedorias locais, conforme entendimento adotado no MS 28.003, Rel. Min. Ellen Gracie, e na ADI 4.638, Rel. Min. Marco Aurélio. Nesse sentido, confira-se, também, recente decisão proferida no MS 32.581 AgR, Rel. Min. Edson Fachin.

 

13. Pelo mesmo motivo, também considero superadas as alegações referentes à interpelação judicial no objeto da sindicância. Não há qualquer vício no procedimento quanto a esse ponto, já que o CNJ poderia determinar a abertura de procedimento administrativo disciplinar para apreciar questões relativas à interpelação judicial, independentemente de prévia sindicância. Nesse sentido: MS 28.003, redator para acórdão Min. Luiz Fux. Nessa linha, manifesta-se a Procuradoria-Geral da República. Transcrevo o trecho pertinente do parecer (doc. 66, p. 12):

 

“Ademais, consoante já explicitado, o Conselho Nacional de Justiça possui competência originária e concorrente à atuação dos Tribunais. O fato de a possível coação das testemunhas não ter sido objeto de apreciação pelo Tribunal de origem não impede sua apreciação, no âmbito administrativo, pelo CNJ, sob pena de desvirtuar sua natureza que é de órgão fiscalizador de âmbito nacional. Nesse contexto, legítima a inclusão, na portaria de instauração do processo administrativo disciplinar, pelo CNJ, do suposto abuso de poder do magistrado, ao se utilizar de interpelação judicial com o intuito de influenciar e alterar o depoimento das testemunhas.”

 

15. Por fim, o afastamento preventivo fundamenta-se no uso  reiterado e arbitrário, pelo impetrante, dos poderes de juiz para fazer valer interesses pessoais. De acordo com os fatos apurados na sindicância em questão, o impetrante teria dado voz de prisão para supostamente apropriar-se de gado alheio; depois, proposto interpelação judicial e nela colhido novos depoimentos das pessoas envolvidas no mesmo dia e na iminência do julgamento da sindicância nº 58.855/2014 pela Corregedoria local (TJ/AM).

 

16. O uso reiterado dos poderes de juiz para fins diversos dos autorizados justifica o afastamento provisório do exercício da magistratura. Há notícias de que, em outros procedimentos, apura-se conduta irregular do impetrante em relação a funcionários de companhia aérea e a tabelião de cartório, além reclamações formuladas por advogados de Imperatriz/ MA. Essas circunstâncias reforçam a necessidade de afastamento do impetrante da atividade judicante, além da necessidade de se preservar a boa reputação e a dignidade do Poder Judiciário, já que tais condutas têm sido amplamente divulgadas na internet.

 

17. Diante do exposto, com base no art. 205 do RI/STF, denego a segurança. Custas pela parte impetrante. Sem honorários (Lei nº 12.016/2009, art. 25, e Súmula 512/STF). Admito o ingresso da União. Anote-se.

(Grifo nosso).

 

   Superada a análise das preliminares, passo a examinar o mérito.

 

II- MÉRITO

a) DO ABUSO DE PODER PELA UTILIZAÇÃO DO CARGO DE JUIZ PARA APROPRIAR-SE DE COISA ALHEIA MÓVEL DE QUE TINHA POSSE.

 

 Uma das razões que levaram à instauração do procedimento administrativo disciplinar pelo CNJ contra o magistrado é a suposta utilização do cargo para se apropriar indevidamente de coisa alheia móvel de que tinha posse – no caso, bovinos – após a decretação de prisão de Marques Antônio de Morais, conhecido por “Mineiro”.

Segundo descreve a portaria de instauração, ID 1967569, p. 3 a 6:

 

I- DO ABUSO DE PODER PELA UTILIZAÇÃO DO CARGO DE JUIZ PARA APROPRIAR-SE DE COISA ALHEIA MÓVEL DE QUE TINHA POSSE 

 indícios de que magistrado teria agido com abuso de poder, utilizando-se do cargo de juiz para apropriar-se de coisa alheia móvel (gado transportado por uma determinada pessoa), após a decretação de sua prisão, com o abatimento em breve lapso de tempo, para ocultar os fatos.

 

A controvérsia teve origem a partir de declaração prestada por Jairo Pereira de Moura  – comerciante que reside em João Lisboa/MA – e Raulino Lima Gobira – pecuarista que reside em Imperatriz/MA –  ao Promotor de Justiça Joaquim Ribeiro de Souza Júnior, cujo teor é o seguinte ( ID 1967681 p. 2 a 6) :

 


Destaca-se da declaração:

 

“(...) O Marcelo Baldochi deu voz de prisão em flagrante no “Mineiro”, alegando que o gado que o mesmo transportava era de sua propriedade; que após prender Mineiro o Dr. Marcelo levou o gado como se fosse seu e abateu os animais na Fazenda de um Senhor conhecido como “Real” residente da cidade de Pinheiro; que Real disse que abateu o gado por pensar que era de propriedade do Dr. Marcelo; que o Dr. Marcelo abateu o gado às pressas, para que ninguém percebesse que o ferro dos animais indicava que os mesmos não lhe pertenciam; que após dar voz de prisão em flagrante, o Dr. Marcelo providenciou cópia de um mandado de prisão oriundo do Estado  de Minas Gerais em nome de Mineiro, supostamente por matar a esposa (...)

 

O contexto em que se deu a prisão de Marques Antônio de Moraes, e a apropriação de gado pelo magistrado após essa prisão são capazes de revelar que o processado agiu com excesso e abuso de poder ao buscar o devedor para reaver valores que, em tese, lhe eram devidos.  Contrariou, no afã de superar prejuízo financeiro, os deveres impostos aos magistrados explicitados na Lei Orgânica da Magistratura e no Código de Ética, que exigem conduta irrepreensível na vida pública e particular, bem como dever de prudência, integridade pessoal e profissional.

Marques Antônio de Moraes foi recapturado em 16.6.2013, em um domingo, devido à ordem de prisão proveniente do Juízo da Comarca de Nova Ponte/MG (ID 3492411,  p. 7):

 

 

Segundo retratado por “Mineiro”, a sua prisão ocorreu quando descarregava gado –  comprados por ele do Sr. Raulino –  na Fazenda do “Real”, localizada em Turilândia, próximo ao município de Santa Helena/MA.   Revelou que o Magistrado Baldochi esteve no local onde teria sido efetuada a sua prisão (ID 3573243, 00:04:20 - 00:05:40):

  

Juiz Rodrigo Capez: Que viatura que chegou? Primeiro chegou o juiz numa Hilux, foi isso?

Mineiro: Aí, com pouco prazo, acho que a viatura já estava esperando. Rápido chegou junto.

Juiz Rodrigo Capez: Entendi. E o juiz se dirigiu ao Senhor?

Mineiro: Não, nem lá ele foi. Só a polícia chegou e me deu ordem de prisão.

Juiz Rodrigo Capez: Mas o Sr. viu o juiz ou não viu o juiz?

Mineiro: Vi. Certeza absoluta.

Juiz Rodrigo Capez: Mas o Sr. está dizendo que não teve contato com ele?

Mineiro: Ele estava sim, mas ele não comenta com a gente.

Juiz Rodrigo Capez: Ah, ele não foi conversar com o Sr., o juiz?

Mineiro: É, ele não comentou.

Juiz Rodrigo Capez: Ele não foi conversar com o Sr.?

Mineiro: Só o cunhado dele que desceu, ele estava ruim para caminhar.

Juiz Rodrigo Capez:E o cunhado dele falou alguma coisa com o Sr.?

Mineiro: Não, poucas ideias.

Juiz Rodrigo Capez: Mas falaram alguma coisa na hora daquelas 23 cabeças que o Sr. tinha descarregado? Alguém disse, o cunhado ou o juiz falaram alguma coisa?

Mineiro: Não, não falou se ia pegar, só soube a notícia depois que tinha pegado.

Juiz Rodrigo Capez:E aí chegou a polícia?

Mineiro: Chegou a polícia e me levou.

Juiz Rodrigo Capez:E falou o que para o Sr.?

Mineiro: Ordem de prisão. Tinha um mandato(sic) e eu realmente tinha mesmo.

Juiz Rodrigo Capez: Mas o juiz não falou nada com o Sr.? Por que o Sr. estava sendo preso?

Mineiro: Não. Não falou. Aí chegou lá na delegacia de polícia de Pinheiros, eu fiquei um pouco em Turilândia e depois em Pinheiros. Aí eu falei assim, por que, Dr. que estou sendo preso? Não, é por roubo de gado.

Juiz Rodrigo Capez:Quem falou para o Sr. que seria por roubo de gado?

Mineiro: o delegado da civil. E eu falei, que roubo de gado? Se os gados vêm tudo com GTA, o Raulino que tirou, o Jairo que tirou a GTA para mim. Como é que eu roubei esse gado? Eu tenho prova de que não roubei. Nunca roubei gado.

 

Depoimentos prestados por Gislene, então companheira de “Mineiro” (ID 35804299, 00:04:24), por Walmir Pinheiro Lopes, motorista do magistrado (ID 3664595, 00:16:08) e Adaías  Rocha (ID 386462, 00:03:55), advogado acionado pelo magistrado para reaver o valor devido, igualmente confirmam que o processado esteve na região de Santa Helena/MA e Pinheiro/MA à época dos fatos, quando ocorreu a prisão de “Mineiro”.

De acordo com o magistrado, “Mineiro” devia-lhe por volta de R$ 76.000,00 (setenta e seis mil reais), pela venda de 36 (trinta e seis) bois realizada no período de abril/maio de 2013 (ID 3864647, 00:00:49, ID 3864631 -  00:06:30). 

Entretanto, enquanto Raulino Gobira e Jairo detinham cheque dado por “Mineiro” em garantia da compra de gado realizada na mesma circunstância – ID 1967681, p. 7 a 9 –, o mesmo não se passou com o magistrado Marcelo Baldochi, que alegou informalidade na realização de negociações dessa natureza.

Surpreende, portanto, a ação levada a efeito pelo magistrado que, conhecedor dos meios jurídicos disponíveis para execução de dívidas – vale ressaltar que se trata de magistrado titular da 4a Vara Cível da Comarca de Imperatriz/MA –, dirigiu-se até o local onde se encontrava o seu devedor, fato que é confirmado pelo relato das testemunhas e do próprio magistrado, como anteriormente narrado (ID 3864647, 00:03:55, ID 3864648).

 

Juiz Baldochi: E nessa noite, liguei para o Adaías, já era sábado à noite, cara, realmente aqui, vou levar o cano, que o cara vendeu o gado e pegou o dinheiro. Adaías sugeriu receber as vacas, porque o zum zum zum que está na casa dele é que, além de você, deve para fulano, beltrano, cicrano, algumas pessoas que ele deve; você não acha melhor ver com ele para ver se recebe, senão você não vai receber nada, os veículos que ele tem aqui é carro velho, moto velha, só dor de cabeça, vai lá, você já está aí mesmo. E fui para essa cidade lá, sai numa estrada, chega num trevo, vai para Santa Helena e de Santa Helena tem só a ponte que separa Santa Helena de Turilândia, passa  pela cidade, tem um posto de gasolina, vizinho a esse posto é a Fazenda desse Real. E, me informei, peguei a estrada  e fui para lá. Quando eu  chego, estou na estrada, entre Turilândia e essa Fazenda, não lembro o horário, entre 9:00 da manhã, 8:30, por aí, antes da fazenda, passa duas viaturas da polícia militar, saindo da fazenda e eu chegando. De fato, saindo as duas viaturas e eu entrei na fazenda. Lá na fazenda, o menino que trabalho comigo desceu, ei, Dr. o tal do Mineiro parece que foi preso.

 

Efetuada a prisão, o magistrado afirmou que em conversa tida na delegacia de Pinheiro/MA, ele e “Mineiro” renegociaram a dívida originária. Segundo alega,  o custodiado teria oferecido em pagamento o gado que se encontrava na Fazenda do “Real”, em Turilândia/MA  (ID 3864648, 00:03:00 - 00:04:36).

Tratava-se do gado de Raulino Gobira, adquiridos por “Mineiro”, e que o magistrado, conforme explicitado no interrogatório, logo negociou com a pessoa conhecida por “Real”, coincidentemente o dono da Fazenda onde os semoventes já se encontravam (ID 3864648, 00:03:00 - 00:05:10). A negociação com “Real”, de acordo com o magistrado, ocorreu no mesmo dia da prisão de “Mineiro” (ID 3864648, 00:05:00).

As circunstâncias do negócio originalmente realizado entre “Mineiro” e o magistrado Marcelo Baldochi, na ordem de R$ 76.000,00 (setenta e seis mil reais), sem contrato ou título de crédito em garantia, é, de fato, singular. A renegociação desse valor quando “Mineiro” se encontrava custodiado na delegacia no município de Pinheiro/MA também causa espécie.

Ressai da situação em tela as seguintes indagações: a) não se tratasse de magistrado, teria em tal circunstância acesso à delegacia para renegociar a pretensa dívida com uma pessoa custodiada, no caso particular, o seu devedor? b) estaria exatamente no local onde ocorreu a prisão do seu devedor se não tinha qualquer relação com esse fato? c) coincidentemente, na fazenda onde se efetuou a prisão, encontrar-se o gado posteriormente apropriado pelo magistrado para adimplemento da dívida?

Tenho que as respostas para tais questionamentos chegariam à conclusão diversa caso não tivessem relação com o magistrado.  Convencido de que a sucessão dos fatos, tal como se apresentam, revela a violação dos deveres do cargo pelo juiz Marcelo Baldochi, julgo procedente o procedimento disciplinar quanto às imputações descritas no item I da Portaria inaugural.

O panorama associado à prisão de “Mineiro” e a forma pela qual o juiz Marcelo Baldochi se apropriou do gado para quitação da dívida revela atuação incompatível com a dignidade, a honra e o decoro das funções pelo magistrado, cuja conduta, desapegada de qualquer dever de prudência, macula a própria imagem do Judiciário e caracteriza violação aos deveres impostos no art. 35, I e VIII da LOMAN, bem como no Código de Ética da Magistratura Nacional, nos artigos 1°, 2°, 14, 15, 16 e 37[8].

 Trata-se de reiteração de transgressão disciplinar  pelo juiz Marcelo Baldochi que, como será narrado adiante, detém histórico de abuso de poder pela utilização do cargo.

 

b) DO ABUSO DE PODER PELA UTILIZAÇÃO DE INTERPELAÇÃO JUDICIAL COM O INTUITO DE INFLUENCIAR E ALTERAR O DEPOIMENTO DE TESTEMUNHAS.


De acordo com a portaria de instauração, a forma como se processou a interpelação judicial ajuizada pelo juiz Marcelo Baldochi perante a 2ª Vara da Comarca de João Lisboa/MA revelava indícios de que o magistrado:

a) teria contatado testemunhas previamente ao ajuizamento da medida com o objetivo de influenciar e alterar depoimentos referentes aos fatos narrados ao Promotor de Justiça, Joaquim Ribeiro de Souza Júnior, pelos depoentes interpelados – Jairo Pereira de Moura e Raulino Lima Gobira;

b) provavelmente teria coagido os depoentes interpelados para tanto.

Eis o que descreve a portaria de instauração (ID 1967569, p. 3 a 6): 

 


II - DO ABUSO DE PODER PELA UTILIZAÇÃO DE INTERPELAÇÃO JUDICIAL COM O INTUITO DE INFLUENCIAR E ALTERAR O DEPOIMENTO DE TESTEMUNHAS 

Há indícios de que o Reclamado teria se utilizado de interpelaação judicial e, antes mesmo da propositura da medida, teria contatado testemunhas, com o objetivo de influenciar e alterar depoimentos referentes aos fatos narrados no item I, possivelmente, coagindo os depoentes para tanto. 


 O termo de declaração prestado por Jairo e Raulino perante o Promotor de Justiça Joaquim Ribeiro de Souza Júnior no município de Imperatriz/MA é datado de 15.12.2014 (ID 1967681 p. 2).

O ajuizamento da interpelação judicial de autos n.° 1207-42.2015.8.10.0038 na Comarca de João Lisboa/MA pelo magistrado Marcelo Baldochi ocorreu em sede de plantão judicial, às 20h40 de 17.5.2015. Foi distribuída em 18.5.2015 para a 2ª Vara daquela comarca (ID 1967595, p. 15 a 18).

Vale dizer: referida ação foi movida 5 (cinco) meses após declaração prestada pelos interpelados ao Ministério Público, quando veiculada a pauta de processos administrativos a serem julgados pelo Órgão Especial do TJMA em 20.5.2015, que incluía a apreciação da sindicância instaurada contra o magistrado Marcelo Baldochi - Processo n.° 58855/2014, posteriormente avocado pelo CNJ (ID 1967675, p. 4).

Pois bem, respondendo em substituição ao titular da 2ª Vara de João Lisboa/MA, o magistrado Glender Malheiros Guimarães designou a audiência de justificação para mesma data da distribuição dos autos, 18.5.2015, e restringiu-se a colher os depoimentos de Jairo Pereira Moura e Raulino Lima Gobira. Em relação à interpelada Elisete Gobira, o pedido não foi recebido por ausência de justa causa (ID 1967595, p. 18).

Na interpelação, as narrativas de Jairo e de Raulino ratificam grande parte os fatos anteriormente relatados ao Ministério Público. Houve dissonância apenas quanto às denúncias que tinham relação com o magistrado Marcelo Baldochi.

No termo de declaração prestado em juízo, por exemplo, Jairo Pereira (ID 1967595, p. 24 a 28):

 a)   afirmou que não é verdadeiro o que consta no termo prestado perante Promotor de Justiça, onde supostamente teria dito que o Dr. Marcelo lhe expulsou do fórum;

b)   quanto a imputação de que o magistrado teria dado voz de prisão ao “Mineiro”, relatou ter certeza de que a prisão do “Mineiro” decorreu de ato do delegado, pois o próprio delegado lhe confidenciou o fato quando foi até a delegacia;

c)   notadamente quanto à imputação de que o juiz  Marcelo Baldochi teria levado o gado às pressas para serem abatidos na Fazenda de propriedade do “Real” para que ninguém percebesse o ferro dos animais que não eram de sua propriedade, alega que tal afirmação foi uma razão que passou pela sua cabeça. Uma suposição, mas não tem certeza de que o interpelante teve ciência de que se tratava de gado de outra pessoa (ID 1967595, p. 25 e 26).

Não obstante, durante a instrução deste feito, Jairo Pereira negou qualquer coação praticada pelo magistrado Marcelo Baldochi.  (ID 3580417 - 00:04:40; ID 3580419, 00:04:40): 

O magistrado que presidiu a assentada, em consonância com os depoimentos prestados por Jairo e Raulino, relatou que os interpelados apresentaram-se voluntariamente, sendo adotadas na ocasião todas as cautelas para evitar constrangimentos às partes (ID 3664591, 00:08:24).

Questionado pela defesa sobre coação do juiz Marcelo Baldochi durante a realização do ato, assim explicitou o magistrado Glender Guimarães (ID 3580420 - 00:05:28 - 00:06:27):

 

Defesa: Você sabe informar se essas pessoas foram coagidas durante a audiência pela minha presença de algum modo, por estar lá, ou antes? Tem alguma informação sobre isso?

Glender: Não, não foram, até porque eu não permitiria que isso viesse a acontecer. Recordo, inclusive que durante o depoimento, por estar no momento em que começou a haver alguma divergência, inclusive eu pedi a retirada, para que não houvesse essa conclusão de que fosse algum tipo de constrangimento. Eu me lembro também de outra medida de prudência que eu tomei foi determinar – na época não tínhamos o depoimento gravado, não tínhamos aparelho, era digitado os depoimentos – mas eu pedi que essas pessoas fossem retiradas da sala com o depoimento impresso ali, com cuidado, em uma outra sala, com o secretário acompanhando e dizendo se elas discordavam de alguma constada teor desse depoimento ou não (...).

 

Com efeito, não se pode presumir que a parcial alteração dos relatos colhidos nos autos da interpelação judicial foi seguida de coação, quando os interpelados Jairo Pereira e Raulino Gobira rejeitam qualquer vício de vontade na declaração prestada em juízo.

Assim, a acusação da coação revela-se frágil. As provas formadas são incapazes de asseverar o dolo no comportamento do magistrado em relação às testemunhas, apesar de o processamento da interpelação relevar o intuito de afetar no julgamento do processo disciplinar que se encontrava em tramitação no TJMA à época dos fatos - Processo n.° 58855/2014 - o que demonstra, ao menos sob o enfoque jurídico-processual, quebra dos deveres de cooperação e de boa-fé pelo magistrado.

No entanto, parece legítimo que o magistrado se utilize das medidas disponíveis no ordenamento jurídico, já que a todos os cidadãos é assegurado o acesso à justiça, o que poderia ser traduzido pela impetração de interpelações judiciais.



III- da Dosimetria da pena

 

Para avaliar a pena aplicável ao caso em tela, cabe rememorar que o magistrado já foi sancionado em ocasião pretérita, com aplicação da pena de censura, pelo fato de agir com excesso ao determinar a prisão de funcionários da empresa aérea LATAM. Confira-se:

 

PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. MAGISTRADO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO MARANHÃO. VIOLAÇÃO AO DEVER PREVISTO NO ARTIGO 35, VIII DA LOMAN. MODO DE PROCEDER INCORRETO. PENA DE CENSURA.

1. O Magistrado Marcelo Testa Baldochi agiu com excesso, ao determinar a prisão dos funcionários de companhia aérea LATAM, sem respaldo legal para tanto, e os submetendo a constrangimento e situação vexatória, violando, portanto, o dever de manter conduta irrepreensível na vida particular, em ofensa ao disposto no artigo 35, VIII da LOMAN.

2. Apresenta-se adequada a aplicação da pena de censura, uma vez que a conduta praticada pelo requerido revela a prática de procedimento incorreto, indicando, comportamento repreensível na vida particular.

3. PAD julgado procedente.(CNJ - PAD - Processo Administrativo Disciplinar - 0002800-69.2016.2.00.0000  - Rel. ARNALDO HOSSEPIAN - 49ª Sessão Extraordinária - julgado em 14/08/2018 ).


Desse modo, em razão da conduta arbitrária praticada para reaver valores de seu devedor, valendo-se das prerrogativas do cargo para tanto, as penas moderadas como advertência e censura não seriam adequadas, sobretudo se considerada a reiteração do comportamento incompatível com as funções pelo magistrado[9].

Tampouco, ante a natureza da infração perpetrada, revela-se pertinente a aplicação da remoção compulsória.

Restam, portanto, a aplicação da pena de disponibilidade e de aposentadoria compulsória na esteira do que dispõem a Resolução CNJ n.° 135/2011[10] e o art. 56, da Lei Orgânica da Magistratura[11].

A transgressão disciplinar praticada pelo magistrado configura ato incompatível com exercício do cargo e atenta contra a dignidade, honra e decoro exigido aos juízes, mas não justifica a aplicação pena disciplinar de aposentadoria compulsóriade modo que reputo  compatível com a situação ora investigada a aplicação da sanção disponibilidade com aplicação de proventos proporcionais.

Na condição de juiz, de quem se presume conhecimento do sistema legal, é deveras censurável o comportamento adotado pelo processado queno intuito de superar prejuízo financeiro, agiu em descompasso com aobrigações e deveres éticos impostos à magistratura.

Outrossim, não há que se falar em prescrição pela aplicação da pena no caso concreto se considerada a data de abertura do PAD.

Da data da publicação da Portaria n.° 6, de 14 de junho de 2016 e a aposição da pena disciplinar de disponibilidade aqui defendida não transcorreu lapso temporal a que alude o §2° do art. 24 da Resolução CNJ n.° 135/2011[12] .

 

IV – CONCLUSÃO:

 

As provas constituídas nos autos sobre a prisão de Marques Antônio de Moraes, conhecido por “Mineiro”, e apropriação de gado pelo magistrado processado após essa prisão, descrita no item I da Portaria n.° 6, de 14 de junho de 2016, revelam-se suficientes para afirmar a prática de infração disciplinar pelo magistrado, devido à violação aos art. 35, incisos I e VIII da LOMAN,  c/c arts. 1°, 2°, 14, 15, 16 e 37 do Código de Ética da Magistratura Nacional.

Quanto aos fatos narrados no item II da Portaria de instauração do PAD, não me parece que deva ser presumido o vício de vontade na declaração prestada em juízo, sobretudo quando os depoentes interpelados, perante outro magistrado, afastam a coação atribuída ao juiz processado. As provas formadas nesse caso são frágeis e incapazes de asseverar o dolo no comportamento do magistrado em relação às testemunhas.

Ante o exposto, em razão dos elementos probatórios aptos a embasar a responsabilização de natureza disciplinar do magistrado Marcelo Testa Baldochi pelo fato descrito no item I da Portaria n.° 6, de 14 de junho de 2016, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o presente procedimento para determinar a aplicação da pena de disponibilidade, com proventos proporcionais, em observância aos artigos 42, IV e 45, II, da Lei Orgânica da Magistratura Nacional e artigo 6º, da Resolução CNJ n. 135/2011.

Recomendo, ainda, a remessa de cópia dos autos à Corregedoria Nacional de Justiça a fim de que sejam adotadas as providências reputadas cabíveis, com fundamento no art. 8°, do RICNJ, em razão dos fatos que surgiram durante a instrução do feito. Refiro-me, especificamente, à suposta sonegação fiscal, em razão de venda e compra de gado afirmada pelo magistrado nestes autos, na ordem de setenta e seis mil reais, sem registro ou emissão de nota em razão da negociação e sem adoção das medidas sanitárias devidas na situação concreta (expedição de Guia de Transporte Animal- GTA).

Encaminhe-se cópia do acórdão à Corregedoria Nacional, juntamente com a documentação constante dos IDs 3864631, 3864647, 3864648, 3864649, 3864650 e 3864653; IDs 2716646 e 271664; ID 2641630, para análise e deliberação a respeito da pertinência do prosseguimento da apuração.

 

É como voto.

 

 

Luiz Fernando BANDEIRA de Mello

 Conselheiro Relator



[1] Disponível em: https://www.cnj.jus.br/pautas/pautas-virtuais/pauta-de-julgamentos-da-11-sessao-do-plenario-virtual-19-04-2016-a-26-04-2016/. Acesso em : 22.9.2020.

[2]  Regimento Interno do CNJ:

Art. 120. As pautas do Plenário serão organizadas pela Secretaria-Geral, com aprovação da Presidência, encaminhando-se previamente aos Conselheiros os dados pertinentes aos pontos incluídos em pauta.

(...)

§ 2º A publicação da pauta de julgamento no Diário da Justiça antecederá quarenta e oito (48) horas, pelo menos, à sessão em que os processos possam ser chamados.

§ 3º Para ciência dos interessados, a pauta de julgamentos também será publicada no sítio eletrônico do CNJ.

[3] Art. 118-A. Será admitido o julgamento em ambiente eletrônico dos procedimentos que aguardam apreciação pelo Plenário.

(...)

§ 5º Não serão incluídos no Plenário Virtual, ou dele serão excluídos, os seguintes procedimentos:

V - os que tiverem pedido de sustentação oral (art. 125 do Regimento) ou solicitação, formulada pela parte, para acompanhamento presencial do julgamento.

[4] Súmula vinculante 5  Enunciado

 A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição.

[5] Súmula n.° 523, do STF: “No processo penal, a falta da defesa constitui nulidade absoluta, mas a sua deficiência só o anulará se houver prova de prejuízo para o réu.”

[6] Art. 103-B. O Conselho Nacional de Justiça compõe-se de 15 (quinze) membros com mandato de 2 (dois) anos, admitida 1 (uma) recondução, sendo: 

(...)

§ 4º Compete ao Conselho o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura:  

(...)

III - receber e conhecer das reclamações contra membros ou órgãos do Poder Judiciário, inclusive contra seus serviços auxiliares, serventias e órgãos prestadores de serviços notariais e de registro que atuem por delegação do poder público ou oficializados, sem prejuízo da competência disciplinar e correicional dos tribunais, podendo avocar processos disciplinares em curso, determinar a remoção ou a disponibilidade e aplicar outras sanções administrativas, assegurada ampla defesa;   

[7] Art. 4º Ao Plenário do CNJ compete o controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos magistrados, cabendo-lhe, além de outras atribuições que lhe forem conferidas pelo Estatuto da Magistratura, o seguinte:

§ 1º Dos atos e decisões do Plenário não cabe recurso.

[8] O magistrado defendeu-se dos fatos imputados e não da sua capitulação legal, de tal sorte que a divergência da classificação legal descrita na portaria inaugural  não tem o condão de inquinar o presente processo administrativo disciplinar.

[9] Lei Complementar n. 35, de 1979:

Art. 43 - A pena de advertência aplicar-se-á reservadamente, por escrito, no caso de negligência no cumprimento dos deveres do cargo.

Art. 44 - A pena de censura será aplicada reservadamente, por escrito, no caso de reiterada negligência no cumprimento dos deveres do cargo, ou no de procedimento incorreto, se a infração não justificar punição mais grave.

Parágrafo único - O Juiz punido com a pena de censura não poderá figurar em lista de promoção por merecimento pelo prazo de um ano, contado da imposição da pena.

[10] Resolução CNJ n.° 135/2011:

Art. 6º O magistrado será posto em disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço, ou, se não for vitalício, demitido por interesse público, quando a gravidade das faltas não justificar a aplicação de pena de censura ou remoção compulsória.

(...) 

Art. 7º O magistrado será aposentado compulsoriamente, por interesse público, quando:

I - mostrar-se manifestamente negligente no cumprimento de seus deveres;

II - proceder de forma incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções; 

III - demonstrar escassa ou insuficiente capacidade de trabalho, ou apresentar comportamento funcional incompatível com o bom desempenho das atividades do Poder Judiciário.

[11] Art. 56 - O Conselho Nacional da Magistratura poderá determinar a aposentadoria, com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço, do magistrado:

I - manifestadamente negligente no cumprimento dos deveres do cargo;

II - de procedimento incompatível com a dignidade, a honra e o decoro de suas funções;

III - de escassa ou insuficiente capacidade de trabalho, ou cujo proceder funcional seja incompatível com o bom desempenho das atividades do Poder Judiciário.

Art. 57 - O Conselho Nacional da Magistratura poderá determinar a disponibilidade de magistrado, com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço, no caso em que a gravidade das faltas a que se reporta o artigo anterior não justifique a decretação da aposentadoria.

[12] O marco prescricional é retomado após o transcurso do prazo de 140(cento e quarenta) dias da instauração do PAD .

Resolução CNJ n.° 135/2011:

Art. 24. O prazo de prescrição de falta funcional praticada pelo magistrado é de cinco anos, contado a partir da data em que o tribunal tomou conhecimento do fato, salvo quando configurar tipo penal, hipótese em que o prazo prescricional será o do Código Penal.

§ 1º A interrupção da prescrição ocorre com a decisão do Plenário ou do Órgão Especial que determina a instauração do processo administrativo disciplinar.

§ 2º O prazo prescricional pela pena aplicada começa a correr nos termos do § 9º do art. 14 desta Resolução, a partir do 141º dia após a instauração do processo administrativo disciplinar. (Alterada conforme retificação publicada no DJ-e n. 144, de 04 de agosto de 2011)