Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0008669-71.2020.2.00.0000
Requerente: ANTONIO JOSE CARDOZO
Requerido: THIAGO SOARES CASTELLIANO LUCENA DE CASTRO

 


EMENTA

 

RECURSO ADMINISTRATIVO EM RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR. PRETENSÃO DE REVISÃO DE ATO JURISDICIONAL. ART. 103-B, § 4º, DA CF. NÃO CABIMENTO. INDEPENDÊNCIA FUNCIONAL DO MAGISTRADO QUE REVERBERA EM GARANTIA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL IMPARCIAL EM FAVOR DA SOCIEDADE. RECURSO NÃO PROVIDO.  

1. O que se alega contra o requerido se classifica como matéria eminentemente jurisdicional, razão pela qual deve a parte valer-se dos meios processuais adequados, não cabendo a intervenção do Conselho Nacional de Justiça.  

 2. O CNJ, cuja competência está restrita ao âmbito administrativo do Poder Judiciário, não pode intervir em decisão exclusivamente jurisdicional, para corrigir eventual vício de ilegalidade ou nulidade, porquanto a matéria aqui tratada não se insere em nenhuma daquelas atribuições previstas no art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal.  

3. A independência funcional do magistrado reverbera em garantia de prestação jurisdicional imparcial em favor da sociedade, expressamente prevista no art. 41 da LOMAN, somente podendo ser questionada administrativamente quando demonstrado que, no caso concreto, o órgão judicial atuou com parcialidade decorrente de má-fé, o que não se verifica no caso.  

4. Ausentes indícios de má-fé na atuação do magistrado, eventual impugnação deve ser buscada pelos mecanismos jurisdicionais presentes no ordenamento jurídico.  

5. Recurso administrativo a que se nega provimento. 

 ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do voto da Relatora. Presidiu o julgamento o Ministro Luiz Fux. Plenário Virtual, 16 de abril de 2021. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Luiz Fux, Maria Thereza de Assis Moura, Emmanoel Pereira, Luiz Fernando Tomasi Keppen, Rubens Canuto, Tânia Regina Silva Reckziegel, Mário Guerreiro, Candice L. Galvão Jobim, Flávia Pessoa, Ivana Farina Navarrete Pena, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, André Godinho, Maria Tereza Uille Gomes e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Não votou, em razão da vacância do cargo, o representante do Ministério Público da União.

Conselho Nacional de Justiça

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0008669-71.2020.2.00.0000
Requerente: ANTONIO JOSE CARDOZO
Requerido: THIAGO SOARES CASTELLIANO LUCENA DE CASTRO


RELATÓRIO

          

A MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, CORREGEDORA NACIONAL DE JUSTIÇA (Relatora):  

Cuida-se de recurso administrativo interposto por ANTÔNIO JOSÉ CARDOZO contra decisão da Corregedoria Nacional de Justiça que arquivou a reclamação disciplinar formulada em desfavor do THIAGO SOARES CASTELLIANO LUCENA DE CASTRO, Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Jataí/GO (Id 4186743). 

Na inicial, o requerente alegou que o magistrado requerido cometeu irregularidades na condução do processo de execução n. 0022012.14.2011.8.09.0093.

Esclareceu que "no dia 19 de maio de 2.016, nos autos da carta precatória n. 332835-65.2015.8.09.0179, Comarca de Serranópolis, Estado de Goiás, expedida nos autos processo de execução n. 0022012.14.2011.8.09.0093 que, pela 2ª Vara Cível da Comarca de Jataí, Estado de Goiás, Adejar Caetano de Assis e sua esposa, movem contra o Reclamante e sua esposa Betânia Lupo Nascimento Cardozo, foi realizada à praça do imóvel rural denominado ‘Buriti do Alto’". Na mesma data foi deferido pelo Vice-Presidente do TJGO pedido de liminar no agravo em recurso especial (processo n. 379968-58.2015.8.09.0000) interposto pelo ora requerente para obstar a praça ou a expedição da carta de arrematação. Acrescentou que o auto de arrematação não foi assinado pelo magistrado em 19/5/2016, constando do referido documento apenas as assinaturas do leiloeiro e do arrematante (Id 4148014).

Argumentou que o magistrado proferiu ato processual, direcionado ao juízo deprecado, contrário ao disposto na legislação, eis que autorizou "a qualquer advogado ou estagiário, com a devida inscrição nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil, a retirar a carta precatória distribuída sob o n. 201503328354, para devolução a este juízo" (Id 4148014). Sustenta que ao proferir a decisão, no dia 27/7/2017, “defiro a expedição da carta de arrematação; b) defiro a imissão, imediata, na posse em favor de Adejar Caetano de Assis e/ou Maria Helena Carvalho de Assis, devendo a comarca de Serranópolis expedir o respectivo mandado. c) defiro a remoção de bens moveis, tais como semoventes, máquinas etc., caso o executado não retire imediatamente. Autorizo o sr. oficial de justiça a removê-los, colocando-os do lado de fora da propriedade, sob responsabilidade do executado", o magistrado considerou que a carta de arrematação estaria perfeita, fato equivocado já que não havia sido assinada pelo magistrado (Id 4148014).

Aduziu que "a assinatura do Auto de Arrematação, com a data de 19 de maio obstou o Representante e sua esposa de exercerem seu direito constitucional da ampla defesa e violou os princípios do devido processo legal, impugnando a arrematação, apontando os vícios e nulidades ocorridas no processo executivo" (Id 4148014).

Destacou que "passou-se, 48 horas úteis, da publicação da decisão que denegou o Recurso Especial, para se realizar o desentranhamento da carta precatória; efetivar a distribuição da carta precatória junto ao Juízo de Serranópolis; despachar com o magistrado para a expedição da carta de arrematação e do mandado de imissão na posse; os quais tiveram o efetivo cumprimento, em 01 de agosto de 2016. Com certeza, não existe notícia no Judiciário brasileiro, do cumprimento de uma carta precatória, com tamanha complexidade (imissão de posse em um imóvel rural), em tão exíguo espaço de tempo e, tudo, feito à revelia do Representado e sua esposa" (Id 4148014).

Ressaltou que "não se sabe, passados 04 (quatro) anos do efetivo cumprimento do mandado de imissão, o paradeiro dos bens móveis e parte dos semoventes que se encontravam no interior do imóvel, à época da imissão de posse (…) havia, à época da imissão, na sede do imóvel rural, quadros a óleo, pintados pela filha do Representante, cujo valor sentimental, é inestimável, além de fotos familiares, igualmente, de valores subjetivos incomensuráveis. Ademais, em razão dessas medidas judiciais açodadas, imprudentes e irresponsáveis, o Representante, vem sendo autuado (doc. 20), pela Agência Goiana de Defesa Agropecuária (Agrodefesa), desde a data da imissão na posse da "Fazenda Buriti do Alto", pela não efetivação de vacinação do rebanho, do qual desconhece o paradeiro" (Id 4148014). 

Requereu, por fim, a apuração dos fatos narrados e a aplicação da penalidade disciplinar cabível.

A Corregedoria Nacional de Justiça arquivou o procedimento, porquanto sua competência é restrita ao âmbito administrativo do Poder Judiciário, não podendo intervir em decisão judicial para corrigir eventual vicio de ilegalidade ou nulidade.  

O requerente interpôs recurso administrativo, no qual reitera os argumentos contidos na petição inicial, bem como afirma a competência do CNJ para apreciar a matéria (Id 4191730).

O requerido não apresentou contrarrazões.

É o relatório.

A07/Z09

 

Conselho Nacional de Justiça

 

Autos: RECLAMAÇÃO DISCIPLINAR - 0008669-71.2020.2.00.0000
Requerente: ANTONIO JOSE CARDOZO
Requerido: THIAGO SOARES CASTELLIANO LUCENA DE CASTRO

 

VOTO

         

A MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, CORREGEDORA NACIONAL DE JUSTIÇA (Relatora):  

O recurso administrativo não merece provimento. 

Conforme consignado no decisum recorrido, a via correcional se restringe "ao controle da atuação administrativa e financeira do Poder Judiciário e do cumprimento dos deveres funcionais dos juízes", nos termos do art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal.  

No presente caso, verificou-se que a insurgência em exame evidencia insatisfação com o conteúdo das decisões judiciais proferidas pelo requerido, visto que não guardam relação com a esfera correcional a questão relativa à decisão do magistrado que autorizou a imissão na posse do bem e a impugnação de outros atos processuais. 

Nesses casos, em que os atos impugnados têm natureza exclusivamente jurisdicional, a parte deve valer-se dos meios de impugnação previstos na legislação processual, não cabendo a intervenção da Corregedoria Nacional de Justiça.  

O Conselho Nacional de Justiça possui competência adstrita ao âmbito administrativo do Poder Judiciário, não podendo intervir em decisão judicial com o intuito de reformá-la ou invalidá-la, uma vez que pretendida revisão de ato judicial não se enquadra no âmbito das atribuições do CNJ, nos termos do art. 103-B, § 4º, da Constituição Federal.

 Nesse sentido:

 

(...) II. As atribuições deste Conselho são restritas ao âmbito administrativo do Poder Judiciário, não possuindo competência para intervir em ato de cunho jurisdicional. (CNJ – RA – Recurso Administrativo em PP – Pedido de Providências – Conselheiro – 0002001-21.2019.2.00.0000 –Rel. IRACEMA DO VALE – 50ª Sessão – j. 16/8/2019). 


(...) 2. Não cabe ao CNJ se imiscuir em atos praticados no curso de processos judiciais para examinar o acerto ou desacerto, ou suspender os efeitos dos atos neles praticados, tampouco interferir no poder de direção desses processos. Precedentes. (CNJ – RA – Recurso Administrativo em PP – Pedido de Providências – Conselheiro – 0010429-26.2018.2.00.0000 –Rel. MÁRCIO SCHIEFLER FONTES – 46ª Sessão – j. 3/5/2019).

 

Ademais, a independência funcional do magistrado reverbera em garantia de prestação jurisdicional imparcial em favor da sociedade, expressamente prevista no art. 41 da LOMAN, somente podendo ser questionada administrativamente quando demonstrado que, no caso concreto, o órgão judicial atuou com parcialidade decorrente de má-fé, o que não se verificou no caso.  

Assim, entendo que a decisão que determinou o arquivamento do procedimento deve permanecer íntegra.   

Ante o exposto, nego provimento ao recurso administrativo.  

É como voto.

 A07/Z09